Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | FÁTIMA BERNARDES | ||
Descritores: | VIOLÊNCIA DOMÉSTICA BEM JURÍDICO PROTEGIDO PLURALIDADE DE RESOLUÇÕES DESCONTINUIDADE TEMPORAL PLURALIDADE DE INFRACÇÕES | ||
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Data do Acordão: | 02/07/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Sumário: | I. O crime de violência doméstica é um crime específico, que pressupõe a existência de relação entre o agente e o sujeito passivo/vítima de entre as elencadas nas alíneas do n.º 1 do artigo 152.º do Código Penal. II. O tipo objetivo do ilícito preenche-se com a ação de infligir maus tratos físicos ou psíquicos à vítima, incluindo castigos corporais, privações da liberdade e ofensas sexuais. E quanto ao tipo subjetivo de ilícito, exige-se o dolo (o conhecimento e vontade de praticar o facto), em qualquer das suas formas (direto, necessário ou eventual). III. O bem jurídico protegido é a saúde, física, psíquica ou emocional, que pode ser afetada por toda uma multiplicidade de comportamentos que atinjam a dignidade pessoal da vítima, enquanto sujeito de qualquer das relações previstas no n.º 1 do artigo 152.º CP. IV. A unidade da conduta pode vir a cindir-se pelas seguintes razões: a) períodos prolongados de “bom comportamento”; b) quebras de contacto com a vítima; c) sujeição do agente a processo crime ou aplicação de uma pena. V. Havendo descontinuidade temporal entre os comportamentos agressivos integradores do tipo de ilícito, fundada nalguma daquelas razões, ocorre uma cisão da unidade normativo-social que suporta a continuidade tipicamente imposta para o crime de violência doméstica, daí podendo decorrendo a pluralidade de infrações. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora 1. RELATÓRIO 1.1. Neste processo comum n.º 1719/18.5GBABF, do Tribunal Judicial da Comarca de ... – Juízo Central Criminal de ... - Juiz ..., foi submetido a julgamento, com intervenção do Tribunal Coletivo, o arguido AA, melhor identificado nos autos, acusado da prática, em autoria material e em concurso efetivo, de: - Um crime de violência doméstica, p, e p. pelo artigo 152.º, n. º1, alíneas b) e c), n.º 2, alínea a) e n.ºs 4 e 5 do Código Penal, perpetrado sobre BB; - Um crime de violação, p. e p. pelo artigo 164.º, n.ºs 1, al. a) e 3 do Código Penal, perpetrado sobre BB; - Um crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152.º, n.ºs 1, al. d), 2, al. a), 4 e 5 do Código Penal, perpetrado sobre CC; - Três crimes de fotografias ilícitas, p. e p. pelo artigo 199.º, n.º 2, al. b) do Código Penal, perpetrados sobre DD; - Dois crimes de ameaça, p. e p. pelo artigo 153.º, n.º 1 do Código Penal, perpetrados sobre DD; e - Dois crimes de ameaça agravada, p. e p. pelo artigo 155.º, n.º 1, al. a) do Código Penal, por referência aos artigos 131.º e 153.º, n.º 1, ambos do mencionado diploma legal, perpetrado sobre DD. 1.2. BB e DD constituíram-se assistentes nos autos e deduziram pedido de indemnização civil contra ao arguido/demandado, pedindo a condenação deste no pagamento, respetivamente, de € 10.000 (dez mil euros) e de € 3.000 (três mil euros), em qualquer dos casos, acrescidos de juros vencidos e vincendos desde a notificação do demandado para contestar e até efetivo e integral pagamento. 1.3. Produzida a prova e encerrada a discussão da causa, o Tribunal procedeu à reabertura da audiência de julgamento, tendo comunicado ao arguido uma alteração não substancial dos factos descritos na acusação, bem como a alteração da respetiva qualificação jurídica (artigo 358º, n.ºs 1 e 3, do CPP), no sentido de os factos em causa serem suscetíveis de integrar a prática pelo arguido, de dois crimes de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152º, n.ºs 1, alínea b), 2, alínea a), 4 e 5 do Código Penal e de um crime de abuso sexual de pessoa incapaz de resistência agravado, p. e p. pelos artigos 165º, n.ºs 1 e 2 e 177º, n.º 1, al. b), ambos do Código Penal, tendo como ofendida BB. 1.3.1. Na sequência da referida comunicação, o arguido requereu prazo para preparação da defesa, que lhe foi concedido, tendo exercido o contraditório, sustentando que os factos comunicados não podem ter acontecido, dado ser humanamente impossível aguentar a assistente no ar apenas com uma mão e não permitem imputar-lhe o crime de abuso sexual de pessoa incapaz de resistência, no tocante à agravação prevista alínea b), do n.º 1, do artigo 177º, do Código Penal, além de que a alteração de factos comunicada é substancial, na medida em que, relativamente ao crime de violação de que vinha acusado, implica o agravamento dos limites mínimos e máximos da moldura penal. 1.3.2. O Coletivo de Juízes relegou para o acórdão a proferir a apreciação da defesa apresentada pelo arguido. 1.4. Foi proferido acórdão, em 17/06/2022, depositado nessa mesma data, com o seguinte dispositivo: «Face ao exposto, decide-se: 1. Absolver AA da prática de: 1.1. Um crime de violação, p. e p. pelo artigo 164º, n.º 1, alínea a) e n.º 3, do Código Penal; 1.2. Dois crimes de ameaça, p. e p. pelo artigo 153º, n.º 1, 155º, n.º 1, alínea a), por referência ao artigo 131º, todos do Código Penal; 1.3. Dois crimes de fotografias ilícitas, p. e p. pelo artigo 199º, n.º 2, alínea b), do Código Penal; 2. Condenar AA pela prática, em autoria material e em concurso efetivo, de: 2.1. Um crime de violência doméstica, p. e p. pelos artigos 13º, 14º, n.º 1, 26º, 152º, n.º 1, alínea b) e n.º 2, na pena de dois anos e seis meses de prisão [vítima BB]; 2.2. Um crime de violência doméstica, p. e p. pelos artigos 13º, 14º, n.º 1, 26º, 152º, n.º 1, alínea b) e n.º 2, na pena de três anos e nove meses de prisão [vítima BB]; 2.3. Um crime de violência doméstica, p. e p. pelos artigos 13º, 14º, n.º 1, 26º, 152º, n.º 1, alínea d) e n.º 2, do Código Penal, em vigor na data da prática dos factos e atualmente, p. e p. pelos artigos 13º, 14º, n.º 1, 26º, 152º, n.º 1, alínea e) e n.º 2, do Código Penal, na pena de dois anos e nove meses de prisão [vítima CC]; 2.4. Um crime de fotografias ilícitas, p. e p. pelo artigo 199º, n.º 2, alínea b), do Código Penal, na pena de dois meses de prisão [vítima DD]; 2.5. Um crime de ameaça p. e p. pelos artigos 13º, 14º, n.º 1, 26º, 153º, n.º 1, do Código Penal, na pena de quatro meses de prisão [vítima DD]; 2.6. Um crime de ameaça p. e p. pelos artigos 13º, 14º, n.º 1, 26º, 153º, n.º 1, do Código Penal, na pena de três meses de prisão [vítima DD]; 3. Condenar AA, em cúmulo jurídico das penas fixadas em 2.1. a 2.6., na pena única de cinco anos e nove meses de prisão 4. Condenar AA na pena acessória de proibição de contactar, por qualquer forma, com BB, pelo período de cinco anos [artigo 152º, n.º 4, do Código Penal]; 5. Condenar AA, no pagamento das custas, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC [artigo 513º, n.º 1 do Código de Processo Penal, em conjugação com o artigo 8º, n.º 9 e tabela III do Regulamento das Custas Processuais], acrescida dos encargos a que a atividade do mesmo houver dado lugar, nomeadamente o pagamento da fatura emitida pela DGRSP pela elaboração do relatório social [artigo 514º, nº 1, do CPP e artigo 16º, n.º 1, alínea d), do Regulamento das Custas Processuais], cujo pagamento deverá ser adiantado pelo IGFEJ; 6. Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil de deduzido por BB e, em conformidade: 6.1. Condenar AA a pagar-lhe a quantia de € 7.500 (sete mil e quinhentos euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data da presente decisão e até integral e efetivo pagamento; 6.2. Absolver AA do restante pedido; 6.3. Condenar demandante e demandado no pagamento das custas, na proporção do respetivo decaimento; 7. Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil de deduzido por DD e, em conformidade: 7.1. Condenar AA a pagar-lhe a quantia de € 1.000 (mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data da presente decisão e até integral e efetivo pagamento; 7.2. Absolver AA do restante pedido; 7.3. Condenar demandante e demandado no pagamento das custas, na proporção do respetivo decaimento; 8. Julgar totalmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido pelo C..., E.P.E. e, em conformidade: 8.1. Condenar AA a pagar-lhe a quantia de € 112,07 (cento e doze euros e sete cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, que se vencerem desde a data da notificação para contestar e até integral e efetivo pagamento, à demandante; 8.2. Declarar que não são devidas custas; 9. Condenar AA a pagar a CC a quantia de €1.500 (mil e quinhentos), a título de arbitramento oficioso; 10. Determinar que o arguido aguarde os ulteriores termos do processo sujeito à medida de coação de Termo de Identidade e Residência, que se mantém até à extinção da pena [artigo 196º, n.º 3, alínea e) e 214º, n.º 1, alínea e), ambos do Código de Processo Penal]; 11. Declarar perdido a favor do Estado o GPS apreendido; (...).» 1.5. Inconformado com o decidido, recorreu o arguido para este Tribunal da Relação, extraindo da motivação de recurso presentada as conclusões que seguidamente se transcrevem: «1 - Analisados os factos 21.1, 21.2, 25, 27, 27.1, 27.2, 27.3, 28, 40 e 42, da matéria provada ressalta à vista tratar-se de imputações genéricas, não havendo concretização contextual nem localização temporal desses factos, pelo que os mesmos deverão ser dados como não escritos, não podendo relevar para efeito de responsabilização criminal, uma vez que impedem o eficaz exercício do direito de defesa e o exercício do contraditório. 2 - Por outro lado, salvo o respeito devido por opinião diversa, o recorrente considera, nos termos do artigo 412.º, n.º 3 do CPP, que o tribunal a quo valorou erradamente os factos identificados com os números 5, 6, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 21, 21.1, 21.2, parte inicial do 22, 25, 26, 27, 27.1, 27.2, 27.3, 28, 29, 30, 31, 32, parte inicial do 33, 35, 36, 37, 42, 43, 43.1, 43.2, 43.3, 43.4, 43.5, 43.6, 47, 50, 53, 55, 62, 69 69.1, 69.2, 69.3, 70, 70.1, 71.1, 71.2, 71.3, 72.1, 72.2, 73, 73.1, 73.2, 74, 75, porquanto em relação aos mesmos não foi produzida prova que permita considerar, sem margem para dúvidas, a prática dos mesmos pelo arguido, pelo que se impunha considerar os referidos factos como não provados. 3 - No que respeita ao crime de violência doméstica agravado, previsto e punido pelos artigos 13º, 14º, n.º 1, 26º, 152º, n.º 1, alínea e) e n.º 2, do Código Penal, praticado contra o menor CC, a prova produzida em julgamento não permite dar como provados os factos elencados nos pontos 25, 26, 73, 73.1 e 74. Para o efeito basta atentar no depoimento prestado por BB, em .../.../2021, pelas 16h11m24ss, gravado no sistema em uso no tribunal, com início aos 38m50 ss.. 4 - Em relação ao período temporal considerado no ponto 25), não se percebe com base em que prova foi o mesmo dado como provado, pois a assistente limita-se a dizer que “O CC nem tinha um ano sequer”, mas nada refere quanto a datas. Pelo que forçoso será concluir que nenhuma prova foi produzida quanto ao período em que os factos descritos alegadamente ocorreram. Impondo-se, por isso, dar como não provado este ponto. 5 - Quanto ao facto descrito no ponto 26, não foi produzida qualquer prova que permita considerar provado tal facto. 6 - O Tribunal a quo julgou incorrectamente os referidos factos, impondo-se, por isso, após audição das declarações da assistente (gravadas, quanto a este ponto, no dia .../.../2021, pelas 16h11m24ss, gravado no sistema em uso no tribunal, com início aos 38m50 ss), dar os mesmos como não provados, e, em consequência absolver o recorrente do crime de violência doméstica agravado. Sem conceder, ainda se dirá: 7 - Mesmo que por hipótese, se considerasse provado que o recorrente abanou o menor, como descrito no ponto 25 dos factos provados, ainda assim, nada se provou quanto ao dolo, essencial para o preenchimento do elemento subjectivo do tipo de crime em análise, pois, referiu a assistente no seu depoimento identificado em 3) “Sim, são coisas que se calhar ele não sabe”. 8 - Ora, se o recorrente não sabia que abanar a criança lhe podia causar danos, forçoso será concluir que o mesmo não representou que atingia o corpo e a saúde de CC. 9 - Quanto ao ponto 73.2, apesar das expressões alegadamente utilizadas pelo recorrente serem deselegantes, não têm virtualidade de atingir a honra e a consideração do menor. 10 - Os factos dados como provados, quanto a este crime, não têm gravidade bastante para se afirmar que, com eles foi colocada em causa a dignidade pessoal do menor e que o seu bem-estar físico e emocional foi intoleravelmente lesado. 11 - As condutas descritas não encerram qualquer carga adicional relativamente a qualquer outra situação de ofensas à integridade física e injúrias, e, por isso, a conduta em análise não tem a virtualidade de, objectivamente, atingir intoleravelmente a dignidade pessoal do menor. 12 - No crime de violência doméstica não basta a prática de agressões físicas, é necessário que a conduta do agente seja susceptível de ser classificada como maus tratos. 13 - Decisivo para que tais comportamentos possam integrar o conceito de maus tratos físicos ou psíquicos passíveis de preencher o tipo objetivo do crime de violência doméstica é que revistam intensidade ou gravidade bastante para poder justificar “a sua autonomização relativamente aos ilícitos que as condutas individualmente consideradas possam integrar”. 14 - Inexiste qualquer fundamento para se concluir que a conduta do arguido é reveladora de especial censurabilidade ou perversidade, juízo que seria indispensável para a qualificação daquele ilícito criminal. 15 - Assim, por falta de preenchimentos dos elementos do tipo do crime de violência doméstica alegadamente praticado contra CC, impõe-se a absolvição do recorrente deste crime. 16 - Quanto ao crime de violência doméstica respeitante aos dias .../.../2016 e .../.../2016, o tribunal a quo, com base apenas nas declarações da assistente BB, considerou provados os factos constantes dos pontos 5, 6, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, da matéria de facto provada. Contudo, 17 - A descrição efectuada pela assistente da dinâmica dos factos é incompatível com a realidade, na medida em que, como se pode ver dos fotogramas 1, 2 e 3 juntos aos autos a fls. 443, assistente e arguido têm a mesma compleição física (altura e peso), mesmo que o arguido tivesse mais força, por ser homem – o que não ficou provado – ainda assim não conseguia manter a assistente no ar, com apenas uma mão, e com a outra, munido de um taser, e enquanto a assistente movimentava as pernas e o corpo, tentar acertar-lhe nas pernas com o mesmo, como esta pretende fazer crer. 18 - As regras da experiência comum não permitem aceitar como válida a versão apresentada pela assistente. Pelo que se impõe dar como não provados os factos constantes dos números 12., 13., 14 e 17. 19 – Além disso, a assistente refere ter gritado por auxílio e que os vizinhos ouviram. Inquiridos os vizinhos, EE, FF (declarações prestadas no dia .../.../2021, com início às 11:34:29) e GG (declarações prestadas no dia prestadas no dia .../.../2021, com início às 14h13m12s), os mesmos referiram nada terem ouvido. 20 - O mesmo se diga quanto aos restantes factos respeitantes aos dias .../.../2016 e .../.../2016, elencados nos pontos 5, 6, 8, 9, 10, 11, 15, 16 e 17, da matéria de facto provada, pois tiveram por base única e exclusivamente as declarações prestadas pela assistente, que são infirmadas pelas declarações prestadas pelo recorrente, que refere que discutiam, mas que, nesse período, nunca bateu na companheira. 21 - Assim, apesar da ampla margem de livre de apreciação da prova pelo tribunal, a prova produzida em julgamento, conjugada com as regras práticas da experiência e critérios lógicos, impunham decisão diversa da obtida pelo tribunal, pelas razões já exposta. 21 - Face ao exposto, deverão ser dados como não provados os factos elencados nos pontos 5, 6, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, da matéria de facto provada e, em consequência, o recorrente absolvido do crime de violência doméstica respeitante aos dias .../.../2016 e .../.../2016. Caso assim não se entenda, ainda se dirá: 22 - Salvo o devido respeito por opinião contrária, considera-se que os elementos do tipo do crime de violência doméstica alegadamente praticado nos dias .../.../2016 e .../.../2016 não se encontram preenchidos apenas com base nos factos supra mencionados em 16), pois os mesmos não têm gravidade suficiente para que se possa considerar a ocorrência de maus-tratos, elemento essencial ao preenchimento do tipo do referido crime. Pelo que se impõe a absolvição do recorrente do crime de violência doméstica que lhe era imputado. 23 - Considerou ainda o tribunal a quo que o recorrente teria praticado um outro crime de violência doméstica, previsto e punido pelo pelos artigos 13º, 14º, n.º 1, 26º, 152º, n.º 1, alínea b) e n.º 2, do Código Penal. Tendo, para o efeito, considerado que os elementos do crime se encontravam preenchidos através dos factos que considerou provados nos pontos 21, 21.1, 21.2, parte inicial do 22, 27, 27.1, 27.2, 27.3, 28, 29, 30, 31, 32, parte inicial do 33, 35, 36, 37, 42, 43, 43.1, 43.2, 43.3, 43.4, 43.5, 43.6, 47, 50, 53, 55, 62, 69 69.1, 69.2, 69.3, 70, 70.1, 71.1, 71.2, 71.3, 72.1, 72.2 e 75 da matéria de facto provada. 24 - Considerando que tais factos foram dados como provados apenas com base nas declarações da assistente e que as mesmas são infirmadas pelo depoimento do recorrente, não havendo qualquer fundamento para dar mais credibilidade às declarações prestadas pela assistente em detrimento das declarações prestadas pelo recorrente, em obediência ao princípio da presunção da inocência, impõe-se que sejam dados como não provados os factos supra mencionados. 25 - Desconhece-se em que documentação clínica ou depoimentos se baseia o tribunal para dar como provado que a assistente ficou com hematomas num braço, que não sabemos qual foi, nem a localização do hematoma. Impondo-se, por isso, dar como não provado o facto 28. 26 - Quanto ao facto 33, é verdade apenas que BB, em ... de ... de 2018, iniciou um relacionamento com um cidadão ..., pelo que deverá o mesmo ser alterado, passando a ter a referida redação. 27 - Deverá ser dado como não provado que foi o recorrente que praticou os factos elencados nos pontos 43. a 43.6, pois resulta das regras de experiência comum que qualquer um pode copiar e descarregar fotografias de terceiros existentes nas redes sociais e utilizá-las como bem entender, criando perfis falsos com as mesmas. 28 - Além disso, a fls. 323, a Polícia Judiciária refere "Para prossecução da investigação, são necessários elementos que apenas poderão ser fornecidos pela rede social "FACEBOOK", a qual está sediada nos ....". Contudo, as referidas diligências de prova ou não foram feitas ou não terão tido resposta, pelo que, é impossível apenas com a prova existente nos autos considerar que a referida página pertence ao arguido, sem margem para dúvidas. 29 - Face ao supra exposto, deverá ser dado como não provado que foi o recorrente que praticou os factos elencados nos pontos 43. a 43.6. 30 - Por consequência lógica, não se dando como provados os factos supra mencionados, ter-se-á que dar como não provados os factos elencados sob os n.ºs 70, 70.1, 71.1, 71.2, 71.3, 72.1, 72.2 e 75 da matéria de facto provada, pois que, para além das declarações da assistente infirmadas pelo depoimento prestado pelo arguido, nenhuma outra prova foi produzida sobre as mesmas. Assim, não existindo razão alguma para dar prevalência a um depoimento em detrimento do outro, impunha-se, em obediência ao princípio da presunção da inocência, considerar tais factos não provados. 31 - Pelo que, deverá em consequência, o recorrente ser absolvido do crime de violência doméstica que lhe foi imputado. 32 - Relativamente ao crime de fotografias ilícitas imputado ao recorrente, considerando a impossibilidade de identificar o autor da página do Facebook onde foram publicadas as fotografias, pelas razões indicadas em 27) e 28), impõe-se a absolvição do recorrente deste crime. Caso assim não se entenda, ainda se dirá: 33 - Considera-se que as penas aplicadas quanto aos crimes de ameaças e de fotografia ilícita são manifestamente exageradas, atendendo aos critérios de determinação da medida de pena previstos no artigo 71º do Código Penal. Endente-se antes adequada a aplicação de uma pena de multa, próximo do patamar mínimo, em relação a cada um dos crimes em apreço, uma vez que, tal como é referido no acórdão sob escrutínio, “as condutas do arguido se situam no patamar da baixa gravidade relativamente aos crimes de ameaça e fotografias ilícitas”. 34 - Considera-se que o artigo 70.º, do Código Penal, na interpretação segundo a qual quando estamos perante uma situação de concurso de crimes, e a parte deles o tribunal tem necessariamente de aplicar pena de prisão, impõe-se aplicar a pena de prisão quanto a todos os crimes em apreço, ainda que alguns sejam puníveis apenas com pena não privativa de liberdade, é inconstitucional, por violação das disposições conjugadas dos artigos 13.º e 30.º, da Constituição da República Portuguesa. 35 - Caso assim não se entenda e se considere que a pena a aplicar deverá ser a pena de prisão, ainda assim considera-se que as penas parcelares aplicadas são manifestamente excessivas e exageradas, e violam os critérios de determinação da medida da pena previstos no artigo 70.º, do Código Penal, devendo, por isso, ser reduzidas para o mínimo legal. 36 - Sem conceder, admitindo por hipótese, que o tribunal ad quem considera que o recorrente praticou os três crimes de violência doméstica que lhe vinham imputados, importa referir que a medida da pena concreta aplicada quanto aos mesmos é manifestamente excessiva. 37 - Constituindo as exigências de prevenção geral o limite mínimo da pena e a culpa do agente o seu limite máximo, a medida concreta da pena deve ter em consideração a finalidade de prevenção especial, de ressocialização do arguido ou de suficiente advertência, no sentido de retirar este agente do caminho criminoso. 38 - O Tribunal a quo não considerou devidamente que o recorrente é primário quanto aos tipos de crimes em análise. Por lado, também não teve em consideração a reduzida gravidade dos factos, nem o contexto em que os mesmos ocorreram – grande parte deles, num contexto de litigiosidade relativa à guarda do menor. 39 - Descurou também o tribunal que o recorrente se encontra integrado social e familiarmente, encontrando casado desde .../.../2020 (ponto 89 da matéria de facto). 40 - A medida da pena não pode, em caso algum ultrapassar a medida da culpa. 41 - Assim, considera-se que as penas aplicadas quanto aos crimes de violência doméstica são manifestamente exageradas, atendendo aos critérios de determinação da medida de pena previstos no artigo 71º do Código Penal, considerando-se antes adequada a aplicação de uma pena de prisão mais próxima dos limites mínimos. 42 - Quanto à medida da pena única decorrente do cúmulo jurídico, entende-se que a mesma é excessiva, exagerada e desproporcional, pois o tribunal a quo não valorou devidamente o efeito previsível da pena de prisão efectiva sobre o comportamento futuro do recorrente, desconsiderou o facto de os crimes em apreço estarem interligados entre si e terem sido cometidos num período de tempo estanque, bem como o facto de não se poder concluir por uma tendência criminosa da personalidade do arguido, tendo-se de um caso isolado e ainda o facto de três penas parcelares respeitarem factos semelhantes, devendo, por isso, ter um peso diminuto na determinação da pena conjunta. 43 - Com base nos critérios supra elencados, entende-se que a pena única deverá ser reduzida, para uma pena única nunca superior a 4 anos e 6 meses de prisão. 44 - O artigo 50.º, n.º 1, do Código Penal permite que o tribunal suspenda a execução da pena de prisão em medida não superior a cinco anos, se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. 45 - No caso, em apreço atendendo à ausência de antecedentes criminais quanto a crime da natureza dos aqui em apreço, deverá admitir-se a prognose social favorável, devendo, por isso, ser-lhe dada uma oportunidade, e suspender a execução da pena de prisão, por período idêntico ao da pena imposto, ainda que sujeita a regime de prova e a plano de readaptação social a delinear pela DGRS. 46 - No que respeita ao pedido de indemnização cível, entende-se que a sentença é nula, nos termos conjugados dos artigos 379.º, n.º 1, al. a) e 374.º, n.º 2, in fine, ambos do CPP, vício que, desde já, se argui, nos termos do n.º 2 do referido artigo 379.º, do CPP, por falta de fundamentação. 47 - Caso assim não se entenda, considera-se que o montante de indemnização fixado é excessivo, pois não deveria fixado em montante superior a €2.000,00 (dois mil euros), tendo em conta, nomeadamente, os rendimentos do arguido, os danos de pouca gravidade causados à assistente e, ainda que não justifique o comportamento do arguido, as razões que o motivaram a praticar os factos em análise. Pelo que, deverá o acórdão condenatório ser revogado, por violação do disposto no artigo 483º e 484.º, ambos do Código Civil. 48 - Decidindo, como decidiu, o Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 13.º, 30.º e 32.º, da Constituição da República Portuguesa, os artigos 40.º, 50.º, 70.º, 71,º, 77.º, 152º, n.º 1, alíneas b) e e) e n.º 2, 199.º, n.º a, al. b), 153.º, n.º 1, todos do Código Penal, e ainda os artigos 127.º, 379.º, n.º 1, al. a) e 374.º, n.º 2, in fine, ambos do CPP, bem como os artigos 483.º, 494.º e 496.º do Código Civil. Nestes termos e nos demais de direito, que V. Exas. queiram subscrever, deverá ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, ser revogado o acórdão recorrido e substituído por outro que se coadune com a pretensão exposta, fazendo-se, assim, a habitual e necessária JUSTIÇA.» 1.6. O recurso foi regularmente admitido. 1.7. O Ministério Público, junto da 1.ª instância, apresentou resposta, pronunciando-se no sentido de dever ser negado provimento ao recurso e confirmada a sentença recorrida nos seus precisos termos. 1.8. Neste Tribunal da Relação, o Exmº. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, aderindo à posição defendida pelo Ministério Público junto da 1.ª instância, na resposta que o mesmo ofereceu, concluindo no sentido de o recurso dever ser julgado improcedente. 1.9. Cumprido o disposto no n.º 2 do artigo 417º do Código de Processo Penal, o arguido/recorrente apresentou resposta, dando por reproduzidas as alegações feitas na motivação de recurso. 1.8. Feito o exame preliminar e, colhidos os vistos legais, realizou-se a conferência. Cumpre agora apreciar e decidir: 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.2. Acórdão recorrido 52.º Nessas circunstâncias, o arguido AA aproximou-se de BB e, de forma que se não logrou apurar, abriu a boca de BB e aí introduziu o seu pénis ereto, efetuando, por duas vezes, movimentos de vaivém até ter sido empurrado por aquela.115.º O arguido AA sabia ainda que ao abrir a boca de BB e introduzir na mesma o seu pénis ereto, efetuando, por duas vezes, movimentos de vaivém, agia sem o consentimento e contra a vontade de BB.Mais sabia o arguido AA que, ao atuar do modo supra descrito, constrangia BB a manter com o mesmo contacto de natureza sexual, com o propósito concretizado de obter prazer sexual e dar satisfação aos seus instintos lascivos e libidinosos, assim atentando, como atentou, contra a liberdade e autodeterminação sexual de BB. O tribunal comunicou que o descrito nos artigos 52º e 115º acusação nos artigos acima referido havia sucedido da seguinte forma: Artigo 52º Nessas circunstâncias, AA aproximou-se de BB e, verificando que a mesma estava a dormir e com a boca aberta, aí introduziu o seu pénis ereto;Em ato contínuo, BB acordou e, ao verificar que o pénis de AA havia sido introduzido na sua boca, empurrou-o, logrando, dessa forma, retirar o pénis do interior da sua boca; Artigo 115º AA, nas circunstâncias acima descritas, quis introduzir o pénis da boca de BB, ciente de que a mesma estava a dormir e que atuava contra a vontade da mesma;Agiu de forma livre, voluntária e consciente, sabendo a conduta que adotou proibida e punida por lei; Das alterações ora transcritas, resulta que as mesmas apenas divergem dos factos descritos na acusação relativamente ao modo como o arguido introduziu o pénis na boca de BB, considerando o tribunal que o arguido não abriu a boca de BB quando esta estava a dormir [facto que acusação erige como suscetível o conceito de constrangimento previsto no n.º 3, do artigo 164º, do Código Penal], mas sim que o mesmo, verificando que BB estava a dormir de boca aberta, aproveitou tal facto para introduzir o seu pénis nesse local. Em conformidade com a conduta objetiva adotada pelo arguido, o tribunal, ao nível do tipo subjetivo, comunicou que o mesmo quis, conscientemente, introduzir o pénis na boca da mesma, sabendo que estava a dormir e que, concomitantemente, estava temporariamente incapacitada de manifestar o seu dissentimento. Dito de outra forma, o tribunal, em função da prova produzida em audiência de julgamento, alterou uma atuação para constranger [abrir a boca pessoa que se encontrava dormir, contra a vontade cognoscível da vítima] para uma situação de aproveitamento de pessoa inconsciente [introdução do pénis da boca, que já se encontrava aberta, de uma pessoa que se encontrava dormir e, como tal, temporariamente incapaz de manifestar o seu dissentimento]. O referido aproveitamento é o elemento essencial do crime de abuso sexual de pessoa incapaz que o distingue dos crimes de coação sexual e violação, respetivamente previstos, nos artigos 163º e 164º, do Código Penal, na medida em que nestes últimos é necessário um prévio ato de constrangimento que coarta a vítima na sua liberdade de dissentir, enquanto que no crime de abuso sexual de pessoa incapaz, inexiste constrangimento que causa a incapacidade de dissentir, a qual preexiste à conduta eu consubstancial um ato sexual de relevo, aproveitando-se o mesmo de tal incapacidade para praticar tal ato. Postas as coisas nestes termos, tudo se reconduz à questão de saber se a alteração de uma ação de constrangimento para uma situação de aproveitamento nos termos ora descritos pode ser considerada o mesmo acontecimento histórico ou mesmo pedaço de vida que a acusação submete à apreciação judicial. Considerando que o bem jurídico protegido pelo crime de violação e o crime de abuso sexual de pessoa incapaz é o mesmo [liberdade e autodeterminação sexual], que a vítima é a mesma [BB], que o ato sexual de revelo praticado é o mesmo [introdução do pénis na boca de BB] e que tal ato ocorreu nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar [... de 2018], não oferece dúvida que estamos perante o mesmo facto histórico ou mesmo pedaço de vida, pelo que não estamos perante um crime diverso. Relativamente ao outro critério legal para aferir da existência da uma alteração substancial dos factos, isto é, a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis, considerando que o artigo 165º, n.º 2, do Código Penal prevê uma moldura abstrata de dois a dez anos e que o crime de violação, p. e p. artigo 164º n.º 2, alínea a), da redação que lhe foi dada pela Lei n.º 83/2015, de 5 de agosto [em vigor na data da prática dos factos] e atualmente previsto no artigo 164º, n.º 1, alínea a), e n.º 3, redação dada pela Lei n.º 101/2019, de 6 de ... [que entrou em vigor no dia 1 de outubro de 2019, cf. artigo 5º da referida Lei], prevê uma moldura penal, de um a seis anos, forçoso é concluir que estamos perante uma agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis e, concomitantemente, perante uma alteração substancial dos facto descritos na acusação. Considerando que, como ficou dito, o arguido se opôs ao conhecimento pelo tribunal pelos novos factos, não pode este conhecer de mérito relativamente a tal crime e, por outro lado, não valem como denúncia, dado por si só, não consubstanciam a prática de qualquer crime e, como tal, não são autonomizáveis. Termos em que, não se fará constar do elenco dos factos provados e não provados, a matéria descrita em 51º a 53º e 115º, da acusação. 3. QUESTÕES PRÉVIAS QUE INFLUEM NO MODO DE CONHECIMENTO DE MÉRITO: 3.1. FACTOS GENÉRICOS E/OU JUÍZOS JURÍDICO-CONCLUSIVOS: Seguindo a linha de orientação que vem sendo defendida, de forma reiterada, pelo Supremo Tribunal de Justiça [veja-se, a título exemplificativo, acórdãos do STJ de 5.2.2009 e de 15.11.2011, disponíveis, em texto integral, no endereço eletrónico www.dgsi.pt], bem como pelas Relações [acórdão da Relação do Porto de 9.3.20216 e acórdão da Relação de Évora de 21.6.2016, também disponíveis, em texto integral, no mesmo endereço eletrónico] entendemos que a matéria de facto narrada na acusação e elencado nos factos provados ou não provados de uma decisão judicial só deve integrar acontecimentos ou factos concretos, e não factos genéricos ou indeterminados, conceitos, proposições normativas ou juízos jurídico-conclusivos, sobretudo se integrarem o thema decidendum. Consequentemente, no que se refere ao tipo legal de violência doméstica, a acusação deve descrever condutas concretas, referentes a eventos que se traduzam em maus tratos físicos ou psíquicos [nomeadamente castigos corporais, privações da liberdade e ofensas sexuais], localizados no espaço e no tempo e que sejam dotados de uma dimensão externo-objetiva suficiente para que possam ser objeto de prova e contraditório no processo penal [referindo esta exigência relativamente ao crime de violência doméstica (dado que, à semelhança do crime de tráfico de estupefaciente, que esteve na origem da orientação em causa, é um tipo penal muito amplo), veja-se, a título exemplificativo, acórdão da Relação de Évora de 17-9-2013, acórdão da Relação do porto de 15-6-2016 e acórdão da Relação de Coimbra de 17-1-2018, todos disponíveis, em texto integral, in www.dgsi.pt.]. Em determinados segmentos da acusação deduzida nos presentes autos a referida exigência não foi respeitada, dada a forma genérica, vaga e difusa da descrição aí feita, bem como a referência a conceitos normativos e a juízos jurídico-conclusivos. Consequentemente, tais segmentos foram expurgados, nomeadamente: - O segmento do artigo 6º onde consta: “passou a maltratar BB, psicologicamente, insultando-a, ameaçando-a e controlando a sua rotina, as pessoas com quem se encontrava e privava, sexualmente, constrangendo-a a contactos de natureza sexual não desejados, e fisicamente, agredindo-a”; - Os segmentos dos artigos 21º, 30º, 32º e 44º onde consta: “número não concretamente apurado de vezes”; - O segmento dos artigos 59º, 60º, 72º, 94º, 117º, 118º, 120º e 121º onde consta: foros de seriedade; - O segmento do artigo 70º onde consta “por forma a controlar os movimentos de BB”; - O segmento do artigo 112º onde consta: “o que conseguiu”; - O segmento do artigo 113º onde consta: “propósito concretizado (…), com efetivamente causou”; - O segmento do artigo 114º onde consta: “como atingiu”, “que lhe são devidas, quer enquanto pessoa, quer na qualidade de companheira e x companheira e mão do se filho, humilhando-a”; - O segmento do artigo 115º onde consta: “propósito concretizado de obter prazer sexual e dar satisfação aos seus instintos lascivos e libidinosos, assim atentando, como atentou”; - O segmento dos artigos 116º e 119º onde consta: “conhecendo, por isso, o vínculo familiar que as une”. - O segmento do artigo 117º onde consta: “como efetivamente causaram, (…), e que, por tais motivos e pela relação familiar existente entre ambas, a mesma transmitiria, como transmitiu, aquelas expressões a BB, o que (…) conseguiu. - O segmento dos artigos 118º e 121º onde consta: “e conseguiu” - O segmento do artigo 120º onde consta: “como efetivamente causou, (…), e que, por tais motivos e pela relação familiar existente entre ambas, a mesmo transmitiria, como transmitiu, aquelas expressões a BB, o que (…) conseguiu. - O segmento do artigo 123º onde consta: além do mais, no interior da residência comum e na presença do seu filho menor de idade, CC, sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei, mas, apesar de o saber, quis atuar da forma descrita, causando, como causou, humilhação, sofrimentos físicos e psíquicos, medo e inquietação e receio pela vida, integridade física e segurança à sua atual ex-companheira BB e mãe do seu filho, CC. Não obstante a referida expurgação, a acusação narra factos concretos suscetíveis de preencher as referidas imputações genéricas e juízos jurídico-conclusivos, sendo esses os factos que farão parte do elenco da matéria provada e não provada, embora, como se verá, descrito com diferente encadeamento e com recurso a outras palavras, para melhor precisar, em termos lógico-cronológicos, o decurso da ação. O diferente encandeamento lógico-cronológico e uso de palavras diferentes da que constam da acusação [em termos gramaticais, trata-se de uma alteração da sintaxe, isto é, alteração da disposição das palavras na frase e das frases no discurso, incluindo a sua relação lógica, entre as múltiplas combinações possíveis para transmitir um significado completo e compreensível], na parte em que nada de novo acrescentaram à descrição da ação típica relevante, não foram comunicadas ao arguido, dado não configurarem matéria suscetível de ser considerada alteração substancial ou não substancial dos factos descritos na acusação [no sentido apontado, acórdão da Relação de Coimbra de 23-5-2012 e acórdão da Relação do Porto de 29-9-2010, disponíveis, em texto integral, no endereço eletrónico www.dgsi.pt]. Na parte em que se considerou existir uma alteração não substancial dos factos descritos na acusação, foi dado cumprimento ao disposto no artigo 358º, n.º 1, do C.P.P., cujas implicações processuais são as que se seguem. * 3.2. DA ALTERAÇÃO NÃO SUBSTANCIAL DOS FACTOS DESCRITOS NA ACUSAÇÃO:Conforme decorre da respetiva ata e do ponto 8. do relatório desta peça processual, na sequência da reabertura a audiência, o tribunal, diferentemente da situação referente ao crime de violação, entendeu que as alterações dos factos descritos na acusação relativos aos crimes de violência doméstica de que o arguido se encontrava acusação, era não substancial e, como tal, deu cumprimento ao disposto no artigo 358º, do C.P.P. Nessa sequência, o arguido não pôs em causa que as alterações comunicadas relativamente aos crimes de violência doméstica eram não substanciais, colocando apenas em causa a existência de indícios que permitissem sustentar a comunicação de tal alteração. Assim sendo, estamos perante uma questão de valoração da prova, a qual não obsta ao conhecimento de mérito, sendo decidida em sede própria, isto é, na fundamentação da matéria de facto. Consigna-se que inexiste qualquer nulidade ou irregularidade no facto de a comunicação da alteração não substancial dos factos ter tido lugar após o encerramento da discussão da causa, na medida em que esta não se confunde com o encerramento da audiência [expressão consagrada no n.º 1, do artigo 358º, do Código de Processo Penal], e a qual abrange todo o período que vai da respetiva abertura até à leitura da sentença, pelo que só com tal leitura fica precludida a possibilidade o tribunal de proceder a tal comunicação [acórdão da Relação de Lisboa, de 7-9-2010, disponível, in www.dgsi.pt]. Assim sendo, e tendo presentes as disposições conjugadas dos artigos 339º, n.º 4, 358º e 379º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal, os factos que constituem uma alteração não substancial dos descritos na acusação podem e devem ser conhecidos pelo tribunal e, como tal, serão elencados nos factos provados e, consequentemente, valorados como parte integrante do objeto do processo. III. FUNDAMENTAÇÃO: * B) FACTOS NÃO PROVADOS:Com relevância para a decisão da causa não se provaram os seguintes factos: a) A relação de namoro referida em 1) dos factos provados teve início em ... de 2013; b) Nas circunstâncias descritas em 5) dos factos provados, AA agarrou e apertou o pescoço de BB, causando-lhe dores nessa zona; c) Nas circunstâncias descritas em 7) dos factos provados, AA disse a BB: “não quero estar em casa para olhar para ti, tenho que aproveitar antes do meu filho nascer, tenho que aproveitar a liberdade”; d) No mês de ... de 2016, à hora do almoço, após um passeio de mota, AA regressou à residência referida em 2), e, dirigindo-se a BB, disse-lhe: “Foda-se ainda não está feito o almoço? Quero almoçar, estou com fome”; e) BB, ao mesmo tempo que lançava mão dos seus bens pessoais, para sair de casa, disse a AA: “Não sou tua empregada”; f) Nessa sequência, AA praticou os factos descritos em 11) e 12) dos factos provados, ao mesmo tempo que dizia “mato-te a ti e a essa bebé que tens aí, sua cabra”; g) Após BB gritar por ajuda nos moldes descritos em 14) dos factos provados, AA disse-lhe “cala-te caralho. É preciso isso tudo”; h) Devido ao descrito em 8), 9) e 12) BB sentiu dores na cabeça; i) AA e BB permanecerem na residência referida em 2) dos factos provados até ... de ... de 2017; j) Devido ao descrito em 21) e 21.2. dos factos provados, BB sofreu dores no nariz e o interior dos lábios ficaram negros; k) O descrito em 25) dos factos provados ocorreu até após ... de ... de 2018; l) Nas circunstâncias descritas em 25) dos factos provados, AA apertou os ombros de CC e efetuou os movimentos aí descritos em dez diferentes ocasiões ao mesmo tempo que proferia as expressões: “foda-se, caralho, merda do miúdo”; m) Numa das referidas ocasiões, AA desferiu uma palmada sobre a coxa direita de CC, provocando um hematoma na zona atingida; n) Nas circunstâncias descritas em 27) a 27.2. dos factos provados AA proferiu as expressões: “cabra de merda”, “puta de merda”, “filha da puta”, “vou arranjar outra mãe para o meu filho, tu não prestas, estás toda estragada”, “não sabes fazer nada, vou avariar o teu carro, para não ires trabalhar”; o) O descrito em 27 a 27.2. dos factos provados ocorria com frequência diária; p) DD esteve presente aquando da ocorrência do descrito em 27) a 27.3. dos factos provados e colocou o seu corpo entre o de AA e BB, de forma a impedir que aquele atingisse o corpo daquela; q) O descrito em 28) dos factos provados, ocorreu em ... de 2017 e AA, na sequência do aí descrito atirou BB contra a parede e a cama; r) AA atirou os talhares nos moldes descritos em 29) dos factos provados porque BB não havia lavado a roupa e, em simultâneo, disse-lhe “eu sei que não vou acertar no meu filho, quero é acertar em ti”; s) De seguida, AA agarrou e puxou os cabelos de BB e empurrou-a contra a uma parede, causando-lhe dores na cabeça; t) Nessa sequência, BB pegou no filho de ambos e levou-o para o quarto e, enquanto se encontrava ao telemóvel com a sua mãe, DD, o arguido AA, dirigindo-se-lhe, proferiu as seguintes expressões: “foda-se, vocês são umas merdas”; u) AA, ao mesmo tempo que proferia a expressão “ficas mas é aí sua cabra”, apertou o pescoço de BB em datas diferentes das referidas em 28) e 29) dos factos provados e, nessas ocasiões, empurrou-a contra o chão, a cama e o sofá, causando dores no pescoço e nas partes do corpo embatidas; v) O relacionamento iniciado por BB nos moldes descritos em 33) dos factos provados foi de amizade; w) Apercebendo-se dessa amizade AA, proibiu BB de manter tal amizade, retirou-lhe o telemóvel e afirmou: “só iria ficar tudo bem se a mesma apresentasse queixa por assédio contra o amigo em causa”, que “iria ter outras mulheres”, que aquela “não prestava” e “não sabia como tinha conseguido ter um filho com a mesma”; x) Nas circunstâncias descritas em 35) dos factos provados, BB ingeriu quatro comprimidos do antidepressivo “maprotilina ratiopharm 50 mg” e de quatro comprimidos do ansiolítico “ansitec 5 mg” e foi assistida naquela residência por elementos da Cruz Vermelha; y) Ao ingerir os comprimidos nos moldes descritos em 35) dos factos provados, BB visou o suicídio; z) Nas circunstâncias descritas em 36) dos factos provados, quando BB retirava o menor CC da banheira, este escorregou; aa) Nessa sequência, AA disse a BB “não és boa mãe” e “quando o menino está contigo, está sempre a chorar”. bb) Em ato contínuo, AA puxou pelos pés de CC, que se encontrava ao colo de BB, e colocou-o no seu próprio colo; cc) No período temporal mencionado em 42) dos factos provados, AA, em local não apurado, disse a DD: “ando com uma pistola no bolso, vou metê-la na boca da tua filha, dou-lhe um tiro e rebentou-lhe os miolos”; dd) AA, agir nos moldes descritos em cc) representou que proferia expressão em que anunciava que iria provocar a morte BB e que a mesma era suscetível de lhe causar medo e inquietação, o que, de forma livre e consciente, quis, sabendo que praticava conduta proibida e punida por lei; ee) A expressão descrita em 42) dos factos provados foi comunicada por DD a BB; ff) A mensagem e fotografia referidas em 43.1. dos factos provados foram enviadas a BB no dia ... de ... de 2018; gg) No mês de ... de 2018, AA obteve uma fotografia de DD, na sequência do que procedeu à publicação mencionada em 43.3. dos factos provados; hh) As fotografias de DD mencionadas em 43.3. 43.5 e 43. e 43.6 foram publicadas em três diferentes datas; ii) No mês de ... de 2019, AA, através telemóvel com o número ...57, telefonou para HH [doravante HH], pai de BB, e disse-lhe “a tua filha deveria passar sempre em cima da passadeira”; jj) Nessa sequência, HH deu de imediato conhecimento a BB da referida expressão; kk) AA, ao agir conforme descrito em ii) sabia que estava a proferir expressão em que anunciava que iria atingir a integridade física de BB e que a mesma era suscetível de causar medo e inquietação na mesma, no caso de HH lhe transmitir a mesma; ll) Nas circunstâncias descritas em 49.1 dos factos provados AA seguiu BB até ao local aí referido; mm) No dia ... de ... de 2019 , pelas 17:30 horas, após a visita ao menor CC, sabendo que se tratava de trajeto a seguir por BB para a Casa Abrigo, AA aguardou, no interior do seu veículo automóvel, nas imediações do estabelecimento comercial, denominado supermercado ..., junto ao ..., na ..., a passagem de BB e daquele menor; nn) No dia mencionado em 52) dos factos provados BB, AA, ao volante do seu veículo automóvel, seguiu BB até a um estabelecimento de café e de bebidas, sito em ..., quando aquela ali se deslocou acompanhada do vizinho JJ; oo) De seguida, AA, de capuz na cabeça, passou apeado por BB; pp) Após o regresso de BB à residência identificada em 52) dos factos provados, AA permaneceu durante cerca de 10 (dez) minutos parado em frente à mencionada residência; qq) No dia ... de ... de 2019, a hora concretamente apurada, compreendida na manhã do referido dia, AA enviou a BB uma fotografia que ilustrava o local onde a mesma se encontrava quando tirou ao menor CC a fotografia referida em 44.1.; rr) No dia ... de ... de 2019, pelas 18:12 horas, AA, através do telemóvel número ...57, telefonou para o telemóvel número ...56, pertencente a DD, a quem disse: “vou acabar com a raça de toda a família”; ss) No dia ... de ... de 2019, BB, acompanhada pelo menor CC, deslocou-se para a cidade ..., onde permaneceu na residência de DD, sua mãe, sita no ..., ..., ..., ... e ...; tt) No dia ... de ... de 2019, pelas 13h00, AA, através do telemóvel com o número ...57, telefonou para o telemóvel número ...56, pertencente a DD, e disse-lhe: “se eu vejo o meu filho aí dentro da tua casa eu pego-lhe fogo”; uu) AA, agir nos moldes descritos em tt) representou que proferia expressão em que anunciava que iria danificar um imóvel de DD e que a mesma era suscetível de lhe causar medo e inquietação, o que, de forma livre e consciente, quis, sabendo que praticava conduta proibida e punida por lei; vv) Nas circunstâncias de tempo e lugar mencionados em 57), 57.2. e 57.3. dos factos provados AA disse a BB “não tens medo de mim, mas devias ter que vou dar cabo da tua vida, aqui não te faço nada, cadela, filha da puta, violada”, provocando-lhe dores no pescoço e no tronco; ww) O descrito em 57.2. dos factos provados ocorreu quando CC se havia dirigido às prateleiras do supermercado; xx) HH deu conhecimento a BB da mensagem descrita em 62) dos factos provados; yy) O descrito em 63) dos factos provados sucedeu mais que uma vez; * * * C) MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO:Relativamente à matéria descrita em 1) e 2) dos factos provados e vertida na alínea a) dos factos não provados [narrada no artigo 1º e 2º da acusação], o tribunal valorou, de forma crítica e conjugada, as declarações do arguido e da assistente/demandante BB, as quais, se mostraram coincidentes quanto ao momento temporal em que iniciaram a relação de namoro, quanto ao momento temporal em iniciaram a união de facto [isto é, em comunhão de cama, mesa e habitação], e quanto à localização do imóvel onde passaram a efetivar a referida comunhão. Considerando que por ambos foi dito que a relação de namoro teve início no mês de ... de 2012 [e não, como referido no artigo 1º acusação, em julho de 2012] o tribunal, por imposição lógica decorrente do princípio da não contradição, considerou não provada a matéria vertida na alínea a). Com efeito, o postulado lógico decorrente do princípio da não contradição determina que duas afirmações contraditórias não podem ser verdadeiras ao mesmo tempo sob o mesmo aspeto, ou seja, são mutuamente excludentes [trata-se aqui da formulação mais simples do princípio da não-contradição, isto é, como a segunda das três leis clássicas do pensamento, correlato da lei da identidade (a primeira dessas leis), a qual divide o universo em duas partes, criando, dessa forma uma dicotomia, da qual resulta que as duas partes são "mutuamente excludentes". É essa formulação que, segundo cremos, está subjacente na alínea b), do n.º 2, do artigo 410º, do C.P.P., ao falar em contradição insanável]. O apuramento da matéria descrita em 3) [não mencionada diretamente na acusação, mas relevante para o afirmado no artigo 6º dessa mesma peça processual] assentou na valoração crítica das declarações de BB, a qual referiu o mês em que soube em que está grávida, estando tais declarações de acordo com as regras que regem na medicina, dado que tendo CC nascido a .../.../2017 [cf. infra] e que se tratou de uma gravidez de termo [ou seja, com a duração de não inferior a 39 semanas], o primeiro mês de gravidez coincide com o mês de ... de 2016. Relativamente à matéria descrita em 4) a 17) dos factos provados e vertida nas alíneas b) a h) dos factos não provados [narrada, em parte, nos artigos 7º a 27º da acusação], o tribunal valorou, de forma crítica e conjugada, as declarações do arguido e da assistente/demandante BB, nos moldes que a seguir se explicitam. O arguido assumiu que no dia ... de ... de 2019, dia de aniversário do sobrinho de BB, se preparava para sair com o seu padrinho para andar de mota, pelo que foi questionado por aquela se já não iam ao aniversário daquele, tendo respondido que não ia. Negou, contudo, o descrito nos artigos 8º e 9º da acusação, ou seja, que tenha puxado os cabelos de BB, que lhe tenha apertado o pescoço e que lhe tenha dito “eu quero que o teu sobrinho se foda”. Por seu turno, BB, referiu que, ao verificar que o arguido ia a sair de casa para passear com o padrinho, lhe disse: “então e aos anos do meu sobrinho, já não vamos?”; Nessa sequência, AA, ao mesmo tempo que dizia “eu quero que a tua irmã e o teu sobrinho se fodam”, puxou-lhe os cabelos para trás, o que lhe causou dores na nunca. Não confirmou, porém, que, nessa ocasião, o arguido lhe apertou o pescoço e a encostou à parede nos moldes descritos no artigo 8º da acusação, e não confirmou, que tenha sofrido dores no pescoço. Já no que se refere ao descrito nos artigos 10º a 27º da acusação, o arguido apenas admitiu que foi confrontado por BB relativamente ao facto de passar mais tempo fora de casa do que com ela, mesmo quando estava de férias, e que arrancou o “taser” das mãos da mesma, mas para evitar ser agredido [de forma a que não restasse dúvida de que o arguido e a assistente, ao falarem e “taser” se estavam a referir a um mecanismo que produz descargas elétricas, fez-se constar na descrição dos factos provados as caraterísticas de tal mecanismo]. Tudo o mais descrito nos artigos 10º a 27º da acusação, com exceção de a assistente ter saído da residência, na sequência do episódio que envolveu o uso do “taser”, o arguido referiu não corresponder à verdade. BB, no que se refere à matéria em causa, isto é, narrada nos artigos 10º a 27º da acusação, referiu que tudo teve lugar no dia ... de ... de 2016 [data que reteve vívida na memória, por corresponder ao dia em que saiu da residência onde vivia em união de facto e foi viver para a casa da sua mãe], esclarecendo, no que se refere ao descrito no artigo 10º a 15º, que após confrontar o arguido, que se encontrava de férias a seu pedido, com o facto de o mesmo não aproveitar para passar tempo consigo, mas sim com os amigos, lhe disse: “se não estou aqui a fazer nada, vou-me embora”. Nessa sequência, o arguido agarrou-lhe pelo pescoço, empurrou-a contra uma das paredes da cozinha e, ao mesmo tempo que dizia: “mato-te a ti ao bebé”, apertou-lhe o pescoço com tal força que, dado momento, começou a sentir falta de ar, a qual persistiu até ao ponto de se sentir a desfalecer [deixou de ter força para se manter de pé]. Só nessa altura o arguido lhe largou o pescoço, o que, devido a falta de força nas pernas, fez com caísse no chão da cozinha. Mais referiu que não tem memória de o arguido ter proferido a frase narrada no artigo 11º da acusação, ou seja, “não quero estar em casa a olhar par ti, tenho que aproveitar antes do meu filho nascer, tenho que aproveitar a liberdade”, bem como a expressão que consta do artigo 13º da acusação, ou seja, “cabra”. Mais referiu, relativamente ao narrado em 16º a 25º, que no próprio dia 26 de junho de 2016 [não no mês de ... de 2016, como referido na acusação], depois de recuperar a força, levantou-se do chão e dirigiu-se ao quarto e pegou no “taser” que ambos haviam adquirido em ..., e exibiu-o ao arguido, ao mesmo tempo que lhe dizia “se me voltas a tocar, mato-te”. Nessa sequência, o arguido arrancou-lhe o “taser” das mãos e empurrou-a contra uma parede e, com umas mãos, apertou-lhe o pescoço no sentido ascendente, aplicando força capaz de a levantar no ar, e, com a outra mão, pressionou o botão do “taser” que permite que o mesmo efetue descargas elétricas, e dirigiu-o em direção às suas pernas. Como se encontrava com as pernas suspensas no ar, conseguiu movimentá-las para os lados, evitando, dessa forma, que as descargas elétricas produzidas pelo “taser” a atingissem. Nesta situação não proferiu qualquer frase, não sendo, pois, verdade que tenha dito “mato-te a ti e a esse bebé que tens aí, sua cabra”. A dado momento, o arguido cessou a sua conduta, pelo que aproveitou para se dirigir para a porta da rua, tendo-se deparado com a porta fechada à chave, tendo sido o arguido a fazê-lo. Como não sabia das suas chaves começou a gritar por ajuda, na esperança que os vizinhos ouvissem, mas ninguém veio em seu auxílio. Decorrido algum tempo, visualizou as suas chaves de casa em cima do sofá, pegou nas mesmas, abriu a porta e saiu da residência comum, indo residir para a casa da sua mãe, onde permaneceu durante 5 ou 6 meses, após o que retomou a união de facto com o arguido, na mesma residência. As declarações da assistente, dada a sua espontaneidade, coerência e descomprometimento foram valoradas como credíveis. Com efeito, a argumentação usada pelo arguido para minar a credibilidade de BB, alavancada na imputação à mesma problemas psicológicos [dada a toma de ansiolíticos e a tentativa de suicídio], de infidelidade [envolveu-se sexualmente com outro homem, quando ainda estava a viver em união de facto com ele], apresentação tardia de queixa [só apresentou queixa contra após cessar união de facto] e motivada pelo receio de perder a guarda do filho comum para o arguido, não colhe, na medida em que BB explicou que tomou comprimidos na sequência de ser agredida física e psicologicamente pelo arguido, o que este, em parte, corroborou, ao admitir que a chamava de porca e puta, que lhe dizia não sabia fazer comida, que não sabia cuidar do filho, que não cuidava da limpeza da casa, que tinha asco dela e que a mesma era uma “violada” porque tinha sido abusada sexualmente quando ainda era criança. Ora, expressões e críticas deste jaez, confessadas pelo arguido, são demolidoras para a autoestima e, como tal, suscetíveis de criar picos de ansiedade que levaram BB à toma de ansiolíticos. Ou seja, a toma de medicamentos por parte da assistente não preexistia às condutas do arguido, são sim consequência das mesmas. Mesmo dando por adquirido, dado os estudos que apontam nesse sentido, que BB era portadora de marcas de sofrimento psicológico profundo por ter sido abusada sexualmente em criança, tal não conduz a que se torne numa pessoa mentirosa. Já o facto de o arguido, confessadamente, usar esse abuso como forma de diminuir BB, fazendo-a sentir-se culpada pelo sucedido, apodando-a de “violada de merda” revela ato de crueldade, ou seja, uma atitude interior que revela baixeza de caráter. As caraterísticas da atitude interior [a doutrina alemã, fala a este propósito de gesinnungsmerkmale, vide STRATENWERTH, in Zur Funktion strafrechtlischer Gesinnungsmerkmale, Weber- FS. 1963. p. 171, apud FIGUEIREDO DIAS, in Direito Penal, Parte Geral, 3ª edição, p. 446, nota 100], relevam ao nível da culpa. Relativamente ao facto de BB ter decidido iniciar uma relação extraconjugal, não lhe retira credibilidade, antes é fator que a acentua, na medida a que a mesma, de forma absolutamente descomprometida/desprendida, assumiu que iniciou essa relação extramarital. Fê-lo porque, segundo as palavras da própria “o arguido a deixou de querer conviver socialmente com mesma, de lhe dizer que tinha asco dela, que não queria andar com a tromba em público e de procurar para terem relações sexuais e, como tal, decidiu procurar ser feliz com outra pessoa”. Ora, esta explicação, dada de forma espontânea e “sem sombra de pecado” [se não me queres, vou procurar quem me queira], revela, de forma impressiva, autenticidade/genuinidade. O arguido juntou mensagens trocadas com a mãe da arguida, em que esta mostra desagrado com a atitude de BB e incentiva o arguido a terminar com essa relação. Nada disso afeta a autenticidade da mesma. BB é livre de escolher o parceiro que entender, nada a obrigando a escolher um que agrade à mãe. As pessoas não são mais ou menos credíveis consoante escolham parceiros do agrado dos pais. A apresentação da queixa após a cessação da união de facto é atitude corrente em muitas das vítimas de violência doméstica, as quais, após longos períodos de sofrimento, conseguem ganhar coragem para por fim à relação e ganhar consciência crítica que as torna capazes de denunciar a pessoa que sobre as mesmas exerceu violência doméstica. O suposto medo da perda da guarda do filho, após a separação, como motivo para mentir também não colhe, na medida em que, após tal separação, o arguido admitiu ter enviado mensagens injuriosas e contendo ameaças, credibilizando, dessa forma, o afirmado por BB no período em que viveram em união de facto. A argumentação de que era humanamente impossível o arguido ter levantado a assistente BB no ar, dada a sua estatura e compleição física, também não afeta a credibilidade do relatado por BB, dado que a assistente é pessoa de estatura baixa e franzina e estava encostada à parede, sendo, assim, perfeitamente possível ao arguido, em estado de fúria e com o apoio da parede, levantar, por momentos, a assistente do chão nos termos dados como provados. Por último, o depoimento prestado pela testemunha FF, arrolada pelo arguido, que foi vizinha daquela e BB, em nada beliscou a credibilidade desta última, na medida em que dizer que não presenciou agressões não infirma o relatado por BB, pois as mesmas ocorreram no interior da residência. Acresce que a referida testemunha relatou que viu e ouviu discussões, o que é facto potenciador do relatado por BB. Termos em que se considerou provada a matéria descrita em 4) a 17), resultando não provada a matéria vertida nas alíneas b) a h), na medida em que a mesma ou é logicamente incompatível com a matéria dada como provada ou não foi confirmada por BB. .O apuramento do facto 18) [correspondente à parte final do artigo 27º da acusação] assentou nas declarações da assistente, a qual, relatou que, na sequência de o arguido lhe ter pedido desculpa e prometido que não voltava a adotar os comportamentos que a levaram a sair de casa, regressou à mesma quanto estava grávida de cinco ou seis meses, ou seja, ... ou ... de 2016, retomando a união de facto, isto é, comunhão de cama, mesa e habitação. O arguido confirmou o regresso à residência de BB quando a mesma ainda se encontrava grávida, mas disse não se recordar do momento exato em que tal sucedeu. Face ao exposto, e considerando que nenhuma outra prova foi feita sobre tal facto, o tribunal considerou provado que BB regressou à residência referida em 2) em novembro [cinco meses], retomando a união de facto com o arguido. O apuramento do facto 19) [correspondente ao artigo 5º da acusação] resultou da análise do assento de nascimento junto a fls. 646, o qual consubstancia documento autêntico, pelo que, não tendo a sua autenticidade e veracidade posta em causa [antes pelo contrário, pois arguido e a assistente BB, corroboraram o respetivo teor] faz prova plena dos factos materiais nele inscritos [artigo 169º, do C.P.P], ou seja, comprova a data de nascimento e filiação de CC. Relativamente à matéria descrita em 20) dos factos provados e vertida na alínea i) dos factos não provados [correspondente á parte fina do artigo 2º e ao artigo 3º da acusação] o tribunal valorou as declarações da assistente BB, não infirmadas pelas declarações do arguido ou qualquer outro meio prova, ao mencionou que ainda antes de CC ter completado um mês de idade saírem da habitação referida em 2) dos factos provados e passaram a residir, em união de facto, no imóvel identificado no artigo 3º da acusação. Considerando que BB não referiu o dia exato em que mudaram em residência, o tribunal considerou não provado que tal mudança ocorreu no dia 20 de fevereiro de 2016, ou seja, considerou não provada a matéria vertida na alínea i) Relativamente à matéria descrita em 21) a 21.2., 22) e 23) dos factos provados e vertida na alínea j) dos factos não provados [narrada, em parte, nos artigos 28º, 35º e 36º da acusação], o tribunal valorou, de forma crítica e conjugada, as declarações do arguido e da assistente/demandante BB, nos moldes que a seguir se explicitam. A assistente relatou a ocorrência dos factos descritos em 21) a 21.2., 22) e 23) da acusação.~ Por seu turno, o arguido admitiu ter proferido as expressões “não quero andar com a tua tromba” e “vou arranjar outra mãe para o meu filho”, negando ter proferido as demais expressões descritas no artigo 28º. Negou ter agredido BB nos moldes descritos em 35º da acusação e causado na mesma as lesões descritas no artigo 36º da mesma peça processual. Pelas razões já acima exaradas, o tribunal considerou que BB prestou declarações credíveis e, como tal, deu como provada a matéria descrita em 21) a 21.2., 22) e 23) e, dado tais lesões não terem sido confirmadas pela assistente, não provada a matéria descrita na alínea j). O apuramento do facto 24) [correspondente ao artigo 4º da acusação] assentou nas declarações do arguido e da assistente BB, coincidentes quanto ao facto de terem passado a residir na Rua ..., ..., ..., ..., no início do Verão de 2017, ou seja, atendendo ao calendário gregoriano que nos rege, no dia ... de ... de 2017. Relativamente à matéria descrita em 25) e 26) dos factos provados e vertida nas alíneas k) a m) dos factos não provados [narrada nos artigos 55º a 57º da acusação], o tribunal valorou, de forma crítica e conjugada, as declarações do arguido e da assistente/demandante BB, nos moldes que a seguir se explicitam. O arguido negou ter agredido o seu filho. BB confirmou que, pelo menos quatro vezes, todas antes do CC completar um ano de idade, o arguido, porque era acordado pelo choro do filho, pegava nos ombros dele, abanava-o e empurrava o corpo do mesmo contra o colchão. Pelas razões já acima exaradas, o tribunal considerou que BB prestou declarações credíveis e, como tal, deu como provada a matéria descrita em 25) e 26) . Dada a matéria descrita nas alíneas k) a m) ser incompatível com a matéria descrita em 25) e 26), a mesma foi dada como não provada. Relativamente à matéria descrita em 27) a 27.3. e 28) dos factos provados e vertida nas alíneas n) a q) dos factos não provados [narrada nos artigos 28º a 34º, da acusação], o tribunal valorou, de forma crítica e conjugada, as declarações do arguido e da assistente/demandante BB, nos moldes que a seguir se explicitam. O arguido admitiu, embora não com caráter diário, que disse a BB que não sabia cuidar do filho, que lho ia tirar no Tribunal de Família, que a mesma não saber fazer nada, que a chamou de cabra e que lhe tirou o filho dos braços, referindo quanto a esta última situação que o fez porque BB estava a lavar loiça, a criança escorregou e bateu com a cabeça. Por seu turno, BB, cujas declarações foram consideradas credíveis pelos motivos acima referido, confirmou o descrito em 27) a 27.3. e negou a ocorrência da situação de CC ter batido com a cabeça. Mais referiu que as expressões descritas em 27.1. não ocorreram com caráter diário, mas com muita frequência, pelo que é possível afirmar, para além da dúvida razoável que, pelo menos semanalmente, tal aconteceu. Referiu ainda que, para além das situações já acima referidas, o arguido lhe voltou a apertar o pescoço, a atirou ao chão, onde bateu com o braço e ficou com hematomas e que essa terceira vez ocorreu antes do episódio que teve lugar no dia ... de ..., razão pelas qual se considerou provado o descrito em 28). O descrito nas alíneas n) a q) foi considerado não provado porque não confirmado por BB, sendo que o referido em p) também não foi confirmado por DD. Relativamente à matéria descrita em 29) a 32) dos factos provados e vertida nas alíneas r) a u) dos factos não provados [narrada nos artigos 37º a 41º e 44º e 45º da acusação], o tribunal valorou, de forma crítica e conjugada, as declarações do arguido e da assistente/demandante BB, nos moldes que a seguir se explicitam. O arguido admitiu que teve uma discussão com BB com questões relacionadas com a limpeza e que, nessa sequência, a chamou de porca. Negou a situação que envolveu o arremesso de facas e a agressão descrita no artigo 39º da acusação. Por seu turno, BB, cujas declarações foram consideradas credíveis pelos motivos acima referido, confirmou a ocorrência descrito em 29) a 32), mas não o descrito nas alíneas r) a u). Relativamente à matéria descrita em 33) e 34) dos factos provados e vertida nas alíneas v) a w) dos factos não provados [narrada nos artigos 42º e 43º da acusação], o tribunal valorou, de forma crítica e conjugada, as declarações do arguido e da assistente/demandante BB, nos moldes que a seguir se explicitam. O arguido, como resulta do já acima afirmado, soube que BB se envolveu sexualmente com cidadão de nacionalidade ..., o que, como também já acima referido, foi confirmado por BB, a qual explicou o motivo de tal envolvimento, ou seja, o facto de ser agredida, injuriada e ameaçada pelo arguido e o de o mesmo se recusar a manter relações sexuais consigo. Referiu ainda BB que, quando o arguido descobriu tal relacionamento, a apodou de “cadela”. Pelas razões já referidas as declarações da BB foram credíveis, pelo que o descrito em 33) e 34) foi considerado provado. A matéria vertida nas alíneas v) a w) foi considerada não provada porque, em parte, é incompatível como o considerado provado [mormente a existência de uma relação de amizade com o cidadão de nacionalidade ...], e, na outra parte, não foi confirmada por BB. Relativamente à matéria descrita em 35) dos factos provados e vertida nas alíneas x) e y) dos factos não provados [narrada no artigo 46º da acusação], o tribunal valorou, de forma crítica e conjugada, as declarações do arguido e da assistente/demandante BB, nos moldes que a seguir se explicitam. O arguido referido que no dia referido no artigo 46º da acusação não estava em casa, tendo sabido do sucedido por DD. BB confirmou que, devido às agressões físicas e psíquicas de que era alvo por parte do arguido ingeriu, na data referida em 34) ansiolíticos, cuja marca e número não soube concretizar. Não confirmou a ingestão de antidepressivos. Negou a tentativa de suicídio, referindo que ingeriu os comprimidos para se acalmar. Termos em que se considerou provado o descrito em 35), mas não provado o vertido nas alíneas x) e y). Relativamente à matéria descrita em 36) e 39) dos factos provados e vertida nas alíneas z) a bb) dos factos não provados [narrada nos artigos 47º e 50º da acusação], o tribunal valorou, de forma crítica e conjugada, as declarações do arguido e da assistente/demandante BB, nos moldes que a seguir se explicitam. O arguido apenas admitiu que, na data referida em 36), dada a queda de CC na banheira, discutiu com a BB por tal ter acontecido. BB, cujas declarações foram consideradas credíveis pelas razões acima exaradas, confirmou a ocorrência do descrito em 36) a 39) o que, por decorrência lógica, implicou que não se considerasse provada a matéria descrita nas alíneas z) a bb). O conhecimento da factualidade descrita nos artigos 52º a 54º da acusação, pelas razões que ficaram exaradas em sede de saneamento, está vedada ao tribunal. O apuramento da matéria descrita em 40) dos factos provados [narrada no artigo 54º da acusação], assentou nas declarações confessórias do arguido. O apuramento da matéria descrita em 41) dos factos provados [narrada no artigo 58º da acusação], assentou nas declarações da assistente, não infirmadas pelo arguido ou qualquer outro meio de prova. Relativamente à matéria descrita em 42) dos factos provados e vertida nas alíneas cc) a ee) da acusação [narrada nos artigos 59º a 61º da acusação], assentou nas declarações de DD, a qual, de forma credível, confirmou o descrito em 42), mas não o descrito nas alíneas cc) e ee), o que, por decorrência lógica, implicou a ausência de prova do descrito em dd). Com efeito, não confirmada a ocorrência da expressão, não existe dolo. A credibilidade de DD assentou no facto de o arguido lhe ter enviado mensagens com ameaças a ela e à filha, que o próprio arguido admitiu, o que corrobora a existência de ameaças verbais presenciais. Relativamente à matéria descrita em 43) a 43.6. dos factos provados e vertida nas alíneas ff) a hh) da acusação [narrada nos artigos 62º a 69º da acusação], assentou na apreciação crítica das declarações do arguido e das assistentes BB e DD, na análise das fotografias de fls. 170, 172 e fls. 1077-a e 1077-b dos autos principais, na análise das fotografias de fls. 57, 58 e 63 do apenso 400/18.... e a data que consta no auto de denúncia de fls. 165/166 dos autos principais. Explicitando. A fotografia e legenda a que se alude em 43.1. encontram-se juntas a fls. 171 dos autos principais. A fotografia e legenda a que se alude em 43.2. encontram-se junta a fls. 172 dos autos principais e fls. 58 do apenso 400/18..... A fotografia e legenda a que se alude em 43.3. encontram-se juntas a fls. 57 do apenso 400/18...., bem como a fls. 63 desse mesmo apenso. As fotografias e legendas a que se alude em 43.4., 45.4. e 43.6 encontram-se juntas a fls. 57 do apenso 400/18..... Quanto à data da criação do perfil com o nome “II”, à identificação da pessoa que criou tal perfil e que colocou as fotografias das assistentes, com as respetivas legendas, no mural daquele perfil, não foi feita prova direta [o arguido negou ser o autor e assistentes não o viram publicar], mas da prova indireta produzida é possível inferir, para além da dúvida razoável, que foi o arguido quem criou tal perfil, pelo menos antes em ... de ...de 2018, e publicou tais fotografias e legendas, pelo menos em ... de 2018. Com efeito, na fotografia junta a fls. 170 dos autos principais é possível observar a indicação que o perfil “II” foi renovado em ... de ...de 2018, pelo que, forçosamente, foi criado em data anterior, pois não se renova o que não existe. Quanto à autoria, resulta do teor das legendas que acompanham a publicação das fotografias e do facto de as fotografias juntas a fls. 1077 a) e fls. 1778 b) terem sido publicadas no perfil da pessoa “KK”, cujo mural é idêntico ao perfil de “II”, resultado do teor de fls. 46 e 80 do apenso 400/18...., que KK é o arguido, pois o número de telemóvel associado ao nome KK é o mesmo do arguido [...57]. Com efeito, a legenda “violada de merda”, que acompanha a fotografia referida em 43.1., revela que foi o arguido o autor da mesma, dado que BB, nesse período temporal, só ao arguido havia revelado que foi abusada sexualmente em criança. Essa mesma expressão voltou a ser usada, ora confessadamente pelo arguido, em data posterior, conforme resulta do facto 46.3. Quanto à data em que foram publicadas, as assistentes referiram que visionaram as mesmas em ... de 2018 porque foram alertadas para a sua publicação por pessoas, pelo que não se pode sustentar que foram publicadas em 3 diferentes datas. Termos em que, provando-se o descrito em 43) a 43.6. dos factos provados, não se provou o vertido nas alíneas ff) a hh) da acusação. O apuramento da matéria descrita em 44) dos factos provados [narrada no artigo 70º da acusação], assentou nas declarações confessórias do arguido. O apuramento da matéria descrita em 45) dos factos provados [narrada no artigo 70º da acusação], assentou na análise do teor da mensagem junta a fls. 77 do apenso 400/18...., cujo teor se reproduziu e que o arguido confessou ter enviado, através do seu telemóvel, com o número ...57, para o telemóvel com o n.º ...56, pertença de DD. A matéria descrita nas alíneas ii), jj) e kk) [narrada no artigo 72º da acusação] foi considerada não provada porque BB e HH não confirmaram a ocorrência da frase descrita no artigo 72º da acusação o que, por decorrência lógica, implicou a inexistência de prova do descrito em jj) e kk). O apuramento da matéria descrita em 46) a 46.4.2 e 47) e 48) dos factos provados [narrada nos artigos 73º e 74º da acusação], assentou na análise das mensagens descritas em 46.1. a 46.4.2., as quais se encontram juntas a fls. 40 a fls. 45, a fls. 77/79 e 81 do apenso 400/18.... e se transcreveram, e as quais o arguido assumiu ser o autor das mesmas, bem como assumiu tê-las enviado do seu telemóvel para o telemóvel de DD, nas datas referidas em 46.1. a 46.4. Por seu turno, DD relatou que recebeu tais mensagens e que a leu na sua residência, delas dando que o conhecimento a BB, a qual confirmou que a sua mãe lhe mostrou as mensagens em causa, tendo-as lido. O arguido confessou ainda o descrito em 48), o que também foi conformado por BB. Relativamente à matéria descrita em 49) a 49.2.2. e 50) dos factos provados e vertida na alínea ll) da acusação [narrada no artigo 75º, 76º e 77º da acusação], assentou na análise das mensagens descritas em 49.2.1 a 49.2.2., as quais se encontram juntas a fls. 40 a fls. 45, a fls. 77/79 e 81 do apenso 400/18.... e se transcreveram e as quais o arguido assumiu ser o autor das mesmas, bem como assumiu tê-las enviado do seu telemóvel para o telemóvel de DD, na data referida em 49. Relativamente ao descrito em 49.1., o arguido assumiu, o que aí consta, mas a assistente BB não sabe se foi seguida pelo arguido desde o local onde o mesmo visitou o filho até ao ..., mas apenas que viu o carro do mesmo naquele local. Note-se que, sendo um local de compras e estando aberto ao público, é perfeitamente possível a ocorrência de uma coincidência. Termos em que não se considerou vertida na alínea ll). Por seu turno, DD relatou que recebeu tais mensagens e que a leu na sua residência, delas dando que o conhecimento a BB, a qual confirmou que a sua mãe lhe mostrou as mensagens em causa, tendo-as lido. A matéria descrita na alínea mm) da acusação [narrada no artigo 78º da acusação], foi considerada não provada porque o arguido não assumiu ter perseguido BB e esta não confirmou a presença do arguido no supermercado “...”. Relativamente à matéria descrita em 51) a 51.2 dos factos provados e vertida nas alíneas nn) a pp) da acusação [narrada no artigo 79º a 85º da acusação], o tribunal valorou a declarações do arguido e de BB nos termos que a seguir se expõem. O arguido e BB relativamente ao descrito em 51) a 51.2. Quanto ao mais, o arguido negou e BB limitou-se a dizer que avistou o arguido junto à porta da casa do seu pai, nada mais confirmando, o que implicou que se considerasse não provado o descrito nas alíneas nn) a pp). A matéria descrita na alínea qq) e rr) da acusação [narrada nos artigos 86º e 87º da acusação], foi considerada não provada porque BB não confirmou o descrito em qq) e DD não confirmou que o descrito em rr) ocorreu na data em causa, pelo que, sendo recorrente o arguido proferir este tipo de expressões, pode dar-se o caso de DD se estar a referir a outra situação que não a investigada nos autos. O que fica dito vale para os depoimentos das testemunhas LL, atual companheiro de DD, e MM, os quais, tendo-se referido a situação relatada em rr) não a souberam concretizar no tempo. O apuramento da matéria descrita em 52) a 52.2. e 53) [narrada no artigo 88º da acusação], assentou na análise das mensagens descritas em 52.1. e 52.2., as quais se encontram juntas a fls. 40 a fls. 45, a fls. 77/79 e 81 do apenso 400/18.... e se transcreveram e as quais o arguido assumiu ser o autor das mesmas, bem como assumiu tê-las enviado do seu telemóvel para o telemóvel de DD, na data referida em 52). Por seu turno, DD relatou que recebeu tais mensagens e que a leu na sua residência, delas dando que o conhecimento a BB, a qual confirmou que a sua mãe lhe mostrou as mensagens em causa, tendo-as lido. A matéria descrita na alínea ss) a tt) da acusação [narrada nos artigos 86º e 87º da acusação], foi considerada não provada porque BB não confirmou o descrito em ss) e DD referiu que o arguido apenas uma vez falou em pegar fogo à casa, e a qual foi a ocorreu em 25-08-2022, pelas razões abaixo exaradas. O apuramento da matéria descrita em 54) a 54.3. e 55) [narrada no artigo 91º da acusação], assentou na análise das mensagens descritas em 54.1. a 54.3., as quais se encontram juntas a fls. 40 a fls. 45, a fls. 77/79 e 81 do apenso 400/18.... e se transcreveram e as quais o arguido assumiu ser o autor das mesmas, bem como assumiu tê-las enviado do seu telemóvel para o telemóvel de DD, na data referida em 54). Por seu turno, DD relatou que recebeu tais mensagens e que as leu na sua residência, delas dando conhecimento a BB, a qual confirmou que a sua mãe lhe mostrou as mensagens em causa, tendo-as lido. O apuramento da matéria descrita em 56) [narrada no artigo 92º da acusação], assentou nas declarações da assistente BB, confirmadas pelo depoimento do seu pai HH e não infirmada por quaisquer outros meios de prova. Relativamente à matéria descrita em 57) a 57.3 e 58) dos factos provados e vertida nas alíneas vv) a ww) dos factos não provados [narrada no artigo 93º a 102º da acusação], assentou nas declarações do arguido e BB, depoimento de HH, fotografias de fls. 483/484 dos autos principais, relatório institucional de episódio de urgência junto a fls. 704 [rosto e verso] dos autos principais, auto de visionamento de fls. 442, dos autos principais, fotogramas de fls. 443/444, dos autos principais. Explicitando. O arguido negou ter proferido a frase que consta de 57.1., mas BB, no decurso do minuto 48 da gravação, relatou que no dia em que foi agredida no supermercado a sua mãe lhe telefonou a avisar que o arguido tinha ido a sua residência à procura do filho e que ia pegar fogo à mesma, e que estava a caminho do supermercado. Pelas razões já acima expostas, BB prestou declarações credíveis, pelo que se deu como provado que o arguido proferiu a frase descrita em 57.1. Relativamente à situação ocorrida no supermercado modelo, o arguido admitiu que esteve nesse local para dar um abraço ao filho, o qual se dirigiu para a zona das prateleiras. Nesse momento, BB abriu a mala, retirou do interior da mesma um objeto [talvez um telemóvel], o qual atingiu BB na cara, não sendo, pois, verdade que lhe tenha desferiu um soco. Por seu turno, BB, bem como o seu pai, HH, confirmaram a ocorrência da agressão descrita na acusação, nos moldes descritos em 57.2. e 57.3. Pelas razões já acima expostas, BB prestou declarações credíveis. Além disso, neste caso específico, as mesmas se mostram suportadas pelo teor do auto de visionamento e fotogramas acima mencionados e, por outro lado, as lesões sofridas, descritas no relatório de urgência assim referido e no relatório pericial de dano corporal em processo penal, são causalmente compatíveis com a agressão relatada pelo arguido. Termos em se considerou provada a factualidade descrita em 57) a 57.3 e 58), tendo a factualidade vertida na alínea vv) sido dada como não provada porque incompatível com a matéria provada. A matéria vertida na alínea ww) foi considerada não provada, porque BB e pai não confirmaram a ocorrência da frase aí referida. O apuramento da matéria descrita em 59) a 61) [narrada no artigo 104º da acusação], assentou nas declarações confessórias do arguido, no depoimento de HH, que confirmou o descrito no artigo 103º da acusação, e nas declarações de BB, que confirmou o descrito em 60) e 61). Relativamente à matéria descrita em 62) e vertida nas alíneas xx) e yy) da acusação [narrada no artigo 105º da acusação], assentou nas declarações credíveis [cf. supra] de BB, que confirmou o descrito 62), mas não confirmou o vertido nas alíneas xx) e yy). O apuramento da matéria descrita em 63) a 68.6 [narrada nos artigos 106 a 111º da acusação], assentou nas declarações confessórias do arguido. O apuramento da matéria descrita em 69) a 78), isto é, a matéria atinente aos elementos do tipo subjetivo dos crimes de violência doméstica, ameaça e fotografias ilícitas consciência da ilicitude dos mesmos, o tribunal atendeu às declarações do arguido e juízos de inferência extraídos a partir da factualidade dada como provada, conjugados com a regras da experiência comum. Explicitando. O arguido, na parte em confessou os factos objetivos acima descritos, assumiu que agiu com dolo, enquadrando as suas condutas como reação o de facto BB não o deixar com CC, seu filho. Quanto ao mais, há que ter presente que é a doutrina hoje dominante, a cujo entendimento nos acolhemos, que, na sua formulação mais geral, o dolo pode ser conceitualizado como o conhecimento (representação) e vontade de realização do facto material típico [FIGUEIREDO DIAS, com a colaboração de Maria João Antunes; Susana Aires de Sousa; Nuno Brandão e Sónia Fidalgo, in Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, Questões Fundamentais; A doutrina Geral do Crime, 3ª edição, outubro de 2019, § 4, p. 407], constituído pelos elementos objetivos, naturalísticos ou normativos de uma infração. Engloba, assim, os elementos: a) intelectual - a exigência de que o agente conheça as circunstâncias de facto que pertençam ao tipo legal – e; b) volitivo - a vontade ou desejo de produzir certo resultado ou ato. O último elemento confere ao dolo três graus distintos, consoante o agente atue: com intenção de realizar o facto ilícito - dolo direto [cf. artigo 14º, n.º 1, do Código Penal]; a realização do facto típico seja consequência necessária, mas não diretamente desejada, da sua conduta - dolo necessário [cf. artigo 14º, n.º 2, do CP]; a realização do facto típico seja consequência possível, da sua conduta e, não obstante, o agente atue conformando-se com essa realização - dolo eventual [cf. artigo 14º, n.º3, do CP]. O dolo, conceptualizado nos termos que antecedem, na ausência de confissão ou perante o silêncio da pessoa a quem é imputado, só é suscetível de prova indireta. Acolhendo-nos à bem conseguida síntese de RUI PATRÍCIO [in O dolo enquanto elemento do tipo penal: questão de facto ou questão de direito? – Curso de Mestrado em Ciências Jurídico-Criminais, Ano letivo de 1996/97, Universidade de Lisboa], diremos que “os atos psíquicos não se comprovam em si mesmos, mas mediante ilações, ou seja, os atos psíquicos transcendem a possibilidade de comprovação histórico-empírica (…) por outras palavras, o apuramento do dolo do agente, enquanto ato interior e conceito mentalístico é uma conclusão, uma ilação e uma atribuição de significado social que o tribunal criminal extrai a partir dos factos imputados ao arguido que forem dados como provados, factos esses lidos à luz das regras da experiência da vida, da normalidade social, da experiência comum”. A jurisprudência, desde há muito, trilha o mesmo caminho da doutrina, conforme resulta do teor do acórdão da Relação do Porto de 23/2/83 [in BMJ, n.º 324, p. 620], onde se refere que “o dolo pertence à vida interior de cada um, sendo, portanto, de natureza subjetiva, insuscetível de direta apreensão, só sendo possível captar a sua existência através de factos materiais comuns”. No mesmo sentido se pronunciou o acórdão da Relação de Coimbra de 16-11-2005 [disponível, em texto integral, in www.dgis.pt] ao entender que “não obstante o dolo pertencer ao íntimo de cada um, ser um ato interior, revestindo natureza subjetiva, o facto de o arguido exercer o direito ao silêncio não impede que a existência daquele seja captada através de dados objetivos, através das regras da experiência comum”. Revertendo ao caso dos autos, tendo presentes as considerações acima tecidas, verifica-se que se provou [pelas razões expostas na motivação referente à respetiva factualidade], que o arguido agrediu BB, dirigiu-lhe expressões injuriosa e ameaças, bem como ameaçou DD e colocou fotografias na da mesma, contra a vontade daquela, na internet, partilhando-as com outras pessoas, pelo que, dúvidas não se suscitam que o mesmo, de forma livre e consciente, quis atingir a integridade física de BB, injuriá-la e ameaçá-la, o mesmo sucedendo com DD, no que se refere às ameaças e fotografias. Dito de outra forma, no caso dos autos, entre os referidos factos provados a existência de dolo pode afirmar-se uma relação de implicação necessária. No que à consciência da ilicitude concerne, há que ter presente os crimes de violência doméstica, ameaça e fotografias ilícitas integram os chamados “crimes naturais” [“crimes em si” ou “mala in se”], isto é, crime cuja punibilidade se pode presumir conhecida, e não é desculpável que não seja conhecida de todos os cidadãos normalmente socializados. No sentido de que nos crimes naturais, a punibilidade se presume conhecida, o acórdão da Relação de Coimbra de 2.10.2002 [disponível, em texto integral, no endereço eletrónico www.dgis.pt], pelo que não existe dúvida em afirmar que o arguido tinha consciência da ilicitude dos seus atos. O apuramento da matéria descrita em 79) a 82), assentou nas declarações das assistentes/demandantes BB e DD, as quais, de forma credível, relataram os danos não patrimoniais que sofreram em virtude da conduta do arguido, sendo os mesmos compatíveis com as regras da experiência comum. Os danos não patrimoniais de DD foram corroborados pela testemunha LL, atual companheiro de DD e pela testemunha e MM que, como já acima referido, é vizinho de DD. Por seu turno, resulta do relatório institucional de episódio de urgência junto a fls. 704 [rosto e verso] dos autos principais e da fatura junta a fls. 907 dos autos principais que BB, na sequência da agressão de que foi vítima no dia ... de ... de 2019 foi assistida no C..., EPE, onde lhe foram prestados serviços no valor global de € 112,07. O apuramento da matéria descrita em 83) a 91.5., assentou no teor no relatório social do arguido, junto em suporte informático, do qual constam as condições pessoais e socioeconómicas do mesmo, tendo o arguido atualizado o que consta relatório com as declarações que prestou na reabertura da audiência de julgamento. Sobre as condições pessoais e socioeconómicas do arguido depuseram as testemunhas NN, EE e GG, dizendo, no essencial, que é pessoa preocupada com o filho e amigo de ajudar. O apuramento da matéria descrita 92., assentou no teor do certificado do registo criminal, junto em suporte informático, do qual consta o averbamento da condenação transcrita. * D) SUBSUNÇÃO DOS FACTOS AO DIREITO:1) ENQUADRAMENTO JURÍDICO-PENAL: A atividade cognitória e decisória do tribunal, face a conjugação do disposto nos artigos 339º, n.º 4, 359º e 379º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal, encontra-se delimitada pelos factos alegados na acusação, pelos factos alegados pela defesa e pelos factos que resultarem da prova produzida em audiência. As normas legais acima mencionadas tratam do que, em termos doutrinais, se designa por princípio da vinculação temática, mantendo-se ainda hoje atuais as palavras que FIGUEIREDO DIAS teceu a tal propósito, na sua obra “Direito Processual Penal, I Volume, 1974, onde, na página 145 fez exarar, em súmula, o seguinte: "Segundo o princípio da acusação […] a atividade cognitória e decisória do tribunal está estritamente limitada pelo objeto da acusação, pelo que deve “afirmar-se que o objeto do processo penal é o objeto da acusação, sendo esta que, por sua vez, delimita e fixa os poderes de cognição do tribunal (atividade cognitória […]) e a extensão do caso julgado (atividade decisória […])”; É a este efeito que se chama a vinculação temática do tribunal e é nele que se consubstanciam os princípios da identidade, da unidade ou indivisibilidade e da consunção do objeto do processo penal ”. Aplicando as considerações ora tecidas ao caso dos autos, verifica-se, pelas razões que constam do ponto II. [Saneamento] do presente acórdão, que está vedado ao tribunal conhecer de mérito relativamente ao crime de violação imputado arguido, bem como dos crimes de fotografia ilícita e ameaça referidos em sede de Saneamento. Assim sendo, importa decidir se os factos dados como provados permitem imputar ao arguido a prática, em autoria material e concurso efetivo, de: - Dois crimes de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152º, n.º 1, alínea b) e n.º 2, do Código Penal; - Um crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152º, n.º 1, alínea d) e n.º 2, do Código Penal; - Três crimes de fotografia ilícita, p. e p. pelo artigo 199º, n.º 2, alínea b), do Código Penal. - Dois crimes de ameaça, p. e p. pelo artigo 153º, n.º 1, do Código Penal. - Dois crimes de ameaça, p. e p. pelos artigos 153º, n.º 1, e 155º, n.º 1, alínea a), do Código Penal. 1. DOS CRIMES DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA: Em ordem a analisar os elementos no tipo de ilícito de violência doméstica, importa, para a decisão a proferir nos autos, ter presentes os seguintes normativos do Código Penal: Artigo 13.º Só é punível o facto praticado com dolo ou, nos casos especialmente previstos na lei, com negligência;Dolo e negligência Artigo 14.º 1 - Age com dolo quem, representando um facto que preenche um tipo de crime, atuar com intenção de o realizar;Dolo 2 - Age ainda com dolo quem representar a realização de um facto que preenche um tipo de crime como consequência necessária da sua conduta; 3 - Quando a realização de um facto que preenche um tipo de crime for representada como consequência possível da conduta, há dolo se o agente atuar conformando-se com aquela realização; Artigo 26.º É punível como autor quem executar o facto, por si mesmo ou por intermédio de outrem, ou tomar parte direta na sua execução, por acordo ou juntamente com outro ou outros, e ainda quem, dolosamente, determinar outra pessoa à prática do facto, desde que haja execução ou começo de execução.Autoria Artigo 152º 1 - Quem, de modo reiterado ou não, infligir maus tratos físicos ou psíquicos, incluindo castigos corporais, privações da liberdade e ofensas sexuais:Violência doméstica (redação em vigor na data da prática dos factos) a) (…); b) A pessoa de outro ou do mesmo sexo com quem o agente mantenha ou tenha mantido uma relação de namoro ou uma relação análoga à dos cônjuges, ainda que sem coabitação; c) (…); ou d) A pessoa particularmente indefesa, nomeadamente em razão da idade, deficiência, doença, gravidez ou dependência económica, que com ele coabite; é punido com pena de prisão de um a cinco anos, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal. 2 - No caso previsto no número anterior, se o agente: a) Praticar o facto contra menor, na presença de menor, no domicílio comum ou no domicílio da vítima; ou b) (…); é punido com pena de prisão de dois a cinco anos. 3 – (…): a) (…); b) (…). 4 - Nos casos previstos nos números anteriores, podem ser aplicadas ao arguido as penas acessórias de proibição de contacto com a vítima e de proibição de uso e porte de armas, pelo período de seis meses a cinco anos, e de obrigação de frequência de programas específicos de prevenção da violência doméstica. 5 - A pena acessória de proibição de contacto com a vítima deve incluir o afastamento da residência ou do local de trabalho desta e o seu cumprimento deve ser fiscalizado por meios técnicos de controlo à distância. 6 - Quem for condenado por crime previsto neste artigo pode, atenta a concreta gravidade do facto e a sua conexão com a função exercida pelo agente, ser inibido do exercício do poder paternal, da tutela ou da curatela por um período de um a dez anos. Artigo 152º 1 - Quem, de modo reiterado ou não, infligir maus tratos físicos ou psíquicos, incluindo castigos corporais, privações da liberdade, ofensas sexuais ou impedir o acesso ou fruição aos recursos económicos e patrimoniais próprios ou comuns:Violência doméstica (redação em vigor) a) (…); b) (…); c) (…); d) (…); ou e) A menor que seja seu descendente ou de uma das pessoas referidas nas alíneas a), b) e c), ainda que com ele não coabite; é punido com pena de prisão de um a cinco anos, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal. 2 - No caso previsto no número anterior, se o agente: a) Praticar o facto contra menor, na presença de menor, no domicílio comum ou no domicílio da vítima; ou b) (…); é punido com pena de prisão de dois a cinco anos. 3 – (…): a) (…); b) (…). 4 - Nos casos previstos nos números anteriores, incluindo aqueles em que couber pena mais grave por força de outra disposição legal, podem ser aplicadas ao arguido as penas acessórias de proibição de contacto com a vítima e de proibição de uso e porte de armas, pelo período de seis meses a cinco anos, e de obrigação de frequência de programas específicos de prevenção da violência doméstica. 5 - A pena acessória de proibição de contacto com a vítima deve incluir o afastamento da residência ou do local de trabalho desta e o seu cumprimento deve ser fiscalizado por meios técnicos de controlo à distância. 6 - Quem for condenado por crime previsto no presente artigo pode, atenta a concreta gravidade do facto e a sua conexão com a função exercida pelo agente, ser inibido do exercício de responsabilidades parentais, da tutela ou do exercício de medidas relativas a maior acompanhado por um período de 1 a 10 anos. Os normativos acabados de transcrever, quer na redação em vigor antes de 17 de agosto de 2021, introduzida pela Lei n.º 44/2018, de 9 de agosto, quer na redação atualmente em vigor, introduzida pela Lei n.º 57/2021, de 16 de agosto, revelam que o tipo incriminador do crime de tráfico foi construído como um delito doloso de ação, o qual, a semelhança de todos os delitos dolosos de ação, apresenta uma estrutura complexa, composta por elementos de natureza objetiva e de natureza subjetiva e com os quais é possível, respetivamente, apreender um tipo objetivo e um tipo subjetivo, [FIGUEIREDO DIAS - com a colaboração de MARIA JOÃO ANTUNES; SUSANA AIRES DE SOUSA; NUNO BRANDÃO e SÓNIA FIDALGO -, in Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, Questões Fundamentais; A doutrina Geral do Crime, 3ª edição, outubro de 2019, p. 329, § 1º], sendo que, no tipo objetivo, se incluem os elementos relativos ao autor, na medida em que apesar da sua natureza “subjetiva” ou “intersubjetiva”, é elemento constitutivo do tipo objetivo de ilícito [vide FIGUEIREDO DIAS, in ob. cit., p. 329, § 1º; TERESA BELEZA, in Direito Penal II, pp. 116 e ss.; HENRIQUE SALINAS MONTEIRO, in Comparticipação em Crimes Próprios, Lisboa, Universidade Católica Editora, 1999, p. 11 e JOSÉ LOBO MOUTINHO, in Da Unidade à Pluralidade dos Crimes no Direito Penal Português, p. 255], os relativos à conduta, onde encontramos a descrição da(s) ação(ões) típica(s) e, nalguns casos, o objeto da ação [FIGUEIREDO DIAS, in ob. cit., pp. 355/356, §37] e os elementos relativos ao bem jurídico, que não se confundem com os elementos relativos ao objeto da ação, os quais se apresentam como uma manifestação real da noção do mesmo [FIGUEIREDO DIAS, in ob., cit., p. 359, § 44 e MARIA FELINO RODRIGUES, in “As incriminações de Perigo e o Juízo de Perigo no Crime de Perigo Concreto”, p. 22, nota 15, em que a autora refere que na doutrina alemã se distingue entre o Tatobjekt (que corresponde ao objeto material do crime/ação), por contraposição ao Rechtsgutsart (que corresponde o bem jurídico-valor, bem jurídico-categoria)]. No que se refere ao tipo subjetivo, o mesmo inclui o chamado dolo do tipo e, em alguns casos, os especiais elementos subjetivos do tipo [FIGUEIREDO DIAS in op., cit., p. 406/407, § 3]. Posto isto, cabe analisar cada um dos referidos conjuntos. No que tipo objetivo se refere, iniciar-se-á a análise pela apreciação do bem jurídico protegido, dado que uma correta interpretação dos elementos que dizem respeito ao autor e à conduta pressupõe, antes de mais, a determinação do respetivo objeto de tutela [dito de outra forma, o modus aedificandi criminis reflete a opções do legislador relativamente ao bem jurídico a proteger]. A) TIPO OBJETIVO DE ILÍCITO: 1. ELEMENTOS RELATIVOS AO BEM JURÍDICO: Quer na redação introduzida pela Lei n.º 44/2018, de 9 de agosto, quer na redação atualmente em vigor, introduzida pela Lei n.º 57/2021, de 16 de agosto, que relativamente ao bem jurídico nada veio alterar, a doutrina e jurisprudência nacional estão de acordo de que está hoje afastada a possibilidade do bem jurídico em análise estar ligado à proteção da família ou das relações familiares, pois os interesses protegidos dizem respeito à pessoa individual ofendida [nesse sentido, AMÉRICO TAIPA de CARVALHO, in Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo I, 2ª Edição, Coimbra Editora – maio de 2012, pp. 511/513; NUNO BRANDÃO no artigo intitulado “A Tutela penal especial reforçada da Violência Doméstica”, publicado na revista Julgar, n.º 12, 2010, p. 13; na jurisprudência, veja-se, a título de exemplo o acórdão do STJ de 5.11.2008, publicado, em texto integral, no endereço eletrónico www.dgsi.pt. e PLÁCIDO CONDE FERNANDES, in Violência Doméstica – novo quadro penal e processual penal, in Revista do CEJ, 1º Semestre de 2008, n.º 8 – especial -, pp. 304/306]. É de rejeitar também o entendimento daqueles que sustentam que o bem jurídico protegido é o da dignidade humana [como é o caso de, AUGUSTO SILVA DIAS, “Crimes contra a Vida e Integridade Física”, 2ª Edição, AAFDL, 2007, p. 110 e acórdão do STJ de 30.10.2003, publicado no endereço eletrónico www.dgsi.pt], porque, como refere NUNO BRANDÃO [in, estudo citado, p. 14, fazendo apelo ao ensinamento de FARIA COSTA e FIGUEIREDO DIAS], “a dignidade humana como valor fundante e transversal a todo o sistema jurídico não está em condições de desempenhar a função de específico referente e padrão crítico da criminalização que deve ser própria de um bem jurídico penal”. Na esteira da maioria dos autores [nesse sentido Américo Taipa de Carvalho In Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo I, 2ª Edição, Coimbra Editora – maio de 2012, pp. 511/513; PLÁCIDO CONDE FERNANDES, in Violência Doméstica – novo quadro penal e processual penal, in Revista do CEJ, 1º Semestre de 2008, n.º 8 – especial -, pp. 304/306] e da jurisprudência [vide, a título meramente exemplificativo, Acórdãos: STJ de 27/04/2006, proc. 06P957; TRL de 15/11/2007, proc. 1587/07.9; TRC de 19/11/2008, proc. 182/06.8; TRP de 06/10/2010, proc. 296/08.0 PDVNG.P1; de 03/07/2002, proc. 0210597; de 31/01/2001, proc. 30646, disponíveis, em texto integral, o endereço eletrónico in www.dgsi.pt.] entendemos que o bem jurídico protegido é a saúde, a qual se apresenta como um bem jurídico complexo, englobando a saúde física, psíquica, mental e moral, e o qual pode ser atingido por uma variedade de comportamentos que afetem a dignidade pessoal da vítima. Veja-se, a este propósito, as considerações tecidas pelo acórdão do STJ de 2.7.2008 [relatado por RAÚL BORGES, disponível, apenas em sumário, in www.dgsi.pt], onde, desenvolvidamente, se sustenta, que o bem jurídico em causa é complexo, abrangendo a saúde física, psíquica e mental, e a liberdade, nas suas expressões sexual e de natureza pessoal. NUNO BRANDÃO [in, estudo citado intitulado p. 17] configura o bem jurídico complexo em causa como tutela antecipada da saúde, pelo que se está perante um crime de perigo abstrato. Pese embora, a qualidade da argumentação do referido autor, temos para nós que o crime em causa se deve configurar, como crime de dano, no que aos maus tratos físicos concerne dado que, a expressão «infligir», como resulta da sua própria etimologia [do latim infligo,-ere, ou seja, lançar contra, chocar contra, ferir com], implica a efetiva lesão da saúde. Mesmo nos maus tratos psíquicos, que podem ser construídos como crimes de perigo abstrato-concreto, como é o caso do crime de ameaça, tem de ocorrer uma efetiva lesão psíquica da vítima. Com efeito, a efetividade da lesão do bem jurídico [físico ou psíquico] é que, em última análise, permite sustentar, de forma cabal, que o crime de violência doméstica se encontre numa relação de concurso aparente, seja na modalidade de consunção [posição defendida por AMÉRICO TAIPA de Carvalho, in ob. cit., p. 528], seja na modalidade de especialidade [posição defendida por PAULO PINTO ALBUQUERQUE, Comentário ao Código Penal, 4ª edição, 2021, anotação 19 pp. 594], com os crimes que atomisticamente correspondem à realização repetida de atos parciais, nomeadamente, e para o que a economia da presente decisão interessa, os crimes de ofensa à integridade física simples [artigo 143º, n.º 1, do Código Penal], ofensa à integridade física qualificada [artigo 143º, n.º 1, 145º, n.º 1, alínea b), por referência ao artigo 132º, n.º 2, alínea a) do Código Penal] de ameaça [artigo 153º, n.º 1 e 155º, n.º 1, alínea a), do Código Penal] e injúria [artigo 181º, do Código Penal]. 2. ELEMENTOS RELATIVOS AO AUTOR: O conceito de autor é-nos dado pelo acima transcrito artigo 26º, do C.P. [1ª preposição, e a única que nos interessa para o caso que nos ocupa], segundo o qual é autor quem executar o facto, por si mesmo. Tal preceito, nos que aos delitos dolosos de ação concerne, consagra um conceito restritivo de autor, ancorado na chamada teoria do «domínio (funcional) do facto», pode traduzir-se, de forma sintética e conclusiva, nos seguintes termos: autor é quem domina o facto, quem dele é “senhor”, quem toma a execução “nas suas próprias mãos”, de tal modo que dele depende decisivamente o se e o como da realização típica [FIGUEIREDO DIAS, in ob., cit., p. 894, §16º]. Quando é o próprio agente que procede à realização típica, quem leva a cabo o comportamento com o seu próprio corpo estamos no chamado domínio da autoria imediata [FIGUEIREDO DIAS, in ob. e loc. cit.], a única que interessa abordar no caso concreto. Conjugado tal norma com o teor do artigo 152º, seja na redação em vigor na data dos factos, que na atual redação, acima transcrito, resulta que estamos perante um crime específico, dado que só pode ser cometido por pessoas relativamente a quem o sujeito passivo seja: - O cônjuge ou ex cônjuge; - Quem com ele mantenha ou tenha mantido uma relação de namoro, ainda que sem coabitação; - Quem com ele conviver ou ter convivido em condições análogas às dos cônjuges, ainda que sem coabitação; - Pessoa do mesmo sexo com quem mantenha ou tenha mantido uma relação análoga às dos cônjuges, ainda que sem coabitação; - O progenitor de descendente comum em 1º grau; - Pessoa particularmente indefesa, nomeadamente, em razão da idade, deficiência, doença, gravidez ou dependência económica, que com ele coabite; e, desde a redação introduzida pela Lei n.º 57/2021, de 16 de agosto: - A menor que seja seu descendente ou descendente de uma das pessoas referidas nas alíneas a), b) e c), ainda que com ele não coabite; Dentro da categoria do crime específico, assume a modalidade de impróprio, dado que a qualidade do sujeito não fundamenta a responsabilidade, mas torna a ilicitude do crime mais grave [FIGUEIREDO DIAS, com a colaboração de MARIA JOÃO ANTUNES; SUSANA AIRES DE SOUSA; NUNO BRANDÃO e SÓNIA FIDALGO, in Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, Questões Fundamentais; A doutrina Geral do Crime, 3ª edição, outubro de 2019, p. 354, §35]. Porém, AMÉRICO TAIPA de CARVALHO [In Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo I, 2ª Edição, Coimbra Editora – maio de 2012, pp. 513/514] sustenta que, em certos casos, se poderá estar perante um crime específico próprio, na medida em que são pensáveis maus tratos psíquicos reiterados, o que fundamenta a ilicitude. Para a decisão do caso dos autos, interessa tecer considerações sobre os sujeitos passivos pressupostos: - na alínea b), do nº 1, do artigo 152º, do Código Penal, no segmento referente a “A pessoa de outro ou do mesmo sexo com quem o agente mantenha ou tenha mantido (…) uma relação análoga à dos cônjuges, ainda que sem coabitação; e - na alínea d), do n.º 1, do mesmo preceito, no segmento referente a “pessoa particularmente indefesa, nomeadamente em razão da idade (…)”; e - na alínea e), do n.º 1, do mesmo preceito, introduzida pela já citada lei 57/2021, de 16 de fevereiro, no segmente referente a “menor que seja seu descendente” Relação análoga à dos cônjuges é aquela que se consubstancia numa relação afetiva de proximidade existencial e interdependência mútua, de aspeto matrimonial, implicando necessariamente relacionamento sexual, mas já não partilha de mesa e habitação, já que não é exigida a coabitação, a qual se carateriza pela comunhão de residência e de mesa. Pessoa particularmente indefesa Menor que seja seu descendente abrange todas a pessoas dos 0 aos 17 anos que sejam filhos ou netos do autor do facto; 3. ELEMENTOS REFERENTES À CONDUTA TÍPICA: As condutas previstas e punidas abrangem a seguintes modalidades: a) maus tratos físicos; b) maus tratos psíquicos; Entre a multiplicidade de comportamentos que podem ser tidos como «maus tratos físicos» a lei tipifica expressamente “os castigos corporais”, ou seja, aqueles que visam diretamente o corpo da vítima e que por norma integram o crime de ofensa à integridade física simples, como bofetadas, murros, pontapés, puxões de cabelos, apertões, empurrões ou pancadas com objetos. Como exemplo de «maus tratos psíquicos», a lei típica as “privações de liberdade”, onde, além do sequestro, se incluem as perseguições, as esperas, a proibição de entrada ou saída de casa ou o acesso a certas zonas da habitação comum. Dentro do conceito de «maus tratos psíquicos» cabem ainda os insultos, as humilhações, as provocações, as críticas destrutivas ou vexatórias, as ameaças, as privações de comida, de medicamentos ou de bens e serviços de primeira necessidade [nesse sentido AMÉRICO TAIPA de CARVALHO, in Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo I, 2ª Edição, Coimbra Editora – maio de 2012, pp. 516]. As ofensas sexuais, outra das condutas expressamente previstas, tanto se podem traduzir em maus tratos físicos, quando a agressão sexual é cometida por meio de violência física, ou maus tratos psíquicos, quando a agressão sexual é cometida mediante o uso de violência psicológica, sendo disso exemplo a agressão sexual cometida através da ameaça ou coação. Resulta do exposto que existem comportamentos que são atos típicos do crime de violência doméstica e não possuem relevância típica no âmbito de outros tipos legais de ilícito, pelo que a enumeração do artigo 152º não deve ser havida como taxativa. Com as alterações introduzidas pela Lei n.º 59/2007, de 4 de ... o tipo objetivo do crime em análise veio prescindir do elemento reiteração, consagrando em letra de lei uma certa linha jurisprudencial que defendia, mesmo ao abrigo da anterior redação, que a reiteração da conduta, não era necessária quando a gravidade intrínseca se assumir como suficiente para agredir o bem jurídico protegido, ou porque a razão da agravação é a especial relação existente entre o agressor e a vítima, não sendo necessária qualquer reiteração de conduta [vide, entre outros, acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13/11/1997, CJ STJ, V, Tomo III, pág. 235; acórdão da Relação do Porto, de 3/07/2002, acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 04/02/2004, acórdão da Relação de Évora de 25/01/2005, acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 06/04/2006, acórdão da Relação de Coimbra de 13/06/2007 e Acórdão da Relação do Porto de 11/07/2007, todos disponíveis no endereço eletrónico www.dgsi.pt]. Em suma, não é suficiente qualquer ofensa à saúde física, psíquica, emocional ou moral da vítima, para o preenchimento do tipo legal. «O bem jurídico, enquanto materialização direta da tutela da dignidade da pessoa humana, implica que a norma incriminadora apenas preveja as condutas efetivamente maltratantes, ou seja, que coloquem em causa a dignidade da pessoa humana, conduzindo à degradação pelos maus-tratos» [PLÁCIDO CONDE FERNANDES, in est. cit., pág. 3]. Nesse enquadramento a ofensa à saúde física, psíquica, emocional, moral e sexual da vítima, perpetrada pelo agressor pressupõe que este afirme um domínio ou uma subjugação sobre a pessoa da vítima, sobre a sua a vida ou (e) sobre a sua honra ou (e) sobre a sua liberdade e a reconduz a uma vivência de medo, tensão e subjugação [no sentido apontado no texto vejam-se acórdãos da Relação do Porto de 9.1.2013 e de 9.5.2018, disponíveis, em texto integral, in www.dgsi.pt]. B) O TIPO SUBJETIVO DE ILÍCITO: Da conjugação dos já mencionados e transcritos artigos 13º, 14º e 152º do Código Penal, o tipo subjetivo da violência doméstica exige o dolo. Relativamente ao conceito de dolo e as modalidades que assume remete-se para o que ficou dito em sede de motivação da decisão de facto. Note-se, porém, que na violência doméstica o conteúdo do dolo é variável em função da espécie de comportamento do agente. Assim, no caso de maus tratos físicos, o dolo estende-se ao próprio resultado danoso da integridade física, mas já em relação às outras condutas bastará o dolo de perigo, que se consubstancia na vontade de o agente empreender determinado comportamento. Consoante a circunstância típica, assim, o dolo terá de ter um conteúdo e abrangência, sendo o mesmo variável de conduta para conduta, das que estão tipificadas como violência doméstica. Apreciação dos casos dos autos à luz das considerações jurídicas ora tecidas: No caso dos autos, com relevância para o enquadramento jurídico que nos ocupa, apurou-se, em síntese que: O arguido e BB iniciaram uma relação de namoro em ... de 2012 e, em ... do mesmo ano, passaram a viver em comunhão de cama, mesa e habitação, ou seja, em união de facto. Em ... de 2016 BB engravidou e o arguido, disso tendo conhecimento, no dia ... de ... de 2016, ou seja, quando BB estava grávida de um mês, e após ter sido questionado por aquela da razão de não querer ao aniversário do sobrinho da mesma, disse-lhe “quero que a tua irmã e sobrinho se fodam” e, em simultâneo, agarrou os cabelos de BB, puxou-os para trás, causando-lhe dores na zona da nuca. Praticou tal conduta no interior do imóvel em que viviam em união de facto. No dia ... de ... de 2019, ou seja, 3 dias depois, também no interior da mesma residência, o arguido, que se encontrava de férias, após ter sido confrontado por BB pelo facto de, mesmo em férias, se recusar a sair com ela, preferindo a companhia dos amigos, agarrou o pescoço de BB, empurrou-a contra uma das paredes da cozinha, ao mesmo tempo que lhe dizia “mato-te a ti e ao bebé”. Dada a força e o tempo que o arguido levou a apertar o pescoço, BB deixou de conseguir respirar e, nessa sequência, sentiu-se desfalecer, altura em que o arguido lhe largou o pescoço, fazendo-a cair no chão. BB, após recuperar as forças, pegou num taser e exibiu-o ao arguido, ao mesmo tempo lhe dizia “se me voltas a tocar, levas com isto”. Nessa sequência, o arguido arrancou-lhe o taser das mãos, empurrou-a contra uma parede, colocou uma das suas mãos no pescoço de BB e, num movimento ascendente, logrou elevá-la no ar por alguns instantes, aso mesmo tempo que, com a outra mãos procurou atingir as pernas de BB com descargas elétricas produzidas pelo taser, não o conseguindo, devido ao facto de BB ter conseguido desviar a pernas. Além disso, o arguido trancou a porta de casa para impedir que BB, na sequência do sucedido, fosse procurar ajuda. BB, logrou encontrar as chaves da residência e, nesse mesmo dia, cessou a união de facto com o arguido. A factualidade ora descrita consubstancia agressões físicas que, quer pela sua intensidade [um puxão de cabelos, empurrões contra paredes e duas esganaduras, isto é, pressão exercida no pescoço da vítima pela ação direta das mãos do agente, sem a utilização de objetos para tal], quer pela sua reiteração [os empurrões contra paredes e as duas esganaduras ocorreram no espaço de 3 dias], violam o bem jurídico acima mencionado, na medida em que, tais agressões se dão num contexto em que o arguido foi confrontando pela vítima de estar a adotar comportamentos que visavam fazê-la sentir que não era desejada, dada a reiterada recusa do arguido em conviver socialmente com a mesma. Dito de outra forma, o arguido perante confrontações legítimas da companheira, no sentido de o questionar se ainda gostava dela [revelada pela frase, “se não estou aqui a fazer nada, vou-me embora”], dado o desprezo a que a estava a votar, ao recusar-se conviver socialmente com a mesma, reagiu com agressões físicas violentas [a esganadura, na medida em que pode conduzir à asfixia, como de facto conduziu, é uma agressão que traduz um elevado grau de violência], as quais, neste contexto, traduzem um domínio ou uma subjugação sobre a pessoa da vítima, mediante a inflição de maus tratos físicos. Em linguagem corrente, a conduta do arguido traduz-se no seguinte: “não te tenho de dar explicações sobre as razões porque não saio contigo, por isso não perguntes, senão levas porrada”. Não se argumente que a vítima, dado o facto de, numa das situações ter reagido, munindo-se de um taser e exibindo-o ao arguido, dizendo-lhe que o usava se ele lhe voltasse a tocar, anula a relação de domínio, isto é, coloca a vítima numa relação e paridade com o agente. Com efeito, a vítima reagiu a uma agressão que quase a asfixiava, ou seja, não se está perante um contexto de agressões mútuas, iniciadas por um ou por outro [caso em que se pode falar de paridade] e a sua capacidade de reação foi imediatamente anulada pelo arguido, que lhe retirou com grande facilidade o taser das mãos e a tornou a esganar, assim revelando, de forma evidente, a sua superioridade física em relação à vítima, o que também obsta a sustentação de uma relação paritária. Acresce que a vítima estava grávida, o que era do conhecimento do arguido e, como tal, sujeita a sofrer aborto em situação de violência física sobre si exercida, o que a colocava numa situação de fragilidade acrescida em relação ao arguido. Decorridos quatro ou cinco meses o arguido e vítima retomaram a união de facto e até dois meses após o nascimento do filho comum, ou seja, até o início de ... de 2019, a relação de ambos foi pacífica. A partir dessa data e até à separação definitiva, ocorrida em ... de ... de 2018, e após essa separação e até ... de ... de 2020, o arguido praticou os factos descritos em 21) 21), 21.1., 27), 27.1., 27.2., 27.3., 28), 30), 34), 39), 40), 43), 43.1., 43.2., 43.4, 43.5. e 43.6., 44), 45), 47, 47.1, 47.2., 47.3, 47.4, 49), 49.2.1, 53), 53.1., 53.2., 55), 55.1., 55.2., 55.3., 58), 58.3. 64), 64.1., 65), 69), 69.1., 69.2., 69.3., 69.4. e 69.6, ou seja, praticou reiteradamente, ao longo de dois anos e dez meses, factos suscetíveis de preencher os crimes de injúria, ameaça, perseguição e ofensa à integridade física simples, sobre a pessoa de BB. Face ao exposto, e por maioria de razão face ao que ficou dito relativamente ao primeiro período temporal em que viveram em união de facto [face ao número de condutas e dilação temporal em que perduraram], dúvidas não se suscitam que a conduta do arguido preenche os elementos que constituem o tipo objetivo e subjetivo do crime de violência doméstica. Por outro lado, parte das condutas em causa, em ambos os períodos temporais analisados, foram praticados no interior da residência que partilhavam, em união de facto, e, numa das situações, na presença do filho menor, pelo que se mostram preenchidas as circunstâncias qualificativas «domicílio comum», «domicílio da vítima» e “na presença de menor” prevista na alínea a), do n.º 2, do artigo 152º, do Código Penal. Note-se que o facto de arguido e a assistente/demandante terem deixado de viver em união de facto não afasta o preenchimento do crime em causa, pois, como acima fico dito, a alínea b), do n.º 1, do artigo 152º, do Código Penal, abrange não só quem vive em união de facto como quem tenha vivido. Posto isto, há que o arguido, em dois momentos temporais distintos, assumiu condutas suscetíveis de preencher os elementos do tipo objetivo e subjetivo do crime de violência doméstica, na sua forma agravada, relativamente à pessoa de BB. Considerando a dilação temporal ocorrida entre os dois períodos é de nove meses [a cessação da união de facto ocorreu em .../.../2018 e o primeiro ato do arguido que integra o crime de violência doméstica, após o retomar a união de facto em ... de 2018, ocorreu em abril de 2019], é entendimento do tribunal de que, apesar de se tratar a mesma vítima, se está perante o preenchimentos de dois tipos de ilícito do crime de violência doméstica, pelas razões que se passam a expor. No que se refere o concurso efetivo de crimes, o artigo 30º, n.º 1, do Código Penal manda atender ao número de crimes efetivamente cometidos pelo agente e ao número de vezes que a mesma norma é preenchida. Ou seja, a problemática do concurso não se fecha com o concurso heterogéneo, temos de passar também pelo concurso homogéneo, determinando quantas vezes cada tipo de crime é efetivamente realizado. Esta problematização do concurso homogéneo deve ser feita no crime de violência doméstica, sob pena levar ao “efeito perverso de transformar um tipo protetor ou especialmente protetor da vítima, num tipo que, na aplicação que dele fazemos, acaba por beneficiar o infrator” [ANA BARATA BRITO, 2014, p.10]. Assim sendo, a aderindo ao entendimento de INÊS FERREIRA LEITE [in artigo intitulado “Violência Doméstica e Concurso de Crimes: Delimitação à Luz do conceito de Unidade Normativo-Social, publicado na obra “prof. Doutor Augusto Silva Dias, In Memoriam, AAFDL, volume II, 2022, p. 58 ], no caso de Violência Doméstica, a unidade da conduta pode vir a cindir-se pelas seguintes razões: a) períodos prolongados de “bom comportamento”; b) quebras de contacto com a vítima; c) sujeição do agente a processo crime ou aplicação de uma pena. Assim, a existência de uma elevada desconexão temporal é sempre indício de que ocorreu uma cisão da unidade normativo social. No mesmo sentido, mas relativamente ao concurso em geral, se pronunciar FIGUEIREDO DIAS [2007, p. 1020] “uma certa unidade ou proximidade de espaço e/ou tempo das realizações típicas pode constituir forte estímulo para concluir pela interseção dos sentidos dos ilícitos singulares e, por essa via, por uma leitura do sentido de ilícito do comportamento total (…)”. Por sua vez, um claro desfasamento espácio-temporal indiciará uma pluralidade de sentidos sociais de ilicitude. Como refere EDUARDO CORREIA [1996, p.97], ditam as regras e experiência da psicologia que, “em regra, se entre diversos atos medeia um largo espaço de tempo, a resolução que porventura inicialmente os abrangia a todos se esgota no intervalo da execução, de tal sorte que os últimos não são já a sua mera descarga, mas supõem um novo processo deliberativo”. Aplicando o que ficou dito ao caso dos autos, verifica-se que o arguido esteve afastado da vítima 5 meses e, quando voltou a viver a união de facto com a mesma, teve “bom comportamento”, durante 4 meses, o que perfaz um período global de 9 meses em que o arguido não assumiu qualquer conduta típica. Esta descontinuidade temporal, acrescida do facto de ter existindo uma alteração do modus operandi [no primeiro período a conduta do arguido cingiu-se às agressões físicas, no segundo períodos, além das agressões física, o arguido praticou injúrias, ameaças e perseguição], leva-nos a concluir houve uma cisão da unidade normativo-social que suporta a continuidade tipicamente imposta para o crime de violência doméstica e, como tal, estamos perante dois crimes de violência doméstica e não apenas um, com sustentado pela acusação. Não se trata aqui de uma alteração dos factos descritos na acusação [eles já lá estavam descritos], mas de uma da qualificação jurídica, comunicada ao arguido ao abrigo do disposto no artigo 358º, do Código de Processo Penal, tendo o mesmo exercido o respetivo contraditório. * No que se refere à pessoa de CC, provou-se que no período compreendido entre ... de 2017 e ... de ... de 2018, no interior da residência comum, quando CC acordava durante a noite, a chorar, AA, em quatro dias distintos, pegou naquele pelos ombros, abanou-o e empurrou-o contra a colchão, ao mesmo tempo que dizia: “cala-te puto da merda”; nessa sequência, CC intensificava o choro.Face à introdução da alínea e), do n.º 1, do artigo 152º, do Código Penal, pela referida lei 57/2021, de 16 de fevereiro, desde logo se conclui que o mesmo é vítima protegida pela incriminação em causa, dado que, na data da prática dos factos era menor. Considerando que esta nova alínea introduzida pela referida lei 57/2021, de 16 de fevereiro veio alargar o leque das vítimas protegidas pela incriminação do artigo 152º, do Código Penal, na medida em que, na lei anteriormente em vigor, nem todos os menores se enquadravam no conceito de pessoa particularmente indefesa, pois é completamente diferente o grau de indefesa de um bebé e de um adolescente de 17 anos de idade, coloca-se o problema de saber se CC, para além de menor, deve ser também considerando pessoa particularmente indefesa, pois não sendo, não é aplicável a alínea e), do n.º 1, do artigo 152º, do Código Penal, atualmente em vigor, por constituir um alargamento da incriminação [artigo 2º, n.º 4, do Código Penal]. A resposta é, sem margens para dúvidas, que CC deve ser considerada pessoa particularmente indefesa em razão da idade. Com efeito, estando em causa uma criança que, na data da prática dos factos, tinha menos de um ano de idade, ela é, por inerência da sua condição de absoluta dependência de um adulto para sobreviver, pessoa particularmente indefesa em razão da idade. Assim sendo, caso se conclua que a conduta do arguido acima descrita assume gravidade suficiente para se considerada maus tratos físicos suscetíveis de lesar a saúde de CC, dúvidas não se suscitam que a mesma se enquadra na alínea d), do n.º 1, do artigo 152º, do Código Penal, em vigor na data da prática dos factos e na alínea e), do n.º 1, do artigo 152º, do Código Penal, atualmente em vigor. Ora, pese embora a privação do sono cause comprovadamente irritabilidade na pessoa atingida por essa privação, a mesma é, de todo, insuficiente para sustentar uma diminuição de ilicitude de tal ordem que desqualifique, cada uma das quatro condutas assumidas pelo arguido para o crime de integridade física, ainda que qualificada, p. e p. pelos artigos 143º, n.º 1 e 145º, n.º 1, alínea a), por referência ao artigo 132º, n.º 2, alínea a), do Código Penal. Com efeito, abanar um bebé pelos ombros e empurrá-lo contra o colchão, em quatro diferentes ocasiões, traduz um grau de ofensividade de tal forma elevado à saúde física e psíquica do bebé que não oferece dúvida que o bem jurídico pressuposto pelo crime de violência doméstica sofre uma lesão efetiva e, como tal, a conduta do arguido dever ser enquadrada no crime em causa. Por outro lado, dado que, as condutas em causa foram praticados no interior da residência que partilhava com o menor, contra o mesmo e na presença do mesmo, mostram-se preenchidas as circunstâncias agravantes, «domicílio da vítima» e “contra e na presença de menor” prevista na alínea a), do n.º 2, do artigo 152º, do Código Penal. C) O TIPO DE CULPA: Para além de preencher os elementos constitutivos do tipo de ilícito, a conduta do arguido, para ser punível, pressupõe que o mesmo tenha agido com culpa. Com efeito, o dolo não se reduz ao conhecimento e vontade de realização do tipo de ilícito objetivo; a estes elementos acresce uma autónoma atitude interior, […], que não podem ser retirados à culpa [FIGUEIREDO DIAS - com colaboração de MARIA JOÃO ANTUNES; SUSANA AIRES DE SOUSA; NUNO BRANDÃO e SÓNIA FIDALGO-, Direito Penal, Parte Geral, 3ª edição (…), pp. 317, § 64]. É este acréscimo/alargamento (na verdade, um enriquecimento) que consubstancia o chamado “dolo da culpa” [in op., cit., p. 319]. Daí que o facto punível com uma pena criminal não se esgota na desconformidade com o ordenamento jurídico-penal refletida no tipo de ilícito, necessário se tornando sempre que a conduta seja culposa, isto é, que o facto possa ser pessoalmente censurado ao agente, por aquele se revelar expressão de uma atitude interna juridicamente desaprovada e pela qual ele tem por isso de responder perante as exigências do dever ser sociocomunitário [in op.. cit., p. 317, § 64]. É pacificamente aceite que a culpa pressupõe a imputabilidade que é, na terminologia penal, a possibilidade de se atribuir a uma pessoa a prática de um ato ilícito, tipificado como crime, e de a responsabilizar penalmente pela sua prática. Dito por outras palavras, a imputabilidade constitui o pressuposto essencial para a formulação de um juízo de culpa. Essa responsabilização penal pressupõe que o agente tenha capacidade para avaliar o mal que pratica e se determinar de acordo com essa avaliação. Isso mesmo resulta do artigo 20.º, n.º 1 do Código Penal, nos termos do qual “é inimputável quem, por força de uma anomalia psíquica, for incapaz, no momento da prática do facto, de avaliar a ilicitude deste ou de se determinar de acordo com essa avaliação”. No caso dos autos, não oferece dúvidas que o arguido é capaz de culpa, pois não padece de qualquer anomalia psíquica que o impeça de avaliar ilicitude do facto ou de se determinar de acordo com essa avaliação, conforme decorre da factualidade provada, onde se fez constar que o arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, sabendo que incorria em condutas proibidas e punida por lei. D) DA INEXISTÊNCIA DE CAUSAS DE EXCLUSÃO DA ILICITUDE E DA CULPA: Da matéria considerada provada inexistem factos suscetíveis de ser enquadrados como configurando as situações previstas nos artigos 31º a 39º do Código Penal, ou sejam, inexistem causas que possam excluir a ilicitude ou a culpa do arguido. Termos em que, a final, deverá o arguido ser punido pela prática de dois crimes de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152º, n.º 1, alínea b) e n.º 2, do Código Penal, sobre a pessoa de BB e um crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152º, n.º 1, alínea d) e n.º 2, do Código Penal, na redação em vigor na data da prática dos factos e atualmente, p. e p. pelo artigo 152º, n.º 1, alínea e) e n.º 2, do Código Penal, na pessoa de CC; * 2. DOS CRIMES DE AMEAÇA:Para aferir dos elementos constitutivos do crime identificado em epígrafe importa ter presente, além dos já transcritos artigos 13º, 14º e 26º, os seguintes normativos do mesmo diploma legal: Artigo 153º 1. Quem ameaçar outra pessoa com a prática de um crime contra a vida, a integridade física, a liberdade pessoal, a liberdade e autodeterminação sexual ou bens patrimoniais de considerável valor, de forma adequada a provocar-lhe medo ou inquietação ou a prejudicar a sua liberdade de determinação, é punido com pena de prisão até 1 ano ou como pena de multa até 120 dias.Ameaça 2. O procedimento criminal depende de queixa; Artigo 155º 1. Quando os factos previstos nos artigos 153º e 154º forem realizados:Agravação a) (…) b) (…); c) (…); d) (…); o agente é punido com pena de prisão até dois anos ou com pena de multa até 240 dias, no caso do artigo 153º (…) A) TIPO OBJETIVO DE ILÍCITO: 1. ELEMENTOS REFERENTES AO BEM JURÍDICO PROTEGIDO: O bem jurídico protegido é a liberdade de ação e decisão [AMÉRICO TAIPA CARVALHO, in Comentário Conimbricense do Código Penal, Tomo, I, 2ª Edição, maio de 2012, Coimbra Editora, pp. 552/55]. Exigindo a lei que que a ameaça, seja, na situação concreta, adequada a provocar medo ou inquietação, TAIPA DE CARVALHO conclui que se está perante um crime de perigo concreto [In Ob., Cit., pp. 564], isto é, o tipo só fica preenchido quando o bem jurídico tenha sido efetivamente posto em perigo [sobre o conceito de crime de perigo concreto, vide FIGUEIREDO DIAS, In Direito Penal, Parte Geral. Tomo I, 3ª edição, Questões Fundamentais, A Doutrina Geral do Crime, Coimbra Editora, p. 359/360]. Diferentemente, PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE, conclui que está perigo abstrato-concreto [in Comentário do Código Penal, UCE, 3ª edição, 601, anotação 3]. Tal categoria de crime, de um ponto de vista formal, cabe ainda na dos crimes de perigo abstrato, porque a verificação do perigo não é essencial ao preenchimento do tipo. Porém, de um ponto de vista material, são crimes de aptidão, no sentido de que só devem relevar tipicamente as condutas apropriadas ou aptas a desencadear o perigo proibido no casado de espécie [FIGUEIREDO DIAS, in Ob., Cit., pp. 361/362]. Utilizando o legislador, no acima transcrito artigo 153º, n.º 1, do Código Penal, a expressão “de forma adequada a provocar”, estamos em crer que se está perante um crime de aptidão e, como tal, de perigo abstrato-concreto, o que implica que se faça prova da potencialidade da ação causar a lesão [in Comentário do Código Penal, UCE, 3ª edição, 602, anotação 8] ou, vistas as coisas por outro ângulo, implica que o tribunal averigue da “possibilidade de a perigosidade ser objeto de um juízo negativo” [cf. FIGUEIREDO DIAS, in Ob., Cit., p. 361]. 2. ELEMENTOS REFERENTES AO AUTOR: Quanto ao autor, o crime de ameaça configura um crime comum, pelas razões acima referidas. Relativamente ao conceito de autoria, igualmente se remete para o que acima ficou dito. 3. ELEMENTOS RELATIVOS À CONDUTA: Seguindo de perto o ensinamento de AMÉRICO TAIPA CARVALHO [in Comentário Conimbricense do Código Penal, Tomo, I, 2ª Edição, maio de 2012, Coimbra Editora, pp. 552/553], são três a características essenciais do conceito ameaça (simples ou agravada): a) mal, que tanto pode ser de natureza pessoal como patrimonial; b) futuro, isto é, o mal, objeto da ameaça não pode ser iminente, pois que, existindo iminência, estar-se-á diante de uma tentativa de execução do respetivo ato violento, isto é, do respetivo mal; c) dependa (ou apareça como dependente) da vontade do agente. Esta característica estabelece a distinção entre a ameaça e o simples aviso ou advertência. O critério para afirmar ou negar a existência, no caso concreto, de uma verdadeira ameaça é o critério objetivo-individual. Significa este critério que o ponto de partida para o juízo sobre a dependência, ou não, do mal feito segundo a perspetiva do homem comum, isto é, da pessoa adulta e normal. Todavia, sendo este o critério base, não pode deixar de ser ter em conta – como fator corretivo do critério objetivo do «homem médio» - as características individuais da pessoa ameaçada. Assim, afirmações de ocorrência de males futuros poderão não ser consideradas ameaças para um adulto normal (na medida em que seja manifesto que a verificação, ou não, do mal anunciado não depende da vontade do “ameaçante”), mas já o serem, quando a pessoa destinatária da ameaça é uma criança ou um débil mental. Mutatis mutandis para o caso inverso, isto é, afirmações de ocorrências de mal futuros poderão ser consideradas ameaças para um adulto normal, mas já o não serem quando a pessoa destinatária da ameaça seja um membro das forças armadas, militarizadas ou de segurança. Estas pessoas são especialmente treinadas para situações de risco, pelo que, neste campo, possuem “sobrecapacidades” relativamente ao cidadão comum [AMÉRICO TAIPA CARVALHO, in, ob. cit. pp. 562/563]. 4. A CIRCUNSTÂNCIA QUALIFICADORA DA ALÍNEA A), DO N.º 1, DO ARTIGO 155º: Tal circunstância, que consiste na ameaça com a prática de crime punível com pena de prisão superior a três anos, não oferece dificuldade, dado que é aferida em função da moldura penal abstrata, tendo a sua justificação na especial gravidade da ameaça. B) O TIPO SUBJETIVO DE ILÍCITO: Quanto ao elemento subjetivo da incriminação em causa estamos perante um crime exclusivamente doloso, dado que não está prevista expressamente a sua punição por negligência [cf. artigo 13º, do Código Penal, acima transcrito, por referência aos artigos 154º e 155º, também acima transcrito, e o qual não prevê a punição por negligência]. Quanto à definição de dolo do tipo e a suas modalidades, remete-se para o que ficou dito em sede de motivação da decisão de facto. Assim, e no que ao caso dos autos concerne, para haver dolo, o agente tem de representar que anuncia um mal futuro adequado a causar medo e inquietação na pessoa ameaçada. No caso dos autos, provou-se que o arguido enviou uma mensagem de texto a DD com o seguinte teor: “E tu usa mais a passadeira Recomendado pela segurança rodoviária nacional o perigo está em todo o lado” [facto 49) e desdobramento 49.2.2.] Provou-se ainda que, no dia ... de ... de 2010, o arguido, dirigiu-se à residência de DD e disse-lhe “pego fogo à casa” [facto 57) e seu desdobramento 57.1]. Tendo presente que é o critério objetivo-individual que deve ser tido em conta como critério de adequação da ameaça a provocar medo ou inquietação, há que considerar que as mencionadas expressões são adequadas a provocar medo ou inquietação a DD, tendo em consideração o contexto em que foram proferidas, isto é, em situação de conflito. Considerando que a ameaça de atropelamento pode conduzir apenas a uma lesão à integridade física simples e que puxar fogo a um imóvel, não equivale, sem mais, a prática do crime de incêndio, não se encontra preenchida a circunstância qualificadora, prevista no artigo 155º, n.º 1, alínea a), do Código Penal. Quanto ao elemento subjetivo, tendo-se se provado que o arguido quis provocar medo e inquietação, sabendo que as expressões que usou era adequadas a provocar tal medo e inquietação, também não se suscitam dúvidas quanto à sua verificação. No que se refere à culpa e as causas de exclusão da ilicitude e da culpa, valem, mutatis mutandis as considerações acima tecidas aquando da análise do crime de violência doméstica, ou seja, o arguido é capaz de culpa e inexistem causas que possam excluir a culpa ou ilicitude da sua conduta. Quando à demais expressões a imputadas ao arguido na acusação nada se provou. Termos em que, a final, deverá o arguido ser: - Condenado pela prática de dois crimes de ameaça, p. e p. pelo artigo 153º, n.º 1, do Código Penal; - Absolvido da prática de dois crimes de ameaça, p. e p. pelos artigos 153º, n.º 1 e 155º, n.º 1, alínea a), do Código Penal. * 3. DOS CRIMES DE FOTOGRAFIAS ILÍCITAS:Para aferir dos elementos constitutivos do crime identificado em epígrafe importa ter presente, além dos já transcritos artigos 13º, 14º e 26º, os seguintes normativos do mesmo diploma legal: Artigo 153º 1 - Quem sem consentimento:Gravações e fotografias ilícitas a) Gravar palavras proferidas por outra pessoa e não destinadas ao público, mesmo que lhe sejam dirigidas; ou b) Utilizar ou permitir que se utilizem as gravações referidas na alínea anterior, mesmo que licitamente produzidas; é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 240 dias. 2 - Na mesma pena incorre quem, contra vontade: a) Fotografar ou filmar outra pessoa, mesmo em eventos em que tenha legitimamente participado; ou b) Utilizar ou permitir que se utilizem fotografias ou filmes referidos na alínea anterior, mesmo que licitamente obtidos. 3 - É correspondentemente aplicável o disposto nos artigos 197.º e 198.º Os normativos acabados de transcrever, à semelhança dos demais crimes acima analisados, revelam que o tipo incriminador do crime ameaça foi construído como um delito doloso de ação, valendo, pois, as considerações acima tecidas sobre a estrutura típica de tais tipos de delito, que se passa a analisar nos termos que se seguem. A) TIPO OBJETIVO DE ILÍCITO: 1. ELEMENTOS RELATIVOS AO BEM JURÍDICO PROTEGIDO: Os bens jurídicos que se pretendem proteger com a norma incriminadora ora em causa, são a proteção do direito à imagem e à palavra, os quais assumem carácter eminentemente pessoal e com a estrutura de uma liberdade fundamental, que reconhecem a cada pessoa o domínio exclusivo sobre a sua própria imagem e a sua própria palavra. Ou seja, no direito penal português vigente, os direitos à imagem e à palavra - com assento constitucional no artigo 26.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa- configuram bens jurídico-penais autónomos e como tal protegidos, independentemente da sua valência do ponto de vista da privacidade/intimidade, como vem frisando a doutrina e a jurisprudência [MANUEL COSTA ANDRADE, in “Comentário Conimbricense do Código Penal”, Parte Especial, Tomo I, pág. 821; Ac. da Relação de Lisboa de 15/2/89, CJ 1/89, pág. 154; Ac. do STJ de 24/5/89, BMJ n.º 387, pág. 531]. 2. ELEMENTOS RELATIVOS AO AUTOR: Quanto ao autor, o crime de gravações e fotografias ilícitas configura um crime comum, na medida em que pode ser praticado por qualquer [sobre o conceito de crime comum remete-se para o que acima ficou escrito]. Relativamente ao conceito de autoria, vale o que acima ficou dito relativamente ao crime de violência doméstica. 2. ELEMENTOS RELATIVOS À CONDUTA: No caso dos autos apenas interessa a ter presente a condita prevista na alínea b), do n.º 2, do artigo 199º, do Código Penal, a qual consiste em, contra a vontade utilizar ou permitir que utilizem fotografias ou filmes em eventos em que tenha legitimamente participado, mesmo que licitamente obtidos. Para que esta modalidade de conduta típica resulte preenchida, a fotografia (filme, vídeo) tem de permitir identificar a pessoa [MANUEL COSTA ANDRADE, in “Comentário Conimbricense do Código Penal”, Parte Especial, 2º edição Tomo I, pág. 1214, § 62]. A utilização pode revestir várias formas, nomeadamente colocar a imagem no site, oferecendo aos utilizadores da internet [MANUEL COSTA ANDRADE, in ob. e loc. cit., § 63]. B) O TIPO SUBJETIVO DE ILÍCITO: Quanto ao elemento subjetivo da incriminação em causa estamos perante um crime exclusivamente doloso, dado que não está prevista expressamente a sua punição por negligência [cf. artigo 13º, do Código Penal, acima transcrito, por referência ao artigo 199º, também acima transcrito, e o qual não prevê a punição por negligência]. Quanto à definição de dolo do tipo e a suas modalidades, remete-se para o que ficou dito em sede de motivação da decisão de facto, sendo que, no crime em análise, o dolo pode revestir quaisquer das suas modalidades, ou seja, direto, necessário e eventual, não se sendo necessário um qualquer outro elemento subjetivo adicional, nomeadamente devassa da vida privada [MANUEL COSTA ANDRADE, in ob. cit., p. 1221 §§ 74 e 75]. Assim, e no que ao caso dos autos concerne, para haver dolo, o agente, na modalidade que nos ocupa, tem de representar que utiliza uma imagem de pessoa identificável, ainda que licitamente obtida, contra a vontade dessa pessoa, e, além disso, tem de querer, ter por necessária ou conformar-se com essa utilização contra a vontade da pessoa identificável nessa imagem. Aplicando as considerações ora tecidas ao caso dos autos, não oferece dúvidas que os elementos que constituem os tipos objetivo e subjetivo do crime em causa se mostram preenchidos, dado que o arguido, em ... de 2018, contra a vontade DD, logrou, de forma não apurada, aceder à posse de uma fotografia de tipo e outras publicadas pela própria DD em rede social de acesso não aberto, e publicou-as em rede social, da qual era utilizador, de acesso público. Fê-lo de forma livre, voluntária e consciente e, como tal, atuou com culpa. Por último, inexistem causa de exclusão da ilicitude ou da culpa, mormente as desenvolvidamente focadas por MANUEL DA COSTA ANDRADE, na obra acima citada, pp. 1221 a 1229, mormente consentimento/acordo, legítima defesa, direito de necessidade, ponderação de bens ou interesses ou prossecução de interesses legítimos. Com efeito, o facto de DD ter publicado no seu perfil da rede social facebook, de acesso reservado, uma fotografia sua em evento social, não legitima que o arguido faça um download dessa fotografia e a vá publicar num outro perfil, por si criado e usado, para que outras pessoas possam ter acesso a essa fotografia, contra a vontade da pessoa que ela retrata, no contexto de adicionar à fotografia um comentário depreciativo. Considerando, porém, que não se logrou apurar que o arguido utilizou a fotografias em 3 dias distintos, a mesmo apena pode ser punida pela prática de um crime de fotografias ilícitas e não pelos três de que se encontrava acusado. Termos em que, a final, o arguido será condenado por um crime de fotografias ilícitas e absolvido de outros dois. * 2. DAS CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS DO CRIME:2.1. DETERMINAÇÃO DA PENA: Feito, pela forma acima descrita, o enquadramento jurídico das condutas do arguido e tendo-se concluindo pela sua responsabilidade criminal, importa agora, em obediência ao disposto nos artigos 71º, n.º 3, do Código Penal e 375º, n.º 1, do Código de Processo Penal, expor os fundamentos que irão presidir à escolha e medida da pena a aplicar, os quais, no caso concreto, passam pela adoção de um procedimento que decorre cronologicamente [sobre o modo como, cronologicamente, devem ocorrer as operações de determinação da pena, veja-se FIGUEIREDO DIAS, in Direito Penal Português - As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas - Editorial Notícias, 1993, § 256, p. 198], nos seguintes termos: A) Determinação da medida legal ou abstrata da pena: Em regra, a moldura penal aplicável, corresponde à moldura penal prevista no tipo de crime que a conduta do agente preenche, só assim não sendo quando, ao caso, forem aplicáveis as chamadas circunstâncias modificativas agravantes ou atenuantes, as quais determinam, consoante os casos, um agravamento ou uma atenuação da moldura penal prevista no tipo de crime que a conduta do agente preenche [veja-se, de forma desenvolvida, FIGUEIREDO DIAS, in ob. cit., § 257, p. 198 e § 259 p. 199]. Tendo presente o que fica dito, verifica-se que, no caso dos autos, as molduras penais abstratas aplicáveis aos crimes acima analisados são as seguintes: - Crimes de violência doméstica: dois a cinco anos de prisão [artigo 152º, n.º 2, do Código Penal]; - Crime de ameaça: um mês a um ano de prisão ou multa de 10 a 120 (cento e vinte) dias [artigo 155º, n.º 1, alínea a), do C.P. por referência aos artigos 41º, n.º 1 e 47º, n.º1, do mesmo diploma]; - Crime de fotografias: um mês a um ano de prisão ou multa de 10 a 120 (cento e vinte) dias [artigo 199º, n.ºs 1 e 2, do C.P. por referência aos artigos 41º, n.º 1 e 47º, n.º1, do mesmo diploma]. B) Escolha da natureza da pena: Dado que a um dos crimes em causa é aplicável, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, impõe-se a escolha entre uma delas. O critério de escolha é-nos dado pelo artigo 70º do Código Penal, que estabelece a obrigatoriedade de o tribunal dar preferência à pena não privativa da liberdade sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. Porém, no caso dos autos, estamos perante uma situação de concurso de crimes, sendo que a parte deles [violência doméstica] o tribunal terá de necessariamente aplicar pena de prisão, já que não admite a aplicação, em alternativa, de uma pena de multa. Nestes casos, como faz notar FIGUEIREDO DIAS, sabendo-se que a pena que vai ser efetivamente aplicada não é a pena parcelar, mas a pena conjunta, torna-se claro que só relativamente a esta tem sentido pôr a questão da sua substituição [in, "Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime", pág. 285, § 409]. Pelo exposto, escolhe-se aplicar pena de prisão aos crimes de ameaça e fotografias ilícitas. C) Determinação da pena concreta: Para proceder à determinação da medida concreta da pena de prisão interessa ter presente o disposto no artigo 71º, n.º 1 do Código Penal, segundo o qual a determinação da pena concreta se faz em função da culpa do agente, tendo ainda em conta as exigências de prevenção de futuros crimes. C-1.) Do modelo de determinação da medida concreta da pena: Vários modelos têm surgido para solucionar a questão de saber a forma como estas entidades distintas (culpa e prevenção) se relacionam no processo unitário da medida da pena. Face ao disposto no artigo 40.º do Código Penal, que veio tomar posição expressa quanto à questão dos fins das penas, afigura-se-nos inquestionável que é o modelo da “moldura da prevenção” proposto por FIGUEIREDO DIAS [in, "Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime", pág. 285, § 409 pp. 227/231], aquele que melhor se adequa ao espírito desta norma, quanto mais não seja por “nela ter sido consagrado o seu pensamento” [assim o afirma JOSÉ GONÇALVES DA COSTA, in RPCC, ano III, 1993, pág. 327]. O que fica dito resulta reforçado pelo facto de o Supremo Tribunal de Justiça, pelo menos na última década, ter acolhido, de modo largamente maioritário, as lições de Jorge de FIGUEIREDO DIAS [sobretudo plasmadas na obra Direito Penal Português - As Consequências Jurídicas do Crime] e de ANABELA MIRANDA RODRIGUES [plasmadas na obra A determinação da Medida da Pena Privativa de Liberdade, Coimbra Editora, 1985]. Isso mesmo é referido, sob uma perspetiva crítica por LOURENÇO MARTINS [In Medida da Pena, Finalidades e Escolha, sobretudo pp. 187 e ss.] Para este autor, o modelo que melhor se adapta ao nosso quadro legal, é o da teoria mista ou integradora dos fins das penas, cujos pressupostos são desenvolvidos a fls. 491/492 da obra citada], e, sob numa perspetiva concordante, por Souto Moura [In estudo intitulado a jurisprudência do S.T.J. sobre a fundamentação e critérios da escolha e medida da pena, publicado in www.stj.pt/documentacao/estudos/penal, pp. 12 e ss.]. Segundo aquele modelo, primordialmente, a medida da pena há de ser dada por considerações de prevenção geral positiva, isto é, prevenção enquanto necessidade de tutela dos bens jurídicos que se traduz na tutela das expectativas da comunidade na manutenção da vigência da norma infringida, que fornece uma «moldura de prevenção», isto é, que fornece um quantum de pena que varia entre um ponto ótimo e o ponto ainda comunitariamente suportável de medida da tutela dos bens jurídicos e das expectativas comunitárias e onde, portanto, a medida da pena pode ainda situar-se até atingir o limiar mínimo, abaixo do qual já não é comunitariamente suportável a fixação da pena sem pôr irremediavelmente em causa a sua função tutelar. Através do requisito da culpa, dá-se tradução à exigência de que aquela constitui um limite inultrapassável de todas e quaisquer considerações preventivas (limite máximo) – ligada ao mandamento incondicional de respeito pela dignidade da pessoa do agente. Por último, dentro dos limites consentidos pela prevenção geral positiva – entre o ponto ótimo e o ponto ainda comunitariamente suportável – podem e devem atuar ponto de vista de prevenção especial de socialização, sendo eles que vão determinar, em último termo, a medida da pena. Esta deve, em toda a sua extensão possível, evitar a quebra da inserção social do agente e servir a sua reintegração na comunidade [In Direito Penal Português - As Consequências Jurídicas do crime, p. 227 e ss. e, quanto ao juízo de culpa, ANABELA RODRIGUES, in A Determinação da Medida da Pena Privativa da Liberdade, pp. 478 e ss.]. C- 1.1.) Critérios de aquisição e de valoração dos fatores de medida da pena: Tendo presente o modelo adotado, importa, de seguida, eleger, no caso concreto, os critérios de aquisição e de valoração dos fatores da medida da pena, nomeadamente os referidos nas diversas alíneas do n.º 2 do artigo 71.º do Código Penal. Neste âmbito, há que ter em consideração: C- 1.1.1.) A determinação do substrato da medida da pena: Para efeito de medida da pena o conceito «substantivo» de facto é insuficiente para conter todos os fatores de medida da pena, se se considerar que aquele conceito é somente integrado pelas categorias do tipo-de-ilícito e do tipo-de-culpa. Na medida da pena deve ser tido em consideração um tipo complexivo total, isto é, que não se basta com as categorias do tipo-de-ilícito e do tipo-de-culpa, mesmo quando a elas se acrescente a categoria da punibilidade, mas que abarque a categoria da punição (que suporta a consequência jurídica), integrada pelo princípio da carência punitiva [FIGUEIREDO DIAS, Direito Penal Português - As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas - Editorial Notícias, 1993, pp. 232/234]. B-1.1.2. O princípio da proibição de dupla valoração: O referido princípio, consagrado no artigo 71º, n.º 3, do Código Penal, implica que não devem ser tomadas em consideração, na medida concreta da pena, as circunstâncias que façam já parte do tipo de crime. Todavia, o que fica dito não obsta em nada a que a medida da pena seja elevada ou baixada em função da intensidade ou dos efeitos do preenchimento de um elemento típico de um elemento típico e, portanto, da concretização deste, segundo as especiais circunstâncias do caso, v.g. não deve ser valorado da mesma forma um sequestro de 3 dias ou de 3 meses [FIGUEIREDO DIAS, ob., cit., pp. 234 e ata da 26º sessão da Comissão Revisora do Projeto da parte geral do Código Penal, in BMJ, 49, pág. 74/75]. Ainda neste âmbito importar referir que os fatores que influem na determinação da medida são, muitas vezes, dotados de particular ambivalência. Por exemplo um mesmo fator, na perspetiva da culpa, pode funcionar como agravante e, na perspetiva da prevenção, funcionar com atenuante. C- 1.2.) Os concretos fatores de medida da pena: O artigo 71º, n.º 2, do Código Penal elenca, de forma não exaustiva, os concretos fatores de medida de pena que o tribunal deve ter em consideração, os quais, como se infere do que atrás ficou dito, devem valorados de acordo com o modelo adotado e dentro dos limites impostos pelo substrato da medida da pena e o princípio da proibição da dupla valoração. Tendo presentes estas considerações, é nosso entendimento que, no caso concreto, assumem relevância para a determinação da medida da pena os seguintes fatores: 1. No que se refere grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e às suas consequências, assumem relevância os seguintes fatores: 1.1. A intensidade das agressões e extensão das suas consequências: o arguido, reiteradamente, empurrou, socou, esganou, BB, causando-lhe dores, escoriações, hematomas, por seu turno provocou naquela, medo, nervosismo, ansiedade e necessidade de toma de ansiolíticos; 1.2. Intensidade do anúncio do mal futuro e a intensidade de tais anúncios: O arguido ameaçou de morte, de forma reiterada, BB, o que lhe causou medo, nervosismo e ansiedade e, por outra lado, ameaçou a integridade física de DD, com recurso a atropelamento e a ameaçou danificar um bem de valor considerável da mesma, mediante a ação do fogo; 1.3. A frequência e o elevado grau pejorativo das injúrias: O arguido, referiu-se a BB como sendo “puta”, “cabra”, “merda”, “porca”, “não és boa mãe”, “não sabes cuidar do teu filho,” “não quero andar com a tua tromba”, “não sabes fazer nada”, “cadela”, “violada de merda”, “violada do caralho” “filha da puta da violada” “essa mulher abandona o filho de um ano e meio de idade em casa para ir ter com ... fazer as necessidades”, “essa aí tentou o suicídio”; sendo aqui de destacar a persistência do arguido a referir-se a uma situação de abuso sexual de que BB foi vítima ainda em criança, e que aquela lhe relatou, usando tal episódio para a achincalhar pelo abuso que sofreu, o que revela baixeza de caráter. 1.4. O grau de disseminação das fotografias ilicitamente usadas e das legendas das mesmas: o arguido, ao colocar na internet as fotografias com legendas injuriosas, disseminou-as por elevado esperto de pessoas; 2. No que se refere ao grau de culpa, assume relevância a elevada intensidade dolosa, pois o arguido agiu, em todos os crimes, sob a forma de dolo direto, que é a forma mais gravosa de culpa e, como tal, implica um maior juízo ético-social de desvalor; 3. No que se refere aos sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins e os motivos que o determinaram, apurou-se que o arguido agiu por ciúmes e vingança por ter deixado de ter acesso a filho; 4. Relativamente às condições pessoais e situação económica do arguido, assume relevância o crescimento em ambiente familiar funcional, a normal formação escolar, o estável percurso profissional e a capacidade para obter rendimentos suficientes para as suas necessidades; 5. Relativamente à conduta anterior aos factos, o arguido regista a condenação pela prática de um crime de furto, não assumindo a mesma grande relevância para o caso dos autos, considerando que em nada contende com os bens jurídicos protegidos pelos crimes que violência doméstica, ameaça e fotografias ilícitas; 6. Relativamente à conduta posterior aos factos, assume relevância a confissão parcial e a aceitação, na atualidade, do facto de a vítima ter cessado a união de facto, o que o levou a iniciar uma outra relação marital; 7. Relativamente à falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, em face da ausência de condenações anteriores relevantes, não se pode sustentar que formou uma personalidade de tendência criminosa, sendo, pois, de afirmar mera pluriocasionalidade. Sopesando todos os fatores conclui-se, da imagem global do facto, que as condutas do arguido se situam no patamar da baixa gravidade relativamente aos crimes de ameaça e fotografias ilícitas e de média gravidade relativamente ao primeiro dos crimes de violência doméstica e crime de violência de que foi vítima o menor, e de elevada gravidade relativamente ao segundo crime de violência doméstica sofrido por BB, pelo que se têm por adequadas as seguintes penas: - dois anos e seis meses de prisão para o crime de violência doméstica referente ao primeiro período de união de facto; - três anos e nove meses de prisão para o crime de violência doméstica referente ao segundo período de união de facto e após a separação definitiva; - dois anos e nove meses de prisão para o crime de violência doméstica referente ao menor, filho do arguido; - Quatro meses de prisão para o crime ameaça referente à situação do atropelamento; - Três meses de prisão para o crime ameaça referente à danificação de um imóvel de considerável valor; - Dois meses de prisão para o crime de fotografias ilícitas; * C-2). Determinação da pena única:Nos termos do artigo 77º, do Código Penal: 1- Quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa pena única. Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente; 2- A pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão e 900 dias tratando-se de pena de multa; e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes; 3 - […] 4 – […] C-2.1. Da moldura abstrata do concurso: Face às normas ora transcritas resulta que, no caso dos autos, a moldura penal abstrata aplicável é a seguinte: - Limite mínimo: três anos e nove meses de prisão; - Limite máximo: nove anos e nove meses de prisão; C-2.2. Determinação da pena concreta do concurso: * D) DAS PENAS ACESSÓRIAS:O Ministério Público, ao remeter para o n.º 4, do artigo 152º, do Código Penal, requereu a aplicação ao arguido das penas acessórias de proibição de contactos com a vítima, de proibição de uso e porte de armas e da obrigação de frequência de programas específicos de prevenção da violência doméstica. Na atual redação a lei passou a impor o afastamento da residência e a impor a fiscalização do seu cumprimento com meios técnicos de controlo à distância. A pena acessória tem uma função preventiva adjuvante da pena principal, cuja finalidade não se esgota na intimidação da generalidade, mas dirige-se também, ao menos em alguma medida, à perigosidade do agente, reforçando e diversificando o conteúdo penal sancionatório da condenação [FIGUEIREDO DIAS, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, p. 96 e 232]. Daí que a determinação da pena acessória deva operar-se mediante recurso aos critérios gerais consignados no artigo 71º do Código Penal com a ressalva de que a finalidade a atingir pela pena acessória é mais restrita na medida em que a mesma tem em vista sobretudo prevenir a perigosidade do agente, ainda que se lhe assinale também um efeito de prevenção geral. Tem em consideração a efetividade da pena aplicada ao arguido e duração da mesma [cinco anos e nove meses de prisão], justifica-se a imposição da medida de coação de proibição de contactos com a vítima pelo período de cinco anos, não sendo viável que a pena acessória em causa seja fiscalizada por meios de técnicos de controlo à distância, dado que o arguido foi condenado em pena de prisão efetiva superior ao prazo da pena acessória. O que fica dito, impede, por idêntica razão, a viabilidade de frequência de programas específicos de prevenção da violência doméstica. Dado que o arguido não detentor de armas de fogo ou de outro tipo e não fez uso de armas para cometimentos dos crimes acima apontados, não se justifica a aplicação da pena acessória de proibição e uso e porte de armas. Relativamente à vítima CC, considerando que após o sucedido, não mais o agrediu, não se justifica a aplicação e penas acessórias. (...) * 3. ENQUADRAMENTO JURÍDICO- CIVIL:3.1. CONSIDERAÇÕES GERAIS: Nos termos do artigo 129º, do Código Penal a indemnização de perdas e danos emergentes de crime é regulada pela lei civil. O princípio geral da responsabilidade civil por factos ilícitos, surge-nos inscrito no artigo 483.º, do Código Civil, onde se afirma que “aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios, fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação”. A responsabilidade civil pode assumir tanto a modalidade da responsabilidade contratual – quando provém da “falta de cumprimento das obrigações emergentes dos contratos” - como a modalidade de responsabilidade extracontratual, também designada por delitual ou aquiliana, a qual, além da responsabilidade pelo risco e a responsabilidade por factos lícitos, compreende a chamada responsabilidade civil por atos ilícitos, sendo precisamente essa que está em causa no artigo 483º [PIRES DE LIMA/ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, vol. I, 4.ª edição revista e atualizada, com a colaboração de MANUEL HENRIQUE MESQUITA, Coimbra Editora, Lda., Coimbra, 1987, pág. 471] e onde se insere a prática de crimes [o crime não é um contrato, nem ato lícito]. Assim, o demandado só poderá ser condenado quando se mostrem verificados os pressupostos de que depende a responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos, não sendo admissível a sua condenação com base noutra modalidade de responsabilidade civil. Com efeito, o artigo 129º, do Código Penal, onde consta «emergente de crime» e o artigo 71º,do Código de Processo Penal, onde se fala «pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime», não deixam dúvidas quanto à modalidade de responsabilidade a ter em consideração, podendo ainda, convocar-se para o efeito o decidido no assento do STJ n.º 7/99 nos termos do qual: «Se em processo penal for deduzido pedido cível, tendo o mesmo por fundamento um facto ilícito criminal, verificando-se o caso previsto no artigo 377.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, ou seja, a absolvição do arguido, este só poderá ser condenado em indemnização civil se o pedido se fundar em responsabilidade extracontratual ou aquiliana, com exclusão da responsabilidade civil contratual» [publicado no DR- I Série-A, de 30.8.1999]. Posto isto, cabe aferir dos pressupostos que condicionam a obrigação de indemnizar imposta ao lesante com fundamento na responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos, que são, segundo a doutrina mais relevante, os seguintes: a) o facto; b) a ilicitude; c) a imputação do facto ao lesante; d) o dano; e) o nexo de causalidade entre o facto e o dano [MÁRIO JÚLIO DE ALMEIDA COSTA, Direito das Obrigações, 5.ª edição, Almedina, Coimbra, 1991, pp. 447. ANTUNES VARELA, Das Obrigações em Geral, vol. I, 7.ª edição, Almedina, Coimbra, 1991, p. 517]. Analisemos, em termos breves, cada um dos mencionados pressupostos. O facto gerador de responsabilidade reporta-se a um facto controlável pela vontade, um comportamento ou conduta humana – que pode consistir num ato positivo ou ação ou num ato negativo ou omissão [MÁRIO JÚLIO DE ALMEIDA COSTA, Direito das Obrigações, 5.ª edição, Almedina, Coimbra, 1991, p. 447]. A ilicitude do facto, no âmbito da responsabilidade extracontratual, pode traduzir-se: na violação de um direito de outrem; ou na violação de uma disposição legal destinada a proteger interesses alheios. A primeira hipótese, a única que nos interessa para o caso concreto, comporta os direitos subjetivos, em especial os direitos absolutos, com relevo para os direitos reais e os direitos de personalidade, pois que que a tutela dos direitos de crédito defronte a formas de incumprimento imputável foi remetida para o capítulo da responsabilidade contratual [PIRES DE LIMA/ANTUNES VARELA, ob. cit., pág. 472; ANTUNES VARELA, Das Obrigações em Geral, vol. I, 7.ª edição, Almedina, Coimbra, 1991., pp. 523/524; MÁRIO JÚLIO DE ALMEIDA COSTA, Direito das Obrigações, 5.ª edição, p. 451]. A imputação do facto ao agente, isto é, a culpa é um conceito que abrange, por um lado, a mera culpa ou negligência e, por outro, o dolo. Ou seja: a culpa tanto provém de falta de cuidado na prestação do serviço, como da intenção de causar um dano. A culpa é apreciada, na falta de outro critério legal, pela diligência de um “bom pai de família”, em face das circunstâncias de cada caso [Cf. Artigo 487, nº 2, do Código Civil]. Agir com culpa significa, assim, “atuar em termos de a conduta do agente merecer a reprovação ou censura do direito. E a conduta do lesante é reprovável, quando, pela sua capacidade e em face das circunstâncias concretas da situação se concluir que ele podia e devia ter agido de outro modo” [Cf. ANTUNES VARELA, obra citada pág. 571/572]. O dano, na formulação de ANTUNES VARELA [Das obrigações em geral, Vol. I., p. 658.], a que nos acolhemos, é a perda in natura que o lesado sofreu em consequência de certo facto, nos interesses (materiais, espirituais ou morais) que o direito violado ou a norma infringida visam tutelar. “É a lesão causada no interesse juridicamente tutelado (…).” Na tipologia dos danos que tradicionalmente podem ser considerados no domínio da obrigação de indemnizar, a doutrina vem entendendo que se distinguem, desde logo, os danos patrimoniais e os danos não patrimoniais, assentando tal distinção na natureza do interesse afetado. Assim, danos patrimoniais são os prejuízos que, sendo suscetíveis de avaliação pecuniária, podem ser reparados os indemnizados [ANTUNES VARELA, in “Das Obrigações em Geral”, Vol. I, 7ª edição, 594] e danos não patrimoniais, são os prejuízos (como dores físicas, desgostos morais, vexames, perda de prestígio ou de reputação, complexos de ordem estética) que, sendo insuscetíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens (como a saúde, o bem estar, a liberdade, a beleza, a honra, o bom nome) que não integram o património do lesado, apenas podem ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo esta mais uma satisfação do que uma indemnização” [ANTUNES VARELA, in “Das Obrigações em Geral”, Vol. I, 7ª edição]. Quanto ao quinto e último pressuposto da responsabilidade civil, isto é, a existência de um nexo de causalidade entre o ato e o dano sofrido, de modo a poder-se concluir que este (o dano) resulta daquele (do ato do lesante) há que atender ao disposto no artigo 563º do Código Civil, nos termos do qual a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão. Vem sendo entendimento de forma consistente pelo supremo tribunal de justiça que aquela norma consagrou a doutrina da causalidade adequada, na formulação negativa, nos termos da qual, na formulação de ANTUNES VARELA [Das Obrigações em Geral, vol. I, pág. 894], “só quando para a verificação do prejuízo tenham concorrido decisivamente circunstâncias extraordinárias, fortuitas ou excecionais (que tanto poderiam sobrevir ao fato ilícito como a um outro facto lícito) repugnará considerar o facto (ilícito) imputável ao devedor ou agente como causa adequada do dano”. * 3.2. DOS PEDIDOS DEDUZIDOS PELAS DEMANDANTES BB E DD:Da factualidade dada como provava resulta que o demandado: - Relativamente à demandante BB praticou dois crimes de violência doméstica, pelas razões de facto e de direito aduzidas em sede de enquadramento criminal, para as quais se remete e que, em consequência de tal crime, a demandante sofreu dores, medo, receio, vexame, vergonha, desgosto, tristeza e foi forçada a tomar ansiolíticos e a ser assistida no hospital. - Relativamente à demandante DD, o demandado cometeu dos crimes de ameaça e um crime de fotografias ilícitas, e que, em consequência de tal crime, a demandante sofreu medo, receio, vexame, vergonha e tristeza. Face a tal factualidade, dúvidas não se suscitam que o demandado praticou atos ilícitos culposos (sob a forma dolosa), do qual resultaram danos para ambas as demandantes. Dito de outra forma, o demandado, de forma livre e voluntária, violou ilicitamente um direito de personalidade das demandantes, mormente a sua integridade pessoal, merecedora de tutela constitucional (artigo 25º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa) e tutela civil, através do artigo 70º, n.º 1, do CC, o qual, protege os indivíduos contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade física ou moral. Termos em que se conclui que se mostram verificados todos os pressupostos exigidos pelo artigo 483º, do CC, pelo que fica o demandado constituído na obrigação de indemnizar os demandantes nos termos legais que regem a obrigação de indemnização, e que são os previstos nos artigos 562º e seguintes do CC. Nesse preceito consagra-se o princípio geral da chamada reconstituição integral ou “in natura”, nos termos do qual o responsável pela reparação de um dano deve reconstituir a situação que existiria se não tivesse ocorrido o facto que obriga à reparação. Não podendo proceder-se à reconstituição natural, há que atender ao disposto no artigo 566º, n.º 1, do CC, nos termos do qual, deverá o lesado ser compensado através da fixação de uma indemnização em dinheiro [a chamada reconstituição por equivalente pecuniário]. Porém, os danos não patrimoniais, pela sua própria natureza, isto é, valores de ordem espiritual, ideal ou moral, são insuscetíveis de reconstituição “in natura” ou por equivalente pecuniário, pois não é possível colocar o lesado na situação em que estaria se o facto danoso não tivesse tido lugar, mediante a concessão de bens com valor equivalente ao dos ofendidos em consequência do facto. Assim sendo, trata-se apenas de dar ao lesado uma satisfação ou compensação do dano sofrido, na forma de uma indemnização pecuniária, a qual não obedece à teoria da diferença consagrada no artigo 566º, n.º 2, do CC (imprestável para a finalidade em causa, atenta a natureza do dano não patrimonial já apontada), mas sim a critérios de equidade (artigo 494º, ex vi do artigo 496, n.º 4, 1ª parte do CC), limitados pela gravidade do dano (artigo 496º, n.º 1, do CC). Com efeito, decorre deste último preceito que são apenas reparados os danos que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito, sendo, assim, o princípio da reparação por equivalente pecuniário limitado pela gravidade do dano. A gravidade do dano há de medir-se por um padrão objetivo (essa apreciação deve ter em linha de conta as circunstâncias do caso concreto), devendo abstrair-se dos fatores subjetivos, nomeadamente “de uma sensibilidade particularmente embotada ou especialmente requintada” [ANTUNES VARELA, ob. cit., p. 576]. Por seu turno, do artigo 494º do CC parece resultar que a “indemnização” por danos não patrimoniais é calculada de acordo com os seguintes critérios: a) Equidade: critério orientador de todos os restantes; b) Grau de culpabilidade do agente (primeiro critério previsto no artigo 494.º); c) Situação económica do agente (segundo critério previsto no artigo 494.º); d) Situação económica do lesado (terceiro critério previsto no artigo 494.º); e) Demais circunstâncias do caso (quarto critério previsto no artigo 494.º, o qual é, em rigor, uma cláusula aberta, que dá ampla liberdade à justiça do caso concreto, a cargo do labor jurisprudencial). O parâmetro representado pela culpa do agente faz inculcar que a indemnização do dano não patrimonial reveste uma certa função punitiva ou sancionatória. Com efeito, como decidido pelo Acórdão do S.T.J. de 29.4.2004 [Relator Conselheiro ARAÚJO BARROS, in "http:/www.dgsi.pt/jstj], há que ter presente que "a indemnização reveste, no caso dos danos não patrimoniais, uma natureza acentuadamente mista: por um lado, visa reparar de algum modo, mais do que indemnizar, os danos sofridos pela pessoa lesada: por outro lado não lhe é estranha a ideia de reprovar ou castigar, no plano civilístico e com os meios próprios do direito privado, a conduta do agente”. Revertendo ao caso concreto tendo presentes as considerações acabadas de tecer, dúvidas não se suscitam que os danos sofridos pelas duas demandantes oferecem gravidade suficiente para ser tutelados pelo direito, pois atingem de forma intensa a personalidade física e moral das mesmas. Quanto ao grau de culpa, verifica-se que o demandado agiu com dolo direto, o que constitui um fator que agrava o montante da indemnização a fixar. Quanto às demais circunstâncias do caso, nada assume relevância particular. Tudo ponderado, tem-se por adequada a fixação de: - uma indemnização no valor de € 7.500 (sete mil e quinhentos euros), relativamente à demandante BB; - uma indemnização no valor de € 1.000 (mil euros), relativamente à demandante DD; Tais valores são fixados tendo já em consideração a taxa de inflação estimada para o ano corrente, isto é, de 6%. Dito por outras palavras, estamos perante um cálculo atualizado. A demandante não deduziu pedido de indemnização por danos patrimoniais. No que se refere aos juros de mora, cumpre referir que o devedor entra em mora quando tarda, por causa que lhe seja imputável, no cumprimento da prestação a que está obrigado - artigo 804º, nº 2 do Código Civil - estabelecendo a lei, através da indemnização moratória, uma sanção para o seu não cumprimento tempestivo. No que se refere ao momento da constituição em mora de responsabilidade por facto ilícito, a mesma tem lugar desde a citação (cf. n.º 3, do artigo 805º, do CC), correspondendo no processo penal à notificação do pedido de indemnização civil. Porém, no que se refere a danos não patrimoniais, únicos peticionados pelas demandantes, há que considerar o decidido pelo Acórdão Uniformizador de Jurisprudência de 9 de Maio de 2002, publicado no D.R., I Série, nº 146, de 27 de Junho de 2002, segundo o qual: "Sempre que a indemnização pecuniária por facto ilícito, ou pelo risco tiver sido objeto de cálculo atualizado, nos termos do nº 2 do artigo 566º do Código Civil, vence juros de mora, por efeito do disposto nos artigos 805º nº 3 (interpretado restritivamente), e 806º, nº 1, também do Código Civil, a partir da decisão atualizadora e não a partir da citação.". Manifestamos total concordância com o referido acórdão uniformizador. Assim, uma vez que no caso dos autos as indemnizações acima fixadas já estão devidamente atualizadas os juros relativos aos danos não patrimoniais apenas são devidos após a data da prolação da presente decisão. (...) Das custas: (...) Relativamente aos pedidos deduzidos por BB e DD, na medida em que os respetivos valores peticionados ultrapassam o valor de € 2040, demandantes e demandado são responsáveis pelo pagamento das custas, na proporção do respetivo decaimento. * 4. DO ARBITRAMENTO OFICIOSO DE INDEMNIZAÇÃO À VÍTIMA CC:A Lei n.º 129/2015, de 3 de setembro, que estabeleceu regime jurídico aplicável à prevenção da violência doméstica e à proteção e à assistência das suas vítimas, estabelece, no artigo 21º do Estatuto da Vítima, direito das vítimas à indemnização, nos seguintes termos: 1 - À vítima é reconhecido, no âmbito do processo penal, o direito a obter uma decisão de indemnização por parte do agente do crime, dentro de um prazo razoável. 2 - Há sempre lugar à aplicação do disposto no artigo 82.º-A do Código de Processo Penal, exceto nos casos em que a vítima a tal expressamente se opuser. Por seu turno, artigo 82º-A do Código de Processo Penal, o qual dispõe: «1 – Não tendo sido deduzido pedido de indemnização civil no processo penal ou em separado, nos termos dos artigos 72º e 77º, o tribunal, em caso de condenação, pode arbitrar uma quantia a título de reparação pelos prejuízos sofridos quando particulares exigências de proteção da vítima o imponham. 2 – No caso previsto no número anterior, é assegurado o respeito pelo contraditório. 3 – A quantia arbitrada a título de reparação é tida em conta em ação que venha a conhecer de pedido civil de indemnização». Considerando que a vítima CC, através da sua mãe, não deduziu pedido de indemnização civil e que esta não se opôs expressamente a que lhe fosse arbitrada uma reparação e que foi assegurado o respeito pelo contraditório, o mesmo tem direito à reparação prevista no artigo 82º-A do Código de Processo Penal. No caso, não se apuraram prejuízos materiais sofridos pela vítima. Relativamente a prejuízos não patrimoniais, cujo conceito acima se referiu e para lá se remete, apenas se apurou que a vítima, sendo bebé, intensificava o choro quando era abando pelo arguido. Termos em que se por adequada a fixação de uma compensação no valor de € 1.500 (mil e quinhentos euros). (...).» 2.3. Do conhecimento do mérito do recurso 2.3.2. Da impugnação da matéria de facto dada como provada Entendemos que a decisão do Tribunal a quo, ao dar como provados os factos agora referenciados, com base em prova indireta, mostra-se devidamente fundamentada, decorrendo do raciocínio explanado que o julgador acolheu uma solução consentânea com as regras da experiência comum, suportada pelas provas que enuncia e a cujo exame crítico procedeu, decidindo de acordo com a sua livre convicção, nos termos do artigo 127º do CPP, em termos que não nos merecem reparo. * Considera-se, assim, definitivamente fixada a matéria de facto dada como provada em 1.ª instância.
2.3.3. Do erro de subsunção * No que se refere à pessoa de CC, provou-se que no período compreendido entre ... de 2017 e ... de ... de 2018, no interior da residência comum, quando CC acordava durante a noite, a chorar, AA, em quatro dias distintos, pegou naquele pelos ombros, abanou-o e empurrou-o contra a colchão, ao mesmo tempo que dizia: “cala-te puto da merda”; nessa sequência, CC intensificava o choro.Face à introdução da alínea e), do n.º 1, do artigo 152º, do Código Penal, pela referida lei 57/2021, de 16 de fevereiro, desde logo se conclui que o mesmo é vítima protegida pela incriminação em causa, dado que, na data da prática dos factos era menor. Considerando que esta nova alínea introduzida pela referida lei 57/2021, de 16 de fevereiro veio alargar o leque das vítimas protegidas pela incriminação do artigo 152º, do Código Penal, na medida em que, na lei anteriormente em vigor, nem todos os menores se enquadravam no conceito de pessoa particularmente indefesa, pois é completamente diferente o grau de indefesa de um bebé e de um adolescente de 17 anos de idade, coloca-se o problema de saber se CC, para além de menor, deve ser também considerando pessoa particularmente indefesa, pois não sendo, não é aplicável a alínea e), do n.º 1, do artigo 152º, do Código Penal, atualmente em vigor, por constituir um alargamento da incriminação [artigo 2º, n.º 4, do Código Penal]. A resposta é, sem margens para dúvidas, que CC deve ser considerada pessoa particularmente indefesa em razão da idade. Com efeito, estando em causa uma criança que, na data da prática dos factos, tinha menos de um ano de idade, ela é, por inerência da sua condição de absoluta dependência de um adulto para sobreviver, pessoa particularmente indefesa em razão da idade. Assim sendo, caso se conclua que a conduta do arguido acima descrita assume gravidade suficiente para se considerada maus tratos físicos suscetíveis de lesar a saúde de CC, dúvidas não se suscitam que a mesma se enquadra na alínea d), do n.º 1, do artigo 152º, do Código Penal, em vigor na data da prática dos factos e na alínea e), do n.º 1, do artigo 152º, do Código Penal, atualmente em vigor. Ora, pese embora a privação do sono cause comprovadamente irritabilidade na pessoa atingida por essa privação, a mesma é, de todo, insuficiente para sustentar uma diminuição de ilicitude de tal ordem que desqualifique, cada uma das quatro condutas assumidas pelo arguido para o crime de integridade física, ainda que qualificada, p. e p. pelos artigos 143º, n.º 1 e 145º, n.º 1, alínea a), por referência ao artigo 132º, n.º 2, alínea a), do Código Penal. Com efeito, abanar um bebé pelos ombros e empurrá-lo contra o colchão, em quatro diferentes ocasiões, traduz um grau de ofensividade de tal forma elevado à saúde física e psíquica do bebé que não oferece dúvida que o bem jurídico pressuposto pelo crime de violência doméstica sofre uma lesão efetiva e, como tal, a conduta do arguido dever ser enquadrada no crime em causa. Por outro lado, dado que, as condutas em causa foram praticados no interior da residência que partilhava com o menor, contra o mesmo e na presença do mesmo, mostram-se preenchidas as circunstâncias agravantes, «domicílio da vítima» e “contra e na presença de menor” prevista na alínea a), do n.º 2, do artigo 152º, do Código Penal.». Entendemos que o enquadramento-jurídico penal dos factos provados, atinentes às condutas assumidas pelo arguido, para com as vítimas BB e CC, efetuado pelo Tribunal a quo, ao crime de violência doméstica, se mostra correta, merecendo-nos concordância. 2.3.4. Da escolha da pena no tocante aos crimes de ameaça e de fotografias ilícitas 2.3.5. Da medida da pena * A medida concreta da pena aplicada, não admite suspensão da respetiva execução, pelo que fica precludida a apreciação da correspondente questão suscitada no recurso.
2.3.6. No referente à indemnização civil arbitrada à demandante BB * O recurso é, pois, improcedente.3. DECISÃO Nestes termos, em face do exposto, acordam os Juízes que compõem esta Secção Criminal deste Tribunal da Relação de Évora em negar provimento ao recurso interposto pelo arguido AA e, em consequência, confirmar o acórdão recorrido. Custas pelo arguido/recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 3 (três) UC (arts. 513º, n.º 1, do Código de Processo Penal e 8º, n.º 9, do Regulamento das Custas Processuais, e Tabela III anexa a este último diploma), sem prejuízo do benefício de apoio judiciário concedido. Comunique-se, de imediato, a presente decisão à 1ª instância. Notifique. Évora, 07 de fevereiro de 2023 Fátima Bernardes
Fernando Pina Beatriz Marques Borges ____________________ [1] Cf., entre muitos outros, Ac. do STJ de 12/07/2008, proc. 07P3861, Ac. da RE de 22/11/2018, proc. n.º 526/16.4 GFSTB.E1, Ac.s da RP de 17/06/2020, proc. n.º 2541/19.7JAPRT.P1 e de 08/09/2020, proc. n.º 672/19.2GBAMT.P1, acessíveis in www.dgsi.pt. [2] Neste sentido, cf., entre outros, Ac.s da RE de 01/10/2013, proc. n.º 948/11.7PBSTR.E1 e de 12/09/2011, proc. n.º 331/08.1GCSTB.E1, Ac. da RG de 05/07/2021, proc. n.º 2/20.0GEBRG.G1, Ac. da RP de 15/06/2016, proc. n.º 1170/14.6TAVFR.P1, acessíveis in www.dgsi.pt. [3] Proferido no proc. n.º 342/14.8GBSTS.P1, acessível in www.dgsi.pt. [4] Cf. Ac. da RC de 09/10/2019, proc. n.º 170/18.1GCPBL.C1, acessível in https://www.direitoemdia.pt/ [5] Proferido no proc. n.º 514/19.9PBBJA.E1, em que a ora Relatora foi Adjunta. [6] Cf., por todos, Acórdãos do STJ de 23/05/2007, proc. 07P1498 e de 03/07/2008, proc. 08P1312, in www.dgsi.pt. [7] Cf., entre outros, Acórdãos da RC de 18/01/2017 e de 17/05/2017, respetivamente, proferidos nos procs. 112/15.6GAPNC.C1 e 430/15.3PAPNI.C1 e Ac. da RL de 18/01/2017, proc. 1050/14.5PFCSC.L1-3, in www.dgsi.pt. [8] Idem. [9] In Curso de Processo Penal, II, Lisboa, Verbo, 1993, pág. 111. [10] Proferido no proc.03P2612, acessível em www.dgsi.pt. [11] Sobre o tema, vide, Sandra Pereira e Teresa Magalhães, “Síndrome do shaken baby. Realidade ou Ficção em Portugal?”, in Acta Med Port. 2011, 24(S2), págs. 369 a 378 e Lara Lourenço e outros, “Síndrome do bebé abanado experiência de 10 anos de um Serviço de Cuidados Intensivos Pediátricos”, in Nascer e Crescer, Revista de Pediatria do Centro Hospitalar do Porto, ano 2013, vol. XXII, n.º 2, págs. 72 e ss. [12] Cf., entre outros, Ac. da RE de 02/02/2016, proc. 114/13.7TARMR.E1 e Ac. da R.C. de 03/06/2015, proc. 12/14.7GBRST.C1, in www.dgsi.pt. [13] Neste sentido, cf.,, entre outros, na doutrina, Américo Taipa de Carvalho, Comentário Conimbricense do Código Penal, Tomo I, 2ª Edição, Coimbra Editora, 2012, págs. 511 e 512, Nuno Brandão, A tutela especial reforçada da violência doméstica, in Rev. Julgar, nº. 12, - especial -, 2010, págs. 15 e 16 e Catarina Sá Gomes, in O Crime de Maus Tratos Físicos e Psíquicos infligidos ao cônjuge ou ao convivente em condições análogas às dos cônjuges, AAFDL, 2004, p. 59; e na jurisprudência, entre outros, Acórdãos do STJ de 11/03/2021, proc. 5/20.6JAFAR.S1; da RE de 16/05/2017, proc. 93/14.3GBRMZ.E1 e de 26/01/2021, proc. 229/18.5GBGDL.E1; da RL de 2/03/2017, proc. 696/13.3PDCSC.L1-9 e da RG de 08/06/2020, proc. 729/17.4GBVVD.G1 e de 14/09/2020, proc. 302/19.2PABCL.G1, todos acessíveis in www.dgsi.pt. [14] Sumariado na CJ, Ano 2018, T. 1, pág. 317. [15] Proferido no proc. n.º 189/17.0GCOVR.P1, acessível in www.dgsi.pt. [16] Violência Doméstica implicações sociológicas, psicológicas e jurídicas do fenómeno, Manual Multidisciplinar”, Centro de Estudos Judiciários, páginas 93 e 94, citando Teresa Magalhães, Violência e Abuso – Respostas Simples para Questões Complexas, Estado da Arte, Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra, 2010 e seguindo de perto a jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores. [17] Neste sentido, cf., entre outros, Ac. da RP de 11/01/2014, in CJ, 2014, Tomo I, pág. 326 e Ac. da RG de 10/07/2014, proc. 591/11.0PBGMR, acessível in www.dgsi.pt. [18] Cf. Nuno Brandão, in ob. cit., pág. 19 e Ac. da RC de 12/04/2018, proc. 3/17.6GCIDN.C1, acessível in www.dgsi.pt. [19] Proferido no processo 921/13.OPBFAR, acessível in www.dgsi.pt [20] Verifica-se existir lapso de escrita na menção ao ano de 2019, já que tratado-e de factos ocorridos “3 dias depois” e considerando a data dada como provada no ponto 7, o ano é de 2016. [21] In Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Eduardo Correia, Coimbra Editora, 2011, pág. 815. [22] Cf. Prof. Figueiredo Dias, in Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas Editorial Notícias, 1993, pág. 334. [23] Neste sentido, cf., entre outros, Ac.s do STJ de 12/09/2012, proc. 1221/11.6JAPRT.S1, de 21/11/2018, proc. 574/16.4PBAGH.S1 e de 20/01/2021, proc. 642/17.5GCVIS.C1.S1 in www.dgsi.pt. [24] Cf., por todos, Ac. do TC, n.º 673/2022, de 18/10/2022, in www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20220656.html [25] Cf. Prof. Figueiredo Dias, in Direito Penal Português – Das Consequências Jurídicas do Crime, Parte Geral, Aequitas-Editorial Notícias, 1993, pág. 215. [26] In Direito Penal Português, cit., págs. 291 e 292. [27] Cf. Ac. do STJ de 29/06/2017, proc. 976/12.5TBBCL.G1.S1, in www.dgsi.pt. [28] Cf., entre outros, Ac. do STJ de 12/11/2020, proc. 14697/16.6T8LSB.L1.S1, in www.dgsi.pt. [29] Cf., entre outros, Ac. do STJ de 10/10/2018, proc. n.º 1082/13.0GAFAF.G1.S1, in www.dgsi.pt. [30] “Reparação do dano não patrimonial”, in BMJ nº 83, pág. 236 e 237. [31] Neste sentido, cf., entre outros, Ac.s do STJ de 31/01/2012, proc. 875/05.7TBILH.C1.S1, in www.dgsi.pt. [32] “A equidade na indemnização dos danos não patrimoniais”, Dissertação com vista à obtenção do grau de Mestre em Direito, Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, outubro de 2015, pág. 38, acessível in https://run.unl.pt. [33] In ob. e loc. cit. [34] Neste sentido, cf., entre outros, Ac.s do STJ de 22/10/2009, proc. 3138/06.7TBMTS.P1.S1 e de 24/04/2013, proc. 198/06.6TBPMS.C1.S1, acessíveis in www.dgsi.pt. |