Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | JOÃO NUNES | ||
Descritores: | FORMAÇÃO PROFISSIONAL DANOS NÃO PATRIMONIAIS | ||
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Data do Acordão: | 07/13/2017 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Decisão: | REVOGADA PARCIALMENTE | ||
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Sumário: | I – Tendo o trabalhador sido reintegrado na empresa em consequência do despedimento que foi declarado ilícito, não tem direito à retribuição prevista no artigo 134.º do Código do Trabalho por formação profissional em falta, uma vez que mantendo-se o contrato de trabalho essa formação deve ser assegurada ao trabalhador nos termos previstos no artigo 132.º do Código do Trabalho; II – Justifica-se a fixação de uma indemnização por danos não patrimoniais ao trabalhador que em consequência do despedimento (ilícito) passou a andar triste e angustiado, pois tinha a expetativa de continuar na empresa, onde já se encontrava há cerca de 5 anos. (Sumário do relator) | ||
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Decisão Texto Integral: | Proc. n.º 947/16.2T8EVR.E1 Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1] Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora: I. Relatório BB (Autor/recorrido) intentou, na Comarca de Évora (Évora – Inst. Central – Sec. Trabalho – J1), a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra CC, S.A. (Ré/recorrente), pedindo que: a) se considere ilícita a cessação do contrato de trabalho por caducidade nos termos em que a Ré o fez e que se declare que (o Autor) se encontra vinculado à Ré, mediante contrato de trabalhos em termo, a partir de 26-11-2009; b) se condene a Ré reintegrá-lo no mesmo posto de trabalho e na mesma localidade onde nos últimos anos prestou o seu trabalho, em Évora: c) se condene a Ré no pagamento da quantia de € 637,72, a título de danos patrimoniais (por formação profissional em falta); d) se condene a Ré no pagamento da quantia de € 1.000,00, a título de danos não patrimoniais. Mais pediu a condenação da Ré no pagamento de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento. Alegou, para o efeito e muito em síntese, que, mediante a celebração de contrato de trabalho a termo e com a duração de 12 meses, foi admitido ao serviço da Ré em 26 de Novembro de 2009, passando desde essa data a exercer as funções de topógrafo. O referido contrato foi objecto de renovações sucessivas, sendo a última em 26 de Maio de 2014 e pelo período de 12 meses, tendo-lhe a Ré comunicado por escrito em 02 de Maio de 2015 a caducidade do mesmo com efeito a 25 de Maio seguinte, não voltando a partir desta data a trabalhar ao serviço e sob as ordens da Ré. Desde o início do contrato de trabalho o motivo justificativo – “em virtude do acréscimo excecional de atividade cometida ao Centro Operacional Sul” – manteve-se, sendo o mesmo vago e não verídico, na medida em que a sua contratação pela Ré se destinou a satisfazer uma necessidade permanente, pelo que o referido contrato se há-de considerar sem termo, e ilícita a cessação do mesmo nos termos em que ocorreu. Nessa conformidade peticionou as consequências da ilicitude do despedimento, e ainda a quantia de € 637,32 referente a um crédito de horas para formação, bem como a quantia de € 1.000,00 a título de danos não patrimoniais, uma vez que é casado, tem um filho menor, que à data dos factos tinha 2 anos de idade, o seu vencimento mensal constituía o principal sustento da família, pelo que se sentiu bastante angustiado pela sua situação profissional e por se ver privado do seu trabalho, “ que lhe causou grande inquietação”. Tendo-se procedido à audiência de partes e não se tendo logrado obter o acordo das mesmas, contestou a Ré, alegando, também muito em síntese, que no contrato de trabalho se mostra suficientemente concretizada a justificação do recurso à contratação temporária do Autor e que tal justificação é válida. Para além disso afirmou que o Autor teve mais horas de formação do que o mínimo legalmente previsto – pelo que nada lhe é devido a tal título – e que desconhece que a cessação do contrato de trabalho tenha tido no Autor e na sua família as consequências que este alegou. Pugnou, por consequência, pela improcedência da acção. Os autos prosseguiram os seus termos, tendo-se realizado audiência de julgamento, e em 13-10-2016 foi proferida sentença, na qual se respondeu à matéria de facto e se motivou a mesma, sendo a parte decisória, na parte relevante, do seguinte teor: «Pelo exposto julgo a acção parcialmente procedente por provada e em consequência: a) declaro a ilicitude da cessação do contrato de trabalho, por caducidade, celebrado em 26 de Novembro de 2009 entre a Ré CC, S.A. e o Autor BB. b) condeno a Ré CC, S.A. a reintegrar o Autor BB, no mesmo posto, local de trabalho, categoria e antiguidade. c) mais condeno a Ré CC, S.A. a pagar ao Autor BB a quantia de € 544,09 (quinhentos e quarenta e quatro euros e nove cêntimos) correspondente aos danos patrimoniais efectivamente sofridos pelo Autor e € 750,00 (setecentos e cinquenta euros) correspondente aos danos não patrimoniais sofridos em consequência do despedimento ilícito no montante global de € 1.294,09 (mil duzentos e noventa e quatro euros e nove cêntimos) acrescido de juros desde a citação à taxa legal até efectivo pagamento». Inconformado com a sentença, a Ré dela veio interpor recurso para este tribunal, tendo nas alegações apresentadas formulado as seguintes conclusões: «A. Decidiu o tribunal a quo declarar nulo o termo certo aposto ao contrato de trabalho celebrado entre o A. e a R. e, consequentemente, declarar esse contrato sem termo vigorando por tempo indeterminado, condenando a R. no pagamento ao A. de uma indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais em virtude da sua ilícita cessação; B. Nomeadamente, com os demais efeitos previstos no artigo 389.º, do Código do Trabalho, alíneas a) e b), do n.º 1, desse normativo, porque no caso sub iudice o A., ora Recorrido, optou pela reintegração (conforme se refere no penúltimo parágrafo, de folhas 6, da sentença). C. Porém, perante a decisão de reintegração do A., não é desde logo curial entender-se que a os créditos de horas emergentes da formação em falta hajam cessado e se transmutado em créditos retributivos, conforme foram reclamados nos autos no contexto da causa do seu pedido, ou seja, a cessação da relação contratual (que não se verifica, pois, por força da sentença em recurso acaba de ser reconstituída). D. Nenhum crédito de horas cessou, uma vez que as horas não asseguradas pela R. se transformam em crédito de horas para formação passados dois anos sobre o seu vencimento, como disposto no artigo 132.º, n.º 1, do Código do Trabalho; E. Face ao disposto naquele artigo 132.º e à decisão de sua reintegração, o A. não tem o direito a receber um montante equivalente à remuneração horária multiplicada pelo número de horas em falta, mas sim o direito a utilizar livremente essa quantidade de tempo em formação organizada por si, sem que a R. lhe possa descontar remuneração, conforme alegado acima. F. Sem prejuízo do desconto da diferença do tempo de formação a mais que foi, antecipadamente, ministrada no ano de 2010 (foram ministradas 90 horas, ou seja, antecipadamente fornecidas mais 55 horas que as 35 horas de lei) e no ano de 2014 (foram ministradas 84 horas completas, ou seja antecipadamente fornecidas mais 49 horas do que as 35 horas de lei), desconto esse a operar nos termos previsto no n.º 6, do artigo 131.º, do Código do Trabalho. G. Pelo que a R. ainda não pode ser declarada devedora dos montantes referido na sentença a título de formação não dada, desde logo, porque poderá o A. vir solicitar a formação ou a utilizar o crédito de horas correspondente, ou a própria R. ainda vir a proporcionar-lhe aquela formação. H. Logo, também aqui a decisão do tribunal a quo é, manifestamente, errada e deve ser revogada, uma vez que não se aplica ao caso em recurso o artigo 134.º, do Código de Trabalho, uma vez que a relação contratual não cessou porque o tribunal a quo determinou a reintegração do A. na R.. I. Se perante a cessação do seu contrato o A. passou a andar triste e angustiado, o que poderá configurar dano de natureza não patrimonial, o certo é que de acordo com o n.º 1, do artigo 496º referido, apenas são atendíveis os danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito, o que não acontece com os danos não patrimoniais em apreciação, por falta de elementos de facto que permitam ajuizar sobre o correspondente grau de gravidade, conforme alegado acima. J. Ora, não tendo o A. provado que os danos não patrimoniais alegadamente sofridos merecem a tutela do direito, ónus que lhe cabia nos termo previsto no n.º 1, do artigo 342.º, do Código Civil, não se verifica um dos pressupostos legais que permitiriam a fixação da indemnização a esse título, devendo ser revogada a decisão que os declarou e fixou sua indemnização na quantia de Eur. 750,00. Nestes termos e nos demais de Direito aplicável, sem prescindir do mui douto suprimento de V. Exas., deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência: 1) ser revogada a decisão proferida pelo tribunal a quo na parte em que condenou a R. no pagamento ao A. da quantia indemnizatória de Eur. 544,09 a título de danos patrimoniais por formação profissional não dada e, 2) ser revogada a decisão que condenou a R. no pagamento ao A. da quantia indemnizatória de Eur. 750,00 por danos não patrimoniais». Não tendo sido apresentadas contra-alegações, e subidos os autos a esta Relação, neles a Exma. Procuradora-Geral Ajunta emitiu douto parecer, no qual concluiu pela procedência do recurso no que à condenação por danos não patrimoniais diz respeito, e pela improcedência quanto ao restante. Ao referido parecer responderam as partes: (i) a Ré/recorrente, a manifestar a sua discordância em relação ao parecer no que ao crédito de horas de formação diz respeito, e a reafirmar que deve o recurso ser julgado procedente também quanto a esta questão; (ii) o Autor/recorrido, a manifestar a sua discordância em relação ao parecer no que aos danos não patrimoniais diz respeito, e a sustentar que o recurso deve ser julgado improcedente também quanto a esta questão. Entretanto, em 26-06-2017, procedeu-se à redistribuição dos autos nesta Relação, tendo os mesmos sido distribuídos ao ora relator. Preparando a deliberação foi remetido projecto de acórdãos aos exmos juízes desembargadores adjuntos. Colhidos os vistos legais, e realizada a conferência, cumpre apreciar a decidir. II. Objecto do recurso Como é sabido, o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (artigos 635.º, n.ºs 3 e 4 e artigo 639.º, do Código de Processo Civil, ex vi do artigo 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho). Ora, das conclusões das alegações de recurso constata-se que a recorrente não põe em causa a sentença recorrida na parte em que declarou ilícita a cessação do contrato e determinou a reintegração do Autor na empresa Ré [alíneas a) e b) da parte decisória da sentença], pelo que, nesta parte, transitou em julgado: o que questiona é tão só a condenação por formação profissional não dada, bem como por danos não patrimoniais. São, pois, estas as duas questões a decidir. III. Factos Na 1.ª instância foi dada como provada a seguinte factualidade: 1 – O Autor foi admitido ao serviço da Ré em 26 de Novembro de 2009 para sob as ordens, direcção e por conta da CC, S.A., exercer as funções de topógrafo mediante contrato de trabalho a termo certo celebrado pelo período de 12 meses. 2 – Este contrato foi renovado em 26 de Novembro de 2010 pelo período de 12 meses; 26 de Novembro de 2011 pelo período de 6 meses; 26 de Maio de 2012 pelo período de 6 meses; 26 de Novembro de 2012 pelo período de 6 meses; 26 de Maio de 2013 pelo período de 12 meses; e, 26 de Maio de 2014 pelo período de 12 meses. 3 – O Autor assegurava a realização dos trabalhos topográficos nos distritos de Évora, Beja e Faro, área de influência do Centro Operacional Sul, a unidade orgânica a que o Autor pertencia quando foi contratado. 3 – A partir de 2013, apesar de se encontrar afecto a uma unidade orgânica centralizadora da actividade da topografia, a sua área de actuação continuou a ser a zona sul do país. 4 – O motivo justificativo da aposição do termo foi quer no contrato inicial quer nas sucessivas renovações, “… um acréscimo da actividade a desenvolver pelo Centro Operacional Sul da 1ª Contratante, resultante do elevado número de obras, nomeadamente de reabilitação de obras de arte, que se encontra previsto iniciar neste período …”. 5 – Por carta registada com A/R datada de 28 de Abril de 2015 a Ré comunicou-lhe a caducidade do contrato no dia 25 de Maio de 2015. 6 – O Autor auferia à data da cessação do contrato a quantia mensal ilíquida de € 955,00. 7 – O Autor durante a duração do contrato, frequentou uma acção de formação em 11. 1. 2010 com a duração de 35horas "Formação para Utilizadores de Equipamento de Topografia TOPCON/SIERRA SOFT"; em 3. 2. 2010 com a duração de 21horas "Projecto SERVIR - IGeoE"; 22. 2. 2010 com a duração de 21horas "Follow Up - Formação para Utilizadores de Equipamento de Topografia TOPCON/SIERRA SOFT"; em 29. 11. 2010 com a duração de 16horas "Formação para Utilizadores de Equipamento de Topografia TOPCON/SIERRA SOFT (Follow-Up 1)"; em 19. 1. 2011 com a duração de 16horas "Formação para Utilizadores de Equipamento de Topografia TOPCON/SIERRA SOFT (Follow-Up 2)"; 21. 9. 2011 com a duração de 7horas "A adopção do ETRS89 em Portugal Continental; em 25. 11. 2011 com a duração de 4horas "Formação Visualizador SIG - Empresarial - Via Live Meeting"; em 27. 1. 2014 com a duração de 1,5horas "Formação em utilização de EPI`S", EM 6. 2. 2014 com a duração de 1,5horas "Formação em utilização de EPI`S"; em 28. 5. 2014 com a duração de 1,32horas " Formação relativa ao novo serviço de impressão - Live Meeting"; em 21. 10. 2014 com a duração de 28horas "NTOPO - Seminário de Topografia"; em 29. 10. 2014 com a duração de 16horas "ArcGIS I; em 5. 11. 2014 com a duração de 7,5horas "Visualizador SIG - Empresarial"; Iniciação ao SIG"; em 25. 11. 2014 com a duração de 1hora "PAMA - Plano de Actuação das Medidas de Autoprotecção"; em 26. 11. 2014 com a duração de 24horas "AutoCAD Civil 3D"; e, em 22. 12. 2014 com a duração de4horas "Formação de SST aos Topógrafos - Núcleo de Topografia (DGA)". 8– O Autor após a cessação do contrato passou a andar triste, angustiado tinha a expectativa de continuar por já lá estar há cerca de 5 anos. 9 – As necessidades de topógrafos mantém-se e manter-se-ão de futuro. IV. Fundamentação de direito Como já se deixou afirmado, as questões a decidir centram-se em saber se deve manter-se a condenação da Ré/recorrente (1) por não ter dado ao Autor/recorrido (toda) a formação profissional determinada por lei, e (2) por danos não patrimoniais. Analisemos, de per si, cada uma das questões. 1. Da formação profissional A 1.ª instância, no entendimento de que a Ré não proporcionou ao Autor toda a formação profissional que a lei lhe impunha, condenou-a pela formação profissional não dada. A Ré/recorrente rebela-se contra tal entendimento, sustentando, ao fim e ao resto, que face à reintegração do Autor na empresa o crédito de horas por formação ainda não cessou, na medida em que o Autor ainda poderá vir a solicitar essa formação, ou a utilizar o crédito de horas correspondente, ou a própria Ré ainda poderá vir a proporcionar-lhe essa formação. Vejamos. De acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 131.º do Código do Trabalho, o trabalhador tem direito, em cada ano, a um número mínimo de 35 horas de formação contínua ou, sendo contratado a termo por período igual ou superior a três meses, um número mínimo de horas proporcional à duração do contrato nesse ano; contudo, de acordo com o n.º 6 do mesmo artigo, o empregador pode antecipar até 2 anos ou, desde que o plano de formação o preveja, diferir por igual período, a efectivação da formação anual a que se refere o n.º 2, imputando-se a formação realizada ao cumprimento da obrigação mais antiga. Por sua vez, de acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 132.º, as horas de formação previstas no n.º 2 do artigo anterior, que não sejam asseguradas pelo empregador até ao termo dos dois anos posteriores ao seu vencimento, transformam-se em crédito de horas em igual número para formação por iniciativa do trabalhador; e o crédito de horas para formação que não seja utilizado cessa passados 3 anos sobre a sua constituição. Por fim, de acordo com o artigo 134.º do mesmo compêndio legal, cessando o contrato de trabalho, o trabalhador tem direito a receber a retribuição correspondente ao número de horas de formação que não lhe tenha sido proporcionado, ou ao crédito de horas para formação de que seja titular à data da cessação. Ora, no caso, como já resulta supra, por decisão já transitada em julgado a 1.ª instância declarou a ilicitude do despedimento e condenou a Ré, além do mais, na reintegração do Autor na empresa [cfr. artigo 389.º, n.º 1, alíneas a) e b), do Código do Trabalho]: tal significa que subsistiu o contrato de trabalho, mantendo-se a situação jurídica com a configuração que teria se o despedimento não tivesse ocorrido e, portanto, se a prestação de trabalho continuasse a ser normalmente executada. Daí que seja de afastar a aplicação ao caso do disposto no artigo 134.º do Código do Trabalho. Mas para além disso, da matéria de facto provada (n.º 7) decorre que o Autor teve as seguintes horas completas de formação: - em 2010: 93 horas; - em 2011: 27 horas; - em 2014: 83 horas. Daqui decorre que nos anos de 2011, 2012 e 2013 o Autor não teria tido as horas de formação exigidas por lei (faltariam 8 horas no primeiro ano referido, e 35 em cada um dos dois restantes). Contudo, haverá que ter presente o já referido n.º 6 do artigo 132.º: «[o] empregador pode antecipar até dois anos ou, desde que o plano de formação o preveja, diferir por igual período, a efectivação anual a que se refere o n.º 2, imputando-lhe a formação realizada ao cumprimento da obrigação mais antiga». Interessa-nos apenas a primeira parte da norma (antecipar até dois anos a formação), já que nada resulta dos autos que o plano de formação previsse o diferimento por dois anos da formação. Pois bem: face à formação realizada em 2010, 93 horas, são de imputar 35 horas ao ano de 2010, mais 35 horas ao ano de 2011, e as restantes 23 horas no ano de 2012; e as 27 horas de formação em 2011 são de imputar 12 ao ano de 2012 e as restantes 15 ao ano de 2013. Tal significa que apenas se encontram em falta 20 de formação em relação ao ano de 2013, sendo que no ano de 2014 foram dadas todas as horas de formação. Essa formação em falta deve ser assegurada nos termos previstos no artigo 132.º do Código do Trabalho, sendo de afastar – volta-se a sublinhar – a aplicação do disposto no artigo 134.º, uma vez que o trabalhador foi reintegrado na empresa (neste mesmo sentido se decidiu no acórdão deste tribunal de 02-02-2017, Proc. n.º 114/16.5T8EVR.E1, relatado pelo aqui 2.º adjunto – em que foi Ré a também aqui Ré e Autor um outro seu trabalhador –, e que se encontra disponível em www.dgsi.pt). Procedem, por isso, nesta parte, as conclusões das alegações de recurso, devendo, por consequência e também nesta parte, revogar-se a sentença recorrida. 2. Dos danos não patrimoniais Recorde-se que a 1.ª instância condenou a Ré/recorrente no pagamento ao Autor da quantia de € 750,00, a título de danos não patrimoniais. A recorrente discorda de tal condenação, sustentando que os danos sofridos pelo Autor não são suficientemente graves para merecerem a tutela do direito. No mesmo sentido opina o Ministério Público no seu douto parecer, enquanto o Autor/recorrido aplaude a decisão da 1.ª instância, pugnando, por isso, pela sua manutenção. Não parece ser objecto de controvérsia que se verificam os pressupostos de responsabilidade civil previstos no artigo 483.º do Código Civil: a divergência centra-se em saber se esses danos são suficientemente graves para que, no dizer do n.º 1 do artigo 496.º do referido compêndio legal, “pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito”. É pacífico, face ao trânsito em julgado, nessa parte, da sentença, que o despedimento foi ilícito e que após o mesmo o Autor passou a andar triste e angustiado, pois “tinha a expectativa de continuar por já lá estar há cerca de 5 anos” (cfr. facto n.º 8). Tendo a acção sido proposta em 18-05-2016, portanto quase um ano após o despedimento, tal significa que esse estado de “tristeza” e “angústia” do Autor perdurou, pelo menos, durante esse período de tempo; e, sublinhe-se, está em causa todo um estado de tristeza e angústia de alguém que, sem qualquer fundamento válido lhe é retirada a dignidade do direito a trabalhar, afectando não só o próprio mas também a estrutura familiar. No já referido acórdão deste tribunal de 02-02-2017 – em que estava em causa o despedimento ilícito de outro trabalhador da Ré e que em consequência do mesmo, tal como o aqui Autor, passou a andar triste, angustiado tinha a expetativa de continuar por já lá estar há 5 anos – entendeu-se que tais danos pela sua gravidade mereciam a tutela do direito. Escreveu-se para tanto no acórdão: «A expetativa do autor em continuar ao serviço da ré, dado tempo em que aí prestou a sua atividade, justifica-se. Não é uma expetativa infundada. Embora o contrato de trabalho fosse a termo certo, a verdade é que se apurou que não existia fundamento para a aposição do termo. A tristeza e angústia sofridas pelo trabalhador são aquelas que qualquer trabalhador colocado na sua situação sentiria. São factos subjetivos, de índole emocional, mas objetiváveis quando referidos ao sentir comum de outro trabalhador colocado na sua posição. A comunicação da caducidade do contrato de trabalho promovida pela empregadora constitui um ato contrário ao Direito, que causou tristeza e angústia objetivável e não meramente devida a eventual sensibilidade do autor, pelo que merece a tutela do direito, nos termos dos art.ºs 494.º e 496.º n.ºs 1 e 4 do CC». Não vislumbramos motivo para divergir do então decidido, sendo que se trata de um caso em tudo idêntico ao presente e não perdendo de vista o disposto no n.º 3 do artigo 8.º do Código Civil. Por isso, é de manter a referida condenação por danos não patrimoniais, assim improcedendo, nesta parte, as conclusões das alegações de recurso. V. Decisão Face ao exposto, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em julgar parcialmente procedente o recurso interposto por CC, S.A., e, em consequência, revoga-se a sentença recorrida, na parte em que a condenou no pagamento ao Autor da quantia de € 544,09 a título de danos patrimoniais, por formação profissional em falta [alínea c) da parte decisória da sentença], absolvendo-se a mesma de tal condenação. Quanto ao mais, mantém-se a sentença recorrida. Custas pela Ré e pelo Autor, na proporção do decaimento, que se fixam em 58% para aquela e em 42% para este (artigo 527.º do Código de Processo Civil). * Évora, 13 de Julho de 2017João Luís Nunes (relator) Mário Branco Coelho Paulo Amaral __________________________________________________ [1] Relator: João Nunes; Adjuntos: (1) Mário Coelho, (2) Paulo Amaral. |