Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1922/23.6T8TMR.E1
Relator: PAULA DO PAÇO
Descritores: ESTAFETA
PRESUNÇAO DE LABORALIDADE
ARECT
Data do Acordão: 10/16/2025
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA A SENTENÇA RECORRIDA
Área Temática: SOCIAL
Sumário: Sumário elaborado pela relatora:
I. O artigo 12.º-A do Código do Trabalho estabelece uma presunção de laboralidade. A verificação de, pelo menos, duas das características discriminadas nas alíneas a) a e), do n.º 1 deste preceito legal é condição suficiente para operar o funcionamento da presunção. Trata-se de uma presunção juris tantum (artigo 350.º do Código Civil), cabendo à parte contrária demonstrar que, não obstante a verificação das circunstâncias apuradas, existem factos e contraindícios indicadores de autonomia, que sejam quantitativa e qualitativamente significativos para permitirem a descaracterização.

II. É de qualificar como contrato de trabalho a relação contratual entre a GLOVOAPP PORTUGAL, UNIPESSOAL, LDA. e o estafeta quando se mostrem verificados cinco índices da presunção de laboralidade (alíneas a), b), c), e) e f) do aludido artigo 12.º-A) e a plataforma digital não logrou provar factos que pela quantidade e impressividade imponham concluir que se está perante outro tipo de relação jurídica, como lhe competia.

Decisão Texto Integral: P. 1922/23.6T8TMR.E1

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora1


I. Relatório


O Ministério Público, Autor na ação especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho que intentou contra “Glovoapp Portugal Unipessoal, Lda.”, veio interpor recurso da sentença proferida pelo Juízo do Trabalho de Tomar – Juiz 1, do Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, que terminou com o seguinte dispositivo:


«Pelos fundamentos expostos, julga-se as presentes ações totalmente improcedentes, por não provadas e, em consequência, absolve-se a Ré Glovoapp Portugal Unipessoal Lda. dos pedidos contra a mesma deduzidos de declaração de existência de contrato de trabalho com os diversos Autores.»


O Ministério Público tinha instaurado ações especiais contra a Ré pedindo o reconhecimento da existência de contrato de trabalho sem termo celebrado entre a ora demandada e os seguintes trabalhadores:


1. Processo 1922/23.6T8TMR, o prestador/estafeta AA, residente em ..., a partir de 31-12-2021;


2. Processo 1911/23.0T8TMR, o prestador/estafeta BB, residente em ..., a partir de 31-10-2021;


3. Processo 1913/23.7T8TMR, o prestador/estafeta CC, residente em ..., a partir de 30-09-2023;


4. Processo 1925/23.0T8T8TMR, o prestador/estafeta DD, residente no ..., a partir de 30-06-2022;


5. Processo 1928/23.5T8TMR, o prestador/estafeta EE, residente em ..., a partir de 31-12-2022;


6. Processo 1947/23.1T8TMR, o prestador/estafeta FF, residente em ..., a partir de 31-08-2023;


7. Processo 1953/23.6T8TMR, o prestador/estafeta GG, residente em ..., a partir de 30-04-2023.


Para tal alegou, em síntese, que a Ré celebrou com cada uma das pessoas identificadas uma relação contratual para estas prestarem a atividade de estafeta, a qual contém os elementos caracterizadores de um contrato de trabalho, pelo que devem qualificar-se tais contratos como sendo de trabalho sem termo.


Contestou a Ré, negando tal qualificação.


Saneados os processos e apensados (despacho de 15-10-2024, proferido no processo 1925/23.0T8TMR), foi realizado julgamento e foi proferida a sentença recorrida.


-


O Ministério Público apresentou alegações que terminam com as seguintes conclusões:


«1.ª As leis laborais, salvo regras interpretativas específicas por elas próprias estabelecidas, devem ser interpretadas de acordo com os critérios gerais dos artigos 12.º e 13.º do Cod. Civil.


2.ª O art.º 35.º, n.º 1 da Lei 13/2023 de 3 de abril dispõe que Ficam sujeitos ao regime do Código do Trabalho, com a redação dada pela presente lei, os contratos de trabalho celebrados antes da entrada em vigor desta Lei, salvo quanto a condições de validade e a efeitos de factos ou situações anteriores àquele momento.


3.º O art.º 12, n.º 2 do Cod. Civil estabelece que a Lei nova só produz efeitos para o futuro, mas quando dispuser diretamente sobre o conteúdo de certas relações jurídicas, abstraindo dos factos que lhe deram origem, entende-se que a Lei nova se aplica de imediato às relações já constituídas desde que ainda subsistentes e o contrato de trabalho é precisamente uma dessas situações.


4.ª De acordo com o art.º 12, n.º 2 do C.C. se a Lei nova pretende estabelecer uma disciplina das condições de trabalho com abstração dos factos que lhe deram origem, essas normas devem ser aplicadas de imediato às relações laborais constituídas anteriormente à sua entrada em vigor, mas ainda subsistentes àquela data.


5.ª A qualificação de um contrato é uma questão jurídico-normativa a solucionar por subsunção da factualidade clausulada aos preceitos legais, uma operação que abstrai da concreta vontade das partes.


6.ª As presunções de laboralidade (quer as do art.º 12.º nas suas diversas versões, quer a do art.º 12.º-A do Cod. do Trabalho) destinam-se a operar essa qualificação olhando sobretudo para a execução que as partes fazem do acordado e essa execução não sofre alteração por força da entrada em vigor da Lei Nova.


7.ª A aplicação imediata da Lei Nova que estabelece nova presunção de laboralidade às relações laborais constituídas anteriormente à sua entrada em vigor, mas ainda subsistentes, não limita o princípio da Liberdade contratual das partes, sendo esta “ a Liberdade de modelar e de concluir os negócios, não a de decidir arbitrariamente da lei a que eles devem submeter-se” sobretudo se o nomen não corresponde à execução efetiva, não havendo, por isso legitimas expectativas a proteger, não se afetando a função estabilizadora do Direito que as normas transitórias visam proteger.


8.º Não estão em causa condições de validade do contrato, nem efeitos de factos ou situações passadas anteriormente. O que se trata é de avaliar os factos com base em diferente juízo normativo, a noção de contrato de trabalho e dos seus elementos constitutivos mantem-se exatamente igual, “sendo a presunção de laboralidade um instrumento, uma nova metodologia de qualificação do contrato”.


9.º Salvo o Enorme e devido respeito por opinião contrária, a presunção de laboralidade prevista no art.º 12-A do Código do trabalho e na nova redação do art.º 12.º, introduzidas pela Lei 13/2023 de 3 de abril, aplica-se às relações contratuais iniciadas em momento anterior à entrada em vigor da referida norma e que ainda subsistam, a essa data.


10.º Diga-se ab initio que o artigo 12-A não afasta aplicação do artigo 12 .º do Cod. do Trabalho e, à semelhança deste, basta-se com a verificação de duas (podendo, no entanto, ser mais) das caraterísticas que estabelece para que se tenha por verificada a presunção de laboralidade.


11.ª Para poder exercer a atividade, ao registar-se na plataforma, o estafeta teve de indicar a área geográfica onde estava disponível para fazer as entregas, dentro das áreas geográficas onde a plataforma estivesse operacional.


12.ª Quem determina a área onde o negócio se vai desenvolver é a empresa que o tem. O estafeta não tem qualquer possibilidade de determinar a área geográfica onde a plataforma vai estar operacional, a sua liberdade limita-se à de eleger um dos lugares onde a plataforma decidiu operar como qualquer outro trabalhador que se candidate a um emprego.


13.ª Acresce que é a plataforma quem indica ao estafeta o ponto de recolha e o ponto de entrega da encomenda e lhe define inicialmente a rota (e só esta é paga) pelo que se considera preenchida a caraterística do art.º 12, n.º 1 alínea a) do C.T..


14.ª A aplicação informática é um instrumento de trabalho incorpóreo essencial, sem o qual não haveria relação entre o prestador da atividade e a plataforma enquanto sujeito da relação jurídica e é absolutamente imprescindível que exista e que o prestador a ela continue a ter acesso para que a relação se mantenha.


15.ª É através da aplicação que é feita toda a organização da atividade, pelo que a caraterística do art.º 12.º alínea b) assim como a caraterística da alínea f) do n.º 1 do art.º 12-A se tem por verificada uma vez que não se exige que todos os instrumentos pertençam ao beneficiário da atividade, como já acontecia com a presunção de laboralidade da Lei 99/2003 de 27 de Agosto.


16.º Estando preenchidas duas das caraterísticas prevista no art.º 12.º do Cod. do Trabalho (as alíneas a) e b) ) está verificada a presunção de laboralidade, mas se assim não fosse, sempre se teria de considerar que também estão verificadas as caraterísticas previstas no art.º 12-A , n.º 1 do Cod. do Trab., nas alíneas a) b) c) d) e) e f).


17.º A retribuição paga ao estafeta é determinada unilateralmente pela plataforma e pode ter a colaboração do estafeta mediante a aplicação de um fator, também ele determinado pela aplicação, entre um mínimo (1) e de um máximo (1,10) também fixados plataforma e apenas uma vez por dia, pelo que está verificada a caraterística da alínea a) do art.º 12-A do Cod. Trab.


18.º A plataforma digital exerce o poder de direção, de gestão e organização da prestação de atividade e o poder de regulamentar sobre a prestação de atividade em todos os aspetos que a envolvam.


19.º Fá-lo quando define o próprio processo de registo na aplicação, quando define quanto, quando e como paga o serviço de entrega sem intervenção ativa do prestador que apenas pode alterar o valor proposto uma vez por dia e nos termos admitidos pela R., quando define ab initio um percurso de entrega e só esse é pago.


Em conclusão, está verificada a caraterística da alínea b) do art.º 12 –A do CT.


20.º A plataforma digital tem o poder de controlar e supervisionar a prestação de atividade incluindo em tempo real ou verificar a qualidade da atividade prestada nomeadamente através de meios eletrónicos ou de gestão algorítmica quando recolhe dados, incluindo, biométricos, com a geolocalização do prestador de atividade a partir do momento em que este se coloca online , quando disponibiliza uma funcionalidade que permite ao cliente final colocar a sua apreciação sobre a prestação de atividade do estafeta, pelo que está verificada a caraterística da alínea c) do art.º 12 –A do CT.


21.º E não se diga que a plataforma não faz uso dessa informação porque independentemente do uso que a plataforma faz desta informação quem decide o uso que faz é a plataforma, não o prestador.


22.º Com a alínea d) do art.º 12.º-A entramos no domínio do controlo e das restrições à própria atividade e não à prestação propriamente dita. Se relativamente à escolha de horários, períodos de ausência, não há restrições, já no que respeita à utilização de subcontratados ou substitutos, nomeadamente partilha de contas a plataforma impõe regras próprias a que o estafeta tem de obedecer, podendo mesmo impedir o acesso temporário à conta e ou o cancelamento definitivo da mesma, se não cumpridas pelo estafeta impedindo-o de trabalhar.


23.º O poder disciplinar prende-se com a sujeição do prestador de atividade à direção do empregador e é o critério distintivo principal entre o trabalhador subordinado e o independente.


24.º Como já se referiu, o prestador de atividade está sujeito a um controlo do seu desempenho, está adstrito a um conjunto de regras impostas pela R., que tem sobre ele o poder de lhe restringir o acesso à plataforma de forma temporária ou definitiva.


25.º Do âmbito desta alínea e) essas possibilidades aparecem associadas ao poder disciplinar que por sua vez, remete, sem margem para dúvidas, para o trabalho subordinado.


26.º Atendendo ao grau de controlo que a plataforma exerce sobre o prestador, na prática é esta que detém o domínio da prestação, controlando como é exercida, estando prestador sujeitos às regras impostas pela plataforma, pelo que também esta caraterística se tem como verificada.


27.º Para afastar a presunção de laboralidade, a prova tem de ser efetiva, não bastando, pois, declarações negociais escritas, insertas num formulário elaborado unilateralmente pela R. – contrato de adesão- feito para conferir uma aparência de autonomia a uma prestação que não quer ver qualificada como de trabalho subordinado. Para ilidir a presunção não bastam afirmações em audiência, feitas por funcionários da Ré de que existem poderes que não são exercidos ou que há controlos inócuos, quando realidade demonstra o contrário!


28.ª Mas a presunção poderia ser ilidida com a demonstração do funcionamento do algoritmo. Algoritmo, em termos simples, é uma sequência de instruções lógicas que um computador pode seguir para executar uma tarefa específica. Essas instruções são a tradução em linguagem informática do contrato que as partes vão executar entre elas. Logo, a divulgação dessas instruções de “programação” assume particular importância para a qualificação da relação contratual estabelecida entre as partes.


29.º Caso se entenda não serem aplicáveis as presunções de laboralidade, então perante a “dificuldade em determinar a subordinação jurídica importa recorrer ao método indiciário de qualificação do contrato devendo concluir-se pela existência de um contrato de trabalho quando se verifiquem um conjunto de circunstâncias ou caraterísticas que sopesadas nos permitam concluir pela subordinação de quem presta o serviço perante o beneficiário da prestação.” Como se escreveu doutamente no Acórdão da Relação de Guimarães de 31-10.2024 que é precisamente o que acontece nos presentes autos.


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Pelo exposto, deverá a douta sentença ser revogada e substituída por outra que reconheça a existência de um contrato de trabalho entre os prestadores de atividade e a R, desde as seguintes datas:


AA desde 7 de junho de 2022;


BB desde 7 de junho de 2022;


CC desde 6 de junho de 2023;


DD desde junho de 2022;


EE desde dezembro de 2022;


FF desde agosto de 2023;


GG desde abril de 2023;


Porém Vossas Excelências fareis, como sempre JUSTIÇA.»


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Contra-alegou a Ré, com ampliação do objeto do recurso interposto, tendo, a final, concluído:


«A. No caso dos autos, a data em que alguns prestadores de atividade se registaram na plataforma da Ré Recorrida, (aceitando os respetivos termos e condições – n.º 1 do artigo 224.º do Código Civil) é anterior à entrada em vigor da Lei n.º 13/2023, pelo que, à luz da doutrina do Supremo Tribunal de Justiça e atento o disposto no n.º 3 do artigo 8.º do Código Civil, bem como da recente Diretiva referida supra, não é de aplicar o disposto no artigo 12º-A do Código do Trabalho.


B. Caso assim não se entenda, o que não se concede, nunca os factos anteriores a 01.05.2023, poderão ser tidos em consideração para efeitos do preenchimento de características previstas no artigo 12.º-A do Código do Trabalho.


Do não preenchimento das características para presumir a existência de contrato de trabalho – artigo 12.º do Código do Trabalho


C. Nenhum dos locais onde ocorreram as ações de fiscalização da ACT aos prestadores de atividade pertence à Ré.


D. Os prestadores de atividade escolheram a área onde prestam serviços propostos através da aplicação gerida pela Ré, que podem alterar mediante comunicação à Ré, sem restrição.


E. O estafeta é livre de escolher o meio de transporte e o percurso a seguir até ao local de entrega do pedido, de acordo com os seus critérios de eficiência e produtividade (cfr. ponto 24 dos factos provados).


F. A indicação, numa proposta de entrega, do concreto local de recolha e entrega não vale como determinação de local para exercício da atividade, sendo apenas uma informação dada ao estafeta, juntamente com o valor a receber, para que ele possa decidir esclarecidamente se aceita, rejeita ou ignora o pedido


G. A Ré não indica quaisquer rotas aos estafetas.


H. Neste conspecto, andou bem o Tribunal a quo, ao decidir não se verificar a al. a) do n.º 1 do artigo 12.º do Código do Trabalho.


I. Resulta do ponto 47 dos factos provados da sentença que os principais equipamentos da atividade dos estafetas são o veículo, o telemóvel e a mochila, todos propriedade daqueles, que são também responsáveis pela sua manutenção e reparação.


J. A aplicação não pode ser considerada um instrumento de trabalho, mas antes uma forma de comunicação simplificada – como seriam uma chamada de voz, SMS, e-mail, mensagem por beeper, etc., não podendo o software ter-se como um utensílio nos mesmos moldes que o hardware (um bem corpóreo), pois entender em sentido divergente deste seria entrar num raciocínio tautológico ou metalinguístico, absorvendo-se a própria plataforma digital no conceito de equipamento ou utensílio de trabalho, com a consequente desvirtuação de conceitos.


K. Por conseguinte, andou bem o Tribunal a quo ao não considerar preenchida a característica prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 12.º do Código do Trabalho.


L. Não se pode presumir a existência de contrato de trabalho, uma vez que não se verificam preenchidas quaisquer das características previstas no artigo 12.º n.º 1 do Código do Trabalho.


Do não preenchimento das características para presumir a existência de contrato de trabalho – artigo 12.º-A do Código do Trabalho


M. A Recorrida não fixa a retribuição para o serviço, podendo o prestador de atividade não apenas rejeitar a proposta que entenda, como definir o preço mínimo pelo qual pretende que lhe sejam apresentadas propostas.


N. A Recorrida não determina um número mínimo, nem máximo, de serviços que o prestador de atividade tenha que realizar.


O. Resulta da matéria de facto provada da sentença a seguinte matéria relevante (pontos 6, 8, 16, 17, 18, 33, 37, 38, 39, 40, 41 e 44), que a plataforma digital não fixa a retribuição para o serviço prestado ou estabeleça limites máximos e mínimos para aquela, porquanto o preço do serviço depende de inúmeros fatores, alguns dos quais da exclusiva eleição do prestador de atividade, não havendo mínimos nem máximos, pois dependem:


- da distância percorrida para efetuar o pedido (local onde se encontra o estafeta, que é escolhido pelo próprio; local de recolha e local de entrega);


- do tempo de espera se o estafeta quiser esperar no local de recolha;


- das condições meteorológicas;


- das horas de procura mais elevada (é o estafeta que decide a que horas presta atividade);


- das gorjetas que os clientes paguem aos Estafetas; etc.


P. Acresce que, os estafetas escolhem e definem ainda um fator de multiplicação sobre todas as componentes do preço.


Q. Os estafetas não têm qualquer obrigatoriedade de aceitar um mínimo, nem um máximo, de serviços a executar, podendo ignorar ou rejeitar, livremente, serviços, sem qualquer consequência, inclusive depois de os ter aceite, podendo aceitar aqueles que lhe apresentem o preço desejado e rejeitar aqueles que não lhe interessem.


R. O utilizador estafeta recebe apenas em função do número de pedidos/entregas realizados, não recebendo qualquer valor por disponibilidade, ou pelo tempo que está a aguardar pela proposta de serviços.


S. Se a Ré organizasse a atividade dos estafetas, o que se lhe exigiria é que dividisse as gorjetas por todos os estafetas, o que não sucede.


T. Pelo exposto, não se pode considerar preenchida a característica prevista no artigo 12.º-A, n.º 1, alínea a) do Código do Trabalho, resultando provado que a aplicação gerida pela Ré não fixa a retribuição para o trabalho efetuado na plataforma ou estabelece limites máximos e mínimos para aquela.


U. Com interesse para a análise do preenchimento da alínea b) do n.º 1 do artigo 12.º-A do Código do Trabalho, relevam os pontos 2, 3, 6, 7, 8, 12, 14, 15, 18, 21, 22, 24, 26, 33, 37, 38, 39, 40, 41, 43, 44, 45 e 46 da matéria de facto provada da Sentença.


V. Inexistem regras de conformação da prestação da atividade.


W. A Recorrida não faz qualquer seleção de estafetas com base em determinados critérios, nem atribui pedidos a determinados estafetas.


X. Para além disso, quando aceita realizar um serviço, sendo que não é obrigado a fazê-lo, está obrigado a um resultado, isto é, transportar um bem de um ponto “A” ao ponto “B”, sendo irrelevante para o utilizador cliente, as características, capacidades ou experiência prévia da pessoa para executar esses serviços.


Y. Os utilizadores estafetas são totalmente livres de se substituírem pelo tempo e quando entenderem.


Z. O registo na aplicação da Ré pelos estafetas é feito proativa e livremente por aqueles, que decidem, motu proprio, aceder ao site da Ré e inscrever-se como utilizador-estafeta, para poder receber propostas de serviços de estafeta através da aplicação.


AA. Os requisitos de inscrição e utilização da plataforma não podem ser confundidos com regras quanto à prestação da atividade de estafeta.


BB. Caso contrário, a utilização da plataforma seria, por si só, um critério indiciário, o que não tem correspondência com a Lei.


CC. A Recorrida não exige que os estafetas estejam disponíveis durante uma determinada hora do dia, que estejam ligados à aplicação, que cumpram um determinado número de entregas ou que prestem serviços durante um determinado número de horas, isso cabe exclusivamente ao estafeta decidir.


DD. A Recorrida não organiza a atividade dos estafetas, pois nem sequer sabe, de antemão, quem é que vai estar ou não disposto a realizar serviços.


EE. O estafeta é livre de escolher e utilizar o veículo que entender, sendo certo que a Recorrida, nem sequer controla, nem tem os meios humanos ou outros para o efeito, aferindo qual o veículo que estafeta está a utilizar (ou nenhum).


FF. A estafeta é ainda livre de exercer a atividade de estafeta diretamente para terceiros, nomeadamente restaurantes, etc., à semelhança do que fazem já outros estafetas, recebendo as propostas de serviços através de SMS ou telefone, pelo que é falso quando se afirma que o prestador de atividade para exercer a atividade de estafeta precisa da aplicação da Ré Recorrida.


GG. O prestador de atividade é que escolhe qual o trajeto que pretende efetuar para executar o serviço de entrega.


HH. O prestador da atividade pode utilizar qualquer aplicação de GPS que indique qualquer outra rota ou não utilizar nenhuma.


II. Em suma, do acervo factual constante da sentença conclui-se que:


i. A Recorrida não exerce poder de direção sobre o estafeta e fiscalização, nem dá ordens ao estafeta;


ii. A Recorrida não determina regras específicas quanto à prestação da atividade por parte do estafeta;


iii. A Recorrida não controla nem supervisiona a atividade do estafeta;


iv. A Recorrida não exerce o poder disciplinar sobre o prestador de atividade.


JJ. O eventual feedback de clientes sobre o serviço dos estafetas, para além de facultativo, não tem qualquer influência no número de serviços a oferecer ao estafeta no futuro.


KK. Ainda que se possa alegar existir um nível de inserção numa certa organização, por resultar dos factos provados que para aceder às propostas de serviços dos utilizadores efetuadas na aplicação da Recorrida o prestador de atividade também tem que estar registado nessa aplicação, a verdade é que, conforme se decidiu no Acórdão da Relação de Lisboa, de 15 de janeiro de 2025, proc. n.º 29383/23.2T8LSB-L1.-4, relatora Manuela Fialho, ocorre uma falha de submissão à autoridade da organização, pois que existe o exercício de uma atividade remunerada que pressupõe o uso de instrumentos próprios do prestador, o prestador decide o local e percurso, o horário, onde e a quem presta a atividade, inexistindo, em adição ao mencionado, sinais exteriores de pertença a uma organização, podendo contratar com terceiros (e concorrentes), inexistindo uma exclusividade relacional e controle acerca do desempenho.


LL. Em suma, o estafeta não deve qualquer obediência à Ré!


MM. Fica assim claro que os estafetas são livres e autónomos na execução dos serviços que entendam prestar, não se verificando preenchida a característica prevista no artigo 12.º-A, n.º 1 al. b) do Código do Trabalho.


NN. Ao contrário do alegado pelo Recorrente, não se provou que a Recorrida controlasse e/ou supervisionasse a prestação de atividade.


OO. O douto Tribunal a quo na fundamentação da Sentença refere o seguinte: “Não se apurou, igualmente, que a Ré controle ou supervisione a prestação da atividade, incluindo em tempo real, ou verifique a qualidade da atividade prestada, nomeadamente através de meios eletrónicos ou de gestão algorítmica. Com efeito, não obstante a utilização do GPS - essencial para o recebimento de propostas de entrega - não se apurou que a plataforma monitorize a atividade do estafeta (embora o possa fazer enquanto o GPS estiver ligado), podendo este optar por não utilizar qualquer sistema de navegação, sem ser penalizado por isso. Há um feed back qualitativo que é dado pelo cliente final e que incide também sobre o restaurante ou estabelecimento comercial, mas sem qualquer influência na oferta de novos pedidos de entrega ou na livre utilização da plataforma. O sistema de reconhecimento facial, embora exista, serve para impedir que o estafeta se faça substituir por pessoa não autorizada a desenvolver a atividade na plataforma, o que se justifica (mostra-se razoável e adequado) por razões de segurança, pois só o titular da conta está perfeitamente identificado e demonstrou possuir aptidão para o exercício da atividade, não sendo desajustado que essa aptidão seja sindicada, para descartar casos de imigração ilegal, trabalho de menores, etc.


Pelo que também a característica indiciária prevista na al. c) do n.º 1 do art. 12.º-A do Código do Trabalho não se mostra verificada”.


PP. Há uma ressalva que é importante realizar: a sindicância de aptidão para o exercício da atividade não é de natureza qualitativa, mas apenas e só de garantir que o prestador de atividade está legalmente habilitado ao exercício de atividade profissional em território nacional.


QQ. Em face do exposto, impõe-se concluir, como fez o Tribunal a quo, pelo não preenchimento da alínea c) do n.º 1 do artigo 12.º-A do Código do Trabalho.


RR. Resulta da matéria de facto provada que os prestadores de atividade podiam prestar atividade de estafeta através de outras aplicações/plataformas, bem como diretamente com estabelecimentos comerciais ou clientes. Resultou provado que AA e BB exerciam atividade de estafeta com a plataforma “UBER EATS” (ponto 30 da matéria de facto provada da sentença).


SS. Resulta da matéria de facto provada que os prestadores de atividade podiam escolher livremente os dias e as horas em que acediam à aplicação; também eram livres de aceitar ou recusar qualquer serviço que lhes fosse proposto na aplicação, bem como era livre de escolher os clientes/restaurantes a quem não queriam prestar serviços.


TT. Toda a organização do trabalho do estafeta é feita por este. Escolhe o seu horário e os seus períodos de ausência. Escolhe até se quer trabalhar ou não e sempre sem qualquer consequência. E isso é uma realidade que nenhum trabalhador subordinado pode ter sem consequências.


UU. A plataforma não interfere com escolhas de horários, não interfere com a autonomia de aceitar, e mesmo depois de o fazer o estafeta pode “voltar atrás” numa entrega, e vir a recusá-la.


VV. A plataforma não impõe clientes: o estafeta pode ele próprio decidir que com determinado cliente não quer sequer receber ofertas, ou recusar essa oferta.


Como se pode ver subordinação jurídica quando um trabalhador recusa determinado trabalho sem que a entidade empregadora possa reagir?!


WW. E por fim, a plataforma não restringe a autonomia de arranjar substituto.


O estafeta pode livremente fazê-lo, o que contraria o espírito da relação laboral, como ainda não é próprio de determinadas relações de prestação de serviço. Quem contrata o A para algo não quer o B precisamente porque contratou o A.. Mas até isso o estafeta pode fazer livremente. Apenas tem que indicar a pessoa em quem o vai fazer e demonstrar que está legalmente autorizada a exercer atividade profissional em Portugal, o que consubstancia um dever legal.


XX. Por conseguinte, e pelos factos provados n.ºs 6, 18, 21, 22, 24, 30, 37, 38, 41, 42, 44, 45 e 46 e não provados n.ºs 3, 5, 6, 7, 8, 9, 10 e 11, não se mostra verificada a alínea d) do artigo 12.º do Código do Trabalho.


YY. Acertadamente, o Tribunal a quo referiu o seguinte: “Igualmente não se pode afirmar que a Plataforma exerça algum poder disciplinar sobre o prestador de atividade, ou de outro tipo, sendo que não se pode confundir pode disciplinar com consequências decorrentes do incumprimento contratual, sob pena de banalização dos conceitos”.


ZZ. Sucede que não resulta da matéria de facto provada que a plataforma exerça qualquer poder disciplinar sobre o prestador de atividade, nomeadamente com aplicação de sanções.


AAA. Tal como resulta do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa n.º 30191/23.6T8LSB.L1 já citado:


(…)


BBB. Mais, conforme resulta da matéria de facto provada, a suspensão ou bloqueio de contas não é exclusivo do utilizador-estafeta, estando a isso sujeitos os utilizadores-clientes e os utilizadores estabelecimentos / parceiros.


CCC. A Recorrida não procede à desativação/suspensão de contas por o Prestador de Atividade:


i. Ligar ou desligar a aplicação quando entender;


ii. Recusar pedidos;


iii. Escolher as rotas que pretende efetuar;


iv. Ter ou não bons feedbacks por parte dos utilizadores clientes (quando tal possibilidade existia); etc.


DDD. Nem mesmo quando os prestadores de atividade deixaram de prestar atividade, por decisão própria, a conta tenha sido pela Recorrida, unilateralmente, encerrada. Pelo contrário, foi referido pelos prestadores de atividade manterem-se ativas.


EEE. Conclui-se, assim, que também este critério (artigo 12.º-A n.º 1 al. e) do Código do Trabalho) não se verifica, sendo que todos os factos dados como provados apenas permitem concluir em sentido oposto ao previsto nesta alínea.


Do método indiciário e dos factos que demonstram a inexistência de contrato de trabalho e fazem ilidir a presunção da sua existência que eventualmente pudesse ser invocada


FFF. Resultou provado que os estafetas, na execução da atividade que os próprios decidiram prestar com a utilização da aplicação gerida pela Recorrida, têm liberdade para:


• Definir onde, quando e por quanto tempo, pretende ligar-se à aplicação tecnológica da Ré, não tendo qualquer compromisso, mínimo que fosse, de regularidade, pontualidade ou assiduidade na prestação de atividade, podendo não se ligar à Plataforma durante semanas ou meses, sem que daí resulte qualquer represália ou penalização;


• Quando decidir estar ligado, decide se aceita ou se rejeita pedidos de entrega solicitados por utilizadores clientes registados na plataforma da Ré, sendo que pode rejeitar todos os pedidos que lhe sejam oferecidos, mesmo após ter aceite os mesmos, sem que daí resulte qualquer represália ou penalização;


• Escolher a área e a localidade em que presta serviços de estafeta podendo mudar de áreas e de localidade quando entender;


• Desligar a geolocalização do telemóvel, após aceitar o serviço na aplicação, não recebe quaisquer instruções da Ré sobre a forma de efetuar a entrega, sendo livre de escolher o meio de transporte, o percurso e definir os seus critérios de eficiência e produtividade;


• Escolher os instrumentos utilizados na sua atividade, que são da sua propriedade, mantidos e escolhidos por si;


• Definir o preço e os rendimentos que pretende auferir pelos serviços a prestar, não apenas pelo multiplicador que escolhe, mas também pelo facto de poder rejeitar ou aceitar os serviços que não pretende ou pretende realizar;


• Subcontratar terceiros para utilizar a sua conta registada na Ré;


• Prestar atividade de estafeta, nomeadamente para outras plataformas, ou qualquer outra atividade para terceiros, sem qualquer necessidade de informação prévia ou autorização da Recorrida.


GGG. Por seu turno, resulta que o estafeta é responsável pelos serviços e, em particular, pela perda e pelos danos dos bens transportados.


HHH. Não se pode aceitar a conclusão constante do Recorrente que o prestador de atividade atua na organização da Recorrida, porque se o fizesse, necessariamente que a plataforma teria que ter o poder de determinar aos estafetas, nomeadamente:


i. O horário de trabalho;


ii. A obrigação de realizar todas as entregas que lhes fossem apresentadas;


iii. Quais as rotas a seguir;


iv. Quais os veículos a utilizar;


v. O tempo mínimo e máximo para realizar uma determinada entrega;


vi. Objetivos mínimos de número de entregas por hora, por dia ou por mês;


vii. Quem é que substituiria o estafeta;


viii. Impossibilidade de prestar atividade semelhante através de plataformas concorrentes e/ou diretamente para estabelecimentos ou particulares.


III. Caso procedesse o recurso do Recorrente, o que não se concede e por dever de patrocínio se teoriza, violaria frontalmente o acórdão do TJUE, de 22 de abril de 2020, proferido no processo Yodel Delivery Network.


Termos em que:


Deve o recurso do Recorrente ser considerado improcedente por:


(a) Não se verificarem preenchidas, pelo menos, duas características constantes do n.º 1 do artigo 12 n.º 1 do Código do Trabalho;


(b) Não se verificarem preenchidas, pelo menos, duas características constantes do n.º 1 do artigo 12.º-A do Código do Trabalho;


(c) Resultar da matéria de facto provada que a relação entre os prestadores de atividade e a Recorrente consubstancia um contrato de prestação de serviços e não de contrato de trabalho.


Em consequência, deve manter-se a douta sentença recorrida, sem prejuízo da ampliação do objeto do recurso efetuado pela Recorrida, a qual deve ser procedente.» 2


O Ministério Público respondeu à ampliação do objeto do recurso.


-


A 1.ª instância admitiu o recurso como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.


-


O processo subiu ao Tribunal da Relação e o recurso foi mantido.


Não tendo o projeto de acórdão apresentado pelo Relator inicial obtido vencimento, nos termos previstos pelo n.º 3 do artigo 663.º do Código de Processo Civil, foram os autos conclusos à 1.ª Adjunta para elaboração de acórdão.


Cumpre apreciar e decidir.


*


II. Objeto do Recurso


É consabido que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da recorrente, com a ressalva da matéria de conhecimento oficioso (artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi do artigo 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho).


Em função destas premissas, as questões em debate são as seguintes:


Recurso de apelação:


- Saber se o tribunal a quo errou ao não qualificar as relações contratuais que se apreciam nos autos como contrato de trabalho.


No âmbito da ampliação do recurso:


- Não preenchimento da alínea a) do n.º 1 do artigo 12.º-A do Código do Trabalho.


*


III. Matéria de Facto


A 1.ª instância julgou provados os seguintes factos:

1. A Ré Glovoapp Portugal Unipessoal Lda. tem por objeto social o desenvolvimento e exploração de uma plataforma tecnológica, comércio a retalho por via eletrónica, comércio não especializado de produtos alimentares e não alimentares, bebidas e tabaco e, de um modo geral, de todos os produtos de grande consumo, comercialização de medicamentos não sujeitos a receita médica, produtos de dermocosmética e de alimentos para animais, a importação de quaisquer produtos, comércio de refeições prontas a levar para casa e a distribuição ao domicílio de produtos alimentares e não alimentares. Exploração, comercialização, prestação e desenvolvimento de todos os tipos de serviços complementares das atividades constantes do seu objeto social. Realização de atividades de formação, consultoria, assistência técnica, especialização e de pesquisa de mercado relacionadas com o objeto social. Qualquer outra atividade que esteja direta ou indiretamente relacionada com as atividades acima identificas. Atividades que desenvolve com o CAE Principal 47910-R3 (comércio a retalho por correspondência ou via internet) e com os CAE secundários: 73200-R3 47112-R3; 47730-R3 e 56106-R3 [Cfr. certidão permanente junta aos autos];

2. No âmbito da atividade mencionada em 1, a Ré explora uma plataforma digital de intermediação tecnológica através da qual certos estabelecimentos comerciais oferecem os seus produtos através de uma aplicação móvel ou da Web e, acessoriamente, quando apropriado e solicitado pelo cliente através da aplicação, atua como intermediária na entrega imediata dos produtos;

3. Através da referida plataforma, a Ré estabelece a ligação entre os utilizadores da mesma, a saber, o estabelecimento comercial (restaurante, por exemplo), o estafeta e o cliente final/consumidor;

4. Tendo a ACT – Autoridade para as Condições de Trabalho desenvolvido atividade inspetiva ao sector de atividade em causa, os Srs. Inspetores abordaram estafetas inscritos na plataforma da Ré e utilizadores da aplicação, nas seguintes circunstâncias:

a) No dia 23 de agosto de 2023, pelas 20.30h, abordaram AA junto às instalações do restaurante McDonald’s, sitas na Rua Coronel Garcês Teixeira, n.° 49, em Tomar, que ali prestava a sua atividade como estafeta;

b) No dia 31 de agosto de 2023, pelas 19h30m, abordaram BB junto às instalações do McDonald’s, sitas na Avenida Andrade Corvo n.º 3, em Torres Novas, que ali prestava a sua atividade como estafeta;

c) No dia 6 de outubro de 2023, pelas 20h30m, abordaram CC junto às instalações do McDonald’s, sitas na Rua Manuel da Costa Nery, em Torres Novas, que ali prestava a sua atividade como estafeta;

d) No dia 31 de agosto de 2023, pelas 19h40m, abordaram DD junto às instalações do McDonald’s, sitas na Avenida Andrade Corvo n.º 3, em Torres Novas, que ali prestava a sua atividade como estafeta;

e) No dia 31 de agosto de 2023, pelas 20h30m, abordaram EE junto às instalações do McDonald’s, sitas na Avenida Beato Nuno 479, em Fátima, que ali prestava a sua atividade como estafeta;

f) No dia 7 de setembro de 2023, pelas 13h30m, abordaram FF no TorresShopping, em Ponte Nova, Torres Novas, que ali prestava a sua atividade como estafeta;

g) No dia 15 de setembro de 2023, pelas 20h30m, abordaram GG no TorresShopping, em Ponte Nova, Torres Novas, que ali prestava a sua atividade como estafeta;

5. Nas mencionadas circunstâncias todos os identificados estafetas estavam munidos com uma mochila térmica de cor amarela, com as letras “GLOVO” escritas de modo bem visível e aguardavam que um pedido de entrega de refeição surgisse na aplicação Glovo que possuíam instalada no telemóvel, ou procediam já à recolha de uma refeição correspondente a um pedido previamente aceite;

6. Aquando do recebimento do pedido de entrega na aplicação Glovo, o estafeta é informado sobre o endereço de entrega, valor a receber, preço da refeição e o modo de pagamento deste por parte do cliente;

7. Para desenvolverem a atividade de estafeta através da plataforma da Ré, cada um dos indivíduos identificados acedeu ao sítio da internet pertencente à Ré (https://couriers.glovoapp.com/pt/), criou a sua conta na plataforma e procedeu ao registo no sítio da internet destinado aos estafetas (https://delivery.glovoapp.com/pt/faq/hc essentials/requirements/) na aplicação da Ré na modalidade de “utilizador estafeta”;

8. Para tanto, tiveram de demonstrar que eram maiores de idade, apresentaram cópia do documento de identificação (frente e verso), comprovativo de atividade aberta nas finanças (código 1519 ou 53200), comprovativo de ATCUD (código único de documento), e aceitaram os Termos e Condições de Utilização da Plataforma publicados a https://glovoapp.com/docs/en/legal/terms-couriers/?country=pt e constantes igualmente de fls. 259 e seg. dos presentes autos (Processo Principal n.º 1922/23.6T8TMR, transcrevendo-se a versão junta pela Ré (fls. 259 e seg.) e também pela ACT, que é atualizada à data de 4 de maio de 2023), sujeitos a atualização atenta a sua natureza, com o seguinte teor, além do mais que aqui se dá por reproduzido:

(…)

TERMOS E CONDIÇÕES DE UTILIZAÇÃO DA PLATAFORMA GLOVO PARA ESTAFETAS

Enquanto uma plataforma intermediária tecnológica, preocupamo-nos com a segurança e o tratamento doa dados dos estafetas que utilizam a plataforma GLOVO e estamos empenhados em proteger os seus dados pessoais quando utiliza a nossa Plataforma. Ao aceitar os presentes termos e condições confirma que leu e aceitou expressamente as nossas Políticas de Privacidade e de Cookies publicadas no sítio Web e na aplicação (…) que são parte integrante dos presentes Termos e Condições.

(…)

As pessoas que não aceitem ou não concordem com os presentes termos e condições, que são obrigatórios e vinculativos, abaster-se-ão de utilizar o sítio web e/ou os serviços, dado que o tratamento de dados pessoais descrito abaixo é necessário para a correta execução da utilização da Plataforma, conforme previsto no artigo 6.º n.º 1 do Regulamento (EU) 2016/676, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de Abril de 2016, relativo à proteção de pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais (adiante designado por RGPD).

1.ª Condições Gerais

Os presentes Termos e Condições de Utilização da Plataforma GLOVO aplicam-se à prestação de todos os serviços tecnológicos oferecidos pela Glovoapp Portugal Unipessoal Lda. (…) («GLOVO», a «Plataforma GLOVO», ou «Nós» consoante o contexto), ao país no qual o Prestador de Serviços (o «Estafeta», o «Utilizador» ou «Você», consoante o contexto) tem de se registar na nossa Plataforma. A principal atividade da GLOVO é o desenvolvimento e a gestão de uma plataforma tecnológica através da qual certos estabelecimentos comerciais locais (…) de algumas cidades oferecem os seus produtos através de uma aplicação móvel ou da WEB (adiante designados por «serviços GLOVO», »Serviços» ou «App»); e, acessoriamente, quando apropriado e se solicitado pelo utilizador cliente final (adiante designado por «Utilizador Cliente») dos referidos estabelecimentos comerciais através da aplicação, podem atuar como intermediários na entrega imediata dos produtos. Os seus objetivos incluem intermediação nos processos de recolha e/ou pagamento e a aceitação e execução de pedidos para fazer recolhas e receber entregas em nome do cliente Utilizador e dos Estabelecimentos Comerciais.

(…)

2.ª Países onde a GLOVO opera

1. Jurisdição

(…)

2.2. A sua aceitação

Para utilizar os Serviços GLOVO, é indispensável cumprir os seguintes requisitos.

(…)

ii) Tem de aceitar os presentes Termos e Condições de Utilização.

(…)

Ao aceder aos Serviços Glovo e registar-se pela primeira vez na Plataforma, inserindo os seus dados de identificação de conta (…) está a aceitar os presentes Termos e Condições, bem como todos os anexos que incluem.

(…)

Em caso de utilização ilegítima ou fraude a GLOVO pode cancelar, suspender ou desativar duas ou mais contas com os mesmos dados ou dados relacionados que possa detetar, mediante intervenção humana sempre por parte de um agente da GLOVO e permitindo, em todo o caso, que o Estafeta apresente uma queixa e/ou reclame contra essa decisão em caso de discrepância. Será responsável por todas as transações realizadas na sua Conta (por Si ou por eventuais substitutos), uma vez que só é possível aceder à mesma com o Código de Segurança e estão sujeitas a aceitação dos nossos Termos e Condições, incluindo, nomeadamente, responsabilidade penal. Aceita notificar imediatamente através de meios apropriados e seguros, qualquer utilização fraudulenta ou ilegítima da sua Conta, bem como qualquer acesso à mesma por terceiros não autorizados. Para evitar dúvidas, qualquer venda, cessão e transferência da Conta sempre que possa ser considerada ilegal é proibida em quaisquer circunstâncias, salvo nos casos de sublocação/subcontratação da sua conta em conformidade com a regulamentação local aplicável.

3. Alterações

A GLOVO pode alterar unilateralmente os Termos e Condições e os respetivos anexos sem aviso prévio.

(…)

3.ª A Plataforma Digital da GLOVO Digital (os «Serviços de Tecnologia»).

1. Opções de serviço

(…)

Serviços incluídos na Taxa de Utilização da Plataforma

• Acesso à plataforma que lhe permitirá oferecer voluntária e livremente os seus serviços de entrega podendo conectar-se em qualquer altura de acordo com a possibilidade de escolher livremente os pedidos que pretende realizar. Esse acesso inclui a possibilidade de prestar os seus serviços a qualquer um dos Utilizadores da Plataforma (Utilizadores Cliente, Estabelecimentos Comerciais, etc.), independentemente da empresa do Grupo Glovo e/ou as suas filiais e/ou empresas coligadas) que gere a Plataforma à qual se conectou e sempre de acordo com a disponibilidade do pais no qual se conecta.

• Acesso a cobertura de seguro durante o período de conexão à Plataforma,

• Acesso a apoio e serviço de assistência para qualquer inconveniente técnico que possa ocorrer.

• Gestão e intermediação no serviço de recolha e pagamentos.

• Aquisição e/ou uso de materiais que podem ser solicitados por você.

(…)

4.ª Utilização dos serviços tecnológicos da GLOVO

4.1 Quem é o Estafeta?

Ao aceitar os presentes Termos e Condições, também se torna um utilizador da aplicação GLOVO. Deste modo, pode usar e conectar-se à Plataforma GLOVO de forma flexível e a seu critério. Acede á Plataforma para usar uma tecnologia da Plataforma que lhe permite conectar-se a outros Utilizadores da Plataforma. Os mesmos poderão ser: Estabelecimentos Comerciais, Utilizadores, outros Estafetas e outros Utilizadores.

Se estiver no seu país, usa a GLOVO como:

• Utilizador Estafeta Independente: Pode definir os seus próprios horários para se conectar à Plataforma e manter o seu perfil registado. Atuará em seu próprio nome e interesse, também usando os seus próprios equipamentos para exercer a atividade.

• Utilizador Estafeta numa empresa de serviços de logística: Enquanto profissional de uma empresa de serviços de logística que usa os Serviços da Plataforma, estará dependente das instruções da sua empresa.

A GLOVO não dirigirá, controlará ou será considerada dirigir ou controlar as ações ou conduta da empresa no âmbito dos presentes Termos e Condições, nomeadamente no que diz respeito à prestação dos seus serviços a outros utilizadores da Plataforma.

Reconhece que não existe nenhuma obrigação ou relação de exclusividade entre Si e a GLOVO, de tal modo que pode, a seu exclusivo critério, oferecer serviços ou exercer qualquer outra atividade comercial ou profissional e não com o setor de atividades da GLOVO.

4.2 Cessação dos Serviços.

(…)

As partes podem cessar os Serviços pelas seguintes razões:

1. Por vontade própria, em qualquer altura sem aviso prévio, salvo se acordado de outro modo por escrito.

2. Por violação de qualquer uma das obrigações previstas nos presentes Termos e Condições.

3. Em caso de impossibilidade de cumprir qualquer disposição dos presentes Termos e Condições.

4. O não cumprimento das Normas de Ética e Conduta Empresarial para Terceiros da GLOVO e/ou de qualquer outra Política da GLOVO aplicável a todos os Utilizadores da Plataforma.

5. Por violação da legislação local por parte do Estafeta que possa constituir uma violação do princípio da boa-fé entre as Partes.

6. Quaisquer outras circunstâncias resultantes em danos fiscais, de segurança social, financeiros, comerciais, organizacionais ou de reputação para outra Parte ou um Terceiro, independentemente do montante ou dimensão do dano causado.

7. A utilização da Plataforma GLOVO para fins abusivos ou fraudulentos suscetíveis de causar danos materiais e/ou imateriais a qualquer um dos Utilizadores da plataforma.

8. Em situações de força maior, de acordo com a cláusula 8.5 destes Termos e Condições.

5.ª Obrigações e Restrições

5.1. Utilizador Estafeta

5.1.1 A sua Utilização dos Serviços de Tecnologia da GLOVO

Para utilizar os Serviços de Tecnologia da GLOVO é necessário registar e criar uma Conta completa, atualizada e ativa. Tal inclui, consoante apropriado, mas sem carácter exaustivo, as seguintes obrigações:

1. (a) Estar registado corretamente para poder exercer a atividade de entrega para todos os fins legais, de segurança social e fiscais e em conformidade com a regulamentação local em vigor na altura.

2. (b) Pagar pontualmente os Serviços acordados com a Plataforma.

3. (c) Tem de enviar à GLOVO certas informações, pessoais ou enquanto empresa prestadora de serviços, tais como o seu nome, endereço, número de telemóvel e idade (aplicar-se-á a idade legal da sua jurisdição), bem como, pelo menos, um método de pagamento válido.

4. (d) Tem de manter informações exatas, completas e atualizadas na sua Conta. Será responsável por quaisquer inexatidões nas informações fornecidas.

5. (e) Será responsável por todas as atividades realizadas na sua Conta, incluindo as que terceiros realizam em seu nome, bem como por manter sempre a segurança e o sigilo do nome de utilizador e da palavra-passe (Código de Segurança) da sua conta.

6. (f) Aceita cumprir toda a legislação aplicável, incluindo regulamentação local, nacional e supranacional ao utilizar os Serviços de Tecnologia GLOVO e apenas pode utilizar os Serviços para fins legítimos.

7. (g) Aceita não utilizar a Plataforma de Tecnologia GLOVO para causar inconvenientes, fraude ou danos materiais a terceiros.

8. (h) Caso decida subcontratar a sua Conta de Utilizador Estafeta, tem de fazê-lo em conformidade com a regulamentação local, sempre que a mesma o permita, e serão aplicados processos internos para adaptar a operação. A GLOVO não será responsável por quaisquer danos ou infração que você e/ou as suas subcontratações possam cometer. Neste sentido, a GLOVO, a fim de evitar comportamento abusivo e/ou fraudulento, pode pedir documentação relativa à conformidade do Estafeta titular da Conta GLOVO e dos seus subcontratantes.

9. (i) Declara que dispõe da capacidade jurídica para celebrar contratos e ser de maioridade no país correspondente.

10. (j) Apenas os produtos e serviços que não sejam tácita ou expressamente proibidos nos Termos e Condições e outras políticas da GLOVO ou pela legislação em vigor podem ser incluídos no âmbito dos presentes Termos e Condições. Para mais informações sobre os produtos ou serviços proibidos, consulte as nossas Políticas de Artigos Proibidos nos presentes Termos e Condições ou nos Termos e Condições Gerais de Utilização aplicáveis aos Utilizadores Cliente.

11. (k) A GLOVO irá sempre dar prioridade à sua experiência de Utilizador enquanto parte dos seus serviços. A GLOVO pode criar painéis de informação para incluir as suas preferências enquanto Utilizador da Plataforma Digital da GLOVO e melhorar a sua experiência na mesma.

12. (l) Você, enquanto profissional e Estafeta, é responsável pela prestação dos seus serviços e pelas vicissitudes da sua atividade. Bem como, se for caso disso, pelos estafetas por si subcontratados.

13. (m) O Estafeta compromete-se a verificar e cumprir os requisitos legais pertinentes, em termos de saúde e segurança apropriados para diferentes tipos de produtos (a título de exemplo, mas sem caráter exaustivo: os relacionados com farmácia, álcool e tabaco) e isenta a GLOVO de qualquer responsabilidade caso a regulamentação supracitada não seja respeitada.

14. (n) No caso de transporte de alimentos, em conformidade com a regulamentação aplicável a este respeito, o Estafeta compromete-se a transportá-los em meios de transporte e recipientes adequados para os mesmos.

15. (o) Declara cumprir a legislação aplicável na prestação dos seus serviços de entrega, tais como legislação fiscal, laboral, civil, penal, de transporte de mercadorias, de saúde, segurança e higiene e a legislação inerente à atividade, nomeadamente apólices de seguro aplicáveis à sua região (como o seguro obrigatório de veículos).

5.1.2 Na medida em que a GLOVO é um intermediário que liga diferentes Utilizadores da Plataforma (Utilizadores Estafeta, Utilizadores Cliente, Estabelecimentos Comerciais, etc.) e não participa nas transações realizadas entre si, será responsável por todas as obrigações fiscais e encargos aplicáveis à prestação dos seus serviços, sem que a GLOVO tenha qualquer responsabilidade por infrações a este respeito e tem de informar, se necessário para efeitos dos presentes Termos e Condições, qualquer alteração ou mudança na sua situação jurídica, fiscal, laboral, de segurança social, etc. Declara cumprir sempre a legislação local na sua prestação de serviços.

5.1.3 (…)

5.1.4 Ao aceitar um pedido, o Estafeta reconhece que esse pedido pode incluir a entrega/devolução/serviço de devolução ou conforme a morada/localização/descrição indicado pelo Utilizador Cliente ou o Estabelecimento Comercial com o qual celebrou um contrato.

5.1.5 Por força dos acordos alcançados com os Utilizadores Cliente, e para efeitos de evitar fraude, no momento da entrega, os Estafetas e Utilizadores Clientes aguardarão dez minutos antes de cancelar um pedido.

5.1.6 O Estafeta aceita que os Estabelecimentos Comerciais e o Utilizador Cliente peça um serviço de entrega de acordo com o preço e a qualidade em conformidade com as orientações de mercado.

5.1.7 O Estafeta reconhece que na sua capacidade de prestador de serviços é o único responsável pelo resultado desses serviços, que poderá resultar em custos adicionais associados a: cancelamentos, violações de serviço, impossibilidade de prosseguir ou concluir um pedido, compensação a outros Utilizadores pelo risco decorrente da sua atividade, etc., que serão sempre suportados a suas expensas. De acordo com a legislação local em vigor no país a partir do qual se conecta, esta responsabilidade pode também recair nos serviços de logística relacionados consigo.

5.1.8 O Estafeta aceita que o ponto de recolha e/ou de entrega indicado na Plataforma pode variar em até 200 metros devido a inconvenientes e/ou erros do sistema ou relacionado com as informações prestadas por outros Utilizadores.

5.1.9 O Estafeta reconhece que, ao aceitar um pedido, conforme aplicável com base na regulamentação local do respetivo país, celebrou um contrato comercial com o Estabelecimento Comercial e o Utilizador Cliente. Tal significa que o Estabelecimento Comercial e o Utilizador Cliente podem cancelar e/ou reatribuir o Serviço em qualquer altura por discordância dos compromissos assumidos ou infração dos mesmos.

5.2 Restrições

Sem prejuízo de quaisquer medidas adicionais que possam ser adotadas, uma Conta Estafeta pode ser temporária ou permanentemente desativada se:

1. (a) Em conformidade com o Código de Ética que rege todos os Utilizadores da Plataforma, utilizar a Plataforma para insultar, ofender, ameaçar e/ou agredir Terceiros, nomeadamente, Utilizadores Cliente, Estabelecimentos Comerciais, outros Estafetas e pessoal da GLOVO.

2. (b) Violar a lei ou quaisquer outras disposições dos Termos e Condições Gerais ou outras políticas da GLOVO.

3. (c) Participar em atos ou conduta violentos.

4. (d) Violar os seus direitos na aplicação da GLOVO, causando danos materiais e/ou imateriais a outro Utilizador da plataforma (Estafetas, Utilizadores Cliente e/ou Estabelecimentos Comerciais).

5. (e) Na prevenção de ações fraudulentas, se a identidade do Utilizador da Plataforma e/ou dos seus substitutos ou subcontratantes não puder ser verificada e/ou qualquer informação prestada por si e/ou os seus substitutos ou subcontratantes estiver incorreta.

6. (f) A fim de prevenir a segurança de todos os Utilizadores da Plataforma em caso de violação da Política de Mercadorias, sujeito ao seguinte:














Caso não cumpra qualquer um dos presentes Termos e Condições, a GLOVO pode desativar a sua Conta, sem prejuízo de qualquer ação legal/ação que possa resultar de crimes, violações ou danos civis que possam ter sido causados.

5.3 Rendimentos

5.3.1 Faturação e Pagamentos

O processamento dos pagamentos estará sujeito a todas as condições do Processador de Pagamento, às condições e políticas de privacidade e deverá ter sua própria conta individual ou comercial, dependendo do país em questão, junto do Processador de Pagamento.

A GLOVO, através de um processador de pagamento, conectar-se-á e atuará como um intermediário nos pagamentos entre Utilizadores Cliente, Estabelecimentos Comerciais e Estafetas (ou empresa de serviços de logística conexa).

Aceita e concorda que, dependendo da regulamentação local aplicável, bem como da forma na qual se conecta à Plataforma (diretamente ou através de uma empresa de serviços de logística), os serviços que oferece podem e terão de ser faturados ou refaturados ao Cliente Utilizador e/ou ao Estabelecimento Comercial, que em última instância paga o preço dos serviços por si oferecidos.

Aceita que a taxa pelos serviços que pagará à GLOVO inclui, se autorizado por si e conforme apropriado de acordo com a legislação local do seu país, bem como da forma como se conecta à Plataforma (diretamente ou através de uma empresa de serviços de logística), a gestão e intermediação da faturação correspondente aos seus serviços. Neste caso, estas faturas serão consideradas aceites caso a Glovo não receba qualquer comunicação da sua parte no prazo de 5 dias a contar da emissão das faturas.

O Estafeta reconhece e concorda que a GLOVO, em conformidade com o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS), pode proceder a uma revisão periódica dos pagamentos que lhe são efetuados. Tal revisão pode resultar na retenção do imposto sobre o rendimento caso o limite, em conformidade com o disposto no Artigo 53 do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado e no Artigo 101 do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS), seja ultrapassado.

O Estafeta reconhece e aceita a sua responsabilidade pelo dinheiro que lhe foi entregue pelos Utilizadores Cliente e que é propriedade dos Estabelecimentos Comerciais. Neste sentido, aceita que, consoante apropriado à forma como se conecta à Plataforma, o preço que lhe foi pago pelo serviço pelo Estabelecimento Comercial inclui o serviço de recolha do dinheiro que tem de ser entregue ao referido Estabelecimento Comercial.

5.3.2 Pagamento e Taxas da GLOVO

Aceita que a sua utilização dos Serviços GLOVO tem um custo associado para os serviços ou produtos que recebe («Encargos»). A GLOVO pode cobrar a seu exclusivo critério uma taxa padrão, uma taxa adicional ou um ajustamento aplicável pela utilização da Plataforma e os custos de ativar o Perfil da sua Conta.

A taxa que tem de pagar corresponderá à utilização dos serviços contratados por si através da Plataforma, ou aos eventuais produtos/bens que pode adquirir através da mesma. Para que conste, a utilização dos serviços e os produtos podem ser momentânea ou definitivamente suspensos ou desativados na Plataforma, dependendo do país a partir do qual se conecta.

A GLOVO reserva-se o direito de adotar as medidas judiciais e extrajudiciais que considere apropriadas para obter o pagamento dos montantes em dívida.

A GLOVO reserva-se o direito de modificar, alterar, aumentar ou cancelar as taxas atuais em qualquer altura notificando os Utilizadores da sua Plataforma. Além disso, a GLOVO pode temporariamente modificar a Taxa e a Política e as taxas dos seus Serviços em resultado de promoções ou descontos. Estas modificações produzem efeitos quando a promoção é tornada pública ou o Utilizador beneficiário é notificado.

Todas as Taxas para Produtos e/ou Serviços contratados à GLOVO serão cobradas imediatamente em conformidade com o método de pagamento permitido no seu país e o método preferencial indicado na sua Conta e disponibilizado aos Serviços GLOVO. Quando carregado, a GLOVO enviar-lhe-á um recibo por e-mail. O pagamento também pode ser efetuado mediante a compensação de faturas pendentes entre as partes.

Se o método de pagamento da sua conta principal for considerado expirado, inválido ou indisponível para a cobrança, a GLOVO irá contactá-lo e/ou providenciar outros métodos de pagamento aplicáveis à sua Conta.

A GLOVO envidará esforços razoáveis para o informar sobre quaisquer encargos aplicáveis.

A GLOVO pode ocasionalmente eliminar e/ou rever quaisquer taxas, ofertas e/ou descontos aplicáveis a todos os Utilizadores da Plataforma, você incluído. A GLOVO pode aplicar taxas de Serviço ou outras taxas previamente anunciadas nas redes sociais aplicáveis, salvo se a GLOVO não a aplicar na sua região, caso no qual não lhe serão cobradas.

A forma de cobrança dos Encargos irá sempre depender da forma na qual se conecta à Plataforma, diretamente ou através de uma empresa de serviços de logística.

5.4 Segurança dos Serviços e da Plataforma da GLOVO

5.4.1 Em certos casos, por uma questão de prevenção de fraudes, poderá ter de apresentar prova da sua identidade e/ou, se aplicável nos termos da legislação local, dos seus substitutos ou subcontratantes para aceder ou utilizar os Serviços e aceita que lhe pode ser negado acesso aos Serviços e à utilização dos mesmos se você ou os seus substitutos ou subcontratantes recusarem fornecer essa prova de identidade. A GLOVO pode também recorrer a terceiros fornecedores de serviços para efeitos de verificar a sua identidade ou a dos seus substitutos ou subcontratantes.

(…)

5.5 Definição do preço por serviço

5.5.1 Você pode determinar e escolher o preço dos seus serviços através da Plataforma GLOVO. A GLOVO, para fins informativos, com base em informações de mercado, irá sugerir um preço de mercado que poderá ser alterado diariamente pelo Estafeta através do seu Perfil de Utilizador, sem que isso implique garantias de adjudicação do serviço.

5.5.2 Caso seja identificado que o preço por serviço tenha sido alterado de maneira fraudulenta ou através do uso de erros e bugs do sistema, a GLOVO reserva-se o direito de tomar as medidas necessárias.

5.6 LIMITAÇÕES e Exoneração de responsabilidade da GLOVO

5.6.1 Exoneração de responsabilidade

(…)

5.6.3 Os presentes Termos e Condições não criam qualquer parceria, franquia ou vínculo laboral entre si e a GLOVO. Reconhece e aceita que a GLOVO não é parte em nenhuma transação e não tem qualquer controlo sobre a qualidade, segurança ou legalidade dos serviços oferecidos pelo Estafeta e/ou os produtos e serviços publicitados pelos Estabelecimentos Comerciais e/ou pela capacidade de os Utilizadores Cliente celebrarem contratos. A GLOVO não pode garantir que algum dos seus Utilizadores irá realizar uma transação. A GLOVO não garante a veracidade da publicidade de terceiros que aparece no sítio Web e não será responsável por qualquer correspondência ou contrato trocados ou celebrados entre os Utilizadores e esses terceiros e outros Utilizadores.

(…)

9.º Política de Proteção de Dados

(…)

9.3 Geolocalização

Ao utilizar a aplicação fornecida pela GLOVO para a execução da relação e, portanto, para exercer a atividade, a GLOVO pode receber os dados de geolocalização do Estafeta caso o mesmo tenha ativado esta função diretamente no seu telemóvel.

A GLOVO usará os Dados obtidos para prestar os Serviços ao Estafeta e partilhá-los com o Utilizador Cliente e o Estabelecimento Comercial cujo pedido o Estafeta aceitou executar, para que o Utilizador Cliente e o Estabelecimento Comercial possam contactar o Estafeta no caso de algum incidente.

É expressamente indicado que o Estafeta tem total liberdade de decisão em relação ao itinerário e/ou percursos escolhidos para a oferta e especificação dos seus serviços e em nenhum caso a Glovo utilizará esses dados para fins de controlo.

9.4 Finalidade e base jurídica do tratamento

Os Dados serão tratados exclusivamente para cumprir a relação estabelecida e, nomeadamente:

(…)


(…)

ANEXO I

CONTRATO DE TRATAMENTO DE DADOS PARA ENTREGA DOS PEDIDOS

Conforme estipulado na cláusula 9 dos Termos e Condições, o Estafeta é o Responsável pelo Tratamento de Clientes e Estabelecimentos Comerciais com quem gere um pedido, atuando neste caso a GLOVO como Gestor de Tratamento em nome do Estafeta.

A fim de cumprir cabalmente o disposto no artigo 28.º do Regulamento (UE) 2016/679 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de abril de 2016, relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados e que revoga a Diretiva 95/46/CE (Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados), Glovoapp Portugal Unipessoal LDA (adiante designado por «RESPONSÁVEL» OU «GLOVO») e a Você (adiante designada por «SUBCONTRATANTE» ou «ESTAFETA») formaliza este Contrato de Proteção de Dados (adiante designado por «CPD») sujeito ao seguinte:

(…)

ANEXO II

TERMOS E CONDIÇÕES DE SUBCONTRATAÇÃO E SUBSTITUIÇÃO

O Utilizador da Conta (doravante, o "Utilizador") não pode ceder ou subcontratar, total ou parcialmente, os direitos e obrigações decorrentes do uso da Plataforma sem comunicação prévia por escrito à GLOVO.

Para o efeito, o Utilizador informará a GLOVO, por escrito, e antes da celebração de qualquer acordo de subcontratação, da sua intenção de subcontratar a sua conta, a identidade da pessoa com quem irá subcontratar, juntamente com a sua autorização de prestação de serviços e fotografia, para que a GLOVO tenha prova do subcontrato, sem que tal notificação implique qualquer assunção de responsabilidade por parte da GLOVO. O Utilizador assegura a idoneidade do subcontratado e a garantia do resultado dos serviços por ele prestados a terceiros.

A fim de proteger a integridade do uso da Plataforma, a GLOVO reserva o direito de rejeitar a possível subcontratação de utilizadores que tenham sido previamente desativados na Plataforma por motivos técnicos ou relacionados com fraudes.

Em qualquer caso, o Utilizador deve estar registado nos registos correspondentes e estar autorizado a prestar os serviços ou atividades sujeitas à subcontratação. O Utilizador será responsável por todas as obrigações e encargos fiscais e de Segurança Social aplicáveis à prestação dos seus serviços, quer pelos seus próprios meios, quer através de subcontratados, sem que a GLOVO tenha qualquer responsabilidade por infrações a este respeito. O Utilizador será exclusivamente responsável por garantir que os subcontratantes ou substitutos cumpram sempre a legislação local no âmbito da prestação dos serviços de entrega

A GLOVO não intervém na relação contratual estabelecida entre o Utilizador e os seus subcontratados e/ou substituto(s), pelo que o Utilizador será o único responsável, por sua conta e risco, que a modalidade contratual escolhida seja a ideal e que o contrato seja celebrado respeitando as disposições legais e de boa-fé, não sendo necessário que o Utilizador ou os seus subcontratados e/ou substituto(s) apresentem qualquer documentação a este respeito à Glovo.

A subcontratação será realizada através da utilização de uma única Conta detida pelo Utilizador. Através da possibilidade de substituição, o Utilizador nomeia substitutos que poderão realizar a prestação de serviços em seu nome, podendo a Conta ser utilizada por apenas uma pessoa de cada vez e ao mesmo tempo.

O Utilizador será responsável pelas violações dos Termos e Condições da Plataforma por parte da(s) pessoa(s) subcontratada(s), bem como pela correta utilização da plataforma.

Os atos, erros e/ou violações dos Termos e Condições da Plataforma por parte de qualquer subcontratado e/ou substituto não serão atribuíveis, em caso algum, à GLOVO, que poderá redirecionar a responsabilidade ao Utilizador caso alguma violação por parte do Utilizador ou subcontratado lhe for imputada. O Utilizador será responsável pelas obrigações dos subcontratados, mesmo no caso de notificação à GLOVO. Da mesma forma, o Utilizador isentará a GLOVO de quaisquer danos que a GLOVO possa sofrer direta ou indiretamente devido às ações dos referidos subcontratados.

Os valores provenientes da prestação dos serviços executados pelos subcontratados, pagos pelos clientes e estabelecimentos, utilizadores da Plataforma, serão transferidos para o Utilizador, assumindo este a responsabilidade de gerir o pagamento dos referidos valores junto da(s) pessoa(s) subcontratada(s).

(…)

O Utilizador será o único responsável pelo pagamento da taxa de utilização da plataforma da conta.

Caso o Utilizador decida cessar a sua relação com a(s) pessoa(s) subcontratada(s) e/ou substituta(s), deverá comunicar a GLOVO por escrito, isentando a GLOVO de qualquer responsabilidade que lhe possa ser imputada, em relação à falta de comunicação.

(…)

9. Cada um dos estafetas teve, ainda, de aceitar a “Política de Privacidade e de Proteção de Dados”, a “Política de Cookies”, “Normas de Ética” e “Conduta Empresarial para Terceiros da Glovo”, bem como todas as “políticas” aplicáveis à Comunidade Glovo;

10. Além da criação da conta e do registo, cada estafeta teve de transferir e aprender a utilizar a Aplicação (Glovo Couriers), bem como adquirir uma mochila térmica apta para o transporte de alimentos;

11. Embora, num momento inicial, a Ré impusesse a aquisição, na loja online, de uma mochila térmica com o logotipo GLOVO, essa exigência deixou de se verificar a partir de data não concretamente apurada, embora a mochila seja necessária para facilitar o transporte e, por razões de higiene e segurança alimentar, deva ser apta para o transporte de alimentos;

12. Atualmente os estafetas podem utilizar uma mochila sem marca ou mesmo com o logotipo de plataformas concorrentes;

13. As mochilas com a marca “GLOVO” estão disponíveis para venda a qualquer pessoa;

14. Cumpridas as etapas referidas e uma vez ativada a conta, cada um dos indivíduos, sempre que pretende iniciar a sua atividade, acede à sua conta na aplicação Glovo Couriers, através do nome por si escolhido, bem como do respetivo código de segurança e aciona o botão de disponibilidade para poder receber pedidos de entregas;

15. Cada um dos indivíduos referidos desenvolve a sua atividade de entregador/estafeta em zonas por si previamente escolhidas, que podem alterar mediante comunicação à Ré, a saber:

a) AA, na zona de Tomar;

b) BB, na zona de Torres Novas;

c) CC, na zona de Entroncamento, Torres Novas, Vila Nova da Barquinha e Golegã;

d) DD, na zona de Torres Novas e áreas limítrofes;

e) EE, na zona de Fátima e Ourém;

f) FF, na zona de Torres Novas;

g) GG, na zona de Torres Novas;

16. A remuneração (tarifa) que cada um dos estafetas aufere é composta por três componentes, a saber:

a) taxa de entrega definida pela Ré;

b) distância entre o ponto de recolha e o ponto de entrega que o cliente selecionar ao efetuar uma encomenda na Plataforma (num trajeto previamente definido), sendo o valor por quilómetro definido pela Ré;

c) um incremento definido de acordo com a “política comercial” da Ré em determinado momento, de acordo com fatores como condições meteorológicas adversas, feriados, períodos de maior ou menor procura, etc.;

17. Uma vez por dia, o valor (somatório) dos componentes referidos pode ser alterado pelo estafeta através da aplicação de um fator (“multiplicador”) que anteriormente variava entre 0,90 (mínimo) e 1,10 (máximo) e atualmente varia entre 1 (mínimo) e 1,10 (máximo), passando os pedidos de entrega recebidos a ser condicionados pelo novo valor;

18. O estafeta conhece o valor que poderá receber com a concretização da entrega no momento em que o pedido surge na aplicação (valor sugerido), decidindo nesse momento se o aceita, rejeita ou ignora;

19. A prestação da atividade é paga pela Ré, quinzenalmente, por transferência para a conta bancária cujo IBAN o estafeta lhe indicou ab initio;

20. A partir do momento em que o estafeta faz login na aplicação, a plataforma fica a saber qual é a sua localização, através do sistema de geolocalização instalado no telemóvel (GPS), sendo este conhecimento indispensável para atribuição dos pedidos;

21. O único momento em que a geolocalização deve estar ativa é quando o pedido é efetuado e sugerido ao estafeta;

22. Após a aceitação do pedido e durante toda a respetiva execução, a geolocalização pode ser desativada pelo estafeta;

23. Se o estafeta mantiver a geolocalização ligada, o tempo de entrega do pedido e o percurso efetuado podem ser visualizados em tempo real pela Plataforma e pelo cliente, que pode acompanhar o processo;

24. O estafeta é livre de escolher o meio de transporte e o percurso a seguir até ao local de entrega do pedido, de acordo com os seus critérios de eficiência e produtividade;

25. A plataforma usa um sistema de reconhecimento facial para controlar a identidade do estafeta e impedir que ele se faça substituir, no exercício da atividade, por pessoa não autorizada a desenvolver a atividade de estafeta na plataforma;

26. Os pedidos de entrega decorrem de compras efetuadas a comerciantes utilizadores da plataforma, por clientes utilizadores da mesma, surgindo na aplicação móvel segundo um critério não concretamente apurado, podendo o estafeta aceitar, ignorar ou rejeitar os mesmos, rejeição esta que pode suceder mesmo após uma anterior aceitação;

27. Por orientação da Ré, quando o estafeta chega ao local indicado para a entrega e o cliente aí não se encontra, tem de aguardar 10 minutos e dar nota desse facto ao suporte;

28. O cliente final paga o preço fixado na plataforma, podendo fazê-lo em numerário;

29. Quando o estafeta atinge determinados valores recebidos em numerário, a Ré notifica-o para, em 24 horas, os depositar numa conta bancária indicada, sob pena de bloqueio temporário da conta até concretização do depósito;

30. Cada um dos estafetas referidos desenvolve a sua atividade na Plataforma deste as seguintes datas:

a) AA, desde 7 de junho de 2022, usando, igualmente a aplicação UBER;

b) BB, desde 7 de junho de 2022, usando igualmente a aplicação UBER;

c) CC, desde 6 de junho de 2023;

d) DD, desde junho de 2022, tendo deixado de exercer a atividade em 18 de outubro de 2023;

e) EE, desde dezembro de 2022;

f) FF, entre agosto e outubro de 2023;

g) GG, desde abril de 2023;

31. Pela sua configuração e implantação territorial, a plataforma explorada pela Ré permite aos utilizadores o acesso a uma economia de escala, com mais pedidos e mais utilizadores, de forma mais rápida e conveniente;

32. A Ré recebe de cada um dos utilizadores da plataforma uma taxa de acesso e utilização da plataforma, que é condição de uso da mesma e dos serviços que proporciona, a saber:


a) Os estabelecimentos comerciais pagam a "Taxa de Parceria";


b) Os estafetas pagam quinzenalmente a "Taxa de Plataforma";


c) Os clientes finais pagam a "Taxa de Serviço".

33. A Ré transfere para o estafeta a totalidade do montante pago, pelo cliente final, pelo serviço de entrega;

34. Frequentemente, os estabelecimentos comerciais, apesar de receberem pedidos através plataforma, optam por recorrer a serviços de entrega próprios, sem se conectar via aplicação com os estafetas utilizadores da plataforma;

35. Frequentemente, os clientes finais solicitam os estafetas, sem efetuar qualquer aquisição junto dos estabelecimentos comerciais utilizadores da plataforma;

36. Frequentemente, o cliente final pode, através da plataforma, dirigir pedidos aos estabelecimentos comerciais e usar a opção "take away", sem fazer qualquer uso dos estafetas registados na plataforma;

37. Frequentemente, os estafetas aceitam e executam os pedidos provenientes de outras plataformas, ou subcontratam os seus serviços a outros estafetas, sem alterar os termos da relação com os utilizadores estabelecimentos comerciais e a plataforma;

38. É o estafeta que, sem restrições, define o tempo durante o qual se pretende manter ligado à aplicação, disponível para receber pedidos de entrega;

39. As características do pedido são determinadas pelo cliente;

40. O estafeta pode receber uma gratificação/gorjeta do cliente;

41. O estafeta tem liberdade para trabalhar com várias plataformas distintas;

42. Os clientes finais têm a possibilidade de dar um “feedback qualitativo” sobre a prestação do estafeta e também sobre o restaurante ou estabelecimento comercial, informação que está acessível aos mesmos, mas sem influência na oferta de novos pedidos de entrega ou na livre utilização da plataforma;

43. A plataforma inclui uma ferramenta de comunicação com os utilizadores, facilitando dessa forma o contacto;

44. O estafeta pode livremente escolher o horário em que pretende desempenhar as suas funções, estando a sua atividade apenas limitada à oferta dos estabelecimentos comerciais e dos pedidos dos clientes finais;

45. Concretamente, relativamente aos estafetas identificados, os mesmos estiveram alguns períodos sem se ligar à Plataforma, sem ter pedido autorização ou informado a Ré e sem que as respetivas contas tenhas sido desativadas, designadamente:

a) No caso do estafeta AA: entre 24-3-2023 e 25-4-2023 (33 dias seguidos); entre 28-4-2023 e 9-5-2023 (12 dias seguidos); entre 19-6-2023 e 22-7-2023 (34 dias seguidos); entre 8-8-2023 e 7-9-2023 (31 dias seguidos), entre 17-9-2023 e 05-10-2023 (19 dias seguidos) ou entre 25-5-2024 e 2-8-2024 (70 dias seguidos);

b) No caso do estafeta BB: entre 3-9-2022 e 22-0-2022 (10 dias seguidos); entre 24-9-2022 e 20-10-2022 (27 dias seguidos); entre 22-01-2023 e 8-2-2023 (18 dias seguidos) ou entre 1-5-2024 e 30-5-2024 (30 dias seguidos);

c) No caso do estafeta CC: entre 26-11-2023 e 7-12-2023 (12 dias seguidos) e entre 9-8-2023 e 20-8-2024 (256 dias seguidos);

d) No caso do estafeta DD: entre 21-10-2022 e 2-01-2023 (74 dias seguidos); entre 2-7-2023 e 14-7-2023 (13 dias seguidos) ou entre 20-9-2023 e 6-10-2023 (17 dias seguidos);

e) No caso do estafeta EE: entre 9-01-2024 e 28-01-2024 (20 dias seguidos); entre 9-4-2024 e 19-4-2024 (11 dias seguidos);

f) No caso do estafeta FF: entre 8-9-2023 e 19-09-2023 (12 dias seguidos); ou entre 31-08-2023 e 6-9-2023 (7 dias seguidos), não tendo feito mais entregas a partir de 26 de outubro de 2023;

g) No caso do estafeta GG: entre 22-4-2024 e 1-7-2024 (71 dias seguidos), não tendo feito mais entregas a partir de 3 de julho de 2024;

46. Os estafetas podem recorrer a subcontratados, tendo apenas de o comunicar à Ré, por razões de segurança;

47. Os principais equipamentos da atividade dos estafetas são o veículo, o telemóvel e a mochila, todos propriedade daqueles e que são, também, responsáveis pela sua manutenção e reparação.


-


E considerou que não se provaram os seguintes factos:

a. Que a Ré seja dona da Aplicação Informática;

b. Que aquando do recebimento do pedido de entrega e antes de o aceitar, ao estafeta seja dada a conhecer a identificação do cliente final;

c. Que, aquando da inscrição, os estafetas sejam obrigados a mostrar o veículo em que se farão transportar;

d. Que, atualmente, a Ré exija uma mochila térmica com o logotipo GLOVO;

e. Que os estafetas não possam alterar a zona de atividade/entregas sem o consentimento da Ré;

f. Que o estafeta só saiba quanto vai receber relativamente a cada pedido, no momento em que o aceita na plataforma;

g. Que a escolha do fator (“multiplicador”) máximo implique, necessariamente, o recebimento de menos pedidos de entrega;

h. Que a Ré/plataforma verifique a qualidade da atividade prestada pelo estafeta através do “sistema de reputação” onde os utilizadores avaliam as entregas;

i. Que a plataforma possa gravar as chamadas efetuadas pelos estafetas;

j. Que a aplicação da Ré tenha um horário de funcionamento;

k. Que o estafeta não possa ter clientes próprios fora da plataforma ou uma organização empresarial própria;

l. Que os valores entregues pelo cliente ao estafeta pertençam à Ré;

m. Que AA trabalhe com a Plataforma GLOVO desde dezembro de 2021;

n. Que BB trabalhe com a Plataforma Glovo desde outubro de 2021;

o. Que EE labore exclusivamente com a Plataforma GLOVO, seis dias por semana e sete a oito horas por dia;

p. Que FF exerça atividade de estafeta a tempo inteiro;

q. Que GG labore exclusivamente com a Plataforma GLOVO a tempo inteiro;

r. Que até 30 de novembro de 2023 o estafeta BB tenha estado 275 dias sem se ligar à Plataforma e que só em janeiro e fevereiro de 2023 tenha estado 49 dias sem prestar atividade;

s. Que o estafeta CC não tenha tido atividade durante 21 dias em novembro após ter iniciado atividade;

t. Que o estafeta DD não tenha tido atividade durante 235 dias, num total de 475 dias de calendário.


*


IV. Conhecimento do recurso de apelação


Conforme já mencionámos, importa analisar e decidir se o tribunal a quo errou ao não qualificar as relações jurídicas que se apreciam nos autos como contrato de trabalho.


Argumenta o recorrente que aos casos sub judice se aplica o artigo 12.º-A do Código do Trabalho e que se mostram preenchidas todas as alíneas do n.º 1 deste artigo, não tendo sido ilidida a presunção.


Importa, então, começar por analisar se a presunção estabelecida no artigo 12.º-A se aplica a todas as relações contratuais sob apreciação, nomeadamente às que tiveram o seu início antes da entrada em vigor deste artigo, ou seja, anteriormente a 01-05-2023.


Esta questão foi apreciada pelo Supremo Tribunal de Justiça em acórdão decidido em 15-05-2025 (Proc. n.º 1980/23.3T8CTB.C2.S1), retificado por acórdão de 18-06-2025.3


Escreveu-se neste aresto:


«Relativamente a relações jurídicas iniciadas antes da entrada em vigor do art. 12.º-A, do Código do Trabalho, a presunção de contrato de trabalho no âmbito de plataforma digital é aplicável aos factos enquadráveis nas diferentes alíneas do seu nº 1 que, no âmbito dessas relações jurídicas, tenham sido praticados posteriormente àquele momento (01.05.2023).»


Mais se explicou:


«Encontrando-se em causa relações jurídicas duradouras (como acontece nas situações reportadas nos autos), nada obsta, e tudo aconselha, a que aos diferentes factos praticados em execução do conjunto de cada programa contratual sejam aplicáveis as normas concernentes a presunções de laboralidade que estejam em vigor à data da respetiva produção.


Com efeito, se com a presunção de laboralidade apenas se visa facilitar a qualificação jurídica das situações de fronteira entre o trabalho autónomo e o trabalho subordinado, e sabido que com ela não se produz qualquer alteração dos princípios relativos à distribuição da prova, mas (com base em imperativos de verdade/justiça material e de combate à dissimulação do contrato de trabalho e à precariedade) o mero aligeiramento do ónus que sobre o trabalhador impende neste âmbito, não se vislumbram quaisquer razões de segurança/estabilidade jurídica – e muito menos de salvaguarda de eventuais direitos adquiridos ou de proteção da confiança – que determinantemente imponham diversa solução.


Nas palavras de Monteiro Fernandes, “afigura-se difícil aceitar que um instrumento destinado a potenciar as probabilidades de [a] verdade material ser captada e juridicamente enquadrada possa constituir fator de desequilíbrio no desenvolvimento de qualquer litígio em que essa qualificação esteja em causa”. É certo que, nesta matéria, o Supremo Tribunal de Justiça tem limitado a aplicação da lei nova aos casos em que, após o início da sua vigência, o vínculo obrigacional estabelecido entre as partes se vai reconfigurando ao longo do tempo.


Mas, no plano da ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho, não se vê que ao autor seja de exigir prova positiva dessa reconfiguração, em especial em casos – como paradigmaticamente acontece nas plataformas digitais – em que, pelas próprias especificidades inerentes à atividade prestada, esta tem naturalmente associados elevados grau de heterogeneidade, atipicidade, aleatoriedade e fluidez [como de forma lapidar evidenciam os “Considerandos” da aludida Diretiva (UE) 2024/2831] que implicam a sua sucessiva reconstrução. Tudo para concluir que, relativamente a relações jurídicas iniciadas antes da entrada em vigor do art. 12.º-A, do CT, a presunção de contrato de trabalho no âmbito de plataforma digital é aplicável aos factos enquadráveis nas diferentes alíneas do seu nº 1 que, no âmbito dessas relações jurídicas, tenham sido praticados posteriormente àquele momento (01.05.2023).»


No mesmo sentido se pronunciaram os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 17-09-2025 (Processos n.º 1914/23.5T8TMR.E2.S1 e n.º 31164/23.4T8LSB.L1.S1)).4


Ora, à luz deste entendimento, resta-nos concluir que o artigo 12.º-A do Código do Trabalho é aplicável aos casos dos autos relativamente aos atos praticados posteriormente a 01-05-2023.5


Dispõe o n.º 1 do artigo 12.º-A:


«1 - Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, presume-se a existência de contrato de trabalho quando, na relação entre o prestador de atividade e a plataforma digital se verifiquem algumas das seguintes características:


a) A plataforma digital fixa a retribuição para o trabalho efetuado na plataforma ou estabelece limites máximos e mínimos para aquela;


b) A plataforma digital exerce o poder de direção e determina regras específicas, nomeadamente quanto à forma de apresentação do prestador de atividade, à sua conduta perante o utilizador do serviço ou à prestação da atividade;


c) A plataforma digital controla e supervisiona a prestação da atividade, incluindo em tempo real, ou verifica a qualidade da atividade prestada, nomeadamente através de meios eletrónicos ou de gestão algorítmica;


d) A plataforma digital restringe a autonomia do prestador de atividade quanto à organização do trabalho, especialmente quanto à escolha do horário de trabalho ou dos períodos de ausência, à possibilidade de aceitar ou recusar tarefas, à utilização de subcontratados ou substitutos, através da aplicação de sanções, à escolha dos clientes ou de prestar atividade a terceiros via plataforma;


e) A plataforma digital exerce poderes laborais sobre o prestador de atividade, nomeadamente o poder disciplinar, incluindo a exclusão de futuras atividades na plataforma através de desativação da conta;


f) Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertencem à plataforma digital ou são por esta explorados através de contrato de locação.»


Resulta da citada norma que se presume a existência de um contrato de trabalho quando, na relação entre o prestador da atividade e a plataforma digital, se verifiquem algumas (ou seja, pelo menos duas) das características indicadas nas suas diversas alíneas.


Passemos, assim, à análise dos factos concretos, a fim de apreciar o eventual preenchimento das aludidas características.


A plataforma digital fixa a retribuição para o trabalho efetuado na plataforma ou estabelece limites máximos e mínimos para aquela – alínea a) do n.º 1 do artigo 12.º-A.


Neste âmbito, há considerar a factualidade demonstrada nos pontos 16 e 17.


Resulta da mesma que o valor pago pela Ré ao estafeta é integralmente definido pela Ré, pois é esta quem determina a taxa de entrega, o incremento que tem em conta diversas circunstâncias (como condições meteorológicas, horário de entrega, feriados, etc.) e o custo por quilómetro.


Repare-se que mesmo o “multiplicador” que pode ser aplicado pelo estafeta é previamente fixado pela Ré.


Atenta esta factualidade, não temos dúvidas que é a Ré quem fixa a retribuição do estafeta.


Como tal, consideramos preenchida a característica prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 12.º-A.


A plataforma digital exerce o poder de direção e determina regras específicas, nomeadamente quanto à forma de apresentação do prestador de atividade, à sua conduta perante o utilizador do serviço ou à prestação da atividade – alínea b) do n.º 1 do artigo 12.º-A.


Em relação a esta alínea, no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17-09-2025 (Proc. 1914/23.5T8TMR.E2.S1), escreveu-se: «Quanto à alínea b), uma vez que, rigorosamente, o poder de direção é um elemento essencial do contrato de trabalho (…), e não um indício de subordinação, limitar-nos-emos a aferir se a ré determina regras específicas ao estafeta (nomeadamente, as elencadas nesta alínea).»


Seguiremos esta linha de raciocínio.


Para o efeito, releva a factualidade provada nos pontos 4 a 12, 25 e 27.


Dela decorre que, para o exercício da atividade, o estafeta tem de preencher requisitos que são estabelecidos pela Ré (ponto 8); tem de se registar na Plataforma seguindo os procedimentos padronizados instituídos pela Ré (pontos 7 a 10 ); tem de usar, por imposição da Ré, uma mochila térmica (pontos 10 a 12); e fica sujeito às regras quanto ao reconhecimento facial determinadas pela Ré (ponto 25) e ao tempo de espera imposto pela Ré, no caso de se verificar a ausência do cliente no local de entrega (ponto 27).


O apurado revela, pois, que a Ré determina ao estafeta regras especificas para o desenvolvimento da atividade.


Além disso, os locais de recolha e de entrega são sempre determinados pela Ré.


Por conseguinte, considera-se preenchida a alínea b) do n.º 1 do artigo 12.º-A.


A plataforma digital controla e supervisiona a prestação da atividade, incluindo em tempo real, ou verifica a qualidade da atividade prestada, nomeadamente através de meios eletrónicos ou de gestão algorítmica -alínea c) do n.º 1 do artigo 12.º-A.


Para a circunstância mencionada relevam os factos descritos nos pontos 20, 23 e 25.


Deste contexto, destaca-se que a partir do momento em que o estafeta faz login na App, a Ré fica a saber, em tempo real, a sua localização. Ademais, com o sistema de geolocalização ligado, o tempo de entrega dos pedidos e o percurso efetuado podem ser controlados em tempo real pela Ré.


Por outro lado, através do reconhecimento facial em vigor, a Ré controla a identidade do estafeta.


Enfim, através da App e do GPS nela integrado, a Ré tem acesso imediato e instantâneo à prestação profissional do estafeta.


Dito de outro modo, a Ré pode controlar e supervisionar em tempo real a atividade prestada.


Tanto basta para que se considere preenchida a circunstância da alínea c) do artigo 12.º-A.


A plataforma digital restringe a autonomia do prestador de atividade quanto à organização do trabalho, especialmente quanto à escolha do horário de trabalho ou dos períodos de ausência, à possibilidade de aceitar ou recusar tarefas, à utilização de subcontratados ou substitutos, através da aplicação de sanções, à escolha dos clientes ou de prestar atividade a terceiros via plataforma – alínea d) do n.º 1 do artigo 12.º-A.


Relativamente a esta circunstância, afigura-se-nos que os factos relatados nos pontos 18, 26, 37, 38, 41 e 44 a 46, evidenciam que a Ré não impõe restrições à autonomia do estafeta no que respeita à definição do seu horário de trabalho e períodos de indisponibilidade, à faculdade de aceitar ou recusar entregas, bem como à possibilidade de utilizar substitutos, ou prestar atividade para plataformas concorrentes.


Consequentemente, não consideramos preenchida a alínea d) do n.º 1 do artigo 12.º.


A plataforma digital exerce poderes laborais sobre o prestador de atividade, nomeadamente o poder disciplinar, incluindo a exclusão de futuras atividades na plataforma através de desativação da conta – alínea e) do n.º1 do artigo 12.º- A.


A redação desta alínea não é muito clara e suscita dúvidas de interpretação, sobretudo porque se fala genericamente em “poderes laborais” e, depois, menciona-se especificamente “o poder disciplinar”, integrando-se como uma expressão do exercício deste poder a situação em que a plataforma digital exclui de futuras atividades o prestador de atividade, através de desativação da conta.


Ora, ainda que sejam vários os poderes característicos do empregador - poder de direção, regulamentar e disciplinar-, afigura-se-nos que devemos interpretar esta alínea no sentido restritivo de estar apenas em apreciação o poder disciplinar, adaptado à realidade da plataforma digital.


Afinal, sobre o poder de direção já versa a alínea b) do n.º 1 do artigo 12.º-A, e, de certa forma, o poder regulamentar também aí surge aflorado pela referência à existência de regras específicas, nomeadamente quanto à forma de apresentação do prestador de atividade, à sua conduta perante o utilizador de serviço ou à prestação da atividade.


Foquemo-nos, por conseguinte, no poder disciplinar.


Como é sabido, este poder caracteriza-se como um poder punitivo do empregador, que visa atuar sobre condutas do trabalhador consideradas censuráveis no contexto da relação laboral estabelecida, e só pode ser exercido durante a pendência do contrato.


No vertente caso, provou-se que a cláusula 5.2 (“Restrições”) dos “Termos e Condições de Utilização da Plataforma” transcritos no ponto 8 do elenco dos factos provados, estipula que em caso de violação das obrigações assumidas pelo estafeta, a Ré pode desativar a conta, temporária ou permanentemente.


Acresce que se o estafeta atingir determinados valores recebidos em numerário e não os depositar no prazo indicado pela Ré, esta pode bloquear o acesso até à efetivação do depósito (ponto 29).


Existem, pois, determinados comportamentos do estafeta, que se consideram censuráveis no contexto da relação estabelecida, podendo a Ré, caso tais comportamentos se verifiquem, desativar definitivamente a conta ou restringir o seu acesso, impedindo, desta forma, o estafeta de exercer a atividade.


Tal faculdade consubstancia a existência de um poder punitivo.


Assim o entendeu o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28-05-2025 (Proc. n.º 29923/23.7T8LSB.L1.S1)6, num caso semelhante ao dos autos, também deduzido contra a ora Ré, no qual se escreveu:


«Independentemente da margem de liberdade reconhecida ao estafeta no exercício da sua atividade, é indiscutível que esta é desenvolvida num quadro de regras específicas definidas pela empresa (…), a qual – nos termos que tem por adequados e consentâneos com a prossecução do seu modelo de negócio – também controla e supervisiona a atuação da contraparte (…), tal como tem a possibilidade de exercer o poder disciplinar, mediante a suspensão ou desativação da respetiva conta (cfr. ponto 5.4.2. dos “Termos e Condições de Utilização da Plataforma GLOVO para Estafetas”, citado pela decisão recorrida e transcrito em supra nº 17).


Tudo a sugerir, pois, que, nesta medida, o estafeta em causa igualmente se encontrava sujeito à autoridade da R., cabendo aqui recordar que a subordinação pode ser meramente potencial, não sendo necessário que se traduza em atos de autoridade e direção efetiva, como aprofundadamente se referenciou em supra nº 11.


Argumenta o TRL que a possibilidade de a R. resolver o contrato e desativar a conta não permite concluir pela existência de um poder disciplinar, em virtude de o poder de resolução, em caso de violação de cláusula contratuais, ser “permitido” a qualquer contratante. É certo que em qualquer contrato as partes gozam do direito à respetiva resolução. Mas, no âmbito do contrato de trabalho, a resolução contratual em que se traduz o despedimento por justa causa, corporiza e pressupõe, precisamente, o exercício do poder disciplinar.»


Idêntico entendimento foi manifestado no acórdão de 17-09-2025 (Proc. n.º 1914/23.5T8TMR.E2.S1), deduzido contra uma plataforma concorrente da Ré.


Embora nesta Secção Social de Évora já tenham existido diferentes posições sobre esta matéria, afigura-se-nos, atualmente, que tendo em consideração a jurisprudência assumida pelo Supremo Tribunal de Justiça, bem como os fundamentais valores da segurança e certeza do Direito, a questão deve ser decidida nos mesmos termos.


E, assim sendo, face à factualidade provada, considera-se preenchida a alínea e) do n.º 1 do artigo 12.º-A do Código do Trabalho.


Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertencem à plataforma digital ou são por esta explorados através de contrato de locação – alínea f) do n.º 1 do artigo 12.º-A.


Neste âmbito, releva a factualidade assente nos pontos 2, 3, 10 a 12, 14 e 47.


Da mesma retira-se que, para o exercício da atividade, o estafeta utilizava um veículo, uma mochila térmica e um telemóvel, no qual tinha de instalar a App da Ré, através da qual se conectava e desconectava, recebia informações necessárias sobre os pedidos de entrega e realizava as interações indispensáveis.


Ora, no já identificado acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28-05-2025, sumariou-se, com importância, o seguinte:


«(...) também assume especial relevo a circunstância de pertencerem e serem geridas/exploradas pela R. a plataforma digital e aplicações a ela associadas (App), as quais – enquanto intermediário tecnológico no processo de transmissão dos dados relativos aos pedidos formulados pelo utilizador-cliente – são os instrumentos de trabalho essenciais do estafeta.»


Mais se mencionou, na fundamentação do aresto, que toda a atividade do estafeta «está condicionada pela efetiva ligação/conexão a estas ferramentas digitais».


Tudo indica que esta douta decisão parece pretender pôr fim, e traçar um rumo, sobre a divergência jurisprudencial – verificada nas 1.ª e 2.ª instâncias – a respeito de a App ser, ou não, um instrumento de trabalho essencial do estafeta.


O mesmo entendimento foi reiterado no acórdão de 17-09-2025 (Proc. n.º 1914/23.5T8TMR.E2.S1).


À vista disso, segue-se, atualmente, o decidido pelo Supremo Tribunal de Justiça.


Como tal, há que concluir que, no caso concreto, atenta a factualidade provada referente à utilização da App, se mostra preenchido a circunstância prevista na alínea f) do n.º 1 do artigo 12.º A.


Resumindo, com arrimo nos factos provados, mostram-se preenchidos os índices de laboralidade previstos nas alíneas a), b), c), e) e f) do artigo 12.º-A do Código do Trabalho.


Demonstrada, pois, a base da presunção de contrato de trabalho prevista no mencionado artigo, importa agora analisar se a Ré conseguiu ilidir a presunção.


A presunção de contrato de trabalho consagrada no artigo 12.º-A é uma presunção legal, que admite prova em contrário para a ilidir.


Esta possibilidade mostra-se expressamente prevista no n.º 4 do artigo, que estipula:


«A presunção prevista no n.º 1 pode ser ilidida nos termos gerais, nomeadamente se a plataforma digital fizer prova de que o prestador de atividade trabalha com efetiva autonomia, sem estar sujeito ao controlo, poder de direção e poder disciplinar de quem o contrata.»


Conforme se infere do douto acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça datado de 28-05-2025, a presunção pode ser afastada se a plataforma digital provar a existência de «”factos positivos excludentes da subordinação”, ou seja, da existência de trabalho autónomo ou da falta de qualquer elemento essencial do contrato de trabalho [elementos que, reafirma-se, à luz do art. 11º, do CT, são: i) obrigação de prestar uma atividade a outrem; ii) retribuição: e iii) subordinação jurídica].»


No caso que nos ocupa, como já dissemos, resultaram provados 5 dos indícios constantes do n.º 1 do artigo 12.º-A.


Alguns desses indícios referem-se a características fundamentais da relação laboral, como sejam a existência dos poderes de direção [alínea b)], de supervisão e controle [alínea c)] e disciplinar [alínea e)].


Vejamos, então, que factos resultaram apurados suscetíveis de contrariar a indiciada subordinação jurídica.


Neste âmbito, provou-se que os estafetas:


- tiveram de abrir atividade nas finanças (ponto 8);


- pagam à Ré uma taxa de acesso e utilização da plataforma, que é condição do uso da mesma e dos serviços que proporciona (ponto 32);


- desenvolvem a sua atividade em zonas que previamente escolheram e que podem alterar mediante comunicação à Ré (ponto 15);


- podem recusar, aceitar ou ignorar os pedidos apresentados na App (pontos 18 e 26);


- podem escolher o percurso que melhor lhes convier entre os locais de recolha e entrega do pedido, podendo, inclusive, desligar a geolocalização, sem quaisquer implicações na entrega (pontos 21, 22 e 24);


- são livres de escolher o meio de transporte que usam para executar a entrega, e, atualmente, a mochila térmica que usam (pontos 11, 12 e 24);


- uma vez por dia, podem selecionar e alterar o multiplicador do preço do serviço para valores compreendidos entre 1.0 e 1.10, auferindo, em consequência, um valor superior ao apresentado (ponto 17);


- podem trabalhar para terceiros, incluindo plataformas concorrentes (pontos 35, 37 e 41);


- ligam-se à App quando querem, nas horas que querem e durante o tempo que querem, podendo não se ligar à plataforma durante meses, sem consequências designadamente na distribuição futura de pedidos (pontos 38, 44 e 45);


- podem subcontratar terceiros tendo apenas que comunicar tal facto à Ré (pontos 37 e 46).


No conjunto desta factualidade, existem alguns aspetos que, aparentemente, revelam a existência de autonomia na prestação da atividade. Referimo-nos à possibilidade de o estafeta escolher a área em que exerce a função, à faculdade de ativar ou desativar a aplicação conforme a sua conveniência, à liberdade de decidir os serviços que quer realizar, bem como ao facto de não estar sujeito a qualquer tempo de disponibilidade.


Todavia, no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28-05-2025, que temos vindo a seguir pelas razões já explicadas, entendeu-se que tais aspetos, no âmbito de uma abordagem holística da relação contratual e tendo em consideração os fortes indícios de subordinação demonstrados - também no caso julgado neste acórdão estavam preenchidas as alíneas a), b), c) e) e f) do n.º 1 do artigo 12.º-A -, não assumem relevo decisivo para afastar que a relação estabelecida entre as partes não reveste natureza laboral.


Relativamente à possibilidade de os estafetas poderem trabalhar para terceiros, incluindo plataformas concorrentes, e de subcontratarem terceiros, tendo apenas de comunicar tal facto à plataforma digital, num recente acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça7, contra uma plataforma digital concorrente da ora Ré, mas em que a questão de facto era idêntica, foi decidido que a referida possibilidade sem concretização real não assume qualquer relevância.


Escreveu-se no aresto:


«Quanto aos pontos 748, 759e 8110 da matéria de facto, não se vê que assumam relevância, desde logo pois não se provou que o estafeta, apesar de o poder fazer, tivesse efetivamente a sua própria clientela ou que utilizasse plataformas concorrentes da ré, tal como não se provou que alguma vez se tenha feito substituir por alguém.


Com efeito, quanto ao modus operandi (abstratamente) alegado pelas plataformas que se revele mais típico de trabalho autónomo, impõe-se certificar se isso realmente acontece na prática (…).».


Seguimos, atualmente, este entendimento.


No caso dos autos, embora a Ré tenha demonstrado que os estafetas AA e BB usavam, igualmente, a aplicação UBER - cf. ponto 30, alíneas a) e b) -, tal factualidade é tão vaga e genérica que não assume importância para se aferir que estes estafetas desenvolviam, efetivamente, um verdadeiro trabalho autónomo.


Quanto aos demais estafetas, a Ré não logrou provar que os mesmos trabalhavam, efetivamente, para plataformas digitais concorrentes ou que subcontrataram terceiros, pelo que a potencialidade de tais situações perde relevância com vista à demonstração da existência de trabalho autónomo.


Quanto ao regime fiscal em vigor – tudo indica que os estafetas tiveram que iniciar atividade como trabalhadores independentes para se inscreverem na plataforma – , entendemos que, só por si, é uma realidade pouco significativa, por ser habitual em situações em que não se pretende assumir a existência de uma relação laboral, munindo-se a relação de aspetos formais que não correspondem às reais circunstâncias em que a mesma se desenvolve.11


Em relação ao pagamento de uma taxa de acesso e utilização da plataforma, embora se trate de uma realidade que não se coaduna com a natureza de uma relação de trabalho subordinado, o certo é que o Supremo Tribunal de Justiça desvalorizou este aspeto como representativo de autonomia.


No acórdão de 28-05-2025, escreveu-se:


«Não pode deixar de reconhecer-se que o facto de o estafeta pagar à R. uma taxa pela utilização da plataforma (nº 53 da factualidade assente) contrasta especialmente com a matriz típica de uma relação de trabalho subordinado.


Todavia, de forma alguma se pode conferir a este elemento, só por si, relevância decisiva, tanto mais que, como se sabe, o recurso a cláusulas contratuais com características de autonomia se encontra com frequência associado ao abuso do estatuto de trabalhador independente e às relações de trabalho encobertas, flagelo que com a presunção de laboralidade em apreço se visou, precisamente, combater.»


No que diz respeito à liberdade de escolha dos percursos e à possibilidade de o estafeta desligar a geolocalização, sem quaisquer implicações na entrega, tratam-se de aspetos que, segundo o Supremo Tribunal de Justiça, embora confiram alguma margem de liberdade ao estafeta no exercício da sua atividade, «é indiscutível que esta é desenvolvida num quadro de regras específicas definidas pela empresa (…), a qual – nos termos que tem por adequados e consentâneos com a prossecução do seu modelo de negócio – também controla e supervisiona a atuação da contraparte (…), tal como tem a possibilidade de exercer o poder disciplinar, mediante a suspensão ou desativação da respetiva conta (…)»12


No que concerne à demonstrada liberdade de escolha do estafeta quanto ao meio de transporte e à mochila térmica que usa, afigura-se-nos que tal margem de liberdade, por coerência de raciocínio, não pode deixar de ser apreciada da mesma forma.


Relativamente à aplicação de um multiplicador ao valor base dos serviços, assim se pronunciou o Supremo Tribunal de Justiça no acórdão de 28-05-2025: «Também não é de valorizar a circunstância de o estafeta poder alterar o valor base dos serviços mediante a aplicação de um multiplicador, uma vez que esta ferramenta era disponibilizada pela própria ré e dentro dos limites por esta fixados.»


Enfim, considerando todo o exposto, entendemos que a Ré não logrou provar factos que pela quantidade e impressividade imponham concluir que o trabalho do estafeta era prestado com efetiva autonomia.


Por conseguinte, não se considera ilidida a presunção de laboralidade.


Destarte, há que concluir pela existência de contratos de trabalho entre a Ré e os estafetas abrangidos pelo recurso.


Na sequência, o recurso deve proceder, e, assim sendo, há que considerar a deduzida ampliação do recurso.


*


V. Ampliação do recurso


Juntamente com as suas contra-alegações, a Ré veio deduzir ampliação do objeto do recurso, referindo que não se mostra preenchida a alínea a) do n.º 1 do artigo 12.º-A do Código do Trabalho, por ter resultado provado que a aplicação gerida pela Ré não fixa a retribuição para o trabalho efetuado na plataforma ou estabelece limites máximos e mínimos para aquela.


Ora, em face do anteriormente decidido, designadamente no âmbito da apreciação do preenchimento da referida alínea, resta-nos concluir pela improcedência da ampliação do recurso.


-


Concluindo, o recurso de apelação procede na totalidade.


As custas do recurso deverão ser suportadas pela recorrida, nos termos previstos pelo artigo 527.º do Código de Processo Civil.


*


VI. Decisão


Nestes termos, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em julgar o recurso procedente e a ampliação do recurso improcedente e, em consequência, revoga-se a sentença recorrida, reconhecendo-se a existência de contrato de trabalho entre a Ré e os seguintes estafetas:


a) AA, desde 7 de junho de 2022;


b) BB, desde 7 de junho de 2022;


c) CC, desde 6 de junho de 2023;


d) DD, desde junho de 2022, até 18 de outubro de 2023 (data em que deixou de prestar atividade);


e) EE, desde dezembro de 2022;


f) FF, entre agosto e 26 de outubro de 2023 (data em que deixou de prestar atividade);


g) GG, desde abril de 2023.


Custas do recurso a suportar pela recorrida.


Notifique.


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Évora, 16 de outubro de 2025


Paula do Paço


Emília Ramos Costa


Filipe Aveiro Marques (votou vencido)


Declaração de voto de vencido:


Votei no sentido da confirmação da sentença recorrida pelas seguintes razões:


A) Continuo a não encontrar argumentos suficientes para considerar que a aplicação informática, depois de instalada no telemóvel do estafeta, possa ser considerada um instrumento ou equipamento para os efeitos de funcionamento da presunção. Não parece que seja um elemento físico, como será o telemóvel e, sobretudo, sem esta aplicação (que é apenas um meio de comunicação avançado) o estafeta poderá continuar a prestar a sua actividade, designadamente para outras plataformas (ao contrário do que acontece com os verdadeiros equipamentos – mochila e veículo –, que são dos estafetas, sem os quais não é possível prestar qualquer actividade).


Entendo, por isso, que a aplicação informática (que, de todo o modo, não resulta dos factos que tenha sido desenvolvida pela ré ou, sequer, de que a esta cabe o direito de autoria ou de produção da mesma (ver ponto 2 dos factos provados), não cabe na letra da lei.


Por isso, com o muito respeito devido ao entendimento que fez vencimento, continuo a considerar que, no caso, apenas estão preenchidas as características previstas nas alíneas a), b) e e), do n.º 1 do artigo 12.º-A CT.


B) Apesar do preenchimento dessas três características, sopesando toda a factualidade provada nos autos, continuo a entender que, no caso, se mostra ilidida a presunção de laboralidade.


Não se podem deixar de se salientar as importantes diferenças do caso destes autos para aquele que foi apreciado no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28/05/2025 (processo n.º 29923/23.7T8LSB.L1.S1):

- enquanto nesse caso do Acórdão do Supremo se provou que a geolocalização permite à Ré controlar o tempo de entrega e o percurso efetuado pelo estafeta (apesar de o estafeta ter liberdade de decisão quanto ao itinerário); no caso destes autos provou-se que, após a aceitação do pedido, os estafetas podem desligar a geolocalização, sem quaisquer implicações na entrega (não se provando, por isso, a existência de controlo ou supervisão durante a recolha e entrega dos bens);

- e, decisivamente, no caso julgado pelo STJ existia uma dependência económica do estafeta relativamente à ré, trabalhando aquele regularmente para esta; no caso agora em apreciação, não se provou essa dependência económica, sendo que não resultou provado que as quantias recebidas da ré sejam a única fonte de rendimento dos estafetas.

E também não se pode desconhecer, em sentido contrário (e, sobretudo, com plena pertinência por aplicar legislação que integra o nosso ordenamento jurídico) a decisão do Tribunal de Justiça da União Europeia de 22/04/2020 no caso Yodel Delivery Network ( C-692/19 - ECLI:EU:C:2020:288, acessível em https://curia.europa.eu/juris/document/document.jsf?text=&docid=225922&pageIndex=0&doclang=EN&mode=lst&dir=&occ=first&part=1&cid=8531687).


Dir-se-á (numa abordagem global ou holística) que a favor da existência de uma relação de trabalho subordinado apenas se encontra a possibilidade de ser a ré a fixar a retribuição (mas que existe em muitos outros casos em que, verdadeiramente, não existe um poder de negociação por parte do contraente mais fraco e, ainda assim, não se fala de subordinação jurídica), a existência de algumas regras de conduta a cumprir pelos estafetas (que, igualmente, não permite distinguir especialmente os estafetas de outras entidades que se relacionam com a ré) e a possibilidade de a ré desactivar a conta dos estafetas (o que, de todo o modo, não distingue especialmente os estafetas dos outros utilizadores das plataformas – clientes e comerciantes – que, igualmente, poderão ver as suas contas desactivadas e nem por isso podem ser considerados trabalhadores).


O argumento de que os estafetas estão integrados numa organização produtiva alheia (que os frutos da sua actividade não lhes pertencem originariamente mas sim a essa organização produtiva e que eles próprios não possuem uma organização empresarial própria) não é muito forte, na medida em que mesmo em casos de músicos integrantes de orquestras não foi reconhecida qualquer subordinação jurídica – e não se vislumbram muitas outras actividades humanas que tenham, para manter a harmonia do conjunto, de ser tão finamente organizadas (e sem possibilidade de divergências relativamente às indicações do maestro).


Já no sentido de se afastar a existência de trabalho subordinado existem outros e importantes factores:

- o pagamento pelos prestadores de uma taxa pela utilização da plataforma, que contrasta com a matriz típica de uma relação de trabalho subordinado;

- a remuneração não atender à disponibilidade dos estafetas que aguardam pela distribuição do serviço, mas apenas pelo resultado (recolha e entrega das encomendas), o que é típico de uma simples prestação de serviços;

- a ausência de exclusividade, com especial enfoque na possibilidade de os estafetas prestarem o mesmo serviço para as empresas que directamente concorrem no mercado com a ré (pontos 30., 37. e 41. dos factos provados) que, normalmente, não tem uma normal associação à existência de subordinação;

- a possibilidade de total liberdade de desenvolver a actividade em horário e local definidos pelos estafetas e, até, dos dias em que pretendem prestar, ou não, a actividade (pontos 38., 44., 45. dos factos provados), que normalmente não se encontra numa relação subordinada e que permitem concluir que são os estafetas que organizam o seu tempo e são eles que, com total liberdade, gerem a sua ligação à ré consoante a sua total conveniência pessoal;

- a possibilidade de os estafetas poderem designar outras pessoas para sua substituição no exercício da actividade (ponto 46. dos factos provados), bem demonstrativa de que o que interessa à ré não é a actividade em si mesma, elemento inerente a um contrato de trabalho que é celebrado intuitu personae, mas antes o resultado da sua actividade, característica do contrato de prestação de serviço;

- sobretudo e decisivamente, ficou provada a possibilidade de os estafetas recusarem qualquer serviço proposto e sem qualquer consequência (ponto 26. dos factos provados) o que é, naturalmente, prova de um facto muito relevante que aponta para a inexistência de qualquer subordinação: não se vislumbra que relação laboral pode resistir baseada na possibilidade de o prestador da actividade se poder recusar a prestá‑la e, ainda assim, esperar remuneração (sem olvidar, naturalmente, o regime do artigo 273.º do Código do Trabalho e não se podendo falar, no caso, de trabalho intermitente previsto nos artigos 157.º e 158.º do Código do Trabalho por lhe faltar o mais relevante requisito formal); no limite, o entendimento que obteve vencimento pode levar ao reconhecimento de um contrato de trabalho a quem não faça um minuto de trabalho efectivo, bastando estar “disponível” com o telemóvel ligado à aplicação.

Entendo, por isso e apesar do brilhantismo dos argumentos que fizeram vencimento, que no caso dos autos a independência dos estafetas não parece fictícia, mas é real.


Évora, 16 de Outubro de 2025


Filipe Aveiro Marques






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1. Relatora, por vencimento: Paula do Paço; Adjuntos: Emília Ramos Costa e Filipe Aveiro Marques↩︎

2. A transcrição das conclusões não contém as notas de rodapé que foram apresentadas.↩︎

3. Consultáveis em www.dgsi.pt.↩︎

4. Idem.↩︎

5. O que não impede a qualificação do contrato de trabalho desde data anterior, como se verificou no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17-09-2025 (Proc. n.º 1914/23.5T8TMR.E2.S1).↩︎

6. Publicado em www.dgsi.pt.↩︎

7. Acórdão proferido em 17-09-2025 (Proc. n.º 1914/23.5T8TMR.E2.S1), publicado em www.dgsi.pt.↩︎

8. O ponto 74 tem a seguinte redação: «Os estafetas podem ter a sua própria clientela e atendê-la com liberdade e sem necessidade de comunicar isso à Ré.»↩︎

9. O ponto 75 tem a seguinte redação: «Também podem utilizar outras plataformas concorrentes, incluindo ao mesmo tempo que estão a prestar a sua atividade na Plataforma.»↩︎

10. O ponto 81 tem a seguinte redação: «Os estafetas podem substituir-se por outro estafeta inscrito na app no exercício da sua atividade.»↩︎

11. Cf. Acórdãos desta Secção Social de 22-05-2025 (Proc. n.º 1223/24.2T8TMR.E1), de 13-02-2025 (Proc. n.º 219/24.9T8SNS.E1) e de 12-01-2023 (Proc. n.º 2560/21.3T8FAR.E1), todos acessíveis em www.dgsi.pt.↩︎

12. Cf. Acórdão de 28-05-2025. Este entendimento foi reiterado no Acórdão de 17-09-2025, referido supra.↩︎