Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | TOMÉ DE CARVALHO | ||
Descritores: | RECLAMAÇÃO CONTRA DESPACHO QUE NÃO ADMITIR OU RETIVER RECURSO MOMENTO DE SUBIDA DO RECURSO RETENÇÃO DE RECURSO CAUSA PREJUDICIAL | ||
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Data do Acordão: | 05/08/2024 | ||
Votação: | RELATOR | ||
Texto Integral: | S | ||
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Sumário: | 1 – Os recursos cuja retenção os torna absolutamente inúteis são apenas aqueles cujo efeito mais não poderá ser obtido, ainda que revogada a decisão sob recurso. 2 – O recurso cuja retenção o torna absolutamente inútil é apenas aquele cuja decisão, ainda que favorável ao recorrente, já não lhe pode aproveitar, por não poder produzir quaisquer efeitos dentro do processo, e não aquele cujo provimento implique a anulação de quaisquer actos, incluindo o do julgamento, por esse ser um risco próprio dos recursos com subida diferida. (Sumário do Relator) | ||
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Decisão Texto Integral: | Processo n.º 99/23.1JAFAR-B.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Faro – Juízo Central de Competência Criminal de Faro – J4 * I – Relatório: (…), (…) e (…) veio reclamar do momento da subida do recurso por interposto, nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 405.º do Código de Processo Penal. * Em sede de audiência de discussão e julgamento os arguidos vieram invocar nos termos do artigo 338.º do Código de Processo Penal a existência da questão prévia – existência de causa prejudicial que corre termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé – que, na respectiva visão, afectou a regularidade do processo e que obstava à apreciação do mérito da causa. * Por despacho proferido em acta, datado de 18/04/2024, o Tribunal a quo indeferiu a suspensão do processo nos termos requeridos e determinou o início da audiência de julgamento. * Nessa sequência, na mesma diligência, os arguidos interpuseram recurso em acta. * A Mmª. Juiz Presidente admitiu o recurso interposto pelos arguidos, a subir nos próprios autos, com aquele que vier a ser interposto da decisão que puser termo à causa e com efeito meramente devolutivo, nos termos dos artigos 399.º, 400.º, a contrario sensu, 401.º, n.º 1, alínea b), 411.º, n.ºs 1 e 3, 406.º, n.º 1, 407.º, n.º 3 e 408.º, a contrario sensu, todos do Código de Processo Penal. * Os reclamantes pretendem que o recurso interposto suba de imediato, nos próprios autos e com efeito suspensivo ao abrigo do disposto nos artigos 406.º, 407.º e 408.º, n.º 3, todos do Código de Processo Penal. * II – Dos factos com interesse para a decisão: Os factos com interesse para a justa decisão da reclamação são os que constam do relatório inicial. * III – Enquadramento jurídico: Do despacho que não admitir ou que retiver o recurso, o recorrente pode reclamar para o presidente do tribunal a que o recurso se dirige, nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 405.º[1] do Código de Processo Penal. O momento da subida está provisionado no artigo 407.º[2] do Código de Processo Penal e os reclamantes entendem que sobem imediatamente os recursos cuja retenção os tornaria absolutamente inúteis. Os arguidos vieram invocar a existência de causa prejudicial que corre termos sobre o n.º 377/204.2GELLE no Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, cujo objecto está relacionado as atribuições da Marinha Portuguesa e a possível violação ou abuso de funções por parte desta, no âmbito da actuação ocorrida no dia 20 de Março de 2023. Em primeiro lugar, sem prejuízo da decisão que vier a ser adoptada pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, a avaliação da abordagem policial efectuada à embarcação tripulada pelos ora reclamantes encontra-se na esfera de protecção do artigo 7.º[3] do Código de Processo Penal, que consagra o princípio da suficiência do processo penal e é ao Juízo de Competência Criminal de Faro que, em primeira linha, cumpre avaliar da legalidade da prova e da hipotética ocorrência de um método proibido de prova. Depois, para que se justifique a subida imediata dos recursos, ao abrigo do disposto n.º 1 do artigo 407.º do Código de Processo Penal, é necessário que haja uma situação de absoluta inutilidade do recurso. Isto é, mesmo que venha a ser provido, já não possa ter qualquer efeito útil na marcha do processo e que esta inutilidade seja causada pela sua retenção. É essa a posição dominante na jurisprudência que assevera que o recurso cuja retenção o torna absolutamente inútil é apenas aquele cuja decisão, ainda que favorável ao recorrente, já não lhe pode aproveitar, por não poder produzir quaisquer efeitos dentro do processo, e não aquele cujo provimento implique a anulação de quaisquer actos, incluindo o do julgamento, por esse ser um risco próprio dos recursos com subida diferida”[4] [5]. Por outras palavras, os recursos cuja retenção os torna absolutamente inúteis são apenas aqueles cujo efeito mais não poderá ser obtido, ainda que revogada a decisão sob recurso[6]. Feita a análise da matéria integrada no recurso interposto na sua relação dinâmica com a legislação aplicável[7], caso venha a ser deferida a interpretação proposta pelos reclamantes no âmbito da acção prejudicial e ela seja sufragada igualmente pelos decisores dos Tribunais Comuns, uma vez apreciado o recurso a final, se for provido, proceder-se-á à anulação e/ou repetição do processado que se mostrar necessário à implementação da solução que aí for definida. Em suma, não se enquadra o presente recurso interlocutório em nenhuma das situações previstas no n.º 2 do artigo 407.º do Código de Processo Penal e tão pouco se verifica a previsão do seu n.º 1. E, por conseguinte, neste espectro lógico-jurídico, mantém-se o despacho de não admissão de recurso, por extemporaneidade. * IV – Sumário: (…) * V – Decisão: Nestes termos e pelo exposto, tendo em atenção as considerações expendidas e o quadro legal aplicável, mantém-se o despacho reclamado, não se admitindo o recurso interposto. Custas a cargo dos arguidos, fixando a taxa de justiça em 2 UC´s. Notifique. * Processei e revi. * Évora, 08/05/2024 José Manuel Costa Galo Tomé de Carvalho __________________________________________________ [1] Artigo 405.º (Reclamação contra despacho que não admitir ou que retiver o recurso): 1 - Do despacho que não admitir ou que retiver o recurso, o recorrente pode reclamar para o presidente do tribunal a que o recurso se dirige. 2 - A reclamação é apresentada na secretaria do tribunal recorrido no prazo de 10 dias contados da notificação do despacho que não tiver admitido o recurso ou da data em que o recorrente tiver tido conhecimento da retenção. 3 - No requerimento o reclamante expõe as razões que justificam a admissão ou a subida imediata do recurso e indica os elementos com que pretende instruir a reclamação. 4 - A decisão do presidente do tribunal superior é definitiva quando confirmar o despacho de indeferimento. No caso contrário, não vincula o tribunal de recurso. [2] Artigo 407.º (Momento da subida): 1 - Sobem imediatamente os recursos cuja retenção os tornaria absolutamente inúteis. 2 - Também sobem imediatamente os recursos interpostos: a) De decisões que ponham termo à causa; b) De decisões posteriores às referidas na alínea anterior; c) De decisões que apliquem ou mantenham medidas de coacção ou de garantia patrimonial, nos termos deste Código; d) De decisões que condenem no pagamento de quaisquer importâncias, nos termos deste Código; e) De despacho em que o juiz não reconhecer impedimento contra si deduzido; f) De despacho que recusar ao Ministério Público legitimidade para a prossecução do processo; g) De despacho que não admitir a constituição de assistente ou a intervenção de parte civil; h) De despacho que indeferir o requerimento para a abertura de instrução; i) Da decisão instrutória, sem prejuízo do disposto no artigo 310.º; j) De despacho que indeferir requerimento de submissão de arguido suspeito de anomalia mental à perícia respectiva. k) De despacho proferido ao abrigo do disposto nos n.ºs 2, 3 e 5 do artigo 328.º-A. 3 - Quando não deverem subir imediatamente, os recursos sobem e são instruídos e julgados conjuntamente com o recurso interposto da decisão que tiver posto termo à causa. [3] Artigo 7.º (Suficiência do processo penal): 1 - O processo penal é promovido independentemente de qualquer outro e nele se resolvem todas as questões que interessarem à decisão da causa. 2 - Quando, para se conhecer da existência de um crime, for necessário julgar qualquer questão não penal que não possa ser convenientemente resolvida no processo penal, pode o tribunal suspender o processo para que se decida esta questão no tribunal competente. 3 - A suspensão pode ser requerida, após a acusação ou o requerimento para abertura da instrução, pelo Ministério Público, pelo assistente ou pelo arguido, ou ser ordenada oficiosamente pelo tribunal. A suspensão não pode, porém, prejudicar a realização de diligências urgentes de prova. 4 - O tribunal marca o prazo da suspensão, que pode ser prorrogado até um ano se a demora na decisão não for imputável ao assistente ou ao arguido. O Ministério Público pode sempre intervir no processo não penal para promover o seu rápido andamento e informar o tribunal penal. Esgotado o prazo sem que a questão prejudicial tenha sido resolvida, ou se a acção não tiver sido proposta no prazo máximo de um mês, a questão é decidida no processo penal. [4] Decisão da presidência de 27 de Fevereiro de 2006, no processo 554/06-1, in Base de Dados do ITIJ. [5] Na decisão singular desta Relação de 09 de Outubro de 2012, no processo n.º 410/11.8GHSTC.E1, consultável em www.dgsi.pt, onde se lê que: “não se pode confundir a inutilidade absoluta do recurso com a eventual necessidade de repetição de diligências ou mesmo de anulação do processado, inclusive o próprio julgamento, ou seja, não se pode confundir a inutilidade do recurso com a inutilidade da lide decorrente da procedência dele; essa é uma realidade que o legislador não desconhecia ao consagrar o regime dos recursos, assumindo o risco inerente à celeridade processual, que é valor consagrado no n.º 2 do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa”). [6] Decisão do Vice-Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa de 04/06/2015. [7] Em sentido próximo pode ser consultado o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 476/2007, DR, II Série de 03/01/2008. |