Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | MOISÉS SILVA | ||
Descritores: | EXTINÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO REFORMA DO TRABALHADOR ABUSO DO DIREITO | ||
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Data do Acordão: | 12/06/2017 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Decisão: | CONFIRMADA | ||
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Sumário: | i) A extinção do contrato de trabalho por caducidade decorrente de reforma do trabalhador, só é definitiva se for também definitiva a decisão que a proferir. ii) Sendo declarada antes de ser definitiva, a parte que a invocar fica sujeita às consequências decorrentes da decisão que eventualmente alterar a decisão anterior de reforma. iii) A invocação da caducidade do contrato de trabalho com fundamento na reforma antecipada do trabalhador, quando a empregadora sabia que o trabalhador tinha desistido de tal pedido por motivos legítimos ligados ao valor da pensão proposta e que o pedido de reforma poderia ser, como foi, revogado pela segurança social e ficar sem efeito, sem aguardar pela confirmação da situação de reforma, a qual ainda não se tinha convertido em definitiva em face da posição assumida de forma transparente e de boa-fé pelo trabalhador, constitui uma forma ostensiva, grosseira, que choca fortemente a consciência jurídica geral sobre o exercício do direito de utilizar o direito em proveito próprio com base numa situação jurídica não consolidada e, por isso, incerta, onde avulta a posição vulnerável do trabalhador, quer em face da segurança social quer em face da empregadora. (Sumário do relator) | ||
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Decisão Texto Integral: | Processo n.º 388/16.1T8STC.E1 Acordam, em conferência, na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora I - RELATÓRIO Apelante: CC, Lda (ré). Apelado: BB (autor). Tribunal Judicial da comarca de Setúbal, Santiago do Cacém, Juízo do Trabalho. 1. O A. intentou a presente ação emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma do processo comum, contra a ré, pedindo que pela procedência da ação seja: A) Reconhecido como ilícita a cessação do contrato, ocorrida em 02/03/2016 e consequentemente nulo o despedimento do autor; B) Em resultado de tal declaração de nulidade do despedimento e da ilicitude da cessação do contrato a ré condenada a reintegrar o autor na empresa, sem perda de antiguidade e direitos, ou pagar uma indemnização por despedimento ilícito, não inferior a 3 meses de retribuição base, a ser calculada a final e pelo montante máximo de 45 dias de retribuição, conforme opção do autor a ser tomada até ao termo da discussão de audiência final de julgamento; C) A ré condenada a pagar ao autor todos os créditos exigíveis pela cessação do contrato, designadamente férias não gozadas, proporcionais de subsídios de férias e de Natal, desde a data do seu vencimento até integral pagamento, caso o autor não opte pela reintegração. D) A R. condenada a pagar ao autor todos os créditos exigíveis pela cessação do contrato, designadamente subsídio de férias, ferias não gozadas, proporcionais do subsídio de férias e de Natal. E) A R. condenada a pagar ao autor as retribuições e demais remunerações que se vencerem na pendência da presente ação e que o A. deixou de auferir desde a data da cessação do contrato até ao trânsito em julgado da decisão final. F) A R. condenada a pagar ao A., os demais salários e créditos em divida à data da presente ação, referentes as remunerações que o autor deixou de auferir desde o despedimento e até 30 dias antes da propositura da ação, até ao trânsito em julgado da decisão que declare a ilicitude do despedimento; G) A R. condenada no pagamento de uma indemnização em quantia não inferior a € 3 737,70, a fim de ressarcir o A. de todos os danos morais sofridos, em virtude da conduta da R. H) A R. condenada no pagamento de juros de mora vencidos e vincendos sobre todas as quantias em divida até integral pagamento; I) A R. condenada a efetuar os descontos para a segurança social à taxa legal, desde a data do despedimento até à data da sentença final proferida; J) Em qualquer dos presentes pedidos, a R. condenada no pagamento de taxa de justiça, custas de parte, procuradoria e demais despesas com o processo. Alegou, em síntese que é trabalhador da R. desde 2007, mas produzindo os efeitos quanto à sua antiguidade na empresa, desde 1 de maio de 1989, por força da cláusula 11.ª do contrato celebrado com a R. em 01.07.2007, tendo então passado a integrar os quadros desta, exercendo as funções de Operador Portuário Nível III, auferindo a remuneração de € 3 737,70. R. e A. receberam uma comunicação da Segurança Social, em janeiro de 2016, afirmando que este estaria reformado. Não tendo o A. sido notificado previamente para exercer o seu direito se pretendia ou não a reforma e não a pretendendo, diligenciou e apresentou resposta junto da Segurança Social, tendo informado o Diretor de Recursos Humanos da R. que não pretendia a reforma, e que certamente esta iria receber comunicação da Segurança Social nesse sentido, ao que o Diretor ficou de analisar o assunto. A Segurança Social enviou ofício à R. informando que o A. não estaria reformado, contudo, em 26.02.2016, o A. veio a ser confrontado pela R. com a situação de se encontrar reformado, tendo uma vez mais explicado existir erro quanto a essa situação, não estando reformado e pretendendo permanecer ao serviço da R., não devendo produzir efeito a comunicação da Segurança Social. O A. invocou e confirmou novamente o erro junto da Segurança Social em 01.03.2016, contudo, no dia 02.03.2016, quando o A. iniciou o seu trabalho, foi-lhe comunicado que não o podia retomar e que teria de abandonar as instalações da empresa, já que o seu contrato havia terminado em 29/2/2016, mantendo-se a situação até à presente data. A Segurança Social, por ofício, o último dos quais enviado à R. em 16/3/2016, comunicou reconhecer o erro cometido confirmando que o autor não estava reformado. Assim, a R. não podia, como fez, pôr termo ao contrato invocando a caducidade do mesmo por reforma, pois esta não ocorreu, pelo que a cessação do contrato de trabalho operada pela ré é ilícita e sem fundamento, o que equivale a um despedimento verbal, recusando a prestação de trabalho do A., configurando um despedimento ilícito e sem fundamento, com as consequências daí inerentes. O A. ficou profundamente abalado psicologicamente, não consegue dormir, sofre de angústias permanentes, ficando bastante nervoso, estando numa situação desesperada sem qualquer ajuda ou possibilidade de auferir uma remuneração e tendo uma filha a seu cargo. Vê-se na necessidade de pedir ajuda a familiares e amigos para sobreviver e acudir às suas responsabilidades e necessidades, o que gera grande nervosismo, ansiedade e cansaço, tudo se traduzindo num dano passível de ser indemnizado, porque tutelado pelo direito. Teve lugar a audiência de partes a que alude o artigo 54.º do Código de Processo Trabalho, não se tendo logrado a conciliação entre as partes, pelo que foi desde logo designada data para realização da audiência de discussão e julgamento e a ré notificada para contestar. A ré contestou, alegando, em síntese, que tendo sido comunicado à R. pela Segurança Social que o A. estava reformado por velhice e sendo alheia à relação entre ambos, no âmbito de uma faculdade que lhe é legalmente reconhecida, no dia 26 de Fevereiro de 2016 a R. fez cessar o contrato de trabalho do A., por caducidade, com efeitos imediatos nessa mesma data. Inexistindo, portanto, qualquer despedimento do A. e, consequentemente, não se verificando a causa de pedir com base na qual o mesmo fundamenta a presente ação, devendo improceder igualmente e de forma integral os pedidos formulados. Dispensada a realização de audiência preliminar, foi proferido despacho saneador, no qual foi fixada a matéria de facto assente e elaborada a base instrutória. Realizou-se audiência de discussão e julgamento, com observância do formalismo legal, tendo o tribunal respondido à matéria de facto constante da base instrutória, despacho relativamente ao qual não foi apresentada qualquer reclamação. Após, foi proferida sentença com a seguinte decisão: Em face de tudo quanto se deixou exposto e nos termos dos supra citados preceitos legais: 1. Absolvo a R. CC, Lda da instância quanto ao pedido da sua condenação a efetuar os descontos para a Segurança Social à taxa legal, desde a data do despedimento até á data da sentença final proferida, por incompetência da secção do trabalho; 2. No mais, julgo a ação parcialmente procedente por provada e, em consequência: A. Julgo ilícita a cessação do contrato de trabalho e, consequentemente, nulo o despedimento de que o A. foi alvo por parte da R. CC, Lda; B. Condeno a R. a reintegrar o A. ao seu serviço, sem perda de antiguidade e direitos; C. Condeno a R. a pagar ao A. as retribuições - incluindo férias que se vençam e não sejam gozadas, subsídios de férias e subsídios de Natal e seus proporcionais, em montante a liquidar, vencidas desde 20 de abril de 2016 e que se vencerem até ao trânsito em julgado da presente sentença, acrescidas de juros a contar da data da notificação da liquidação, mas deduzidas das quantias que o A. tiver auferido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento, e do subsídio de desemprego atribuído ao A. desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão que declare a ilicitude do despedimento, subsídio esse que, a ter sido pago, a R. deverá entregar à Segurança Social, tudo a liquidar em execução de sentença; D. Absolvo a R. do pagamento de indemnização ao A. em quantia não inferior a € 3 737,70, a título de ressarcimento por danos não patrimoniais sofridos pelo A. em virtude da conduta da R. Custas a cargo de autor e ré na proporção do respetivo decaimento (artigo 527.º, n.º 1 do Código de Processo Civil). 2. Inconformada, veio o R. interpor recurso de apelação que motivou e com as conclusões que daí se extraem: A. No entender da recorrente, a decisão objeto do presente recurso encontra-se inquinada de nulidade, ao abrigo do disposto na alínea c) do n.º 1 do art.º 615.º do Cód. Proc. Civil, aplicável ex vi do art.º 1.º do Cód. Proc. Trabalho, na medida em que se verifica uma contradição lógica entre os seus fundamentos e a decisão, ou seja, os fundamentos indicados na sentença apontam num sentido e a decisão foi tomada em sentido oposto, nulidade que aqui se deixa invocada com todas as consequências legais daí decorrentes. B. Uma primeira contradição evidente é referente à questão da caducidade do contrato de trabalho entre o autor e ora recorrido e a ré e ora recorrente, na medida em que em sede de fundamentação a Meritíssima Juiz a quo referiu que “não restam dúvidas de que pela R. foi validamente comunicada ao A. a caducidade do seu contrato de trabalho” mas, ainda assim, conseguiu concluir que “não tendo a cessação do contrato sido precedida de qualquer procedimento formal, atento o teor da comunicação feita pela R. ao A., e o facto de no dia 2.03.2016, o autor se ter apresentado ao serviço da R., tendo-lhe sido comunicado que não poderia retomar o mesmo e que teria de abandonar as suas instalações, pois o seu contrato teria caducado, situação que se mantém (facto provado em 8), deverá concluir-se ser o despedimento ilícito (art.º 381.º do Código do Trabalho)”. C). Considerando a Meritíssima Juiz a quo, e bem, que a recorrente comunicou validamente a caducidade do contrato de trabalho ao recorrido em 26 de fevereiro de 2016, com efeitos imediatos, tal significa, incontornavelmente, que o referido contrato se extinguiu (validamente) nessa mesma data, razão pela qual não se concebe nem tão pouco se compreende, como é possível concluir-se a final que a recorrente procedeu ao despedimento ilícito do recorrido no dia 2 de março de 2016, ao não permitir que o mesmo estivesse nas suas instalações por o seu contrato de trabalho ter caducado. D). É igualmente contraditória a sentença recorrida na medida em que a Meritíssima Juiz a quo, em sede de fundamentação, refere que “não se pode considerar que o autor efetivamente acedeu à pensão de reforma, caindo assim por base um dos pressupostos da caducidade do contrato de trabalho” e, simultaneamente, decide que houve um despedimento ilícito do recorrido por se verificar a “inoperância” da caducidade comunicada por força de um despacho da Segurança Social a revogar a atribuição da pensão ao recorrido em 17 de março de 2016 – despacho que pressupõe incontornavelmente que o recorrido estava reformado à data da cessação do contrato, em 26 de fevereiro de 2016. E). Mas a decisão recorrida encontra-se igualmente inquinada de nulidade na medida em que se verifica uma contradição lógica entre os fundamentos e a decisão proferida no que respeita à questão da atribuição de efeitos retroativos ao despacho da Segurança Social que em 17 de março de 2016 revogou a decisão de atribuição da pensão ao recorrido. F). Com efeito, não obstante em sede de fundamentação reconhecer que nos termos da lei a eficácia retroativa do ato de revogação teria de ser atribuída pelo autor do mesmo (e preenchidos alguns requisitos) e não obstante não se encontrar provado nos autos qualquer facto do qual resulte que a Segurança Social atribuiu, ou sequer pretendeu atribuir, efeitos retroativos ao despacho de revogação da atribuição da pensão ao autor, inexplicavelmente, ignorando de forma olímpica esta circunstância, a Meritíssima Juiz a quo concluiu que o ato de revogação destruiu o ato de atribuição da pensão com efeitos retroativos. G). Caso não se entenda que a sentença recorrida se encontra inquinada de nulidade, nos termos expostos e com as consequências legais daí decorrentes, sempre se imporá, no entender da recorrente, a revogação da mesma e a sua substituição por outra que, reconhecendo que o contrato de trabalho entre a recorrente e o recorrido cessou validamente, por caducidade, no dia 26 de fevereiro de 2016, julgue totalmente improcedente a ação por não se verificar a causa de pedir subjacente à mesma – pretenso despedimento ilícito do recorrido – e absolva integralmente a recorrente dos pedidos nela formulados. H). De outro modo, sempre seria de concluir que a interpretação, conjugada, do disposto na alínea c) do art.º 343.º no n.º 1 do art.º 348.º e na alínea c) do art.º 381.º do Código de Trabalho, nos termos em que o fez a sentença recorrida é inconstitucional por violação do princípio da liberdade de gestão empresarial e da autonomia da estratégia empresarial, o que desde já aqui se deixa invocado para todos os efeitos legais. I). Com efeito, sempre seria inconstitucional, por violação do princípio da liberdade de gestão empresarial e da autonomia da estratégia empresarial, consagrado nos arts.º 61.º n.º 1 e 86.º n.º 2 da CRP, bem como do artigo 22.º da CRP e no n.º 1 do artigo 7.º do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas se considerássemos estar perante um ato ilegal da Administração - a interpretação daquelas normas no sentido de que o exercício do direito de fazer caducar o contrato de trabalho por força da passagem de um trabalhador à situação de pensionista por velhice está ou pode estar limitado ou condicionado na sua eficácia pela vontade do próprio trabalhador/beneficiário ou por decisão da Administração, na medida em que se o beneficiário posteriormente desistir da atribuição da pensão ou a Administração entender que ela própria não cumpriu todos os procedimentos legais, a entidade empregadora é obrigada a readmitir o trabalhador ao seu serviço ou a assumir a responsabilidade por ter procedido ao despedimento ilícito. J). A decisão recorrida procedeu, assim, a uma errada subsunção dos factos provados às normas jurídicas aplicáveis ou a uma incorreta interpretação das mesmas, nomeadamente, do disposto na alínea c) do art.º 343.º e no n.º 1 do art.º 348.º do Código do Trabalho, no art.º 483.º do Código Civil e no n.º 1 do art.º 7.º da Lei n.º 67/2007, de 31/12, no n.º 1 do art.º 4.º, al. o) do ETAF, nos arts.ºs 121.º, 122.º, 131.º, 148.º, 155.º n.º 1, 157.º al. c) e 171.º n.º 1 do CPA, no art.º 54.º n.º 1 do CPTA e nos arts.ºs 62.º e n.º 1 e al. c) do n.º 2 do art.º 89.º ambos do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 maio. K). Em face de tudo o exposto, impõe-se a revogação da decisão recorrida e a sua substituição por outra que reconheça que o contrato de trabalho entre a recorrente e o recorrido cessou validamente, por caducidade, em 26 de fevereiro de 2016 e, consequentemente, não se verifica a causa de pedir nos presentes autos, julgando a presente ação totalmente improcedente e absolvendo integralmente a recorrente de todos os pedidos contra si formulados, o que se requer para todos os efeitos legais. Termos em que a douta sentença recorrida não deverá manter-se, devendo o presente recurso merecer integral provimento, com as consequências legais daí decorrentes. 3. Foi apresentada resposta, sem conclusões, mas donde se extrai claramente que o autor pugna pela confirmação da sentença recorrida, a qual, em seu entender, não é nula nem ilegal, mas sim justa e aplicou corretamente o direito aos factos provados. 4. O tribunal recorrido, antes da subida do recurso, sustentou a inexistência das nulidades da sentença arguidas pela apelante. 5. O Ministério Público junto deste Tribunal da Relação apôs o seu visto, sem emissão de parecer. 6. O relator proferiu despacho a convidar as partes para se pronunciarem, querendo, sobre a eventual aplicabilidade ao caso do princípio da boa-fé e do instituto do abuso do direito – art.º 3.º n.º 3 do CPC. Ambas as partes corresponderam e apresentaram douta fundamentação sobre a aplicação do princípio da boa-fé e do instituto do abuso do direito. Contudo, enquanto o autor defende que o comportamento da ré se enquadra na figura do abuso do direito, esta entende que a factualidade provada não permite a sua aplicação, mas que, a verificar-se, só o trabalhador nele incorreu. 7. Após os vistos, em conferência, cumpre decidir. 8. Objeto do recurso O objeto do recurso está delimitado pelas conclusões das alegações formuladas, sem prejuízo do que for de conhecimento oficioso. As questões a decidir são as seguintes: 1.ª – A nulidade da sentença por contradição entre os fundamentos e a decisão. 2.ª – Erro de julgamento na aplicação do direito aos factos provados e constitucionalidade. II - FUNDAMENTAÇÃO Os factos provados são os seguintes: 1. O A. possui o estatuto de trabalhador portuário desde 01.05.1989, pertencente ao histórico de trabalhadores portuários licenciados do remanescente de 1993 (contingente dos portos). (A) 2. Nesta condição, foi inicialmente admitido pela DD, S.A., em junho de 2007, tendo transitado dos quadros da EE, Lda. (B) 3. Em 1 de julho de 2007, entre a CC, Lda e o autor foi celebrado acordo escrito denominado contrato de trabalho, pelo qual este foi contratado por aquela para prestar as funções inerentes à categoria profissional de Operador Especialista às empresas de estiva ou utentes de áreas portuárias privativas de mão-de-obra portuária, que exerçam atividade no Porto de …. (C) 4. Da cláusula 11.ª deste acordo consta: «1. «1. No âmbito do Anúncio colocado na EE no passado dia 3 de abril, com a informação de que estavam abertas oito vagas para Trabalhadores Portuários Históricos, do remanescente de 1993, a 1.ª Contratante declara que as condições de trabalho a que fica sujeito quando for integrado como trabalhador do quadro da CC, são as mesmas que beneficiam hoje os trabalhadores Portuários Históricos do remanescente de 1993, já pertencentes desde 2004 aos quadros da …, dentro dos que estão sujeitos ao Acordo de Empresa em vigor na …. 2. Assume-se igualmente a transição da antiguidade que tinha à data na EE, isto é, desde 1 de maio de 1989.» (D) 5. O A. exerce as funções de Operador Portuário Nível III para a R., auferindo a remuneração mensal de € 3 737,70. (E) 6. Em janeiro de 2016, o A. e a R. receberam comunicação da Segurança Social, de que ao A. fora deferida a “pensão de velhice com data de início em 2015-11-12.”. (F) 7. Em 26.02.2016, o A. foi chamado aos Recursos Humanos da R. tendo sido confrontado pelo representante da R. com o facto de se encontrar reformado, pretendendo que assinasse uns papéis. (G) 8. No dia 02.03.2016, o A. apresentou-se ao serviço da R., tendo-lhe sido comunicado que não poderia retomar o mesmo e que teria de abandonar as suas instalações, pois o seu contrato teria caducado, situação que se mantém. (H) 9. Por ofício dirigido à R. por referência a comunicação desta de 16.03.2016, a Segurança Social informou que o A., em 10.11.2015, solicitara pensão de velhice com recurso a antecipação de idade, todavia, por lapso dos serviços, o cálculo fora concluído sem que o beneficiário tivesse sido notificado do valor da pensão para se pronunciar sobre a aceitação ou não da mesma com a indicação da cessação de atividade, tendo o cálculo sido concluído e enviada notificação automática para a entidade patronal, mas tendo o beneficiário enviado uma carta datada de 02.02.2016, a solicitar a desistência do pedido de pensão, a revogação do ato de atribuição da pensão fora superiormente autorizado confirmando que o beneficiário não é pensionista do Centro Nacional de Pensões nem lhe foram processados quaisquer valores a título de pensões. (I) 10. A R. não pagou ao A. a remuneração em 02.03.2016 e meses subsequentes, acrescidas dos subsídios de alimentação. (J) 11. Por despacho datado de 17.02.2016 da Diretora de Núcleo da Segurança Social, foi decidido que para a revogação do ato de atribuição de pensão seria necessária a devolução de todos os valores pagos a título de pensão, devendo suspender-se cautelarmente o pagamento da pensão e apurar-se o débito do valor já pago e os que ainda não tinham sido recebidos, mas já processados, informando-se o A. em conformidade. (L) 12. Por despacho datado de 17.03.2016 da Diretora de Núcleo da Segurança Social foi decidido revogar o ato de atribuição da pensão ao A. por desistência do procedimento, por parte deste e dado já terem sido devolvidas as importâncias pagas a título de pensão. (M) 13. Assim que recebeu a comunicação referida em F), o A. dirigiu-se aos serviços da Segurança Social em …, explicando que não tinha sido notificado para optar ou não pela reforma, não pretendendo esta. (1) 14. O A. foi então esclarecido de que poderia apresentar resposta. (2) 15. Por escrito datado de 29.01.2016, entregue nos Serviços da Segurança Social em 02.02.2016, o A. comunicou a esta “não estar ainda em condições para avançar para a aposentação, mediante os valores do pedido de aposentação que me foram apresentados”. (3) 16. Após aquela deslocação, em reunião, o A. informou o Diretor de Recursos Humanos da R. que não pretendia a reforma e que a R. iria receber comunicação da Segurança Social nesse sentido. (4) 17. O Diretor de Recursos Humanos da R. afirmou que iria analisar o assunto. (5) 18. Em 26.02.2016, o A. explicou ao representante da R. não estar reformado, existindo um erro da Segurança Social que seria comunicado por esta à R. (7) 19. Como tal, o A. informou pretender continuar ao serviço da R. (8) 20. Em 01.03.2016, o A. dirigiu-se aos serviços da Segurança Social em Lisboa, tendo-lhe sido confirmado o lapso. 21. O A. foi informado que a Segurança Social iria avisar a R. de que não estava reformado. (10) 22. Não são conhecidos problemas ao A. no seu percurso laboral. (12) 23. O A. é considerado bom trabalhador. (13) 24. Devido ao facto de a R. não permitir o seu reinício de funções, o A. tem dificuldade em dormir. (14) 25. Sofre de angústias permanente, ficando bastante nervoso. (15) 26. Até 22.09.2016, o autor não teve tem qualquer possibilidade de auferir outra remuneração, tendo a partir de então passado a auferir subsídio de desemprego. (16) 27. O autor tem uma pessoa a seu cargo. (17) 28. O A. tem tido necessidade de pedir ajuda a familiares e amigos para acudir às suas responsabilidades e necessidades. (18) 29. O que lhe provoca nervosismo, ansiedade e cansaço. (19) 30. A R. recebeu a comunicação referida em F) em 27.01.2016. (20) 31. No dia 26.02.2016, o A. recusou receber do representante da R. a carta comunicando-lhe a caducidade do contrato de trabalho com efeitos imediatos, para além do mais, por não estar satisfeito com o valor da pensão de reforma e não pretender a cessação do contrato. (21) 32. Pelo representante da R. foi referido que a questão do valor da pensão não respeitava à R., atuando esta em conformidade com o comunicado pela Segurança Social. (22) 33. Face à recusa do A., o representante da R. comunicou-lhe que o seu contrato cessara por caducidade nesse dia. (23) 34. Em 09.03.2016, a R. recebeu o ofício UPPIV-223 da Segurança Social comunicando que por lapso fora enviado um ofício para seus Serviços, a indicar o início da situação de pensionista do A. solicitando que R. considerasse sem efeito o conteúdo de tal comunicação, uma vez que o A. enviara uma carta datada de 02.02.2016, a desistir da pensão. (24) 35. A R. recebeu o ofício referido em I), em 06.04.2016. (25) 36. Em 01.06.2016, a R. recebeu o ofício UPPIV/NPIIV da Segurança Social com o teor de fls. 41 v.º a fls. 45. (26) «Assunto: Esclarecimento acerca de pedido de desistência de pensão Na sequência da carta em referência dirigida por V. Exa.s ao ISS, I.P. – Centro Nacional de Pensões, informamos que a atribuição das pensões requeridas pelos beneficiários e que apresentam carreira contributiva na segurança social, exige a decisão expressa da instituição gestora, ou seja o ISS, I.P. – Centro Nacional de Pensões (CNP), conforme disposto no artigo 87.º do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de maio. Nessa sequência, terá de notificar o beneficiário relativamente à atribuição da pensão e data a que o início se reporta, nos termos do artigo 88.º do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de maio. Dispõe o artigo 89.º do Diploma supra referido que, se na instrução do processo se verificar que não se encontram reunidas as condições de atribuição da pensão, deverá o CNP comunicar o facto ao beneficiário, através da audiência de interessados. Atentos ao n.º 3 do artigo 62.º do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de maio, o beneficiário com reforma antecipada do regime de flexibilização não pode acumular a sua pensão com rendimentos de trabalho, a qualquer título, na mesma empresa de onde se reformou ou noutra empresa do mesmo grupo empresarial. Se acumular a pensão antecipada do regime de flexibilização com trabalho ou prestação de serviços na mesma empresa (ou noutra empresa do mesmo grupo), perde o direito à pensão enquanto durar a acumulação. Por esse motivo, o pagamento da pensão apenas pode ser efetuado após o beneficiário informar a data em que cessou ou vai cessar atividade. Assim, no prazo de 10 dias úteis após ser notificado do valor da pensão, terá de comunicar ao CNP a data em que cessou ou vai cessar a atividade, a fim de se iniciar o pagamento da mesma a partir dessa mesma data. A ausência de resposta no prazo indicado determina o indeferimento da pensão. Como informamos nos nossos anteriores ofícios, por lapso, não se aguardou a resposta do beneficiário BB e incluiu-se o pagamento da pensão, sendo os ofícios de cálculo e a informação à entidade empregadora emitidos automaticamente. Detetado o erro, remeteram-se ofícios retificativos, quer ao beneficiário quer à entidade empregadora. Deste modo e não estando de acordo com o valor de pensão atribuído, em 2016/02/10 o beneficiário vem informar, por escrito, que desiste do pedido de atribuição da pensão. Atendendo a que o ato administrativo ainda não se havia tornado definitivo, dado os beneficiários poderem apresentar recurso contencioso nos 90 dias seguintes ao ato praticado, dispondo desse mesmo tempo para apresentar pedido de desistência desse mesmo ato e, atentos ao disposto no n.º 1 do artigo 131.º e o n.º 1 do artigo 147.º do CPA, considerou-se que o pedido de desistência apresentado foi solicitado dentro do prazo legal previsto para o efeito, pelo que se procedeu à suspensão cautelar do pagamento da pensão e solicitou-se os valores pagos a título de pensões. Tendo os mesmos sido devolvidos na totalidade do montante pago, revogou-se o ato de atribuição da pensão, nos termos do n.º 1 do artigo 147.º e do n.º 1 do artigo 165.º do CPA e notificou-se o beneficiário em conformidade. Por carta remetida por essa firma ao CNP em 16-03-2016 e recebida em 23-03-2016, foram prestados os esclarecimentos tidos por convenientes e informou-se que o beneficiário supra referido não é pensionista nem recebeu qualquer valor de pensão, uma vez que desistiu do requerimento apresentado e devolveu todas as verbas recebidas a título de pensão. Aproveitamos para referir que os atos administrativos praticados, quer pelo beneficiário quer pelo CNP estão previstos na lei em vigor, competindo ao CNP a análise e aceitação, ou não, dos requerimentos apresentados pelos beneficiários no que se refere à solicitação de prestações pecuniárias de invalidez, velhice e sobrevivência, ao abrigo da lei em vigor na data em que os mesmos são apresentados. Para concluir e porque na informação pretendida não se encontram elementos do beneficiário abrangidos pela reserva do direito ao sigilo, de acordo com o estipulado no artigo 75.º da Lei n.º 4/2007, de 16 de janeiro, remete-se, em anexo cópia dos documentos que originaram o despacho de atribuição da pensão e a revogação do ato, por desistência do pedido. No que se refere ao vínculo laboral existente ente o Sr. BB e a CC, LDA. é da responsabilidade dos mesmos, sendo uma situação totalmente aleia ao CNP.» Em ANEXO «INFORMAÇÃO O beneficiário BB, apresentou em 2015/11/10, um pedido de pensão por velhice antecipada ao abrigo do Decreto-Lei n.º 8/2015, de 14 de janeiro. A pensão foi atribuída por despacho de 2016/01/12, sendo, na mesma data, notificado do respetivo cálculo. Por lapso, o cálculo foi incluído para pagamento sem se questionar o beneficiário relativamente à data em que cessaria a atividade, uma vez que, nos 3 anos seguintes à data de atribuição da pensão não pode acumular o recebimento de pensão antecipada com rendimentos do trabalho provenientes da mesma firma ou grupo empresarial. Por carta entrada nos nossos serviços, em 2016/02/10, vem informar que desiste do pedido de atribuição da pensão. Atendendo a que o ato administrativo ainda não se tornou definitivo, dado os beneficiários poderem apresentar recurso contencioso nos 90 dias seguintes ao ato praticado, dispondo desse mesmo tempo para apresentar pedido de desistência desse mesmo ato e, atentos ao disposto no n.º 1 do artigo 131.º e o n.º 1 do artigo 147.º do CPA, considera-se que o pedido de desistência apresentado foi solicitado dentro do prazo legal previsto para o efeito, pelo que me parece ser de suspender cautelarmente o pagamento da pensão e solicitar ao beneficiário os valores pagos a título de pensões, bem como as que já se encontram processadas até 31/03/2016. À consideração superior,» ANEXO «DESPACHO Tomei conhecimento. Para que se possa revogar o ato de atribuição de pensão é necessário que sejam devolvidos todos os valores pagos a título de pensão. Assim, deverá: 1.Suspender-se cautelarmente o pagamento da pensão para o processamento em curso e apurar o débito referente aos valores já pagos a título de pensão e os que ainda não foram recebidos mas já se encontram processados; 2. Informar-se o beneficiário em conformidade. 17-02-2016 A Diretora de Núcleo» ANEXO O beneficiário BB, apresentou em 2015/11/10, um pedido de pensão por velhice antecipada ao abrigo do Decreto-Lei n.º 8/20015, de 14 de janeiro. A pensão foi atribuída por despacho de 2016/01/12, sendo, na mesma data, notificado do respetivo cálculo. Por carta entrada nos nossos serviços, em 2016/02/10, vem informar que desiste do pedido de atribuição da pensão. Atendendo a que o ato administrativo ainda não se tornou definitivo, dado os beneficiários poderem apresentar recurso contencioso nos 90 dias seguintes ao ato praticado, dispondo desse mesmo tempo para apresentar pedido de desistência desse mesmo ato e, atentos ao disposto no n.º 1 do artigo 131.º e o n.º 1 do artigo 147.º do CPA, o pedido de desistência apresentado foi aceite, por se ter considerado que foi solicitado dentro do prazo legal previsto para o efeito. Assim, foi o pagamento da pensão suspenso cautelarmente e solicitou-se ao beneficiário os valores pagos a título de pensões, bem como as que já se encontram processadas até 31/03/2016. Dado já constar registada a devolução da totalidade do montante pago, propõe-se a revogação do ato de atribuição da pensão, nos termos do n.º 1 do artigo 147.º e do n.º 1 do artigo 165.º do CPA e que o beneficiário seja notificado em conformidade. À consideração superior,» ANEXO «DESPACHO Visto. Revogo o ato de atribuição de pensão, por desistência do procedimento, por parte do beneficiário e dado já terem sido devolvidas as importâncias pagas a título de pensão. Notifique-se. 17.03.2016 A Diretora de Núcleo» 37. A R. remeteu à Segurança Social carta registada com aviso de receção, datada de 16.03.2016, com o teor de fls. 46 e v.º. «Por ofício com a referência 500.017, de 12 de janeiro de 2016, comunicaram esses serviços à CC, Lda (…), a passagem à situação de pensionista, por deferimento da pensão de velhice com efeitos a 12 de novembro de 2015, do trabalhador BB. Posteriormente, através do ofício com a referência UPPIV-223, de 3 de março de 2016, solicitam V. Exas que seja considerado sem efeito o conteúdo do primeiro ofício (referência 500.017), referindo que o envio do mesmo se deveu a lapso desses serviços uma vez que o trabalhador teria posteriormente, já em fevereiro de 2016 “desistido” da apensão. Em primeiro lugar, refira-se que não se vislumbra, nem tal é especificado no vosso ofício, em que se traduz o alegado lapso em que teriam incorrido esses serviços, sendo certo que quando remeteram a esta empresa e esta recebeu o ofício que comunica o deferimento da pensão de velhice, o trabalhador em questão não tinha apresentado a alegada desistência. Por outro lado, em qualquer caso, cumpre-nos informar que no seguimento da comunicação desses serviços de que tinha sido deferida a pensão por velhice, no dia 26 de fevereiro de 2016 a empresa comunicou ao trabalhador em questão a caducidade do seu contrato de trabalho, com efeitos nessa mesma data, ao abrigo do disposto na alínea c) do art.º 343.º e n.º 1 do art.º 348.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro. Assim, independentemente de qualquer lapso a que, naturalmente, a empresa é alheia, verifica-se que desde 26 de fevereiro de 2016, data em que foi comunicada ao trabalhador a caducidade do seu contrato de trabalho com efeitos imediatos, inexiste qualquer vínculo laboral ou de qualquer outra natureza entre a “CC” e o Senhor BB.» (27) 38. A R. remeteu à Segurança Social carta registada com aviso de receção, datada de 09.05.2016 com o teor de fls. 47 a 49. (28) «Reportamo-nos ao vosso ofício UPPIV – 223, com data de saída de 01 de abril e por nós rececionado no passado dia 8 de abril de 2016, com o assunto “desistência pedido de pensão” do beneficiário BB. No que concerne ao seu teor, que nos mereceu a nossa melhor atenção e, diga-se, não menos estranheza, impõe-se referir o seguinte: Começam V. Exas. Por afirmar que por lapso desses serviços, o cálculo da pensão foi concluído sem que o beneficiário fosse notificado do valor da pensão para se pronunciar sobre a aceitação ou não da mesma, com a indicação da data da cessação da atividade, conforme determina o n.º 3 do art.º 62.º do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de maio. Ora, importa primeiramente salientar que o referido n.º 3 do art.º 62.º do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de maio, não estabelece qualquer obrigação de informação prévia do beneficiário nem faz depender o deferimento da pensão da manifestação de vontade do beneficiário nesse sentido. Com efeito, o referido preceito versa sobre a “acumulação da pensão de velhice com rendimentos de trabalho ou atividade”, sendo que o seu n.º 3 determina a proibição de acumulação de pensão antecipada de velhice, atribuída no âmbito da flexibilização, com rendimentos provenientes de exercício de trabalho ou atividade, a qualquer título, na mesma empresa ou grupo empresarial, situação que nada tem a ver com o caso em apreço. Por outro lado, no caso em apreço inexistia qualquer obrigação legal ou regulamentar de prévia informação ao beneficiário do valor da pensão ou, tão pouco, a necessidade de subsequente manifestação expressa de vontade do beneficiário em aceitar o valor e manter a decisão de aceder á pensão para que a decisão do seu deferimento fosse válida e eficaz. Com efeito, tal obrigação legal de prévia informação e a necessidade da subsequente manifestação expressa da vontade do beneficiário apenas passou a existir por força do disposto no art.º 2.º do Decreto-lei n.º 10/2016, de 8 de março, que entrou em vigor no dia 9 de março de 2016, ou seja, em data muito posterior à decisão de deferimento da pensão do beneficiário BB por esses serviços. Assim, à data em que esses serviços decidiram o deferimento da pensão e a passagem à situação de pensionista por velhice do beneficiário em questão (ofício de 12 de janeiro de 2016), ou até mesmo na data em que a empresa fez caducar o contrato de trabalho do mesmo, inexistia qualquer obrigação legal, ou regulamentar, por parte desses serviços de informarem previamente o beneficiário do valor da pensão ou, sequer o deferimento da pensão estava dependente de manifestação expressa de vontade do beneficiário no sentido de aceitar esse valor. Em conclusão, contrariamente ao que referem no vosso ofício, inexistiu qualquer lapso por parte desses serviços e, muito menos, a violação de qualquer dever ou obrigação legal ou regulamentar a que estivessem vinculados. Nesse sentido, para além de inexistir qualquer fundamento legal para a desistência do pedido por parte do beneficiário (sendo certo que o pedido já tinha sido objeto de decisão de deferimento quando o beneficiário terá pretendido dar o mesmo sem efeito) também sempre careceria de fundamento legal qualquer decisão desses serviços que desse sem efeito a decisão de deferimento da pensão e consequente passagem à situação de pensionista por velhice daquele. Por outro lado, referem no vosso ofício supra identificado que a desistência do pedido de pensão teria sido efetuada pelo beneficiário, em 2 de fevereiro de 2016, ao abrigo do disposto no art.º 147.º, do Código do Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro, e que a revogação do ato de atribuição da pensão teria sido superiormente autorizada ao abrigo do art.º 165.º do mesmo diploma. A este propósito refira-se, primeiramente, que o art.º 147.º do Código de Procedimento Administrativo versa sobre a impugnação de regulamentos administrativos, mais precisamente reclamações e recursos administrativos, o que, como é evidente, não tem qualquer aplicação no caso em apreço nem se vislumbra em que medida poderia fundamentar a desistência do pedido de pensão por parte do beneficiário ou que o ato de deferimento fosse dado sem efeito. Acresce que é no mínimo de estranhar que no ofício a que ora se responde se faça referência ao uma pretensa “revogação” do ato de atribuição da pensão. Com efeito, de acordo com o disposto no art.º 165.º do Código de Procedimento Administrativo, a revogação é o ato administrativo que determina a cessação dos efeitos de outro ato por razões de mérito, conveniência ou oportunidade, sendo a anulação administrativa o ato administrativo que determina a destruição dos efeitos de outro ato administrativo com fundamento em invalidade. Ora, ainda que sem conceder, fazendo fé na “explicação” dada no ofício desses serviços para fundamentar a alegada “revogação” – pretensa violação de uma obrigação legal por esses serviços – o que se imporia sempre seria a anulação do ato e não a sua revogação pois estaria em causa a violação pela administração de uma norma legal (que segundo o vosso ofício, imporia a prévia informação do beneficiário do valor da pensão para se pronunciar sobre a aceitação ou não do mesmo). Por outro lado, é igualmente no mínimo estranho, continuando ainda a fazer fé no afirmado no referido ofício – que a Administração pudesse praticar um ato desta natureza – revogatório ou anulatório de um outro ato por si praticado – sem que retire de forma expressa e objetiva as necessárias consequências dessa circunstância, limitando-se a “confirmar” e informar a empresa “que o beneficiário não é pensionista do Centro Nacional de Pensões” nem lhe foram processados quaisquer valores a título de pensões. Em face do exposto, cumpre-nos concluir que inexistiu qualquer lapso (ao qual a empresa sempre seria alheia) ou, tão pouco, violação de qualquer disposição legal ou regulamentar por parte desse serviços que possa fundamentar ou legitimar qualquer decisão que pretendesse dar sem efeito o ato de deferimento da pensão do beneficiário BB, sendo certo, em qualquer caso, que a “CC” não foi até à presente data notificada pela Segurança Social de qualquer decisão ou despacho, devidamente fundamentada, nesse sentido, o que sempre se impunha e desde já expressamente se requer. Por outro lado, tendo esta empresa sido informada em 27 de janeiro de 2016, na qualidade de entidade empregadora, da passagem à situação de pensionista por velhice do beneficiário BB, no uso de faculdade que legalmente lhe é atribuída, nos termos da alínea c) do art.º 343.º e no n.º 1 do art.º 348.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º7/2009, de 12 de fevereiro, comunicou ao trabalhador a caducidade do seu contrato, a qual produziu efeitos no dia 26 de fevereiro de 2016. Neste sentido, cumpre-nos reafirmar que desde 28 de janeiro de 2016, data em que lhe foi comunicada a caducidade do contrato de trabalho com efeitos imediatos, inexiste qualquer vínculo laboral ou de qualquer outra natureza entre a “CC” e o Senhor BB. Por fim, requeremos que procedam com a máxima brevidade, à notificação à empresa da decisão ou despacho que referem ter sido proferido, devidamente fundamentado, para que a empresa possa analisar e querendo, desencadear os mecanismos que tiver por convenientes.» 39. O A. remeteu à R. cartas datadas de 07.04.2016 e 11.05.2016, com o teor de fls. 52 e 53 respetivamente. «…, 7 de abril de 2016 (…) venho por este meio solicitar esclarecimento acerca da minha situação atual e futura. Desde a data de 26 de fevereiro de 2016, não me encontro em situação de desemprego, aposentado ou ativo. No caso de cessação do contrato teria, eu, como trabalhador, de receber informação e documentação de V parte, para o efeito e, de acordo com a lei. De acordo com informação proferida no ofício n.º 223, de dia 16/03/2016, enviado pela UPPIV Segurança Social, a decisão de Revogação do pedido de Aposentadoria, sendo detetado um erro sem responsabilidade do trabalhador requerente, e tendo esse mesmo ofício sido enviado à empresa, agradeço que seja reposta a situação, pois os prejuízos causados têm sido elevados. (…)» «…, 11 de maio de 2016 (…) Na Sequência da v/ comunicação verbal de que o meu contrato havia terminado e que teria de me retirar das instalações da empresa, o que sucedeu no passado dia 2/3/2016 e de não ter sido dada resposta à m/carta datada de 7/4/2016, considero ter sido alvo de um despedimento ilícito e sem qualquer fundamento. Como é do v/conhecimento, toda esta situação se deveu a um erro da Segurança Social, o que vos foi pela mesma oportunamente comunicado, persistindo V. Exas. Numa situação deveras lamentável, não reconhecendo esse erro. Assim, tendo sido despedido ilicitamente, sem qualquer justa causa, e não tendo V. exas., revertido a v/posição, não obstante o contacto que para o efeito o ACT estabeleceu com V. Exas., venho solicitar que no prazo de cinco dias, me seja enviado para a m/morada o respetivo certificado (…) para fins de concessão de subsídio de desemprego. (…)». (29) 40. A R. remeteu ao A. carta registada com aviso de receção, datada de 12.05.2016 com o teor de fls. 49 v.º a 51 v.º. «Assunto: Reforma por Velhice Ex.mo Senhor: Reportamo-nos às suas cartas datadas de 7 de abril e de 11 de maio de 2016, sobre o assunto em referência. Sem prejuízo das considerações que é livre de ter e ou fazer, V. Exa. continua a incorrer, propositadamente ou não, num conjunto de equívocos que importará esclarecer. No que respeita à cessação do seu contrato de trabalho, como é do seu cabal conhecimento, por ofício da segurança social de 12 de janeiro de 2016, recebido pela empresa em 27 de janeiro de 2016, foi a “CC, Lda.” informada da passagem de V. Exa. à situação de pensionista, por deferimento da pensão de velhice, com efeitos a 12 de novembro de 2015. Tendo presente o referido ofício, no dia 26 de fevereiro de 2016, e não o dia 2 de março de 2016 como falsamente refere na sua última carta, a empresa comunicou a V. Exa. a caducidade do seu contrato de trabalho, com efeitos imediatos nessa mesma data, ao abrigo do disposto na alínea c) do art.º 343.º e no n.º 1 do art.º 348.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro. Saliente-se, a este propósito, que a circunstância de a comunicação ter sido efetuada verbalmente ficou a dever-se única e exclusivamente a V. Exa. na medida em que se recusou a receber em mão a carta a comunicar-lhe a caducidade do contrato, situação que, aliás, foi presenciada por testemunhas e que obrigou a que tal comunicação fosse efetuada verbalmente. Assim, como bem sabe, é falso que a cessação do seu contrato de trabalho, lhe tenha sido comunicada no dia 2 de março de 2016, tendo-o sido no dia 26 de fevereiro, com efeitos imediatos nessa mesma data. Por outro lado, como lhe foi expressamente comunicado e explicado nessa data – apenas não o tendo sido por escrito por única e exclusiva responsabilidade de V. Exa.- o seu contrato de trabalho cessou por caducidade, nos termos legalmente previstos, inexistindo, portanto, qualquer despedimento e, muito menos, ilícito. No que respeita ao alegado pretenso “erro” dos serviços da segurança social, sendo certo que a “CC” não foi notificada de qualquer decisão ou despacho devidamente fundamentado nesse sentido, o que sempre se imporia, e sem prejuízo de a existir qualquer lapso a empresa ser absolutamente alheia ao mesmo, sempre se dirá o seguinte: À data em que os serviços da segurança social decidiram o deferimento da pensão e a passagem à situação de pensionista por velhice de V. Exa. (ofício de 12 de janeiro de 2016) e em que esse ofício foi recebido na empresa (27 de janeiro de 2016), ou até mesmo na data em que a empresa fez caducar o seu contrato de trabalho (26 de fevereiro de 2016), inexistia qualquer obrigação legal ou regulamentar por parte dos serviços da segurança social de informar previamente o valoro da pensão ou, sequer, a decisão de deferimento da pensão estava dependente de manifestação expressa de vontade do beneficiário no sentido de aceitar esse valor. Sendo certo que não se vislumbra qualquer “erro” por parte dos serviços da segurança social, certo é também que tais serviços não violaram no caso em apreço qualquer dever ou obrigação legal ou regulamentar a que estivessem vinculados, razão pela qual sempre inexistiria qualquer fundamento legal para a desistência do pedido por parte de V. Exa. (ainda para mais já após o seu deferimento) e ou para uma qualquer decisão dos serviços da segurança social de dar sem efeito a decisão de deferimento da pensão e a sua consequente passagem à situação de pensionista por velhice. Neste sentido, a existir atuação a lamentar neste processo, essa não será certamente da parte desta empresa. É portanto, absolutamente descabida e infundada a referência que faz a um alegado despedimento sem justa causa, não podendo igualmente deixar de se manifestar enorme estranheza à referência efetuada à Autoridade para as Condições do Trabalho, na medida em que tal entidade, tanto quanto julgamos saber, não tem qualquer intervenção na questão em apreço. Em conclusão, tendo a “CC” sido notificada por ofício da segurança social, em 27 de janeiro de 2016, na qualidade de entidade empregadora, da passagem de V. Exa. à situação de pensionista por velhice, no uso da faculdade que legalmente lhe é atribuída, nos termos do disposto na alínea c) do art.º 343.º e no n.º 1 do art.º 348.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, no dia 26 de fevereiro de 2016 comunicou-lhe a caducidade do seu contrato de trabalho, a qual produziu efeitos nessa mesma data, a partir da qual deixou de existir qualquer vínculo laboral ou de qualquer natureza entre a empresa e V. Exa. Relativamente à documentação solicitada, remetemos em anexo o certificado de trabalho, como como o modelo RP 5044 da Segurança Social com a indicação da causa de cessação do contrato de trabalho – caducidade do contrato por reforma por velhice do trabalhador.» (30) B) APRECIAÇÃO As questões a decidir neste recurso são as que já elencamos: 1.ª – A nulidade da sentença por contradição entre os fundamentos e a decisão. 2.ª – Erro de julgamento na aplicação do direito aos factos provados. B1) A nulidade da sentença Conclui a apelante que a sentença é nula por contradição entre os fundamentos e a decisão. Consta na sentença recorrida, na parte relativa à aplicação do direito aos factos provados, o seguinte: “Neste enquadramento, não restam dúvidas de que pela R. foi validamente comunicada ao A. a caducidade do seu contrato de trabalho, pois o facto de formalmente o A. ter recusado assinar a comunicação escrita, não invalida tal ato, o qual chegou ao conhecimento do mesmo”. Esta afirmação é dúbia e pode ser interpretada no sentido de que a declaração de caducidade do contrato de trabalho é válida, o que está em contradição com a declaração de ilicitude da mesma, a final. Parece-nos, todavia, que, lendo a sentença na sua globalidade, esse não seria o verdadeiro sentido. Poder-se-ia extrair é que a comunicação foi válida no sentido de que tinha que ser efetuada por escrito, mas que esta formalidade não foi observada por motivo imputável em exclusivo ao trabalhador por se ter recusado a recebê-la. Ou seja, o que está em causa parece ser a validade da forma e não o conteúdo; a forma empregue para a comunicação e não a validade da comunicação de caducidade do contrato de trabalho. Como quer que seja, a afirmação proferida na sentença que reproduzimos é suscetível de causar dúvidas, não removidas pelo tribunal recorrido quando admitiu o recurso e apreciou a arguição da nulidade, altura em que poderia esclarecer o sentido da afirmação, pelo que consideramos a sentença nula por contradição entre um dos fundamentos utilizados e a decisão final. As demais nulidades invocadas pela apelante não se consubstanciam em verdadeiras nulidades, mas em discordâncias sobre a decisão sobre a questão central, qual seja, a de apurar se em face do nosso ordenamento jurídico o contrato de trabalho do autor caducou validamente e não pode, por isso, concluir-se que se verificou um despedimento verbal ilícito. É a questão que iremos apreciar de seguida. B2) Erro de julgamento na aplicação do direito aos factos provados e constitucionalidade O art.º 343.º, alínea c), do CT, prescreve que o contrato de trabalho caduca nos termos gerais, com a reforma do trabalhador por velhice ou invalidez. Além do mais, com interesse para esta questão está provado que: “- Em janeiro de 2016, o A. e a R. receberam comunicação da Segurança Social, de que ao A. fora deferida a pensão de velhice com data de início em 2015-11-12. Esta comunicação foi recebida pela empregadora ré em 27.01.2016; - Assim que recebeu a comunicação referida, o A. dirigiu-se aos serviços da Segurança Social em…, explicando que não tinha sido notificado para optar ou não pela reforma, não pretendendo esta; - O A. foi então esclarecido de que poderia apresentar resposta; - Por escrito datado de 29.01.2016, entregue nos Serviços da Segurança Social em 02.02.2016, o A. comunicou a esta “não estar ainda em condições para avançar para a aposentação, mediante os valores do pedido de aposentação que me foram apresentados”; - Após aquela deslocação, em reunião, o A. informou o Diretor de Recursos Humanos da R. que não pretendia a reforma e que a R. iria receber comunicação da Segurança Social nesse sentido; - O Diretor de Recursos Humanos da R. afirmou que iria analisar o assunto; - Em 26.02.2016, o A. foi chamado aos Recursos Humanos da R. tendo sido confrontado pelo representante da R. com o facto de se encontrar reformado, pretendendo que assinasse uns papéis; - Em 26.02.2016, o A. explicou ao representante da R. não estar reformado, existindo um erro da Segurança Social que seria comunicado por esta à R.; - Como tal, o A. informou pretender continuar ao serviço da R.; - Em 01.03.2016, o A. dirigiu-se aos serviços da Segurança Social em Lisboa, tendo-lhe sido confirmado o lapso; - O A. foi informado que a Segurança Social iria avisar a R. de que não estava reformado; - No dia 02.03.2016, o A. apresentou-se ao serviço da R., tendo-lhe sido comunicado que não poderia retomar o mesmo e que teria de abandonar as suas instalações, pois o seu contrato teria caducado, situação que se mantém; e - Por ofício dirigido à R. por referência a comunicação desta de 16.03.2016, a Segurança Social informou que o A., em 10.11.2015, solicitara pensão de velhice com recurso a antecipação de idade, todavia, por lapso dos serviços, o cálculo fora concluído sem que o beneficiário tivesse sido notificado do valor da pensão para se pronunciar sobre a aceitação ou não da mesma com a indicação da cessação de atividade, tendo o cálculo sido concluído e enviada notificação automática para a entidade patronal, mas tendo o beneficiário enviado uma carta datada de 02.02.2016, a solicitar a desistência do pedido de pensão, a revogação do ato de atribuição da pensão fora superiormente autorizado confirmando que o beneficiário não é pensionista do Centro Nacional de Pensões nem lhe foram processados quaisquer valores a título de pensões”. Esta factualidade mostra de forma clara que o trabalhador requereu a antecipação da reforma nos termos legais, a qual foi deferida e comunicada ao trabalhador e à empregadora, mas aquele não concordou em virtude de não ter sido informado previamente do valor da pensão e este não lhe convir. O contexto em que ocorreu o pedido de reforma antecipada, a sua revogação e a caducidade do contrato de trabalho, exigem uma análise ponderada do caso à luz das regras de direito e dos princípios jurídicos que enformam o nosso ordenamento jurídico, nomeadamente o do Estado de Direito Democrático, plasmado expressamente no art.º 2.º da Constituição da República Portuguesa. O trabalhador ao aperceber-se do valor da pensão que lhe seria atribuída comunicou de imediato, verbalmente e por escrito, à segurança social que não pretendia a reforma e comunicou também de imediato à empregadora que não pretendia a reforma e que a segurança social lhe iria comunicar que não estava reformado, tendo a empregadora dito ao trabalhador que iria analisar o assunto. A segurança social, efetivamente, decidiu revogar a decisão de atribuir a pensão de velhice com recurso a antecipação de idade e comunicou tal facto à empregadora através de ofício datado de 16.03.2016. O conhecimento do valor da pensão de velhice com recurso a antecipação de idade é essencial para que o trabalhador possa tomar uma decisão informada e ponderada sobre esta forma de saída voluntária do mercado do trabalho, dadas as consequências gravosas e definitivas que acarreta. Mesmo que a lei na altura do pedido não exigisse expressamente que a segurança social informasse o trabalhador sobre qual seria o valor da pensão, decorre do princípio da boa-fé previsto no n.º 2 do art.º 266.º com referência ao princípio do estado de direito democrático ínsito no art.º 2.º, ambos da Constituição da República Portuguesa, que a verdade, a informação e a transparência imanente a toda a atuação da administração pública impõem que esta ao proferir decisões que afetem de forma significativa a vida dos cidadãos esteja obrigada a informá-los previamente, esclarecê-los e a dar-lhes a oportunidade de se pronunciarem antes de as tomar, evitando decisões surpresa. Este aspeto da questão é muito importante para apreciar a bondade da desistência do trabalhador em relação ao pedido de reforma antecipada por causa do valor da pensão que lhe foi proposta. Face aos factos provados, a desistência do pedido de reforma não é leviano ou infundado, mas tem uma razão de ser substancial, objetivamente considerada. O trabalhador comunicou de imediato à segurança social e à empregadora a sua decisão de desistir da reforma em face do valor da pensão proposta, e esta última ficou de analisar a situação. Contudo, a empregadora decidiu de forma inesperada fazer caducar o contrato de trabalho, apesar de estar informada do que se passava e da oposição do trabalhador e sem que se tivesse informado previamente junto da segurança social se a decisão sobre a reforma era definitiva. A extinção do contrato de trabalho por caducidade prevista no art.º 343.º, alínea c), do CT, pressupõe que a decisão de reforma é definitiva. O trabalhador, através do requerimento que apresentou na segurança social, impediu que a decisão fosse já definitiva no momento em que a empregadora fez cessar o contrato de trabalho. A empregadora, antes de fazer cessar o contrato de trabalho com fundamento na sua caducidade por reforma do trabalhador, perante as dúvidas suscitadas e de que tinha conhecimento, deveria ter aguardado pela consolidação jurídica definitiva da decisão de reforma. A comunicação ao trabalhador da caducidade do contrato de trabalho constitui uma decisão sujeita à condição resolutiva consistente na eventual alteração da decisão anteriormente tomada pela segurança social. Desta forma, a empregadora colocou-se voluntariamente na situação de ter de arcar com as consequências jurídicas decorrentes da decisão da segurança social que revogou a anterior decisão de reforma do autor. Tudo se passa como se nunca tivesse sido deferida a reforma do trabalhador, em face do despacho que alterou e revogou a decisão anterior de forma fundamentada. Em 26 de fevereiro de 2016, data da invocação da caducidade pela empregadora, não estava ainda definitivamente decidido que o trabalhador estava reformado. A existência desta decisão definitiva é condição essencial de que depende a eficácia jurídica deste facto extintivo do contrato de trabalho. Assim, a empregadora não deveria ter comunicado ao trabalhador a caducidade do contrato de trabalho para produzir efeitos em 26.02.2016 ou, tendo-o feito, quando foi notificada pela segurança social de que afinal o trabalhador não estava reformado, deveria ter dado também sem efeito a referida declaração de caducidade de modo a que o contrato de trabalho continuasse a vigorar, conforme era vontade manifesta do trabalhador. Ao não proceder deste modo, a declaração de caducidade da empregadora é inválida e consubstancia um despedimento ilícito do trabalhador. Analisemos, agora, a questão de outro ângulo. O art.º 334.º do Código Civil prescreve que é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito. Ambas as partes apresentaram a sua posição sobre a aplicação do instituto do abuso do direito, que registamos, dada a sua qualidade jurídica, embora com conclusões opostas. A invocação da caducidade efetuada pela ré, no circunstancialismo que referimos, constitui um verdadeiro abuso de direito, na medida em que excede manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes e pelo fim social e económico do direito. A invocação da caducidade do contrato de trabalho com fundamento na reforma antecipada do trabalhador, quando a empregadora sabia que o trabalhador tinha desistido de tal pedido por motivos legítimos ligados ao valor da pensão proposta e que o pedido de reforma poderia ser, como foi, revogado pela segurança social e ficar sem efeito, sem aguardar pela confirmação da situação de reforma, a qual ainda não se tinha convertido em definitiva em face da posição assumida de forma transparente e de boa-fé pelo trabalhador, constitui uma forma ostensiva, grosseira, que choca fortemente a consciência jurídica geral da comunidade sobre o exercício do direito – dever ser que é - de utilizar o direito em proveito próprio com base numa situação jurídica não consolidada e, por isso, incerta, onde avulta a posição vulnerável do trabalhador, quer em face da segurança social quer em face da empregadora. A ré empregadora usa o direito de invocar a caducidade do contrato de trabalho de forma que choca a realização do Direito e a concretização da justiça, ao aproveitar-se da situação de incerteza referida. Trata-se de um comportamento antijurídico da empregadora pelo uso anormal do direito de invocar a caducidade do contrato de trabalho nas circunstâncias conhecidas por si e onde é patente a boa-fé do trabalhador, que merece e deve ser protegida. Concluímos, assim, que a ré empregadora incorre em abuso de direito nos termos do art.º 334.º do CC. As inconstitucionalidades invocadas pela ré não se verificam. Não estão minimamente em causa os princípios da liberdade de gestão empresarial e da autonomia da estratégia empresarial, consagrados nos arts.º 61.º n.º 1 e 86.º n.º 2 da CRP, invocados pela empregadora. Empresas, pessoas coletivas ou cidadãos, estão todos sujeitos aos deveres e direitos consagrados na Constituição e nas leis da República. Todas as pessoas, físicas ou morais, têm direitos e deveres. No caso concreto, como decorre do que já referimos, a empregadora tem total liberdade de tomar as decisões que entender, fincando sujeita, como todos, às consequências dos seus atos por ação ou omissão. A liberdade da ré não está em causa e não se mostram violados quaisquer preceitos constitucionais, nomeadamente os invocados pela apelante. Nesta conformidade, a apelação procede parcialmente quanto à nulidade decorrente da contradição entre a fundamentação e a decisão, nos termos decididos em B1) e improcede quanto ao mais. Sumário: i) a extinção do contrato de trabalho por caducidade decorrente de reforma do trabalhador, só é definitiva se for também definitiva a decisão que a proferir. ii) sendo declarada antes de ser definitiva, a parte que a invocar fica sujeita às consequências decorrentes da decisão que eventualmente alterar a decisão anterior de reforma. iii) A invocação da caducidade do contrato de trabalho com fundamento na reforma antecipada do trabalhador, quando a empregadora sabia que o trabalhador tinha desistido de tal pedido por motivos legítimos ligados ao valor da pensão proposta e que o pedido de reforma poderia ser, como foi, revogado pela segurança social e ficar sem efeito, sem aguardar pela confirmação da situação de reforma, a qual ainda não se tinha convertido em definitiva em face da posição assumida de forma transparente e de boa-fé pelo trabalhador, constitui uma forma ostensiva, grosseira, que choca fortemente a consciência jurídica geral sobre o exercício do direito de utilizar o direito em proveito próprio com base numa situação jurídica não consolidada e, por isso, incerta, onde avulta a posição vulnerável do trabalhador, quer em face da segurança social quer em face da empregadora. III - DECISÃO Pelo exposto, acordam os Juízes desta secção social do Tribunal da Relação de Évora em julgar a apelação procedente parcialmente quanto à nulidade da sentença nos termos referidos em B1) e confirmar a sentença recorrida na parte impugnada quanto ao mais. Custas pela apelante e apelado na proporção de 39/40 para a primeira e de 1/40 para o segundo. Notifique. (Acórdão elaborado e integralmente revisto pelo relator). Évora, 06 de dezembro de 2017. Moisés Silva (relator) João Luís Nunes Paula do Paço |