Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | MARIA JOÃO SOUSA E FARO | ||
Descritores: | TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS EXECUÇÃO DE SENTENÇA COMPETÊNCIA EM RAZÃO DA MATÉRIA | ||
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Data do Acordão: | 03/16/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Sumário: | Todas as sentenças proferidas por Tribunais administrativos são executadas judicialmente junto da jurisdição administrativa, pelo que o Tribunal de Execução de Setúbal (Tribunal Comum) é incompetente em razão da matéria para a execução para pagamento de quantia certa fundada em sentença homologatória de transacção proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa. (Sumário elaborado pela Relatora) | ||
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Decisão Texto Integral: | 1. RELATÓRIO
1. Ecoambiente-Serviços e Meio Ambiente, S.A., Exequente nos autos à margem identificados nos quais figura como Executado o Município de Setúbal, veio recorrer do despacho que, por declarar o “Tribunal materialmente incompetente para conhecer da presente execução”, indeferiu liminarmente a execução, formulando as seguintes conclusões:
1. A Recorrente apresentou requerimento executivo, sendo o título executivo uma sentença homologatória de acordo de pagamento/transacção alcançado entre a Exequente/Recorrente e a Executada, nos termos da qual esta reconheceu ser devedora daquela pelo montante de 172.749, 56€ (cento e setenta e dois mil, setecentos e quarenta e nove euros e cinquenta e seis cêntimos), acordando-se o pagamento do mesmo em 34 prestações mensais, mais bem indicadas na transacção e no requerimento executivo; 2. A sentença homologatória que constitui o título executivo nos termos dos artigos 703.º, n.º 1, al. a) e 704.º, n.º 1, ambos do CPC, foi proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa – Unidade Orgânica 2, no âmbito do processo número 822/19.9BEALM; 3. Conforme também indicado no requerimento executivo, a quantia exequenda corresponde a uma prestação daquela transacção que se venceu a 30/04/2021 e que tem o montante de capital de 4.000 €, à qual acrescem os juros de mora, à taxa legal, vencidos e vincendos até efectivo e integral pagamento, assim como custas e demais encargos legais, incluindo despesas e honorários de Agente de Execução; 4. Apresentada a execução, veio o tribunal a quo a proferir a sentença sob recurso (sentença datada de 17-10-2022 e com a ref.ª 95713784), na qual, em suma, considera que “[n]os presentes autos a relação jurídica que a requerente pretende ver apreciada é de natureza pública/administrativa, no âmbito de um processo de natureza administrativa que corre termos naquela instituição de direito público”, pelo que, no seu entender, verifica-se excepção dilatória por incompetência absoluta do tribunal a quo em razão da matéria, indeferindo-se liminarmente a execução; 5. Com o devido respeito, o tribunal a quo apreciou erradamente a questão sob dois pontos de vista: em primeiro lugar, não se pretende a apreciação de uma relação jurídica, mas sim a execução de uma obrigação adveniente de uma relação jurídica/direito já apreciado/definido/declarado; em segundo lugar, qualquer pretensa relação jurídica em causa nos presentes autos não tem natureza pública/administrativa, mas sim natureza comum;
6. A decisão do tribunal a quo pressupõe a propositura, pela Recorrente, de uma acção declarativa para apreciação de uma relação jurídica, mas aquilo que foi proposto foi uma acção executiva para execução de uma obrigação adveniente de uma relação jurídica já apreciada e de um direito já reconhecido/declarado à Recorrente, nomeadamente o direito ao pagamento de um montante; 7. Conforme refere a jurisprudência superior – como se exemplifica pelos acórdãos citados em sede de alegações – a acção executiva não tem por fim a decisão de uma causa, pelo que não há lugar a decisão sobre o mérito da mesma, visto que o direito que se pretende efectivar já está declarado; 8. Assim, face ao exposto, deve a sentença sob recurso ser revogada e substituída por outra que julgue o tribunal a quo competente para a acção executiva apresentada, ordenando o prosseguimento dos seus termos; 9. Adicional e subsidiariamente, ainda que se entendesse que na presente acção se pretende ver apreciada uma relação jurídica – o que não se concede e apenas se coloca a título meramente académico e por dever de cautela de patrocínio -, jamais tal relação teria natureza pública/administrativa – como alega o tribunal a quo - , tendo antes natureza comum; 10. A relação subjacente à formação do título executivo é, de facto,uma relação de natureza administrativa, tanto assim é, que foi dirimida no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa. 11. No entanto, a relação ou, rectius, o direito que advém do título executivo é distinto e independente da relação subjacente à propositura da acção declarativa junto dos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal. 12. Aquilo que a Recorrente pretende nestes autos executivos é a satisfação coerciva do seu direito de crédito já declarado e balizado pelo título executivo, não a apreciação de uma qualquer relação de “natureza pública/administrativa, no âmbito de um processo de natureza administrativa que corre termos naquela instituição de direito público”. 13. O direito de crédito declarado e balizado pelo título executivo é independente e não pode ser confundido com a relação material subjacente – administrativa ou não – que esteve na base da formação desse título; 14. Em suma, aquilo que a Recorrente pretende é a satisfação coerciva do seu direito a receber uma quantia certa; 15. O tribunal a quo faz uma incorrecta aplicação da Lei, nomeadamente do art. 212.º, n.º 3 da CRP e do art. 1.º, n.º 1 do ETAF, já que aplica-os para justificar a competência da jurisdição administrativa e fiscal para apreciação da execução, por oposição à jurisdição comum, não obstante não estarmos perante o pedido de apreciação de qualquer relação jurídica, muito menos uma de natureza pública/administrativa; 16. Assim, mal se compreende como pode o tribunal a quo sustentar que se verifica incompetência absoluta em razão da matéria por a acção executiva pertencer à jurisdição administrativa e fiscal.
17. Mesmo que estivéssemos perante o pedido de apreciação de uma relação de natureza pública/administrativa – o que não é o caso e não se concede, apenas se colocando a título académico e por mero dever de cautela de patrocínio -tal não implica a conclusão automática de que são sempre os tribunais administrativos a executar as suas próprias decisões; 18. O artigo 44.º do ETAF define qual a competência dos Tribunais Administrativos de Círculo, nada referindo sobre a competência destes para conhecerem das execuções das suas próprias sentenças. 19. No entanto, para os Tribunais Tributários, o legislador teve o cuidado de estabelecer expressamente no artigo 49.º, n.º 1, al. e), ponto v) que lhes cumpre conhecer dos pedidos “[d]e execução das suas decisões”. 20. Adicionalmente, para as execuções para prestação de factos ou de coisas e para as execuções de sentenças de anulação de atos administrativos, o legislador estabeleceu normas de atribuição de competência para os tribunais administrativos que proferiram a sentença dada à execução em 1.º grau de jurisdição, nomeadamente nos art. 164.º, n.º 1 do CPTA e 176.º, n.º 1 do CPTA, respectivamente; 21. Já para a execução para pagamento de quantia certa (o tipo de execução em causa nos presentes autos), o legislador intencionalmente dispôs de forma diferente no art. 170.º, n.º 2 do CPTA, referindo que a execução deve ser pedida ao tribunal competente e não que a execução compete ao tribunal que tenha proferido a sentença em primeiro grau de jurisdição; 22. Com esta distinção, o legislador reconheceu que, no caso de execuções para pagamento de quantia certa nas quais o título executivo é uma sentença proferida pelos tribunais administrativos, o tribunal competente não é necessariamente o tribunal administrativo que proferiu a decisão, ou sequer os tribunais da jurisdição administrativa e fiscal. 23. Contrariamente ao que fez para os outros tipo de execução e para as execuções de decisões proferidas pelos tribunais tributários, o legislador intencionalmente não estabeleceu qualquer norma de atribuição de competência; 24. Se o legislador estabeleceu distinções quanto à definição/atribuição de competência entre os tribunais administrativos de círculo e os tribunais tributários, por um lado, e a execução para pagamento de quantia certa e os restantes tipos de execução, por outro, não é lícito ao intérprete - neste caso, ao tribunal a quo – , nos termos do art. 9.º do CC, ignorar o pensamento do legislador e essas distinções, atribuindo competência aos tribunais administrativos para o conhecimento de uma execução para pagamento de quantia certa, quando não existe norma que o permita; 25. Em teoria, só seria possível sustentar a competência dos tribunais administrativos para conhecer de uma execução para pagamento de quantia certa, caso estivesse aí em causa um litígio emergente de uma relação jurídica administrativa, já que esses são os estritos limites de competência estabelecidos e permitidos pelo artigo 212.º, n.º 3 da CRP, o artigo 1.º, n.º 1 e o artigo 44.º, ambos do ETAF; 26. Tal não é o caso dos presentes autos; 27. Com o devido respeito, o tribunal a quo confunde a definição/declaração de um direito com a execução de um direito, confundindo também a relação que esteve na base da formação de um título executivo com o direito titulado/declarado/definido através desse mesmo título executivo; 28. Não havendo norma de atribuição de competência aos tribunais administrativos e não estando em causa a discussão de uma relação jurídica de natureza pública/administrativa, têm aplicação os artigos211.º, n.º 1da CRP e64.º do CPC, sendo a presente acção executiva da competência dos tribunais comuns/judiciais, já que a causa não é atribuída a outra ordem jurisdicional; 29. Logo, o tribunal a quo é aquele que têm competência para conhecer da presente execução; 30. Questão semelhante foi já decidida pela jurisprudência superior, nomeadamente pelo Tribunal Central Administrativo Sul (cfr. acórdão de 24-10-2019 citado nas alegações supra), que esclareceu que, se no caso de uma injunção que tem por base uma relação jurídico-administrativa, podem ser competentes os tribunais administrativos no caso de o Requerido deduzir oposição à injunção, a partir do momento em que não existe oposição e é aposta fórmula executória ao requerimento de injunção, este constitui título executivo e a execução para pagamento de quantia certa fundada no mesmo é da competência dos tribunais comuns, uma vez que apenas se discute agora o pedido de pagamento de uma dívida já dada por verificada/declarada e não qualquer relação subjacente à mesma; 31. O mesmo raciocínio é aplicável aos presentes autos, já que estamos perante um título executivo que verifica/declara uma dívida, apenas se peticionando o pagamento da mesma e não a discussão de qualquer relação subjacente, muito menos uma de natureza pública/administrativa; 32. Em conclusão, também por aqui, deve a sentença sob recurso ser revogada e substituída por outra que julgue o tribunal a quo competente para a acção executiva apresentada, ordenando o prosseguimento dos seus termos. 33. Ao decidir como na sentença sob recurso, o tribunal a quo violou o disposto no artigo 211.º, n.º 1 e o artigo 212.º, n.º 3 da CRP, o art. 64.º do CPC, o art. 1.º, n.º 1 do ETAF, o art. 44.º do ETAF, o art. 170.º, n.º 2 do CPTA e o art. 9.º do CC, por considerar – incorrectamente, com a devida vénia - que os tribunais administrativos são competentes para conhecer de uma execução onde não se discute nem se aprecia qualquer relação jurídica, muito menos uma de natureza pública/administrativa, apenas se peticionando o pagamento de uma dívida já verificada/declarada pelo título dado à execução. Nestes termos e nos demais de direito que V.Exas. doutamente suprirão, vem a Recorrente requerer a revogação da sentença sob recurso e a sua substituição por outra que julgue o tribunal a quo competente para a acção executiva apresentada, ordenando o prosseguimento dos demais termos dessa acção. FAZENDO ASSIM V.EXAS. A COSTUMADA JUSTIÇA!
2. Não houve contra-alegações.
3. O objecto do recurso, delimitado pelas enunciadas conclusões (cfr.artºs 608º/2, 609º, 635º/4, 639º e 663º/2 todos do CPC) reconduz-se apenas à questão de saber qual o Tribunal competente para uma execução para pagamento de quantia certa fundada numa transação homologada por sentença de um Tribunal Administrativo.
II. FUNDAMENTAÇÃO
4. Os factos a considerar na decisão deste recurso são os que constam do antecedente relatório, sendo de salientar que no âmbito da transacção judicial, o Município de Setúbal reconheceu ser devedor de determinada quantia à ora exequente e se comprometeu a liquidá-la nos moldes aí enunciados.
5. Do mérito do recurso
A recorrente intentou execução para pagamento de quantia certa contra o Município de Setúbal apresentando como título executivo uma sentença homologatória de transacção proferida no âmbito do processo que correu os seus termos no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa.
No Tribunal recorrido, negou-se-lhe tal pretensão por se entender carecer de competência (em razão da matéria) para a execução em apreço.
6. Antes de entrarmos na apreciação do objecto do recurso, justifica-se que teçamos umas brevíssimas considerações sobre a transacção: apenas as necessárias à apreciação da enunciada questão. O contrato de transacção é definido no nº1 do artigo 1248.º do Cód. Civil como o “contrato pelo qual as partes previnem ou terminam um litígio mediante recíprocas concessões”. O objecto da transacção é um litígio, pendente, iminente ou eventual, que pressupõe em todo o caso a existência de uma determinada controvérsia entre as partes. O fim da transação é prevenir o litígio futuro – “transacção preventiva” -ou terminar um já pendente – “transacção judicial” - sempre mediante concessões recíprocas que podem incluir a constituição, modificação ou extinção de direitos diversos do controvertido, caso em que se estará em presença de uma “transação novativa”.
A transacção judicial que é causa de extinção da instância ( art.º 277º c) do C.P.C.) pode ter lugar em qualquer estado da instância ( art.º 283º nº2 ), pode ser total ou parcial , caso em que só faz cessar a instância e o litígio na parte em que recair, ( art.º 284º) e pode fazer-se por documento ou termo no processo ( art.º 290º nº2) e também em acta ( nº3).
Tendo a transacção judicial, como vimos, a virtualidade de terminar o litígio pendente entre as partes outorgantes mediante recíprocas concessões que podem ir para além do direito controvertido, sobre ela recairá sentença homologatória desde que se conclua pela sua validade.
Incumprida por parte do devedor a obrigação a que ficou adstrito, pode o credor requerer as providências adequadas à sua realização coactiva mediante a instauração de uma acção executiva, servindo de título a sentença homologatória da transacção desde que desta resulte uma condenação susceptível de ser executada.
Retomando a apreciação do caso concreto, temos que a sentença homologatória da transacção foi proferida pelo juiz do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa no qual pendia a acção que opunha as partes.
Sem embargo, o aí Autor enveredou por intentar a execução num Tribunal Comum, mais concretamente num Juízo de Execução de Setúbal.
Cremos, porém, que indevidamente.
É que um dos princípios do CPTA ( aprovado pela Lei n.º 15/2002, de 22 de Fevereiro mas alterado plúrimas vezes, a última das quais pela Lei n.º 56/2021, de 16/08) - o da tutela jurisdicional efectiva – está especificamente consagrado no seu art.º 2 que dispõe o seguinte : A todo o direito ou interesse legalmente protegido corresponde a tutela adequada junto dos Tribunais Administrativos”, elencando de forma exemplificativa diversas formas dessa tutela. “Enquanto direito subjectivo público – o direito reconhecido a todo e qualquer sujeito de poder agir jurisdicionalmente em defesa da sua esfera jurídica e de encontrar nas instâncias judiciais uma providência adequada à protecção da sua posição jurídica – o direito à tutela jurisdicional efectiva goza de um estatuto normativo especial, por ser pacificamente considerado como pertencendo à categoria dos direitos, liberdades e garantias. Nessa perspectiva, ele desdobra-se genericamente, segundo a lição de Barbosa de Melo, em três segmentos ou dimensões: i) No direito de os titulares de posições jurídico-administrativamente tuteladas obterem das instâncias judiciais uma decisão sobre a sua pretensão, com a força de caso julgado ( tutela declarativa); ii) Mas também, antes da decisão de fundo, no direito de obterem do Tribunal a concessão de providências cautelares destinadas a garantir o efeito útil da decisão que vier a ser proferida ( tutela cautelar); iii) E no direito de, depois da decisão de fundo, obterem ainda do Tribunal as medidas necessárias para concretizar ou impor os efeitos da decisão judicial aos respetivos destinatários, ou sujeitos passivos ( tutela executiva)[1]”- realce nosso.
Aliás, “a tutela jurisdicional não seria completa nem efectiva se não abrangesse o poder ( e o dever) de os tribunais procederem à ( ou garantirem) a execução das suas sentenças , no caso de a Administração – que em regra terá a posição de demandada no processo administrativo – não cumprir o veredicto judicial ( assim, Gomes Canotilho, Direito Constitucional , 2002, p.494, referindo-se a um verdadeiro “ direito à execução das sentenças”. É este, como bem se sabe, um momento fundamental e particularmente delicado da justiça administrativa, que põe em causa os próprios alicerces do Estado de Direito, pois se não houver solução para o problema ( da inexecução ilegítima das sentenças ) não há “ Estado de Direito” ( Freitas do Amaral, Direito Administrativo, polic. IV, pag.255). A solução do Código nesta matéria responde particularmente bem a essa aspiração, instituindo um verdadeiro processo administrativo, no contexto da plena jurisdição executiva (Vieira de Andrade, A justiça…, cit. P.352) entregando aos Tribunais administrativos , além da respectiva competência, poderes efectivos de execução para prestação de factos ou de coisas ( art.º 162º e ss. do CPTA) bem como de quantia certa ( arts. 170º e ss do CPTA)”.[2]
Nessa senda, no art.º 3º explicitam-se os “poderes dos tribunais administrativos” sendo que, dentre eles se contempla o de assegurar ainda a execução das suas sentenças, designadamente daquelas que se proferem contra a Administração, seja através da emissão de sentença que produza os efeitos do acto administrativo devido, quando a prática e o conteúdo deste acto sejam estritamente vinculados, seja providenciando a concretização material do que foi determinado na sentença ( cfr. nº4).
Tal opção é, antes do mais, uma importantíssima manifestação do princípio da separação de poderes: “É que os tribunais administrativos passaram a ser auto-suficientes neste nível (e não apenas no declarativo) dispondo dos instrumentos estruturalmente executivos necessários para garantir a produção dos efeitos práticos e jurídicos da sua sentença e para compelir a Administração a respeitá-los (…)”[3]
Por seu turno, no título VII do mesmo código, respeitante ao processo executivo, contemplam-se três modalidades de execução: execução contra entidades públicas, podendo abranger a execução de sentenças proferidas pelos Tribunais Administrativos ou a execução de atos administrativos inimpugnáveis a que a Administração não dê a devida execução (artigo 157 n.º 1 e 2); execução de qualquer título executivo emitido contra entidades administrativas no âmbito das relações jurídico-privadas (artigo 157 n.º 4); execução contra particulares, que pode abranger a execução de sentenças proferidas pelos Tribunais Administrativos ou a execução de atos administrativos impositivos quando não possam ser executados coercivamente pela Administração e careçam de execução por via jurisdicional (artigo 157 n.º 5).
No caso, estamos perante uma execução, para pagamento de quantia certa, movida contra uma entidade pública que terá incumprido o pagamento de determinadas prestações pecuniárias que se obrigou a liquidar nos moldes convencionados na transação devidamente homologada por sentença.
Tal processo está regulado no art.º 170º e seguintes do CPTA, estatuindo expressamente o nº2 daquela norma que: “Caso a Administração não dê execução à sentença no prazo estabelecido no número anterior, dispõe o interessado do prazo de um ano para pedir a respetiva execução ao tribunal competente”.
Por seu turno, resulta do disposto nos artºs 164º, n.ºs 1 e 2, e 176º, n.ºs 1 e 2, do CPTA que é competente para a execução o tribunal que tiver proferido a sentença em primeiro grau de jurisdição[4], e, ainda, que a esses autos é apensado o processo executivo. Em conclusão: Todas as sentenças proferidas por Tribunais administrativos são executadas judicialmente junto da jurisdição administrativa, pelo que o Tribunal de Execução de Setúbal é incompetente em razão da matéria para a execução para pagamento de quantia certa fundada em sentença homologatória de transacção proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa.
Logo, o recurso da decisão que assim o considerou não merece provimento.
III. DECISÃO
Por todo o exposto, acorda-se em julgar a apelação improcedente e em manter a decisão recorrida. Custas pela apelante. Évora, 16 de Março de 2023 [1] In Código de Processo nos Tribunais Administrativos, de Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, volume I, pag.109. [2] Idem, autores e ob.cit. pag.116. [3] Idem, autores e ob.cit. pag.130. [4] Dispõe, por seu turno, o artigo 44.º da Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro ( ESTATUTO DOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS E FISCAIS) o seguinte: “Competência dos tribunais administrativos de círculo 1 - Compete aos tribunais administrativos de círculo conhecer, em primeira instância, de todos os processos do âmbito da jurisdição administrativa e fiscal que incidam sobre matéria administrativa e cuja competência, em primeiro grau de jurisdição, não esteja reservada aos tribunais superiores. 2 - Compete ainda aos tribunais administrativos de círculo satisfazer as diligências pedidas por carta, ofício ou outros meios de comunicação que lhes sejam dirigidos por outros tribunais administrativos. 3 - Os agentes de execução desempenham as suas funções nas execuções que sejam da competência dos tribunais administrativos.”. |