Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | CARLOS DE CAMPOS LOBO | ||
Descritores: | IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO MODIFICABILIDADE DA DECISÃO DE FACTO BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS | ||
Data do Acordão: | 06/04/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Sumário: | I - Na impugnação de facto na vertente mais ampla, ou seja, aquela a que se refere o artigo 412º, nºs 3, 4 e 6, do C. P. Penal, o Tribunal ad quem apenas tem de verificar se os pontos da matéria de facto impugnados têm suporte na fundamentação da decisão recorrida, avaliando e comparando, especificadamente, os meios de prova enunciados nessa decisão e as concretas provas indicadas pelo recorrente e que este considera imporem decisão diversa da proferida. II - Para que se possa alterar o decidido em 1ª instância, necessário se torna que as provas adiantadas pelo recorrente imponham decisão diversa da proferida e não apenas que o permitam - alínea b) do nº 3 do artigo 412º do C. P. Penal - pois impor/demandar/exigir uma decisão diversa da questionada não significa admitir uma decisão diferente da recorrida. Tem um alcance mais exigente e significa que a decisão proferida, face às provas, não é possível/plausível/verosímil. III - Não basta contrapor à convicção do julgador uma outra dissemelhante, ainda que também possível, para provocar uma modificação na decisão de facto, sendo antes necessário demonstrar que a convicção formada pelo julgador, relativamente aos pontos de facto impugnados, é impossível, desprovida de razoabilidade, destituída de sentido. Esta é, ao que se cogita, a dimensão do segmento “provas que impõem decisão diversa da recorrida”, expresso no supra citado inciso legal. IV - O crime de branqueamento p. e p. pelo 368º-A, nº 1, do Código Penal, ao que se conjetura, consiste essencialmente na ocultação ou dissimulação da natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou titularidade de vantagens de crimes. V - Tal ilícito, segundo certa doutrina, passa por dois momentos distintos, money launder seguido de recycling, sendo que outros o configuram por três fases, seguindo a linha de pensamento do Gabinete de Ação Financeira Internacional, apontando-as como colocação, dissimulação e integração. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam em Conferência na Secção Criminal (2ª subsecção) I – Relatório 1. No processo nº 134/17.2JASTB da Comarca de Setúbal - Juízo Central Criminal de Setúbal - Juiz 2, foi deduzida acusação pública contra A (…..), imputando-lhe a prática em coautoria material, concurso efetivo e na forma consumada, de 1 (um) crime de falsificação de documento, p.e p. pelo artigo 256º, nº 1, alíneas a), b) e c), do CPenal, com referência ao seu artigo 255º, nº 1 do mesmo normativo, 1 (um) crime de burla qualificada, p. e p. pelo artigo 218º, nºs 1 e 2, alínea a), com referência aos seus artigos 217º e 202º, alínea b) do citado normativo, e de 1 (um) crime de branqueamento de capitais, p.e p. pelo artigo 368º-A, nº 1, do CPenal. * C (….) e “BEST – Banco Eletrónico de Serviço Total, S.A.” requereram a constituição como assistentes nos autos, que se vieram a admitir, tendo ainda o primeiro formulado nos autos pretensão indemnizatória, a qual foi rejeitada, tendo sido a apreciação da mesma relegada para os meios comuns.* Efetuado o julgamento, e em face da prova no mesmo produzida, procedeu-se a alteração não substancial dos factos, a coberto do estatuído no artigo 358º, nº 1 do CPPenal, sendo que, sobre tal, nada houve a requerer por banda do arguido – cf. fls.1295 a 1298.* Sequentemente, foi proferido Acórdão onde se decidiu ABSOLVER o arguido A do cometimento dos crimes pelos quais vinha publicamente acusado.2. Inconformado com o decidido, recorreu o Assistente questionando a decisão proferida, concluindo: (transcrição) I - O presente recurso tem como objecto toda a matéria de facto e de direito do acórdão proferido nos presentes autos, que absolveu o arguido A, da prática, em coautoria, concurso efectivo e na forma consumada, de 1 (um) crime de falsificação de documento, p.e p. pelo artigo 256º, nº 1, alíneas a), b) e c), do Código Penal, com referência ao seu artigo 255º, nº 1 do mesmo normativo, de 1 (um) crime de burla qualificada, p. e p. pelo artigo 218º, nºs 1 e 2, alínea a), com referência aos seus artigos 217º e 202º, alínea b) do citado normativo, e de 1 (um) crime de branqueamento de capitais, p.e p. pelo artigo 368º-A, nº 1, do Código Penal; 3. O Ministério Público respondeu ao recurso pronunciando-se no sentido do provimento parcial do recurso interposto pelo Assistente, invocando, em conclusões: (transcrição) 1ª – O Ministério Público comunga da apreciação da prova pessoal produzida em audiência de discussão e julgamento e da prova documental constante dos autos que é empreendida pelo Recorrente na sua motivação de recurso, no que respeita aos factos integradores da prática pelo arguido, em co-autoria material (com a sua mulher M, entretanto falecida), de um crime de burla qualificada p. e p. pelos arts. 218º nºs 1 e 2 al. a), 217º e 202º al. b) do C.P.; 4. Igualmente, o Arguido veio apresentar a sua resposta ao recurso, sem apresentar quaisquer conclusões, defendendo, (…) não deve o presente recurso merecer provimento, devendo-se manter a Douta Decisão sob censura, nos precisos termos em que foi proferida. 5. Subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Ex.mo Senhor Procurador-Geral Adjunto, na intervenção a que alude o artigo 416º do CPPenal, emitiu parecer pronunciando-se também no sentido da procedência parcial do recurso, referindo (a)companhamos a resposta apresentada pelo Ministério Público em 1ª instância (Ref.ª 7902354) (…) a mesma nos parece fundamentada, qualquer adenda de substância seria despiciente, restando-nos acompanhá-la, na íntegra[1]. Não houve resposta ao parecer. 6. Efetuado exame preliminar e colhidos que foram os vistos legais, cumpre agora, em conferência, apreciar e decidir.
II – Fundamentação 1. Questões a decidir Sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, designadamente a verificação da existência, ou não, dos vícios indicados no artigo 410°, n°2 do CPPenal, o âmbito do recurso é dado, nos termos do artigo 412º, nº 1 do citado complexo legal, pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respetiva motivação, nas quais sintetiza as razões do pedido - jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário das secções do STJ de 19/10/95 in D.R., I-A de 28/12/95.
2. Apreciação 2.1. O Tribunal recorrido, e relativamente ao arguido recorrente, considerou provados e não provados os seguintes factos: (transcrição) Factualidade extraída da acusação pública: *** Factos não provados:Com relevo para o caso dos autos, não se demonstrou, cabal e inequivocamente: A) Que tivesse o arguido, no momento e contexto explicitado em 3) e 4), formulado, conjuntamente com M, o propósito de se aproveitar da situação de C (perda do gestor de conta no BCP), revertendo-a em seu proveito, por forma a auferir quantias monetárias a que sabiam não ter direito, servindo-se para tanto dos conhecimentos e contactos que M tinha no meio bancário. B) Que, no momento de abordagem acima explicitado, M se houvesse apresentado como colaboradora com vínculo funcional face ao Banco BEST. C) Que tivesse o assistente solicitado a M que efetuasse investimentos de baixo risco, de forma a garantir o capital investido, tendo esta concordado. D) Que o início da realização das reuniões a que se alude no ponto 10) da matéria assente ocorresse apenas em setembro de 2005, assumindo, desde esse momento, periodicidade bimensal. E) Que em meados do ano de 2016, C manifestou a M a sua intenção de transferir metade do seu património para títulos financeiros de menor risco ou risco seguro. F) Que as alterações de telefone e morada de envio de correspondência postal, atinentes a C, hajam sido promovidas sem o conhecimento do mesmo, implicando a falsificação dos documentos que suportavam tais pedidos. G) Que o acesso à password de segurança que era solicitada para a realização de operações bancárias houvesse decorrido sem o conhecimento e consentimento do assistente C. H) Que o ora arguido houvesse, por proposta de M, comunicado a C, em meados de 2015, passado a figurar como colaborador na gestão do património de C, já que o mesmo teria, segundo M, mais disponibilidade para o efeito, solicitação a que este anuiu. I) Que, no decurso da gestão assegurada por M, tivesse o assistente verbalizado àquela o interesse em ter na sua conta à ordem um saldo mensal entre €50.000,00 a €70.000,00. J) Que a disponibilização, por M, do cartão bancário (de débito) e password correspetiva, a que se alude em 24) e 25), houvesse apenas ocorrido após insistência por parte de C, em agosto de 2017, no sentido de que lhe fosse transferida a quantia de €500.000,00. Também não se provou (com implicação exclusiva face ao aqui arguido) K) Que tivesse o arguido, em estreita colaboração com M e na execução de um plano entre eles traçado, visado auferir mais-valias que não lhe eram devidas, à custa das correlativas perdas económicas por parte de C, que se viu desapossado da quantia total de €976.098,10, verba utilizada (no todo ou em parte) em proveito próprio do ora arguido e contra a vontade do seu legítimo proprietário. L) Para o efeito, previu e quis o arguido, sempre em estreita colaboração e na execução do aludido plano gizado com M, aproveitando-se dos conhecimentos e contactos que a última tinha nos meios bancários, persuadir C de que, mediante a gestão eficaz do seu património por parte daqueles, este beneficiaria de um aumento substancial de rendimentos. M) Tendo para tanto o aqui arguido, no âmbito do referido plano e colaboração, previsto e querido forjar ou ver forjados os documentos atrás referidos, o que fez bem sabendo que os mesmos não espelhavam a verdadeira situação patrimonial de C, que ali era empolada, colocando em crise a seriedade que devem merecer os extratos bancários, resultado que aceitou por ser necessário aos seus desígnios, tendo ainda alterado o nº de telemóvel deste sem o seu consentimento e criado, ou visto criado, ficticiamente, e sem o conhecimento daquele, um endereço eletrónico, logrando deste modo manter a gestão do referido património, evitando que o titular da conta tivesse conhecimento da realidade e continuasse a acreditar na eficácia da sua gestão. N) Previu e quis ainda o arguido, em colaboração com M, desde outubro de 2004 a agosto de 2017, utilizar ou disponibilizar, consciente e voluntariamente, a sua conta bancária com o nº (…..), apenas por si titulada, para o recebimento na mesma de transferências monetárias provenientes da conta bancária titulada por Carlos Alberto no Banco BEST, com o nº (…..), tendo perfeito conhecimento de que às mesmas não tinha qualquer direito, estando ciente da forma como tais quantias eram obtidas. O) Conhecia o arguido A o carácter proibido das suas condutas e, não obstante ter capacidade de determinação segundo as prescrições legais, não se inibiu de as levar a cabo. 2.2. Fundamentação da matéria de facto: (transcrição) O Tribunal fundou a sua convicção na prova carreada para os autos e produzida em julgamento, infra a detalhar. * À luz dos princípios de apreciação da prova, acabados de enunciar, e não deixando de evidenciar, por incontornável e relevante para a imputação subjetiva dos factos, o falecimento da arguida M na pendência da investigação (ditando, quanto a si, a extinção das responsabilidades punitivas suscetíveis de sobre si recairem) temos que:Declarações de arguido: O arguido A, único indivíduo colocado na posição de arguida face ao perecimento de M, no uso de prerrogativa legal que lhe assiste, optou por relegar-se ao silêncio, fazendo pois recair sobre a demais prova produzida e/ou coligida nos autos a elucidação probatória dos factos aqui sob discussão. * Nesse desígnio, e no domínio da prova declaracional, ressalta-se:Declarações de assistente: C, constituído assistente nestes autos (e apresentando-se como médico reformado, com a idade atual de 76 anos), declarou, a propósito da temática sob julgamento nos autos, o seguinte: - ter conhecido os arguidos (A e a entretanto falecida M) como vizinhos do mesmo bairro e por serem todos frequentadores de um mesmo café; - ter a primeira interação verbal mais “intensa” (além do simples cumprimento social) ocorrido no contexto da frequência do aludido café, quando o declarante, à mesa, confidenciava (lamentando-se) a um amigo que havia perdido o anterior gestor bancário (na instituição Millenium BCP), isto por ocasião temporal que precisa em setembro de 2004; - encontrando-se o casal formado pelos arguidos sentado numa mesma próxima, em posição na qual seria audível tal “lamento”, refere ter-se M levantado e vindo na sua direção, disponibilizando-lhe os serviços de gestão do Banco Best, isto enquanto o aqui arguido se mantinha sentado na mesma, não assumindo pois qualquer intervenção ou papel em tal abordagem; - mostrando-se o assistente recetivo a tal sugestão, refere ter sido, por M, proposto que agendassem ambos (M e assistente) uma reunião no escritório de M, o que sucedeu apenas dias mais tarde; - em tal reunião, na qual apenas o declarante e M se mostraram presentes, refere ter-lhe sido explicado, pela indicada arguida, as condições de tal “auxílio funcional”, pressupondo o pagamento de comissão num valor equivalente a 10 % (a incidir sobre os lucros obtidos); - manifestando concordância com tais condições, refere ter sido acedido a abrir conta bancária no BEST, a qual referiu ter por propósito receber quantias monetárias depositadas noutras instituições (concretamente o BNP), com vista ao seu (re)investimento em aplicações financeiras (em importância que referiu ascender a 700 ou 800 mil euros – de aplicação inicialmente em dólares – em montante de 600 a 700 mil dólares); - para tanto, refere ter assinado a documentação para a abertura de conta, em nova reunião que contou apenas com a presença do declarante e da mencionada M; - referiu ter-lhe sido ali informado, pela mencionada M, que a sua situação junto do BEST não se encontrava “regularizada”, sendo-lhe questionado se poderia figurar o nome do marido (aqui arguido) como gestor de conta, mas assumindo-se ela própria como efetiva gestora e interlocutora do declarante, o que este anuiu/aceitou (prolongando-se tal situação por 1 ou 2 anos, até ao momento em que passou M a figurar formalmente como responsável na gestão da conta); - instado a esclarecer qual o propósito ou pressuposto acordado para os investimentos a efetuar (que explicitou abarcar toda a atrás referida importância), afirmou ser o propósito aceite o da realização de investimentos cuidadosos, pressupondo ainda a diversificação dos produtos a investir; - questionado quanto aos meios disponibilizados para a movimentação da conta, afirmou não ter cartão bancário ou cheques, apenas recorrendo a cheques avulso para pagamento dos valores de comissão entregues à arguida, tendo adicionalmente, e na sua posse, um cartão de coordenadas, cujos códigos refere ter facultado a M telefonicamente sempre que esta lho solicitava; - no que à condição de emissão e preenchimento dos cheques bancários a que acima se faz alusão, refere apenas assinar os mesmos, preenchendo os valores e apondo as datas de emissão, ficando o campo destinado à identificação do beneficiário em branco (por preencher); - esclarece, no que aos valores pagos como pretensa comissão de gestão (10%) nunca ter solicitado ou visto entregue qualquer recibo ou nota de quitação; - afirmou ter recebido em casa extratos bancários de início, porém acabando ele próprio, sob o intuito de não receber tanta documentação por correio, por solicitar à arguida que assim deixasse de suceder, assinando para o efeito uma declaração, a enviar para o BEST, na qual solicitava que tal informação passasse a ser remetida para a morada do escritório da arguida (o documento de fls. 735, cuja assinatura reconhece como sua); - refere ter sido a conta em referência reforçada ao longo do tempo, além do valor inicial de abertura, mais concretamente com a importância de €50.000,00 adveniente da venda de andar do declarante sito em Santiago do Cacém, e com o valor €200.000 ou 300.000 que para ali transferiu, originário do Millenium BCP; - menciona serem realizadas reuniões com vista à disponibilização de informação quanto à evolução dos investimentos, as quais assumiam, inicialmente, frequência mensal, passando, mais adiante, a assumir maior espaçamento (de 2 em 2 meses ou de 3 em 3 meses), sendo tais encontros marcados por M; - em tais reuniões, que refere terem tido inicialmente lugar no escritório de M (no Office Centre), encontrando-se apenas presentes o declarante e aquela, esclarece serem-lhe exibidos/facultados mapas de evolução de investimentos, sendo sempre ali evidenciado uma evolução positiva, apresentando “bons lucros” (sic.); - refere que tais mapas não apresentavam timbre do banco BEST o que, só mais adiante, lhe suscitou desconfiança; - esclarece que não ia recebendo qualquer documentação oficial do BEST na sua casa, fosse ela extratos de conta ou informação sobre posição integrada de ativos ali detidos; - convidado a esclarecer a existência de pedidos de alteração de elementos de contacto do declarante, afirmou: - no tangente ao contrato constante de fls. 735v e 736 (celebrado com o Office Centre) não ser sua a assinatura nele aposto, sendo assim tal documento adjetivado como falso; - no respeitante a alteração de contacto telefónico, ter o mesmo ocorrido sem que o arguido de tal se apercebesse, sendo-lhe disponibilizado um impresso que não leu, limitando-se assinar, sob a justificação aventada pela arguida de que o BEST estaria a realizar atualizações de dados; - chamado a esclarecer qual o momento temporal a partir do qual se assumiram as suas iniciais desconfianças, aludiu aos anos de 2016 ou 2017, concretizando-as com referência a este último ano em dois eventos distintos, a saber: - quando solicitou a M o acesso a €50.000,00, com vista a auxiliar a filha na aquisição de casa própria (sendo-lhe desaconselhado por aquela que o fizesse porquanto o levantamento de tal valor poderia despertar alarme público, motivando a necessidade de dar várias explicações quanto ao destino do dinheiro e razão de ser da movimentação do mesmo); - quando, já “indignado” pela dificuldade de acesso ao seu dinheiro, lhe exigiu, em julho de 2017, a entrega de valor monetário (ocasião em que a arguida, a quem foi verbalizada tal exigência, ligou telefonicamente ao arguido, o qual, cerca de meia hora após, apareceu junto ao escritório de M - sendo essa a única ocasião em que ali o refere ter visto -, trazendo na sua posse um envelope, em cujo interior se encontravam €2.000,00 em numerário, envelope esse que lhe foi entregue na viatura do casal, na qual refere ter sido transportado na companhia dos arguidos no regresso a casa; - a par da intervenção a que supra alude, e no tangente ao aqui arguido, refere serem as interações do declarante face a A cingidas a encontros casuais na rua, nos quais, a par do cumprimento social, o aqui declarante perguntava como corriam os seus negócios/investimentos, respondendo aquele que “estava tudo bem” e que “podia ficar tranquilo”; Ainda esclarece: - ter passado, a dado momento, a ver cada vez com maior frequência, M na imobiliária explorada pelo marido (o aqui arguido), ao invés de no escritório onde antes decorriam os referidos encontros, local ao qual se passou a deslocar sempre que precisava de falar com aquela (precisando ter a abertura da referida imobiliária ocorrido em 2015 ou 2016); - refere assim ter sucedido no encontro a que atrás aludiu, tendo por objetivo a disponibilização de quantia para poder auxiliar a filha na compra da casa, que referiu ter lugar na imobiliária, encontrando-se o declarante na companhia desta, esclarecendo ser a conversa assumida por aqueles e por M, e esclarecendo, no que ao arguido concerne, não ter o mesmo assumido qualquer participação, porém encontrando-se presente no espaço comercial em apreço (onde trabalhava), além de outros funcionários da imobiliária; - ainda declarou que, por comunicação verbalizada por M, lhe era referido que o arguido lhe prestava auxílio (ainda que sem detalhe ou especificação), criando o declarante a convicção própria que tal poderia suceder no domínio da “acessoria informática”, porquanto lhe fora informado por aquela ter sido essa a área de atividade do arguido; - não obstante, acaba por referir que, no contexto das conversações levadas a cabo no espaço da imobiliária, tendo sempre por interlocutora M, não era abordada a temática da evolução das suas aplicações financeiras, sendo a motivação e finalidade dos encontros apenas o de solicitar o acesso ou disponibilização a quantias depositadas; - sem prejuízo refere ter sido informado por M, por volta de meados do ano de 2016, que iria ser-lhe atribuído pelo BEST um novo gestor, sob a explicação que deixara de ser colaboradora do BEST, porém sob o detalhe que seria o mesmo pessoa do conhecimento da arguida e que, por tal facto, continuaria ela a tratar da gestão dos ativos do assistente nos termos até ali vigentes; - perante as suspeitas que, em especial no decurso do ano de 2017, passou a evidenciar (e a que acima se fez alusão), esclarece ter assumido as seguintes diligências: - solicitado a emissão de um cartão bancário para a movimentação bancária da conta (pedido que formulou perante a arguida e ao qual a mesma aduziu um conjunto de reservas), cujo PIN veio apenas a receber em momento temporal subsequente à diligência/deslocação infra a especificar; - deslocando-se à sede do Banco BEST (ao que crê em final de agosto ou início de setembro de 2017), no sentido de se inteirar do dinheiro que ali dispunha, vindo a constatar, por contacto com funcionário daquela instituição, ter pouco mais de 900 euros, por contraponto aos 9 milhões de euros que, tendo por base a documentação de evolução e investimentos disponibilizada por M, referiu estar então convicto ali dispor (em face do que, imediatamente, fez acionar a intervenção em defesa dos seus interesses do seu Advogado); - precisa, já no âmbito da intervenção deste último, ter-se agendado uma reunião nos escritórios do Banco BEST, em Lisboa, sendo-lhe disponibilizados cópias de extratos reais que demonstravam tal discrepância; - refere assim, a par do não recebimento da importância a que se achava intitulado, ter perdido pois as importâncias ali depositadas, e que refere ascenderem a valor superior a 1 milhão de euros; - questionado, face à indicada (e muito expressiva) expetativa de ganhos se alguma vez proceder ao pagamento de impostos (IRS) sobre as importâncias/lucros auferidos, declarou assim não suceder, sob a verbalização, por M, de que a mesma “tinha bons amigos” que evitariam assim ter de suceder, esclarecendo ainda que, por proposta daquele, devidamente aceite pelo assistente, foi M que, do ano de 2005 em diante (até 2016), passou a tratar do preenchimento e entrega da sua declaração de IRS. Por último, e questionado quanto à perceção do estado de “conforto” económico ou vivencial dos arguidos, declarou: - ter conhecimento que os mesmos gozavam férias; - ser-lhe visível a troca de viaturas automóveis, tendo memória de ver o arguido a conduzir um Toyota e, após, um jipe de marca Mercedes (esclarecendo que a arguida não conduzia); - cerca do ano de 2014 (3 anos antes de 2017) refere ter-lhe sido percetível uma redução do até aí percecionável conforto económico, passando por exemplo a ver o arguido na condução de um mais modesto modelo da marca Peugeot. * Prova testemunhal:Indicados pela acusação pública produziram-se os depoimentos de E, V, MJ, CC, MF, JR e MA (sendo MJ e MA comuns ao rol do arguido), sendo ainda produzido o depoimento de D. Dos respetivos contributos, e em ordem de relevância e interesse para a temática dos autos, emergiu o seguinte: E: - apresentou-se como companheira do assistente C há mais de 30 anos. - declarou-se desprovida de conhecimento mais concretizado da situação bancária do companheiro junto do Banco BEST, que referiu apenas ter percecionado num segmento temporal final, aquando da realização de “demarches” junto dos serviços centrais do Banco BEST em Lisboa; Tem ideia que seriam inicio 700 mil +-. 900 mil a 1 milhão de investimento que depois foi reforçando com valores do Milenium e de venda de casa em Santiago do Cacém (80.000 euros). - sem prejuízo, declarou ter ideia que tal conta teria por gestor M, ainda que com uma intervenção inicial, meramente formal, do arguido, por não se encontrar plenamente regularizada a situação da primeira; - referiu ter também ela sido “angariada” como cliente de M, abrindo uma conta própria no ano de 2006, na qual apenas dispôs de um valor económico de pouca expressão, o qual, a dada altura, teria aplicado num seguro; - esclareceu nunca lhe ter sido por aquela solicitado o pagamento de qualquer comissão, circunstância que se justificaria (na explicação então dada de M) na menor expressividade do seu património e na circunstância do companheiro já assegurar o pagamento de uma comissão perante aquela; - No que à sua conta concerne, refere ter sempre rececionado por correio os correspetivos extratos, nunca se tendo registado qualquer movimento anómalo ou não autorizado; Sendo chamada a focar a atenção do seu contributo da situação do companheiro, ainda afirmou: - Ter C, no decurso do ano de 2015, procurado concretizar a inserção da declarante e dos filhos da conta de que era titular, para o que foi realizada uma reunião com M, a qual teve lugar na imobiliária onde aquela e o arguido habitualmente se encontravam; - Refere que, não obstante, tal alteração não veio a concretizar-se, acabando os filhos do assistente por abrirem novas contas apenas por eles tituladas (sendo que a declarante não careceu de o fazer porquanto era já cliente do BEST); - Nessa reunião (única em que refere ter estado presente relacionada com a conta do companheiro) refere não ter lembrança da presença ou participação do aqui arguido; - Refere que tal desempenho veio a prolongar-se até 2016, sendo após nomeado à declarante novo gestor, mas permanecendo aquela nas mesmas funções face ao companheiro; - Após tal encontro, refere que, apenas no decurso do ano de 2017, por ocasião do mês de agosto, o assistente verbalizou preocupação em redor da sua conta, tendo em atenção a alteração do comportamento de M (em quem refere que confiava sem reservas), que passou de uma pessoa prestável para alguém que arranjava desculpas para que o companheiro não assumisse acesso ao dinheiro ali depositado/investido; - Por declaração/relato do assistente, refere ter também aquele verbalizado que também o arguido o começava a evitar, sempre que ambos deambulavam na via pública; - Assim, no referido mês, e por ocasião do aniversário de C, refere ter ela própria sugerido àquele que compartilhasse com a filha tais reservas, o que o mesmo teria feito, sendo então comparados extratos das contas de assistente e filha daquele, percecionando-se a diferença “estética” de ambos; - No dia 31 de agosto refere ter ela própria estado na companhia do assistente numa nova reunião ocorrida com M nas instalações da atrás mencionada imobiliária, na qual referiu ter sido aquela informada que a declarante parecia a inteirar-se da situação bancária do companheiro; - Refere ter ali sido solicitada uma nova password que possibilitasse o acesso on line à conta – por se encontrar inativa a facultada aquando da abertura da conta - tendo M referido que as passwords estavam sempre a ser alteradas pelo Banco; - Ressaltando a declarante à mencionada M que teriam de ter alguma forma de acesso informativo à conta, até por ressalva de algo que pudesse acontecer àquela gestora, refere ter sido pela mesma prontamente dito que não se preocupassem uma vez que, nessa eventualidade, o arguido (que não estava presente no local e hora indicados) estava a par de tudo; - No dia seguinte ao de ocorrência de tal reunião, e parente as desconfianças/reservas que já se haviam instalado, afirmou ter ido na companhia de C à sede do BEST, em Lisboa, local onde falaram com um funcionário daquela entidade (Sr. M), vindo ali a ser informados das reais existências em tal conta bancária (seguindo-se a realização, dois dias depois, de uma nova reunião no mesmo local, desta feita já contando com a intervenção de Advogado). Questionada quanto à perceção, na esfera da mencionada M e do ora arguido, de algum tipo de conforto ou incremento patrimonial, referiu que ambos aparentavam ter uma “vida confortável”, tendo memória de terem um jipe de marca Mercedes e de terem a filha a frequentar o ensino particular, o que a dada altura se alterou, passando a ser vistos com viaturas mais antigas. Questionada quanto ao conhecimento da habilitação ou aptidão do arguido no domínio da informática, afirmou ter ela própria constatado, por consulta da rede social Linkedin, apresentar o mesmo perfil no qual se mencionava formação em informática, adiante acrescentando que o companheiro lhe chegou a solicitar ajuda em questões daquele foro. V, filha do assistente, corroborou o segmento de depoimento da testemunha anterior que a si fez respeito, ainda declarando/complementando (em ordem de intervenção própria): - ter conhecido M no decurso do ano de 2015 (mais concretamente no mês de dezembro), por ocasião na qual o progenitor se propunha a introduzir a declarante e o irmão na cotitularidade da conta do BES, o que, todavia, não viria a ocorrer, optando-se, após sugestão daquela, a abertura de novas contas individuais daqueles, com um valor mínimo de 500 euros, com acesso através dos canais digitais (com envio postal das credenciais para acesso e movimentação); - ter acompanhado, em agosto de 2017, o progenitor a uma reunião com M, ocorrido numa loja imobiliária na qual também se encontrava, sentado numa outra secretária face àquele em que se reuniram em conversa com a primeira, o aqui arguido; - explicitou ter tal encontro, no qual apenas M foi interlocutora, por temática a utilização de valor de cerca de 400 ou 500 mil euros, a levantar das aplicações feitas junto do BEST, para a aquisição de habitação por parte da declarante; - refere que, perante tal solicitação, M teria “desaconselhado” o movimento de uma quantia tão elevada, por poder tal transação “levantar suspeitas”, aconselhado assim a mobilização fracionada em valores mais contidos (na ordem dos 1000 euros de cada vez), sempre adiantando que teria de analisar a melhor para o fazer, com obediência da lei, acabando por nada mais suceder; - No decurso do mesmo ano e mês, e em momento mais próximo ao aniversário do progenitor, refere ter visto pela primeira vez relatada a suspeita de que algo se poderia assumir em plano irregular, sendo exibidos documentos cujo logótipo e conteúdo detetou prontamente ser “estranho” e desconforme aos que ela própria recebia do referido banco, sendo-lhe ainda detetáveis vários erros ortográficos (pouco habituais em literatura bancária). MJ: Identificou-se como consultora imobiliária, tarefa que declarou ter exercido para a Imobiliária do arguido entre março ou abril de 2015 e agosto de 2017. Referiu que também ali trabalhava M, a qual, de resto, procedeu ao recebimento curricular da declarante, realizando a entrevista prévia à sua contratação, sendo certo que, no reforço de tal perceção, aquela ali se encontrava diariamente, participando em todas as reuniões de direção. Não obstante, referiu cumular a mesma tal desempenho funcional com a de colaboradora face ao Banco BEST, por conta da qual refere ter também ela aberto conta naquela instituição no ano de 2016, por “angariação” daquela. Referiu que, nesse desempenho, M recebia, por vezes, clientes bancários no espaço da imobiliária, assim sucedendo designadamente com o assistente. Nesses encontros ou reuniões referiu (sem maior rigor ou precisão) que, em algumas, se poderia mostrar presente nas instalações da imobiliária o arguido e, noutras, poderia ali não se encontrar (embora nunca relatando a intervenção ou participação nas mesmas de A). Chamada a descrever a configuração de tal espaço comercial, afirmou que o mesmo se traduzia numa sala ampla (vulgo open space), apenas compartimentada por móveis divisores (permitindo a difusão do som). Em algumas das reuniões ali tidas lugar entre a falecida M e o aqui assistente, refere ser anunciado abertamente para os presentes (ela própria, desconhecendo se na presença ou ausência do arguido), pela mencionada M, que deveriam seguir o modelo de poupança do assistente, economizando para após viverem dos lucros, sendo até anunciados e/ou confirmados por ambos os valores dos juros recebidos ou a receber pelo último. Chamada a esclarecer a condição económica evidenciada pelo casal formado pelo arguido e pela falecida M, ou bem assim clarificar eventuais alterações na condição ou status de vida daqueles, referiu: - percecionar que os mesmos apresentariam uma “vida desafogada”, destacando, para tal afirmação, a circunstância de possuírem um jipe de marca Mercedes, de gozarem férias no Algarve e de apresentar-se M envergando habitualmente roupas de marca (Moschino, Fendi) e jóias, fazer aquela (on line ou telefonicamente) compras de mercearias no El Corte Ingles, também aludindo à circunstância de disporem de empregada de limpezas a tempo inteiro (embora precise nunca ter sido visita da casa daqueles); - não obstante, e tomando por referencial o final do ano de 2016 ou início do ano de 2017, ter começado a percecionar o eventual constrangimento financeiro daqueles, afirmação que sedimenta na dilação temporal do pagamento das comissões por venda de imóveis e na circunstância de ter sido colocada em venda o veículo automóvel a que atrás fez alusão. Em segmento diverso daquele a que se reportam os contributos supra, e especialmente incidentes na dinâmica contemplando a instituição Banco BEST, entretanto constituída assistente nestes autos, desenrolaram-se os depoimentos de CC, M e JR. Os seus depoimentos, com especial enfoque no primeiro, evidenciaram alguma cautela ou comedimento declaracionais, que cremos justificado pela ligação (atual ou passada) ao Banco BEST, face ao qual poderá ainda vir a estender-se a discussão de temática indemnizatória conexa aos presentes autos. Tal postura foi, sobretudo, assumida por CC, o qual declarou exercer atualmente, naquela instituição bancária, as funções de Diretor Coordenador, tendo até 2018 atribuídas funções de Direção Comercial. Nesse enquadramento/posicionamento, o mencionado CC declarou: - ter apenas visto o aqui arguido por uma ocasião, tendo conhecimento mais intenso de M, face à circunstância de ter a mesma exercido funções de agente vinculada ao Banco BEST durante cerca de 10 anos (sendo já antes pessoa referenciada pelo desempenho passado de funções na área de seguros); - nesse enquadramento, e face às funções então desempenhadas pelo declarante, terem ocorrido reuniões regulares alusivas ao acompanhamento das carteiras de clientes; - no que ao arguido concerne, ter sido o mesmo, igualmente, agente vinculado da referida entidade bancária, porém apresentando o exercício de outra atividade profissional em simultâneo (ao que crê no domínio da informática), circunstância que tornava difícil a ocorrência de tais reuniões/encontros, acabando por gerar-se a desvinculação de tal exercício perante o BEST; - explicando a diferenciação entre o desempenho das funções de angariador e de agente vinculado (agindo o primeiro na angariação de novos clientes/abertura de contas, e atuando o segundo como verdadeiro gestor de clientes), explicitou ter o desempenho, pelo arguido, da atividade de agente vinculado ocorrido em momento no qual M era mera angariadora, sendo que, após este última passar para a posição de agente vinculado, viu passada a carteira de clientes do primeiro, acabando, pouco depois, por abandonar a colaboração face ao BEST (no ano de 2009); - sem maior detalhe ou pormenorização, explicitou que o desempenho de tais funções pressupunha a prévia realização de formações, desde logo aptas à explicação da oferta de aplicações disponíveis; - no que ao conhecimento da evolução patrimonial do assistente C, esclareceu ser o seu envolvimento patrimonial inicial no BEST de cerca de 1 milhão, valor que veio inicialmente a aumentar por conta de investimentos, até perfazer 1 milhão e 200 mil euros (em 2009/2010), sendo que, após, veio a ocorrer a diminuição progressiva do seu ativo no Banco (em momento temporal no qual o aqui arguido havia já cessado a sua colaboração face ao BEST); - questionado quanto à circunstância de poder ou não ter tal diminuição motivado uma intervenção do BEST referiu – diga-se com algumas e compreensíveis cautelas – que, em caso de saídas de capital superiores a 100.000 euros, ocorrer geralmente um contacto da entidade bancária, por forma a aquilatar a causa de tal “afastamento” relacional, o que afirmou, com reporte ao caso concreto, estar registado em sistema ter sucedido em 2013; - explicitou estar vedada a possibilidade dos agentes vinculados auferirem comissões pagas pelos próprios clientes. Ainda declarou: - ter, a partir do ano de 2007, sido implementado no BEST, um procedimento adicional de segurança, complementar ao antes vigente (cartão de coordenadas), traduzido no envio para telemóvel de um SMS (vulgo “Token”) sempre que eram ordenadas transferências/movimentações de conta, sendo tais mensagens identificativas da importância transferida, da conta de origem e do IBAN de destino. MF, atualmente “desvinculado” do Banco BEST, mas no passado ali tendo desempenhado funções (entre 2006 e 2018, sendo, no período compreendido entre 2014 e 2018 como sub-diretor comercial – para a zona sul), declarou: - não conhecer pessoalmente o arguido ou M (não tendo sequer o conhecimento ou perceção de que o primeiro haja, por algum momento, estado vinculado ao BEST); - ter estado presente numa reunião ocorrida no Centro de Investimentos de Lisboa, a pedido do aqui assistente, na qual procurava aquele inteirar-se do estado da sua conta e património à mesma associado; - ainda que sem capacidade de concretização numérica, refere ter sido o mesmo confrontado com o saldo existente na conta do BEST, evidenciando o mesmo surpresa face à existência de uma disparidade muito significativa entre aquilo que ali se encontrava e a ideia ou expetativa pelo mesmo assumida nesse conspecto; - da memória que conserva quanto à dinâmica evolutiva dos ativos ali depositados, afirmou ter presente a existência de investimentos expressivos (na casa das centenas de milhares de euros) em fundos de investimento, bem como de operações de resgate (explicitando que os fundos de investimento tinham sempre risco associado e que não conferiam a garantia do capital), também tendo presente a existência de transferências interbancárias; - perante a situação em apreço, refere ter prontamente reportado a situação ao Administrador Executivo do Banco (PN), não assumindo mais nenhuma intervenção e desconhecendo da eventual existência de auditoria (realçando uma vez mais ter, pouco após, abandonado a estrutura do BEST). JR, apresentando-se como agente vinculado do Banco BEST desde o ano de 2012 (e até à atualidade), explicitou: - conhecer M, com a qual havia partilhado a frequência de escola, e face à qual veio a “herdar” alguns clientes (entre os quais, em 2018, o assistente C, com o qual refere nunca ter antes falado, e, desde 2017, E, que refere desconhecer ser companheira do primeiro, e com a qual refere ter estado numa reunião de apresentação com a cliente e M numa imobiliária de Setúbal); - no tocante ao aqui arguido, refere apenas conhecer como cliente da citada instituição bancária; - corroborou a impossibilidade de recebimento de quantias de clientes por conta de qualquer tipo de comissão ou prémio, ainda destacando a impossibilidade de movimentarem as contas dos clientes – o que apenas a estes ficava reservado – tendo apenas acesso a uma página web do banco por forma a consultarem as carteiras dos clientes aos mesmos afetos. * Num derradeiro plano, alusivo ao circulo vivencial mais próximo do arguido e da falecida M, prestaram depoimento MF (mãe de M e sogra do arguido – indicada pela acusação pública) e D (filho de M e do aqui arguido – arrolado pela defesa deste último).Não obstante a proximidade vivencial ou afetiva face à pessoa do arguido, os seus depoimentos afiguraram-se-nos dotados de desenvoltura e sinceridade. Nesse plano ou enquadramento emerge dos seus depoimentos, em ordem de maior relevância para estes autos: MF: - atualmente com 85 anos, referiu estar reformada há 23 anos, tendo antes desempenhado funções como professora; - referiu ter acedido, a pedido da filha M, a abrir uma conta em seu nome do Banco BEST, sob o fundamento invocado por aquela de permitir-lhe o recebimento de uma comissão por abertura, conta essa que refere nunca ter usado ou movimentado e face à qual afirmou, de resto, nunca ter visto entregue qualquer meio de movimentação; - enjeitou ter alguma vez aberto conta no Banco BANIF ou Santander Totta; - no tangente à conta do Banco BEST refere nunca ter recebido qualquer extrato da mesma, cujo valor depositado referiu ter, a dado momento, pedido que transferisse para os netos, passando apenas a receber extratos após a morte da filha; - ainda que sob juízo dedutivo/opinativo, referiu estar em crer que os movimentos a que aludem os autos, mormente os alusivos a contas criadas em seu nome, à própria filha, que referiu “ser muito esperta” e desenvolta e que dificilmente lhe relataria ações menos claras, face às quais é a declarante contrária; - por contraponto, do arguido assumiu a descrição de um indivíduo de perfil “low profile”, dedicado à profissão (primeiro numa empresa e, após, numa imobiliária) e aos filhos; - concluindo pela ausência de conhecimento, por este último, de eventuais ações levadas a cabo por M, explicitou ser esta última a “mulher das contas” na dinâmica familiar, ainda relatando a surpresa evidenciada pelo arguido, cerca de um mês após a morte da mulher, quando veio a ser surpreendido por dívidas existentes que, até aí, afirmou desconhecer (a testemunha utilizou a expressão “caiu na terra”); - Instada a descrever a condição económica do casal referiu que, desde o casamento de ambos, sempre os ajudou financeiramente, vindo também ela própria, já após o decesso da filha, e percecionadas então as dívidas existentes, a auxiliar o arguido no pagamento de cerca de 16 mil euros de rendas habitacionais deixadas em atraso, tendo ainda de custear as cerimónias fúnebres da filha. D, por seu turno, declarou: - ser desconhecedor da temática dos autos ou bem assim das questões atinentes ao desempenho profissional dos progenitores, que referiu nunca ser objeto de discussão em contexto doméstico; - com enfoque na pessoa do progenitor (aqui arguido) referiu ter do mesmo a imagem de uma pessoa de trabalho (primeiramente na empresa L e, após, em agência imobiliária), saindo cedo de casa e retornando já muito cansado, nunca trabalhando em casa, designadamente no computador, descrevendo-o como pessoa pouco disponível para navegar on line ou aceder a redes sociais; - ser a mãe do declarante, M, que descreveu como pessoa de personalidade muito forte, ativa e quase impositiva (por contraponto a uma posição mais calma, reservada e passiva - algo submissa - do pai), com maior à vontade no uso da internet, quem liderava as opções em família, sendo também a pessoa que chamava a si a gestão da economia familiar, ali contemplando o pagamento de contas; - exemplificou tal facto com a circunstância de, aquando do decesso da progenitora, não ter o arguido qualquer conhecimento da forma ou código de acesso às contas de fornecimento e luz e gás, tendo por isso de recuperar novos acessos; Instado a esclarecer quanto à “saúde financeira” do agregado, referiu: - ter a situação do agregado registado ajuste da condição aquando do términus da atividade do progenitor na L, passando aí o agregado a contar unicamente com o rendimento laboral da mãe (afirmando nunca ter conhecido ao arguido o desempenho laboral no BEST); - ter realizado, tal como a irmã (mais nova) o percurso escolar em colégio do 1º ao 6º ano, transitando após para o ensino público (no ano de 2008); - em matéria de férias, referiu serem sempre passadas no Algarve, onde dispunham de uma semana anual de arrendamento em regime de time-sharing, tendo apenas memória de uma viagem ao estrangeiro, mais concretamente a Paris, quando o declarante apresentava 11 anos de idade; - no que à disponibilidade de viaturas automóveis terem primeiramente uma viatura Toyota, recebida pelo arguido na sequência do acordo de cessação de atividade laboral na L, que acabou por vender, passando então a dispor de um jipe/SUV de marca Mercedes, o qual após também foi vendido, sendo trocado por uma viatura mais antiga. No que ao Peugeot 206 referiu ter sido cedido pela avó ao declarante, acabando este por ceder o seu uso ao arguido, sendo assim o atual veículo daquele; - no que à frequência do ensino universitário, ter carecido de arrendar um quarto em Lisboa em 2015 ou 2016, sendo o valor de tal despesa custeado pela avó; - terem tido empregada doméstica 3 dias por semana. Conclui assim no sentido de nunca ter percecionado, em contexto doméstico, um padrão vivencial tido por superior à norma, destacando mesmo a progressiva degradação da saúde financeira do casal (com necessidade de recurso ao auxílio de terceiros). Reforça tal realidade no momento subsequente ao de óbito da mãe, o qual refere ter sido contemporâneo à descoberta, pelo progenitor e por ele próprio, de que “estavam afundados em dívidas” (designadamente dívida habitacional e relacionada com cartões de crédito), para o que está em crer não ter contribuído a ação do arguido, na medida em que este reagiu a tal realidade sendo apanhado de surpresa. Ainda acrescentou ter também apenas após aquele momento percecionado a existência de contas bancárias criadas em seu nome e da irmã, e cuja existência ou movimentação antes desconhecia. Uma vez mais sob domínio de convicção própria, e em decorrência do que atrás assinalou, referiu estar em crer que M assumiria por motu próprio a movimentação e acesso das contas do arguido, tal como sucederia relativamente à conta dele próprio. * Prova documental:Importará agora centrar a nossa atenção na análise da extensa prova documental feita carrear para os autos, salientando da mesma os aspetos mais relevantes para a elucidação da temática dos autos. Em segmento final da presente apreciação probatória, compatibilizar-se-á a mesma com a prova declaracional antes assinalada, em exercício de interpretação alargada, crítica e conjugada de toda a prova tida por relevante. Assim, e ainda no domínio da análise segmentária inicialmente proposta concretizar, temos que: → Volume I dos autos (processo principal – aquele que é adveniente da apresentação de queixa por parte do assistente C): O presente processo inicia-se em 8 de setembro de 2017 com a apresentação de queixa-crime subscrita, por motu próprio, pelo agora assistente, C. A mesma consta de fls. 11 a 16, firmando o relato dos factos, sendo visada pela denúncia, única e exclusivamente, M. Apenas ali é muito esparsamente referenciado o nome do aqui arguido, descortinando-se três curtas e singelas referências, mais concretamente: - o pedido, formulado por M, em meados de 2005, de que pudesse figurasse aquele como colaborador (sem que, todavia, ocorresse qualquer reunião posterior com aquele); - a deteção de movimentações (saídas) de dinheiro passando por contas daquela e por contas do marido; - a existência de uma entrega, pelo arguido, sequencial a uma reunião com M e de pedido/exigência formulado àquela, de um envelope com dinheiro, contendo €2.000,00. Mais nenhuma referência ou atuação, ou bem assim suspeita, é ali descrita no tangente à pessoa do aqui arguido, também nada se referindo quanto ao suposto conforto económico ou vivencial de que pudesse aquele, ou bem assim a denunciada, usufruir ou demonstrar. Segue-se a disponibilização, pelo próprio assistente, de documentação bancária que o mesmo teria em seu poder, designadamente: - Impresso/formulário com o logótipo “Banco BEST”, sob a denominação “ficha de caracterização/alteração de dados”, assinada em 28/06/2016 pelo assistente (como cliente), e da qual consta a assinatura (como “recebedora”) de M (na mesma data de 28/06/2016) e confirmação pelos serviços centrais do BEST, em 5/07/2016. Ainda que tal documento não seja explícito na indicação da alteração ali efetuada, constata-se que o único campo preenchido é o atinente ao n.º de contacto telefónico, que se constata ser o “0351 962771787” (fls. 33 e 34, replicado a fls. 752 e 753). O tipo de formulário em apreço, contemplando o preenchimento em letra maiúscula e por quadriculas, não permite elucidar quanto à autoria do seu preenchimento, sendo que, no domínio da sua assinatura, o assistente não coloca em crise a validade daquela que ele próprio ali firmou. - Extrato integrado numerado com o n.º 7, datado de 1/07/2016 (indicando como data do prévio extrato 1/06/2016 – permitindo pois a conclusão da periodicidade mensal da emissão e envio), constante de fls. 36) identificando (como entidade emissora) o Banco BEST – quanto ao não se evidencia suspeita de falsificação -, endereçado ao cliente C, e indicando como morada de destino “Rua (…..), em Setúbal”. A morada indicada é diversa daquela que é referida pelo assistente como correspondendo à sua efetiva morada (a saber, Praceta (…..), em Setúbal), sendo correspondente àquela que é indicada no texto acusatório como correspondente ao escritório de M. -Missiva enviada pelo Banco BEST, sob o assunto “Emissão de cartão BEST VISA ELECTRON”, datada de 22 de agosto de 2017, indicando, uma vez mais, como morada de envio, a correspondente a “Rua (…..), em Setúbal”. - Cópia do cartão de segurança/coordenadas do Banco BEST (fls. 41), acompanhado de folha anexa (à qual o mesmo se encontraria colado), referindo: “código de utilizador: (…..)” e “password de negociação: …….”. No impresso anexo consta ainda a seguinte redação: “Por razões de segurança guarde a sua password em local seguro. Lembre-se que esta password deve ser apenas do seu conhecimento, dado que o identifica perante o sistema para realizar operações ou aceder a informação confidencial” e “código pessoal secreto: …..”. - Clausulado de adesão aos serviços contratualizados com o Banco BEST, constante de fls. 42 a 45, subscritos e assinados pelo assistente Carlos Basto (constante de fls. 42 a 45), no qual se indica, entre outras cláusulas, a seguinte: “3. Segurança e Identificação do Cliente. 3.1 – A adesão ao BEST pressupõe o correcto preenchimento pelo Cliente dos diversos campos de identificação obrigatórios constantes do referido site ou da ficha de abertura de conta, bem como a definição do código de utilizador e introdução da password de acesso do primeiro titular, que é única, pessoal e intransmissível por si determinada para o acesso ao serviço, e cumprimento das demais instruções ali previstas. 3.2 – As passwords de acesso ao BEST, com excepção da do primeiro titular na abertura de conta on-line, e as passwords de negociação são geradas e atribuídas pelo BEST de acordo com um processo que garante a sua total confidencialidade e têm carácter único, pessoal e instransmissível, sendo o Cliente responsável pelo bom uso e confidencialidade de tais elementos, comprometendo-se a não os divulgar a terceiros, seja com carácter temporário ou permanente, sendo da sua única, inteira e exclusiva responsabilidade a utilização não autorizada, abusiva ou fraudulenta dos mesmos, pela qual suportará todos os prejuízos daí resultantes”. - Documentos comprativos de movimentações/transferências, constantes de fls. 46 a 59, 60 e 61 e 154 a 169 (contemplando documentos bancários oficiais e mapas de apuramento de autoria particular); - Declarações de IRS relativas aos anos fiscais de 2012, 2013, 2014, 2015 e 2016, dos quais é evidenciada a ausência de declaração de quaisquer mais valias (fls. 63 a 104); - Autos de busca e apreensão (os quais visam apenas a suspeita M e não o aqui arguido, incidindo sobre a imobiliária, escritório e residência daquela), constantes de fls. 170 e segs. No primeiro local (imobiliária “Arrenda na Hora” e “Casa na Hora”), espaço que evidencia a prova antecedente ser também local de trabalho do arguido após abertura (em 2015 ou 2016), nada de relevante para a investigação é encontrado ou apreendido (fls. 172). No escritório arrendado pela arguida, correspondente a Rua (…..) – local referenciado como correspondendo ao local de realização de reuniões com o assistente – sendo ali encontrado e apreendido, entre outros documentos, - 1 dossier tendo escrito na lombada “Dr. C”; - 13 recibos eletrónicos emitidos por M ao assistente; - documentação bancária alusiva ao assistente; - documentação manuscrita vária, entre os quais extratos da conta bancária do assistente (tendo aquela como morada de correspondência final); - declarações fiscais (IRS) do assistente e senha de acesso a portal das finanças – fls. 175 a 177 (documentação compilada sob APENSO 4). Por último, na residência comum de M e do agora arguido, são encontrados e apreendidos (na sala) um PC portátil Toshiba e um PC portátil Fujitsu Siemens. Da informação policial de fls. 184 e 205 consta referência que apenas no equipamento Toshiba são encontrados documentos bancários alusivos ao aqui assistente (que se aponta serem manipulados), bem como correio eletrónico. Num móvel do hall de entrada um bloco de apontamentos, com manuscritos (documentos integrantes do APENSO 6). No quarto dos buscados é encontrado no interior de uma mala de senhora, um cheque titulado em nome do assistente, datado de 28/05/2015, com o valor aposto de €10.340,00. No escritório da habitação é encontrada documentação bancária a manuscrita alusiva ao assistente, folhas timbradas com indicação do nome de M, bem como cópias dos contratos de prestação de serviços de ambos os arguidos face ao Banco BEST – fls. 108 a 193 – Demais documentação encontrada na residência indicada compilada no APENSO 5. → Volume 2 (do processo principal); - Informação alusiva a contas bancárias (tituladas pelos arguidos) de fls. 485 e 486 (junto do Banco BEST), 492, 497 a 523, 550 (Millenium BCP), 579 (Banco BPI) - Informação alusiva a contratos de locação automóvel (da marca Mercedes-Benz) celebrados em nome do aqui arguido (juntos de fls. 488); - Contrato de prestação de serviços (como agente vinculado) celebrado entre M e o Banco BEST em 6 de maio de 2009 (constante de fls. 537 a 540); - Missiva de rescisão do contrato supra, enviada pelo Banco BEST a M em 31 de maio de 2016 (fls. 541 e 542); - Informação alusiva à titularidade do n.º de telefone 962771787 (facultado como contacto associado à conta do assistente), que se constata ser um número pré-pago; - certidão de óbito da arguida M, constante de fls. 655 e 656 (óbito ocorrido em 9 de fevereiro de 2019). → Volume 3 (do processo principal): - Documentação bancária (identificativa de operações de transação de valores mobiliários) de fls. 718 a 734, fls. 737 a 751 e 769 a 773; - Missiva de alteração de morada de envio de correspondência, manuscrita e assinada sob os nomes “C” e “C”, com a datação “29 de abril de 2009” (fls. 735); - Contrato de prestação de serviços outorgado em nome do assistente e a “Office Center S. Julião, Lda.” (fls. 735v e 736), assinado sob o nome “C”, datado de 3 de novembro de 2008; - Mapa(s) de transferências, apurado a fls. 753v a 755, 756v a 761; - Mapa de evolução de património financeiro do assistente, na qual se evidencia evolução com oscilações ab initio, pese embora com predominância crescente, até final do ano de 2007, registando-se uma vez mais flutuação oscilante (já abaixo de 1 milhão) até finais do ano de 2011, início de 2012, registando-se a partir desse momento um decréscimo mais significativo; - Parecer elaborado no âmbito da auditoria efetuado pelo Banco BEST em sequência da denúncia efetuada pelo aqui assistente (datado de 8 de fevereiro de 2018), constante de fls. 774 e 775, do qual emerge, em plano de maior relevância, o seguinte: “(…) na análise a que procedemos aos movimentos espelhados nos extratos durante o hiato de tempo compreendido entre 22/10/2004 (data de abertura da conta) e 23/08/2017, verificamos que os mesmos foram efetuados através do Web Site do Banco Best com a utilização das credenciais (chaves de acesso) e passwords únicas, pessoais e intransmissíveis do titular da conta. De acordo com a documentação disponível, em 28/06/2016, o cliente autorizou a alteração de dados nomeadamente a alteração do número de telemóvel para o envio de segurança adicional por SMS para a concretização das operações”. São ali identificadas transferências interbancárias para contas da titularidade e M, A (ora arguido) e MF (mãe da primeira) e Office Center, transferências internas (em contas BEST) para 3 contas tituladas por M e MF, e cheques depositados em contas do BANIF tituladas pelo arguido e pela mãe de M. E ali conclui-se, a final, que: “Em face do explanado, concluímos que a movimentação questionada, com início há mais de 10 anos, foi realizada através da Web, pelo que o cliente, ao facultar as suas credenciais de acesso ao sistema a M, infringiu ele próprio deveres e obrigações contratuais e não observou os princípios e procedimentos instituídos no âmbito da sua relação com o Banco”. - Informações alusivas a contas bancárias tituladas pelo aqui arguido A (com informação acerca da (in)atividade, saldo e/ou movimentos), constante de fls. 836 (informação centralizada do Banco de Portugal), 850 (Millenium BCP), 854 (Santander), 857 (BPI), 859 a 861 (Caixa Geral de Depósitos), 862 (Banco BEST) e 914 a 923 e 926 a 928 (Banco BANIF). → Volume 4 (do processo principal): - Documentação feita juntar pelo arguido em sede de contestação subscrita nos autos (fls. 1038 a 1040 e 1098v a 1108v – alusiva a saldos e movimentos bancários de conta(s) titulada(s) pelo arguido); - Relatório social do arguido (constante de fls. 1056 a 1059); - CRC do arguido (fls. 1141); - Prova junta do decorrer do julgamento: registo de mensagens de segurança de operações bancárias – vulgo TOKEN – enviadas por telemóvel, de cuja análise se evidencia o envio, em 6/07/2016, de mensagem SMS para o n.º te telemóvel do assistente - (…..) -, sob o assunto “alteração de número de telefones, telemóvel e e-mail”, passando só a partir desse momento o envio de idênticas mensagens a seguir para o novo número comunicado (o …..) – cfr. fls. 1169 a 1170v e 1233; - Extratos bancários da conta do assistente no Banco BEST (já replicados noutros segmentos dos autos) constantes de fls. 1176 a 1232). * → Apenso 7486/18.5T9LSB (adveniente de denúncia criminal apresentada pela assistente “Banco BEST”, contra incertos), sendo o NUIPC em referência incorporado aos presentes autos:- Extratos respeitantes à conta bancária de Carlos Basto no Banco BEST, constantes de fls. 17 a 34 do citado apenso; - Documentação alusiva à vinculação de M à assistente “Banco BEST” (fls. 35 a 62). Da respetiva análise emerge, em plano de destaque, o seguinte: - são celebrados entre as entidades supra dois contratos, sendo um primeiro (datado de 29/09/2005) intitulado de “Contrato de prestação de serviços - Angariador” e um segundo (com a aposição da data de 29/09/2005) denominado “Contrato de prestação de serviços – Agentes Vinculados e Promotores” (este último com a data de 6/05/2009). No primeiro destacam-se as seguintes cláusulas: “1.2. Os serviços previstos no número anterior compreendem, exclusivamente, a apresentação, pelo Angariador ao Banco BEST e nos termos previstos no artigo 2., de pessoas que pretendam celebrar contratos de abertura de conta DO com o Banco BEST, no montante igual ou superior a €500,00 (“Potenciais Clientes”). 1.3. Fica expressamente entendido e acordado que, após a respetiva apresentação ao Banco BEST nos termos previstos neste contrato, os potenciais clientes passarão a ser clientes do próprio Banco BEST, com o qual estabelecerão diretamente, sem qualquer intervenção do angariador, todos os contratos e correspondentes relações comerciais. (…) 3. Retribuição: 3.1. A título de remuneração pelos serviços prestados, o Banco BEST pagará ao angariador, por cada contrato de abertura de conta DO que seja ativado, celebrado com uma pessoa referida pelo angariador nos termos previstos no artigo 2. que não tenha ainda estabelecida qualquer relação contratual com o Banco BEST, o montante previsto no Anexo I ao presente contrato, que deste faz parte integrante para todos os efeitos legais e contratuais. (…) 4.3. O angariador não poderá receber dos potenciais clientes quaisquer importâncias, sob qualquer forma, correspondentes a operações por si executadas ao abrigo do presente acordo, nem assinar, em nome e representação de potenciais clientes ou do Banco BEST quaisquer documentos ou contratos, nomeadamente condições gerais e impressos de solicitação ou contratação de aberturas de conta DO”. No derradeiro vínculo negocial assinalado, lê-se, entre outro clausulado, o seguinte: “Cláusula 1ª – 1. O segundo outorgante obriga-se a desenvolver a atividade de agente vinculado e de promotor em nome e por conta da primeira outorgante. 2. Em particular, o segundo outorgante representará a primeira outorgante na prestação dos seguintes serviços: a) prospeção de investidores, fora do estabelecimento da primeira outorgante, com o objetivo de captação de clientes para quaisquer atividades de intermediação financeira; b) receção e transmissão de ordens, colocação e consultoria sobre instrumentos financeiros ou sobre serviços prestados pela primeira outorgante; c) promoção de operações bancárias; e, d) mediação de seguros. (…) Cláusula 3ª (Atos e operações especialmente vedadas ao segundo outorgante) – Ao segundo outorgante encontra-se vedada: a) a celebração de contratos em nome da primeira outorgante; b) a tomada de qualquer decisão de investimento em nome ou por conta dos clientes ou qualquer outra atuação em nome ou por conta dos clientes; c) a receção de dinheiro, títulos de crédito ou de quaisquer outros valores dos clientes; d) a cobrança aos clientes de qualquer remuneração (…) Cláusula 8º (honorários) 1. O valor de honorários que o segundo outorgante receberá pelo resultado do seu trabalho são aqueles que, em cada momento, constam do documento emitido pela primeira outorgante para o efeito, podendo este valor ser revisto com a periodicidade ali estabelecida. (…)”. - missiva de rescisão contratual promovida pelo Banco BEST face a M, datada de 31 de maio de 2016 (fls. 61 e 62). * Demais apensos:→ Apenso 1 (documentação que se crê ter sido entregue pelo próprio assistente C, logo existente na sua posse ou pelo mesmo obtida): contemplam-se quadros informativos (alusivos a saldos ou comissões pagas a M), documentos, impressos e fichas bancárias alusivas à conta daquele, recibos verdes emitidos por M ao assistente, e cópias de talões de depósito de valores na conta BEST do assistente, encontrando-se, pelo menos os constantes de fls. 30, 31 e 34, assinados por M. → Apenso 2 (contempla extratos bancários – reais – da conta bancária do assistente C no período temporal compreendido entre novembro de 2004 e agosto de 2017 – refletindo a perda patrimonial de ativos junto do Banco BEST – em termos conformes com os sintetizados nos autos principais). → Apensos 3-A e 3-B (Contêm mapas/quadros informativos alusivos a património e rentabilidade de investimentos relativos ao assistente C): tratam-se de documentos elaborados em programa informático – em word ou excel -, sem qualquer indicação da respetiva autoria ou aposição de assinatura/rubrica, e sem qualquer aposição de logotipo da instituição Banco BEST) – a informação neles aposta dá conta de evolução positiva do ativo patrimonial. → Apenso 4 (aglutina e integra documentação apreendida na residência comum do atual arguido A e da ex-arguida M): contempla cheque totalmente preenchido e com aposição de assinatura do assistente C, no valor de €10,340,00, com a data de 28/05/2015, encontrando-se omisso o campo “à ordem de”, o qual se encontrava guardado nas condições acima indicadas; segue-se documentação (mapas) informativos alusiva a movimentos e valores de património e rentabilidades (uns em formato word, outros em excel), alguns dos quais com aposição e inscrições/anotações manuscritas; declarações bancárias alusivas à conta do assistente; folhas manuscritas (com letra não sujeita a perícia mas em tudo similar a documentação encontrada no escritório de M – sendo algumas alusivas a operações financeiras e outra indicativa de despesas cremos que a inscrever em declarações fiscais); - os contratos celebrados entre os arguidos e o Banco BEST (como angariadora e/ou promotor – sendo que, destes, apenas a assinatura respeitante a M é similar à caligrafia aposta na documentação manuscrita e/ou anotada apreendida; - uma agenda pertencente a M e folhas com aposição do nome impresso daquela contendo anotações, na mesma caligrafia, identificativa da conta e contactos do assistente C (entre os quais o e-mail assinalado nos autos – carsibras@sapo.pt), bem como da identificação de contas bancárias do BEST de familiares (filhos). → Apenso 5 (compila a documentação apreendida no escritório da arguida M – sito na Rua ….. – Office Centre): São ali detetados e apreendidos: - cópia de bilhete de identidade e cartão de contribuinte do assistente C; - documentação bancária alusiva a operações bancárias realizadas na conta do assistente; - documento redigido a computador alusivo a valores de venda de ativos e despesas associadas (com inscrições manuscritas em tudo similares à caligrafia dos demais elementos apreendidos); - prints do site do Banco BEST com a identificação “histórico de ordens”; - recibos verdes, em formato eletrónico, emitidos por M e identificando como beneficiário de serviço o assistente C (anos de 2011, 2012 e 2013); - impressos tipo para a realização de movimentos bancários e/ou reforço e resgate de aplicações, assinados (em tinta azul) pelo assistente, sendo um deles em branco e outros com preenchimento em letras maiúsculas, de caligrafia similar aos documentos apreendidos nos autos; - declarações de IRS do assistente; - código de acesso à plataforma de contribuinte fiscal daquele e prints alusivos à entrega das correspetivas declarações fiscais; - documentação manuscrita vária. Prova pericial: - A fls. 866 a 895 do processo principal consta a perícia forense efetuada aos 3 computadores apreendidos aquando da realização de busca domiciliária à habitação comum de M e do aqui arguido A. São assim sujeitos a exame os seguintes equipamentos informáticos: 1 - PC portátil marca Toshiba, modelo Satellite L-50, que se identifica sob o n.º referencial EQ01/HD01; 2 – PC portátil da marca Fujitsu Siemens, modelo Amilo Pro V 2000, a que se atribui o n.º referencial EQ02/HD01; 3 – PC portátil da marca Toshiba, modelo Satellite, ao qual é atribuído o n.º referencial EQ03/HD01. No primeiro equipamento (EQ01) nada de relevante é detetado com relevo para os autos. No segundo equipamento citado (EQ02) é detetado sistema operativo registado no nome “M”, sendo identificado, a par da conta de Administrador, a conta do utilizador “M”, cujo acesso é sujeito a aposição de password. É apenas nesta última conta que são detetados ficheiros com a referência Banco Best e ainda documentos com referência ao assistente (irs dr C e DC.pdf). É ainda detetado o acesso via Micosoft Internet Explorer ao site do Banco BEST. Inexiste qualquer registo de conta associado ao arguido A. No último equipamento analisado (EQ03) existe apenas uma conta de utilizador ativa (Administrador), nada de relevante sendo encontrado para a matéria dos autos. * Análise crítica e complementar da prova:Elencada nos termos retromencionados a prova (documental e declaracional) a considerar para a presente sede, importará agora proceder à sua apreciação crítica, complementar e conjugada, não deixando de descurar, na sua interpretação, as chamadas regras da experiência comum, vistas no caso concreto com respeito ao padrão do homem médio. Nesse conspecto, diremos, com especial enfoque na extensa prova documental feita carrear para os autos, designadamente documentação de origem bancária, resultarem plenamente demonstrados os factos concernentes à abertura de conta, por parte do assistente C (médico de profissão), na instituição bancária Banco BEST, na data de 24 de outubro de 2004. Também resulta inequívoco o incremento patrimonial (relevante) do saldo da mesma, por respeito a transferências/depósitos promovidos para aquela por banda do mencionado assistente, oriundas da transferência de aplicações juntos de outras instituições bancárias e/ou por depósito de valor adveniente de alienação de património imobiliário (firmando-se o património ali detido em cerca de 1 milhão de euros). Igualmente resulta demonstrado que a evolução do património detido pelo assistente C em plano continuamente crescente até 2007, passando a partir desse momento a constatar-se uma maior oscilação (positiva e negativa) de ativos, sendo a tendência geral de decréscimo registada em especial a partir do final do ano de 2011 e início de 2012. Por apelo à mesma evidência probatória, é também inquestionável a existência de saídas de valores económicos de montante relevante para contas bancárias tituladas por M e familiares daquela (marido, ora arguido e progenitora). Tal realidade permite-se extrair (quantificando em conformidade com o plasmado no texto acusatório) da documentação bancária feita coligir nos autos, com especial relevância para os extratos bancários, quer da conta do assistente, quer das contas de destino (uma das quais titulada pelo arguido), corroborando, nesse segmento, o depoimento do assistente. Não obstante a clareza e inequivocidade da demonstração de uma tal realidade, afigura-se-nos ser menos evidente e clara a intervenção e/ou conhecimento, na ação conducente a tal realidade, do aqui arguido. Vejamos qual(is) as razão(ões) para assim suceder: Em primeiro plano, cumprirá destacar que os autos (principais) advêm de queixa/denúncia criminal subscrita pelo assistente C, única a exclusivamente contra M. Na peça processual que desencadeia os autos, após feita plasmar (quase de forma plena ou textual) em sede de despacho acusatório, todas as ações ou comportamentos contendentes à abertura de conta, captação de investimentos, realização de investimentos, “updates” periódicos da sua evolução, reuniões periódicas, contactos conducentes ao acesso a tal conta e ação de depauperação dos montantes antes ali depositados, até ao momento final de agosto de 2017 (contemporâneo com a deslocação aos serviços centrais do Banco BEST), são assacadas, em singelo, à ação individualizada de M. Apenas ali se indicam singelas e pontuais referências ao nome do aqui arguido, sendo uma delas direta, a saber, a referência de ter sido o mesmo a trazer, a pedido de M, desencadeado pela insistência de C, de um envelope, contendo no seu interior dinheiro (cerca de 2000 euros) e, numa referenciação mais secundarizada, a circunstância de ter, a partir de determinado momento temporal, passado a encontrar frequentemente M na agência imobiliária gerida por A. Também ali se fez alusão do pedido formulado por M que, num primeiro segmento temporal, figurasse o aqui arguido a posição de agente promotor da conta do assistente, por não ter aquela as habilitações para assumir tal tarefa, no entanto ressaltando-se ser tal intervenção (aceite pelo assistente) meramente formal, declarando nunca ter reunido ou falado com A a propósito de tal assunto. Mais nenhuma menção ou ação relevante se descreve ou imputa ao aqui arguido. Nesse encadeamento, é pois com naturalidade que se constata ser a ação investigatória direcionada, única e exclusivamente, para a pessoa de M, relativamente à qual se firmam as iniciais ações investigatórias (o mesmo sucedendo no apenso 7486/18 adveniente de denúncia firmada pela após assistente Banco BEST). Entre tais diligências, conta-se também o pedido e execução de mandados de busca física, a realizar na morada de escritório de M (Rua ………, em Setúbal) e na residência que a mesma, em comum, assumia com o ora arguido A (Rua …….., em Setúbal) – ressalta-se que os mandados são emitidos tendo por única referenciação subjetiva a denunciada M. É pois, diga-se de forma algo surpreendente (diremos mesmo incoerente face à tramitação até ali observada), que se constata desencadear tal diligência probatória a constituição, como arguido, de A, que, a partir desse momento, passa a ser sujeito da mesma atenção face à denunciada inicial (sua esposa) – designadamente com sujeição a 1º interrogatório de arguido. Em plano temporalmente não muito distante (cerca de 1 ano e 2 meses depois), passa-se a centrar unicamente em si a atenção processual investigatória dos autos, por ocasião e em sequência do óbito de M, ocorrido em 9 de fevereiro de 2019 (fls. 656). E, perante uma tal realidade, o posicionamento da investigação passou a ser um só, sendo destinado a procurar criar uma “ponte” eventual entre a ação (na 1ª pessoa e em plano primordial) da arguida entretanto falecida e o aqui arguido. E nesse mesmo posicionamento se passou a enquadrar o depoimento do assistente C. Na realidade, não divergindo o mesmo, na essência do seu relato, da descrição firmada na denúncia inicial por si subscrita, foi bem evidente o esforço de mencionação da pessoa e nome do agora único arguido, por apelo a realidades não ali inicialmente descritas (vg. a presença do arguido no estabelecimento de café onde se registou a abordagem inicial do assistente, a presença em plano de audibilidade na loja imobiliária aquando da realização, no local, de reuniões com M, a existência de cruzamentos “sociais” entre ambos na rua, no âmbito do qual questionaria o arguido quanto à evolução dos seus negócios, sendo-lhe respondido que tudo estava bem e que “estava bem entregue”, no mesmo enquadramento a existência, a partir de determinado momento, de uma postura “furtiva” a tais contactos, ou mesmo a referenciação à verbalização, por M, de que também trabalhava em casa e que contava com o auxílio/ajuda do coarguido, que após declarou estar convicto ser no domínio da informática). Ora, este novo posicionamento, inovatório face ao inicialmente firmado nos autos, no qual se ressalta, de forma expressa, a ausência de qualquer contacto de índole, teor ou temática profissional, direto ou indireto, com A - não obstante este figurar inicialmente, sob um plano meramente formal, como promotor dedicado -, afigura-se-nos, pese embora natural face à fragilização da sua posição patrimonial em virtude do perecimento da pessoa por si denunciada (M), passível de assumir-se “artificialmente” criada, diremos mesmo forçada, não deixando de fragilizar, nesse segmento, a desenvoltura, equidistância e crédito do seu discurso. Na realidade, por nenhum contributo da prova testemunhal resultou relatada ou passível de extrair-se a participação ativa e real de A na gestão dos ativos financeiros do assistente, ou sequer fazer concluir pelo conhecimento, por aquele, em plano abrangente e/ou de pormenor, dos termos em que aquela temática se processava (o simples relato da presença do arguido no local físico onde, a dado momento, se passaram a efetivar reuniões entre o assistente e a mulher, ainda que na configuração de open space, sem qualquer participação ativa em tais reuniões – diga-se, a par de outros funcionários do espaço – não o poderá, por si só, fazer evidenciar). Por outro lado, e a par do posicionamento passado a assumir supra, o depoimento do assistente, porventura no desenvolvimento maior de questionação a que é em julgamento sujeito, vem agora a assumir-se pelo menos parcialmente contraditado pela prova documental produzida nos autos ou pelas regras da experimentação comum. Vejamos, exemplificativamente, alguns dos segmentos em que assim sucede: - O assistente, por iniciativa própria e sem que nada lhe fosse questionado, preocupa-se em ressaltar ser por si exigido que os investimentos a realizar no Banco BEST fossem seguros, declarando-se assim um investidor cauteloso ou conservador (dessa forma procurando certamente afastar a possibilidade da perda – ainda que parcial - de ativos financeiros advir de investimentos “de risco”), isto não obstante evidencie ter a conta por si aberta naquela instituição bancária por único propósito o investimento de poupanças (ao invés do uso como conta de movimentação “corrente”). No entanto, a análise das aplicações efetuadas, ab initio, contemplando período em que o mesmo recebia ainda na sua morada os extratos bancários, evidencia um perfil bem distinto, com carteira de ativos/investimentos detidos pelo assistente, na qual se inscrevem investimentos avultados em fundos de investimento internacionais, cuja seleção certamente não se contenderá num chamado perfil conservador de investimento. Neste conspecto, e em plano mais compaginável com um perfil dinâmico de investimentos (com assunção do inerente risco) emerge a realidade, permitida dar pelos extratos bancários (fidedignos) feitos juntar aos autos, que o património do assistente assume tendência geral de crescimento até 2007, sendo a partir daí que se regista uma tendência de perda (pouco expressiva num momento inicial e mais acentuada a partir de final de 2011/início de 2012). E tal contexto ou ocasião temporal não é, cremos, indissociável de episódio de crise no imobiliário, iniciada em 2008, com reflexos alargados e distendidos no tempo (no caso português com manifestação em crise da dívida pública no ano de 2011), sendo que tais eventos, a par de outros, conduziram a uma evidente contração do fulgor ou rentabilidade de investimentos e apontaram para uma crise feita prolongar no tempo. Não se diz com isto que toda a perda patrimonial ocasionada na esfera do assistente decorra de tais eventos “de mercado”, isto na evidência documental da ocorrência de transferências da conta daquele para a conta de terceiros. Porém, afigura-se-nos que parte da perda do seu ativo poderá decorrer de riscos normais de funcionamento dos mercados e, cremos, riscos plena e conscientemente assumidos e conhecidos pelo assistente. Na realidade, pouco ou nenhum crédito se nos merece a afirmação feita, pelo assistente C, de estar convicta e genuinamente convencido de ter assegurado, em cerca de 13 anos, o reforço, em 8 vezes, do seu ativo patrimonial (passando de 1 milhão para 9 milhões de euros) com o simples recurso a aplicações seguras ou de capital assegurado, isto na medida em que é do conhecimento generalizado e comum que investimentos seguros implicam esferas ou margens de rentabilidade diminutas. Por outro lado, idêntica reserva se nos assumirá a afirmação do assistente de que, não obstante os expectáveis e significativos ganhos, nunca foi o mesmo fiscalmente alvo da tributação correspetiva, pretensamente sob o pretexto de existirem “bons conhecimentos ou contactos” que o permitiriam assim suceder. Aliás, com tal afirmação, C evidenciou, diga-se, uma postura inconciliável com a posição de inocência que procura fazer transparecer nos autos, acabando por admitir a aceitação de uma realidade pouco clara ou de legalidade questionável, como forma de obtenção de lucro, passando, pelo menos, pela adesão a um esquema de fuga à cobrança fiscal. E essa realidade ou postura, cremos, não poderá ser vista em plano de dissociação face à circunstância de ter M, a dado momento (pese embora sem qualquer formação ou certificação para tanto), passado a assumir a tarefa de preenchimento e entrega das declarações periódicas/anuais de imposto (IRS), fazendo-o com o conhecimento, anuência e aceitação do assistente que, de resto, para tanto lhe fez chegar os códigos de acesso à plataforma de contribuinte fiscal. Assim sucedeu sem que M se assumisse como gestora de negócios ou contabilista certificada, sendo as declarações certificadas eletronicamente como se tratassem de documentos assinados pelo próprio contribuinte (reforça-se, com a concordância deste último). E, neste cenário ou enquadramento, não se deixa o Tribunal, legitimamente, de questionar… Seria o cenário das saídas de dinheiro da conta do assistente, passando por outras contas e “perdendo-se o rasto do dinheiro” uma forma de assegurar a realização de investimentos em nome do assistente sem ditar para o mesmo a inerente e legal responsabilização tributária? E seria a ausência de retorno de valores para a conta de origem adveniente de investimentos de risco implicando perda de ativos? E, neste enquadramento, seria a divulgação, por M, de informação desajustada e inverídica, destinada a ocultar tais perdas? São cenários que não descartamos de forma plena. - Dir-se-á, ainda a propósito da postura ou comportamento do assistente, o seguinte: O mesmo refere ter-lhe sido exigido, como contrapartida do desempenho funcional, como gestora dos ativos financeiros a si pertencentes, e depositados no Banco BEST, o pagamento de 10 % de comissões sobre as mais-valias auferidas. Esclarece ter acedido a tal pedido, efetuando o pagamento com recurso à emissão de cheques bancários. No entanto, refere nunca lhe terem sido disponibilizados recibos ou documentos de quitação dos valores entregues, com o que, cremos, procura apenas demonstrar a perceção do enquadramento de tal comissão como prevista pelos serviços do BEST. Nada mais falso! Desde logo, porque é o próprio assistente a entregar, aquando do início dos autos, documentação que tem na sua posse, na qual se contemplam recibos verdes emitidos por M (fls. 45 a 47 do Apenso). Por outro lado, aquando da efetivação da(s) busca(s), são também apreendidos recibos verdes (eletrónicos) emitidos pela mencionada M (fls. 43 e 44 do Apenso 4). Tais documentos encontram-se emitidos, como contribuinte individual, por M, não tendo qualquer alusão à atuação por intermédio do Banco BEST. De resto, a emissão de recibos verdes ou a necessidade de emissão de cheques bancários (do próprio BEST) sentido algum faria no âmbito da apontada convicção, pelo assistente, da existência de previsão contratual que o permitisse, isto na medida em que, numa relação tripartida, poderia o BEST fazer o próprio acerto das mais valias após dedução da comissão devida, sendo esta descontada ao valor do rendimento a auferir, sem necessidade de ser o cliente a assegurar, por motu próprio, tal pagamento. Perante esta realidade incontornável, uma vez mais nos questionamos se a cobrança de tais valores se encerraria na referida ligação bancária tripartida ou, ao invés, seria apenas ajustada bilateralmente entre o assistente a M – no âmbito da autonomia contratual de ambos (ainda que implicando a violação do vínculo contratual da arguida perante o BEST) como pagamento dos seus serviços, os quais se constata irem além da ação de promotora (M tratava das declarações fiscais do assistente) e que, em determinados segmentos temporais, se mostram desprendidos de qualquer vínculo face ao BEST (assim sucede no momento de contratação dos serviços da referida instituição Bancária, no qual M refere não ter a sua situação regularizada por forma a atuar em representação daquela, ou após ver cessado o vínculo assumido, de que também informa o assistente, aceitando este que a mesma continuasse a gerir, já sem o referido vínculo, os seus ativos). Na realidade, é apenas este último cenário aquele que se revela digno de credibilidade, isto quando se constata que tais comissões começariam, segundo o próprio assistente, admite, ab inito a ser cobradas, isto em momento no qual nem M nem o arguido assumiam qualquer ligação ao Banco BEST. E assim sendo questionamos, porque razão inexistem recibos emitidos por A? E, reforça-se, tal sucede também num momento temporal final, ocorrido já após maio de 2016, momento em que ocorre a cessação plena de funções de M junto do BEST, facto que é levado ao conhecimento do assistente e que está na origem da nomeação de novo gestor de conta, e que, não obstante, não o demove de, segundo o mesmo refere, continuar a efetuar pagamento de comissões que, face à cessação do vínculo de gestora do BEST, deixaria de ter fundamento de ocorrerem. A resposta, cremos, apontará para o sentido atrás aventado, que apontará para a existência de um vínculo contratual assumido diretamente, e a título particular, entre o assistente e M, no qual a existência de conta no BEST se assumiria, essencialmente, como mera conta de suporte e angariação. De resto, a prova demonstra também que, além dos valores efetivamente entregues pelo arguido a M, fossem eles em plano de comissões ou, admite-se, de prestação de qualquer outro serviço, a referida arguida apresentava-se, à data de realização da busca domiciliária (em 8/11/2017), titular de um outro cheque, emitido já no transato ano de 2015, pelo valor de €10.340,00, assinado pelo assistente, encontrando-se o campo “à ordem de” por preencher (nota-se que tal cheque se encontrava no interior de uma mala de mulher, sendo assim a sua pertença inquestionavelmente feita por referência a M). Mais uma vez questiona-se o Tribunal qual a razão da existência de tal título de crédito nunca apresentado a pagamento e sem preenchimento integral dos seus campos de preenchimento, pouco compaginável com o desígnio feito descrever nos autos. Mais: - A análise documental dos autos permite a soma de valores pretensamente devidos a título das atrás mencionadas comissões em valor superior a 800 mil euros! Ora, uma vez mais, tal valor é muito expressivo como simples remuneração de um agente comercial bancário, sendo quase equivalente ao valor inicialmente subscrito pelo assistente na conta do BEST. Não seria a expressividade de tal valor, pago ao longo de um período temporal de cerca de 13 anos, merecedor de reservas do assistente? A resposta é, para qualquer um, óbvia. Na realidade, o assistente apresenta-se em julgamento como um indivíduo vivido, dotado de estudos superiores e com desempenho alargado das funções de médico, não sendo pois um indivíduo de parca escolaridade ou diminuta experiência de vida. Outrossim, invoca ser a origem do capital investido como correspondendo às “poupanças de uma vida de trabalho”. Porém, revela, no mínimo, uma posição desinteressada ou alheada do controlo efetivo da evolução de tais poupanças, as quais entrega a uma pessoa que, não tendo uma situação de regularidade formal face ao Banco BEST, na posição de promotora, conhecera apenas do contacto de café. De resto, nessa posição de alheamento, acaba mesmo por criar, ele próprio, todo o contexto porventura aproveitado para o eventual “abuso” de quem gere o seu património, solicitando ao BEST, por intermediação de M, que deixasse de receber em casa dos extratos bancários da sua conta, e facultando àquela arguida (entretanto falecida) os códigos de acesso à sua conta (necessários para a realização de operações bancárias), os quais, da leitura do clausulado que ele próprio assinou, são de uso pessoal e estritamente intransmissíveis. E não se invoque, em plano apto a contraditar esse “laxismo” do assistente, a existência de uma atuação criada por terceiros, o que se poderia extrair da alteração, que se refere promovida por M, dos elementos de contacto postal e telefónico do assistente, como propensos a retirar-lhe a capacidade de controlo da sua conta. Senão vejamos: → relativamente à indicação de morada diversa para o envio de correspondência postal, importa ressaltar que a mesma é complementar e indissociável à comunicação escrita feita, a fls. 735 (carta datada de 29/05/2009), pelo assistente, no sentido de passar a ser a comunicação bancária enviada para a Rua (…..), em Setúbal. O assistente admite tal facto (a redação e assinatura da missiva supra) mas enjeita ter celebrado o contrato de aluguer/arrendamento de fls. 735v e 736, com base no qual se fundamenta a razão de ser do envio de correspondência para aquele local, afirmando ser a assinatura ali aposta falsa. No entanto, importa considerar que tal documento é anexado à missiva primeiramente mencionada, tendo datação anterior, sendo salientado na missiva o envio de comprovativo de possuir o requerente, no novo local de notificação de correspondência postal, de gabinete profissional (sendo assim fls. 735 a 736 um único documento e não dois elementos separados). De resto, até se estranha a reserva ora passada a assumir pelo assistente, porquanto, constando tal elemento documental desde uma fase muito embrionária da investigação, constata-se que nunca antes aduzira tal reserva, a qual, a suceder, certamente demandaria a sujeição de tal documento a um exame pericial. Mais, o referido documento encontra-se igualmente assinado pelo representante do centro de escritórios Office Center, sem que se invoque ou demonstre o conluio ou envolvimento do mesmo na outorga de um contrato falseado. Tal contrato, de resto, motiva a realização dos devidos pagamentos de arrendamento, os quais se constata serem feitos em débito da própria conta bancária do BEST titulada pelo assistente. E disso o assistente, pretensamente, também não dá conta… → Relativamente à alteração do contacto telefónico o mesmo se diga. A mesma é promovida pelo preenchimento e entrega nos serviços do BEST de impresso próprio, o constante de fls. 33 e 34 – e replicado noutros momentos dos autos -, o qual se mostra assinado pelo assistente (sem menção de qualquer reserva em redor da fidedignidade da assinatura). Segue-se à sua entrega nos serviços centrais do BEST o envio de uma mensagem SMS dando conta do pedido de alteração formulado, e informando quanto ao envio postal de documentos destinados à comprovação e finalização do mesmo. Tal mensagem SMS é enviada para o n.º (…..), que se constata ser o contacto do assistente (os próprios autos de inquirição do assistente nos autos o evidenciam), não havendo qualquer demonstração que não haja ali sido rececionados. Não obstante referir nunca ter solicitado tal alteração, o assistente nada faz no sentido de invalidar tal alteração ou sequer de se inteirar da razão da sua comunicação, também não procurando indagar quanto ao envio – e para que local – de documentação de validação de tal ordem. E, mais uma vez, apenas encaramos tal “passividade” ou face a um cenário de evidente incúria, desinteresse ou desleixo do mesmo, ou, porventura com maior aproximação da realidade, por ser tal operação de alteração efetivamente desejada, e porventura encarada como forma de conceder a M uma maior liberdade de ação (o assistente evidenciou incómodo por ser contactado pelo Banco e por ter de facultar código de acesso a solicitação telefónica de M). De resto, a mesma lógica se firma quanto à disponibilização do código/password necessária à autorização de operações bancárias, a qual refere suceder a solicitação telefónica de M, com disponibilização da mesma pelo assistente, procedimento que, a deixar de suceder (conforme sustentaria a ausência de perceção das movimentações realizadas ao arrepio da sua vontade ou conhecimento), ou pressuporia a disponibilização plena e voluntária dessa informação ou (“entregando-se o assistente à atuação da arguida”) ou, a assim não suceder, mereceria de um cidadão normal e diligente o esclarecimento sobre a razão de ser de não mais lhe serem solicitadas tais validações. * Mas se algumas das inconsistências ou incongruências acima apontadas se nos permitem apor, pelo menos em parte, algumas reservas em redor da plena validade do relato dos factos veiculada pelo assistente C em julgamento - alimentando a sua absoluta inocência no processo que conduz ao inegável empobrecimento do seu património -, a evidência probatória do envolvimento, participação e/ou conhecimento das ações que conduziram a tal desfecho por parte do aqui arguido é ainda mais frágil.Senão vejamos: → Exercício de funções de promotor/gestor de investimentos: A assunção, pelo arguido A, das funções de promotor dedicado da conta bancária do assistente C, a suceder (o que, diga-se, não é claro e inequívoco), é apenas formal, sendo que o próprio assistente refere nunca ter reunido com o arguido ou lidado com o mesmo a propósito das questões de gestão do seu património financeiro. → Interação entre arguido e assistente: A ocorrência de pretensas interações verbais casuais, em cruzamentos ocorridos em via pública, ou o teor (sempre genérico, quase de “circunstância”) nos mesmos aduzido pelo assistente, nada permite evidenciar a existência de conhecimento genérico ou pormenorizado da gestão empreendida por M. → Entrega de envelope com dinheiro: A circunstância de ser o mesmo a pessoa responsável pela entrega de um envelope contendo dinheiro nada evidencia, na medida em que tal sucede após conversação com M, por solicitação ou sob fundamentação que se desconhece, desconhecendo-se igualmente a origem de tal envelope ou do dinheiro que nele se encontrava (por exemplo se mostrava já naqueles termos, se foi necessário efetuar algum levantamento e quem o fez), sendo também de ressaltar que não se demonstrar ter o arguido atestado o que ali se encontrava, face à circunstância de o ter entregue fechado. É também de destacar que a entrega do referido envelope sucede na rua e não no escritório de M, não se relatando a ocorrência de uma qualquer interação verbal mais impressiva. De resto, a ação descrita é de entrega ao assistente de uma importância monetária ao invés da sua retirada da esfera de disponibilidade daquele, o que, isso sim, configura ser o núcleo da infração penal assacada. → A presença física do arguido em reuniões/encontros entre M e o assistente C: A admita-se provável presença física do arguido, a partir de determinada altura, no local onde passam a existir encontros entre C e M, a saber, a imobiliária explorada pelo próprio arguido, e a circunstância do mesmo poder percecionar, até sonoramente, o teor de tais encontros face à configuração física do espaço – open space -, nada evidencia ou permite concluir, sendo que, a par do arguido, outros funcionários que ali se encontravam poderiam igualmente inteirar-se das mesmas, sem que tal lhes conceda o conhecimento da situação económica ou financeira (real ou fictícia) do assistente. De resto, é o próprio assistente a afirmar que, no indicado local, já não ocorreram reuniões de comunicação de resultados de investimentos ou de comunicação de evolução patrimonial, mas tão somente encontros no âmbito dos quais o mesmo manifestaria o propósito de aceder a importâncias ali pretensamente detidas. → Buscas: Na decorrência das buscas efetuadas ao escritório exclusivo de M, à residência e à imobiliária onde desempenhava funções do arguido, constata-se que, no último espaço, nada é encontrado, apenas ocorrendo apreensão de documentos no escritório da arguida (em maior número e dimensão) e alguma documentação (essencialmente anotações manuscritas) na habitação comum dos arguidos. Neste último segmento, há documentação física que é detetada em condição de acesso estrito à arguida M (cheque guardado numa mala feminina), sendo outra documentação identificativa daquela arguida (agenda e folhas com cabeçalho identificativo daquela). No restante, a documentação apreendida (com conexão face à conta do assistente) é encontrada numa zona comum (de escritório), porém com aposição de anotações em escrita similar àquela que é detetada em espaços da disponibilidade exclusiva de M, ou, no que à contida em suporte digital, num único computador, o qual tem criado uma conta única de utilizador, em nome de M. E também não pode colher a insinuação de que seria o arguido, por titular de conhecimentos no domínio da informática, a pessoa responsável pelo auxílio de M na elaboração de mapas e documentos falsos, quando se constata que estes últimos são feitos sem maior sofisticação ou apuramento, certamente com recurso a programas de uso hoje plenamente generalizado (word, excel). → Movimentação para contas tituladas pelo arguido: O segmento, quanto a nós, mais fortemente passível de revelar o envolvimento do arguido na ação levada a cabo por M prende-se com a circunstância de uma das contas utilizadas para a saída de importâncias monetárias originárias da conta do assistente ser a conta titulada pelo mesmo. Assim é uma realidade incontornável. Porém, a mesma carece de ser analisada com cautela e em plano alargado. Efetivamente, constata-se que outras contas bancárias são utilizadas nesse mesmo plano, designadamente a conta titulada por MF (mãe da arguida). Diga-se, de resto, que é esta última a permitir a movimentação de quantias económicas mais expressivas (por comparação face à conta do arguido). Por outro lado, demonstra-se que as importâncias por ali transferidas não permanecem por períodos temporais alargados, registando-se a sua pronta saída das mesmas. Ora, os depoimentos das testemunhas MF e D evidenciam, cremos que de forma sincera e credível, que a abertura de contas no Banco BEST, em nome de vários familiares de M, ocorrera por iniciativa daquela, tendo desde logo a motivação de permitir a obtenção da comissão devida pela sua abertura. Por outro lado, também evidenciam tais depoimentos que a movimentação das mesmas sempre foi assegurada por M, a qual assumiria uma postura mais dinâmica, por contraponto ao arguido, o qual foi descrito como um indivíduo mais pacato e passivo. Ora, concedendo a decisão final de inquérito que assim haja sucedido quanto a MF (podendo apenas essa realidade justificar a opção pela não dedução, contra aquela, de acusação pública), porque razão não se poderá admitir que o mesmo pudesse suceder quanto à(s) conta(s) do arguido (na qual poderia até ser facilitada a movimentação por M)? De resto, os autos são omissos de elementos de prova que permitam concluir ser apenas o arguido a pessoa encarregue da utilização ou acesso a tal(is) conta(s) – tal como sejam quais os cartões bancários emitidos e respetiva titularidade, existência ou inexistência de canais digitais associados e os seus acessos e utilizadores autorizados, etc. Ou sequer se tais contas eram ou não utilizadas no domínio da atividade profissional que o mesmo desempenhava, designadamente pela agência imobiliária que, a partir de determinada altura, passou a gerir. E, nesse enquadramento, à luz de um agregado que se prefigura ser essencialmente matriarcal, nada nos permite concluir não ter sido M a atuar a jusante e complementarmente à ação que, individualmente, havia já iniciado (sendo inequivocamente ela que se encarregou das ordens de transferência para a saída de montantes da conta do assistente). Diga-se, de resto, e à luz do que se vem atrás analisando, que não se descarta por totalmente inverosímil que, pelo menos em parte, o esquema de saída de montantes da conta bancária do assistente, como passagem por outras contas e eventual destino à concretização, em seu interesse, de investimentos, pudesse ter por propósito evitar a tributação em sede de mais valias, que o próprio C referiu, a dado momento, ter interesse e benefício em ver concretizado. Por outro lado, e ainda que se demonstrasse ter o aqui arguido, em algum momento, percecionado a passagem pela sua conta de tais valores, nada permite clarificar ser a sua ação ou contributo destinada a uma coautoria, ou se, ao invés, numa mera cumplicidade (facilitando a ação delituosa de terceiro). → Do incremento patrimonial do(s) arguido(s): Por último, e em plano necessariamente conexo com o antecedente, cumpre salientar que não se vislumbra, no plano atual, qualquer situação demonstrativa de conforto ou incremento patrimonial, demonstrando os autos, ao invés, que o mesmo se veio apenas a tornar, pelo decesso de M, das dívidas por aquela ou por ambos (na constância do matrimónio) contraídas. Assim se demonstra da análise da documentação bancária alusiva a contas pelo mesmo tituladas, as quais não evidenciam saldos de conta ou aplicações em montante expressivo. Por outro lado, também sob o ponto de vista do património físico, não se vislumbra tal conforto ou incremento. Quanto à habitação, a mesma encontra-se hipotecada em garantia de empréstimo bancário. Quanto às viaturas automóveis descritas como mais “luxuosas” ou de gama mais alta, constata-se que as mesmas haviam sido utilizadas na decorrência da celebração de contratos de leasing. Quanto a aproveitamento para lazer e férias, a prova apenas permite demonstrar a titularidade de um “time-sharing” de um apartamento no Algarve e a realização de uma viagem a Paris, o que, muito dificilmente, poderá ser visto como uma demonstração desproporcional ou evidente de riqueza. De resto, o que a prova produzida espelha é, ao invés, uma maior contração de gastos e despesas, concretizada por exemplo pela troca de viaturas automóveis por outras de condição ou gama mais modesta, o que em tudo contrariaria a lógica refletida na acusação. E diga-se que o aproveitamento, em benefício próprio e ou em benefício familiar alargado, de uma importância de mais de 1 milhão de euros, em chamados gastos ou despesas correntes, isto é insuscetíveis de serem após palpáveis em património real e efetivo, ainda que distendida por um período de cerca de 13 anos (e importa salientar que as perdas se assumem, essencialmente, ocorridas em prazo mais curto – desde 2011/2012), se revela ser dificilmente compreensível, afigurando-se porventura mais crível a realização, sem o esperado retorno, de investimentos em mercados de risco, por ação de M (em nome próprio – e abusivamente – ou em nome do assistente C). Assim, e em síntese, do cotejo de toda a prova acima mencionada, com especial enfoque ao que é permitido retirar da análise da prova documental, a realidade permitida demonstrar é, cremos, não plenamente coincidente com a feita acolher no texto acusatório, quer, num primeiro domínio, quanto ao absoluto desconhecimento e inocência do assistente, que, apenas parcialmente (e numa lógica bem mais circunscrita) se concede poder existir, quer em especial quanto ao envolvimento, participação ou pleno conhecimento, ou bem assim benefício real, que o ora arguido pudesse assumir, em plano de ação concertada face à entretanto falecida M, ou permitindo a esta, com facilitação material, a consumação de um plano pela mesma gizado e executado. O que se crê, ao invés, evidenciado, no que à primeira dinâmica salientada – a da postura do assistente -, é a demonstração clara e real de quem poderá ter pensado, admita-se que iludido pela atuação de M, mas sendo esta temperada por uma “dose significativa”, diremos desmedida, de ambição, ter encontrado uma chamada “fórmula dourada” para o seu enriquecimento rápido e fácil, porventura aceitando o risco associado a tal ensejo (não estando descartada a ocorrência de perdas por funcionamento do risco dos mercados) e/ou descurando ou querendo desconsiderar a realidade comummente conhecida e aceita de que não há lucros fáceis ou soluções milagrosas para o enriquecimento e bem-estar financeiro (pelo menos em plano de legalidade ou isenção de risco). Aliás, a conclusão evidenciada no parecer realizado na auditoria promovida internamente pelo Banco BEST, segundo a qual não haviam sido ali detetadas outras anomalias ou fraudes relacionadas com a gestão de ativos, por M, pertencentes a outros clientes da sua carteira, poderá reforçar a ideia de que o relacionamento entendido assumir entre assistente C e a sua gestora se poderá ter concretizado em termos muito singulares, admita-se consensuais, na sua base, aos envolvidos, ainda que merecendo uma execução que se posse ter assumido desconforme às expetativas de ganho criadas (sendo consabido que, havendo criadas rotinas ou procedimentos habituais de fraude, e intenções de obtenção de rendimentos avultados, estes tendem a generalizar-se a outras vítimas). Dito de outra forma, e fazendo já a ponte com o segundo segmento assinalado - o da intervenção ou conhecimento, pelo arguido, da ação levada a cabo por M -, com apelo aos princípios vigentes no domínio probatório penal, deverá este último segmento, insuscetível de demonstração ou elucidação cabal, ser interpretado com benefício do arguido. O princípio in dubio pro reo é o correlato processual do princípio da presunção da inocência do arguido. Gozando o arguido da presunção de inocência (artigo 32, nº 2, da Constituição da República Portuguesa), toda e qualquer dúvida com que o tribunal fique reverterá a favor daquele. O princípio in dubio pro reo, enunciado por Stubel no século XIX, constitui um princípio probatório segundo o qual a dúvida em relação à prova da matéria de facto deve ser sempre valorada favoravelmente ao arguido. "O principio in dubio pro reo aplica-se sem qualquer limitação, e portanto não apenas aos elementos fundamentadores e agravantes da incriminação, mas também ás causas de exclusão da ilicitude (v. g. a legitima defesa), de exclusão da culpa. Em todos estes casos, a persistência de dúvida razoável após a produção da prova tem de actuar em sentido favorável ao arguido e, por conseguinte, conduzir à consequência imposta no caso de se ter logrado a prova completa da circunstância favorável ao arguido" - Figueiredo Dias in D.tº Processual Penal, 1974, 211. "Não adquirindo o tribunal a "certeza" (a convicção positiva ou negativa da verdade prática) sobre os factos (...), a decisão tem de ser, por virtude do princípio in dubio pro reo, a da absolvição. Neste sentido não é o princípio in dubio pro reo uma regra de ónus da prova, mas justamente o correlato processual da exclusão desse ónus" - vd. Castanheira Neves in processo criminal, 1968, 55/60. Assim, com natural implicação no desfecho decisório dos autos, crê-se unicamente demonstrada a realidade feita descrever em 1) a 32), mas já não cabalmente demonstrada a factualidade indicada em A) a O). De forma mais detalhada, e quanto a cada um dos factos não merecedores de prova, temos que: - A não prova do facto A) estribou-se no conjunto da prova produzida e/ou examinada nos autos, a qual, na leitura acabada de explicitar, se nos afigurou insuficiente para fazer concluir pelo conluio face á ação de M, ou adesão ou apoio a plano gizado em comum ou unicamente por aquela. A mesma lógica impedirá a demonstração probatória plena dos factos K) a O) – os tangentes à imputação subjetiva dos lícitos assacados em acusação pública -, apenas se demonstrando possível provar que algumas importâncias terão passado por conta do arguido, à semelhança do sucedido quanto a outras contas e intervenientes, porém sem demonstração real da ação ou benefício daquele concreto arguido; - Quanto à opção pela não prova do facto B), a opção probatória sedimentou-se, uma vez mais, na análise da prova feita carrear nos autos, designadamente aquela que se assume demonstrativa da análise dos vínculos contratuais de M face ao BEST, demonstrando que, ao ano de 2004, a mesma não assumia ainda qualquer vínculo face àquela instituição bancária. Tal realidade careceu de ser vista à luz da afirmação assumida pelo assistente C em julgamento, no âmbito da qual lhe foi dito, nesse momento inicial, por M, que a mesma não reunia ainda as condições para exercer funções de gestão junto do BEST, sugerindo assim que, na gestão formal, figurasse o nome do arguido (o qual, por análise do suporte contratual que lhe diz respeito, também não assumia, à data de celebração do contrato de abertura de conta, qualquer ligação ou vínculo face ao BEST); - No que ao facto C), afigura-se-nos ter o mesmo resultado contraditado da análise dos investimentos bancários firmados, ab initio, pelo assistente – designadamente em momento no qual era ainda recebedor dos competentes extratos e informações de conta -, os quais se efetivam em montantes elevados aplicados em fundos internacionais, designadamente indexados a índice de bolsa, o que muito dificilmente lhes concede qualquer garantia do investimento do capital investido (não consta, de resto, qualquer literatura aos mesmos respeitante que o evidencie). Aliás, a própria acusação contradiz-se ao afirmar que, inicialmente, o perfil de investidor se assumiu sempre como cauteloso, para, adiante, dar conta de uma pretensa alteração do posicionamento do investidor, verbalizando a vontade de mudança se subscrição para aplicações “mais seguras” – realidade feita refletir no ponto E), do qual também não se fez qualquer prova. Aliás, a acusação assumiria contradição ao afirmar ser o perfil de investimento ser, ab initio, conservador, fazendo após alusão a um pedido pelo cliente de passagem do capital (ou parte) dele para aplicações mais seguras; - O facto D) foi contraditado pelas próprias declarações do assistente, quer no tangente ao momento de início das reuniões assumidas face a M (logo após o momento de abertura da conta no BEST), quer quanto à periodicidade (inicial e subsequente) das mesmas. De resto, a acusação assumia-se, também neste tocante, contraditória, na medida em que fazia relegar “artificialmente” o início das reuniões para setembro de 2005 – data que se percebe ser a de início da prestação de funções de M para o BEST (procurando sustentar a lógica de atuação como gestora do BEST) -, porém descrevendo após ações de captação de capital para investimentos anteriormente a tal data (por exemplo na redação acolhida no ponto 13 da acusação); - A demonstração do facto F) resultou afastada por via da prova efetuada nos autos, a qual demonstrar ter sido o assistente a assinar, por motu próprio, um impresso de alteração de informação do cliente, que se constata ser correspondente ao número telefónico de contacto pelo Banco BEST, rececionando, ainda no seu telefone pessoal, uma mensagem SMS gerada pelo Banco BEST (token) que lhe dava conta da formulação do pedido de alteração de número de contacto. Também no domínio da alteração da correspondência postal, o assistente é subscritor de uma missiva cujo teor é claro na formulação desse pedido (escrita manuscritamente e pelo mesmo assinada), na qual se envia anexa a cópia de um contrato de arrendamento cuja validade não se permite assim duvidar. Nesta medida, o único elemento de contacto cuja alteração se admite puder não ser o assistente conhecedor é o de um endereço de correio eletrónico (email), na medida em que se dá conta da ausência de uso habitual, por C, de meios informáticos; - A não prova do facto G) firmou-se no próprio discurso do assistente C, o qual afirma serem-lhe solicitados por M os códigos/password necessários à validação de operações, que o mesmo lhe fornecia (contrariando, de resto, as obrigações que sobre si impendiam – como alerta – na contratação que ele celebrar com o Banco BEST – onde se ressaltava serem tais elementos de segurança pessoais e intransmissíveis); - O facto H) não mereceu qualquer sequência probatória, sendo que a alusão feita à intervenção “formal” do arguido refere-se reportada a outro momento temporal (fase inicial da gestão) e tendo por suporte motivação diversa (a ausência de condições técnicas para M o fazer); - Também o facto I) não encontrou na prova firmada em julgamento qualquer sustentação probatória, apenas se demonstrando ter o assistente C, por mais do que uma ocasião, solicitado a M o acesso a importâncias depositadas na conta do Banco BEST; - O facto J) também não mereceu, designadamente no que tange à motivação ou fundamento ali mencionados, qualquer corroboração probatória. Também não se provou (com implicação exclusiva face ao aqui arguido) * No que tange ao enquadramento vivencial do arguido e elucidação da sua personalidade, considerou o Tribunal o relatório social feito juntar aos autos, que complementou face aos esclarecimentos prestados por MF e D (demonstração probatória dos factos 33) a 55).* Por último, para a apreciação do seu passado criminal (ou ausência do mesmo), atendeu-se ao CRC feito juntar aos autos – facto 56).
2.3. Das questões a decidir Do texto recursivo de onde perpassa, como se apontou, alguma mescla argumentativa, parece veicular-se um afloramento no sentido de se pretender impugnar a materialidade fáctica, elencando o Assistente recorrente diversos traços da matéria de facto dada como provada e como não provada, com os quais não concorda em termos de dimensão. * Impõe-se, agora, conjeturar, sobre a factualidade entendida pelo tribunal a quo como não provada e que o Assistente recorrente pretende que venha a considerar-se como provada.Aqui, ao que exulta, aponta-se, em primeiro mote, a circunstância de o tribunal recorrido não ter dado como provado - O casal formado por M e o ora arguido, A, já conheciam previamente o assistente, C, visto serem vizinhos do mesmo bairro e frequentaram o mesmo café, no qual por vezes privavam e conversavam; - O arguido, A, consta como o colaborador do Banco Best que apresentou a proposta de abertura da conta bancária do assistente C, tal como foi o PFA (personal financial advisor)/agente vinculado da conta do assistente C, durante o período de Outubro de 2004 a Dezembro de 2009; - O Banco Best é uma instituição bancária que não tem balcões de atendimento ao público e funciona por via electrónica e por contacto telefónico, através de atendimento em centros de investimento e por contacto dos seus Angariadores/“Personal Financial Advisors”/Agentes Vinculados; - Para além do escritório da M no Office Centre São Julião, em Setúbal, realizaram-se também várias reuniões entre o assistente C e a M nas instalações da agência imobiliária “Casas na Hora”, em Setúbal, de que o arguido era o responsável comercial, sobre matéria relacionada com a conta bancária do assistente no Banco Best, sendo que os valores que eram apresentados e explicados pela M ao assistente, nada tinham que ver com a realidade financeira da sua conta bancária; - O arguido é uma pessoa com conhecimentos e experiência em informática e possuía meios técnicos para, por exemplo, apagar as marcas de águas das fotos. Num segundo vetor, questiona o Assistente recorrente a opção tida pelo tribunal recorrido relativamente à materialidade vertida nas alíneas A), B), K), L), M), N) e O). Quanto ao primeiro vetor, pretende o Assistente, sem mais e sem que invoque qualquer normativo legal que o sustente, que se acrescentem factos que no seu único e exclusivo entendimento, pretendendo substituir-se ao tribunal, estão provados. Desde logo, tanto quanto se pensa, toda esta materialidade, cuja essencialidade para o que aqui se discute é duvidosa, não consta da acusação e não foi trazida aos autos pelo Assistente recorrente, em nenhum momento, mormente usando a prerrogativa inserta no artigo 358º, nº 1 do CPPenal, a não ser agora recursivamente. Por seu turno, como já se fez antever, dentre estes “factos novos”, há matéria que pura e simplesmente não tem o menor interesse para saber se o arguido incorreu ou não nos crimes que o Assistente lhe pretende imputar, tais como a questão relativa ao modo como o Banco Best desenvolve a sua atividade, a existência de reuniões entre o Assistente recorrente e M na agência imobiliária e, bem assim, a questão do arguido ser conhecedor e experiente em matéria de informática. Na verdade, não se descortina nem o Assistente recorrente o explica, em que medida o modo de ação do Banco Best – não tem balcões de atendimento ao público e funciona por via electrónica e por contacto telefónico – vem trazer algum colorido que possa conduzir à participação do arguido em todo o sucedido com a conta, investimentos e utilização dos dinheiros do Assistente recorrente. De outra banda, o ter havido reuniões com M em diversos locais, como bem diz o Assistente recorrente, foram com esta e nunca com o arguido. Por conseguinte, sendo o próprio Assistente recorrente a afirmar era sempre tudo com ela (…) desde 2004 e até 2016 reuniu-se sempre só com a Dona M, a circunstância de ter havido ou não reuniões na imobiliária onde por vezes poderia estar o arguido, em nada contribui para demonstrar o que se pretende recursivamente. Quanto ao conhecimento e experiência do arguido em matéria de informática, que lhe permitia apagar as marcas de água em fotografias, pretendendo-se com isso, ao que se pensa, delucidar que o arguido é que congeminou e forjou toda a “documentação bancária” com que o Assistente recorrente foi enganado, basta atentar nas declarações de E (companheira do assistente recorrente) – (…) fui buscar a minha pasta com o extrato da mesma data e comparámos os extratos (…) e eu disse estes extratos não são iguais, eu não acredito que um banco tenha um extrato diferente para cada cliente (…) – e de V (filha do Assistente recorrente) – (…) entretanto mostraram-me documentos que tinham[12] na posse deles com uns logotipos mais estranhos com a escrita cheia de erros ortográficos, com algumas gralhas que é estranho para um banco (…) – para perceber que o alegado grau de experiência e conhecimento do arguido, a ter sido ele a o fazer, é de muito duvidosa consistência. Aliás, o tribunal a quo de modo que se reputa acertado / límpido / certeiro, neste particular conspecto anuncia. E também não pode colher a insinuação de que seria o arguido, por titular de conhecimentos no domínio da informática, a pessoa responsável pelo auxílio de M na elaboração de mapas e documentos falsos, quando se constata que estes últimos são feitos sem maior sofisticação ou apuramento, certamente com recurso a programas de uso hoje plenamente generalizado (word, excel). Por outro lado, no que tange ao grau do prévio conhecimento entre o Assistente recorrente e o casal composto pelo arguido e M, com a densidade que se insinua, sendo uma leitura da prova produzida levada a cabo pelo Assistente recorrente, sem efetivo ancoradouro na prova produzida, não se vislumbra o como e onde se pretende chegar para afirmar que o arguido esteve envolvido no todo acontecido relativamente aos dinheiros e investimentos daquele. Na verdade o Assistente recorrente, em termos de proximidade do casal composto pelo arguido e M afirma (…) conhecia de vizinhança (…) frequentávamos o mesmo café (…) conversávamos de mesa para mesa (…) nunca entrei na casa dos arguidos (…) nunca fui visita de casa (…) quando via o casal era na rua (…), sendo que E, companheira daquele, e a este propósito, é absolutamente cristalina (…) o meu marido é que encontrava o casal (…) no café (…) eu nunca os vi e nunca os encontrei (…). Ora, partir daqui para uma referência em que se pretende dar uma conotação de uma maior ligação, ao ponto de se afirmar que privavam, parece ser uma leitura nada conciliável com a prova produzida, nomeadamente das declarações do Assistente recorrente. Aliás, se houvesse o tipo de laço que se intenta alavancar, não conversariam de mesa para mesa, sentando-se todos na mesma mesa, em sã e amena conversa. Relativamente à questão do arguido ter sido colaborador do Best e que ele é quem consta como o colaborador do Banco Best que apresentou a proposta de abertura da conta bancária do assistente C, trata-se de matéria já por diversas vezes tratada, sendo claro que tudo não passou de uma mera formalidade, referindo o Assistente recorrente (…) assinar um documento por parte do arguido não (…) ela até me disse (…) no início ela ainda não estava bem totalmente regularizada no Best mas este senhor estava como colaborador (…) e ela pediu-me se eu não me importava que o nome dele figurasse como meu gestor e eu disse qua não tinha nada a opor (…) foi o início e passado muito pouco tempo ela ficou logo regularizada (…) quando ia às reuniões, no mapa figurava o nome dela (…) sempre falei com a Senhora M (…). Diga-se que a ligação do arguido ao Banco Best está devidamente tratada no ponto 13 dos factos provados, sendo completamente despiciendo, para o efeito pretendido com o recurso, o acrescento ora pretendido. Em suma, no que concerne a estes pontos, não constando os mesmos da acusação, não tendo o Assistente recorrente, por alguma forma, os suscitado em momento anterior ao recurso e revelando-se os mesmos totalmente inúteis para deles se concluir pela intervenção do arguido, ainda que indiretamente, em todo o acontecido, nada mais resta que concluir pela sucumbência do peticionado. Um debruce, agora, sobre as diversas alíneas consideradas não provadas que o Assistente recorrente defende que deveriam constar como pontos provados. Tal factualidade, esta sim, suscetível de encerrar carga bastante para a condenação do arguido, pelo menos, pelo crime de burla. Conquanto, tal como sobejamente tratado na decisão em dissídio e sopesando toda a prova coligida, sendo que foi auditada a totalidade da prova testemunhal produzida, examinada a prova documental pertinente, é por demais evidente que são escassos, para não dizer quase inexistentes, os dados probatórios que permitam retratar a participação do arguido em todo o histórico sucedido. Reiterando, é absolutamente apreensível que é o próprio Assistente recorrente que tudo reporta a M (…) nessa reunião estava só ela e eu (…) ela apresentou-me uns papeis para eu abrir a conta no Best (…) marquei encontro com ela (…) cheguei ao pé dela no escritório abriu-se e ela mostrou-me e então explicou-me o que era (…) o que se ia fazer, em que é que se ia trabalhar, os códigos e umas chaves, explicou-me isso (…) era só para ela fazer os investimentos (…) ela levantava os cheques para mim (…) os cheques eram para pagamento da comissão dela (…) ela (…) quando achasse oportuno e julgasse que havia uma quantia razoável me convocava para me apresentar uns mapas das evoluções dos investimentos e nos quais refletia a percentagem dela (…) ela só me ligava ao telefone para me pedir os quatro dígitos de uma chave de negociação e eu telefonicamente respondia e dava-lhe (…) apenas eram-me entregues os mapas que ela fazia das evoluções, ela entregava-me e eu lia (…) pedi a ela (…) era sempre tudo a ela (…) lá no escritório não vi este senhor[13] (…) este senhor eu encontrava-me por diversas vezes na rua quando fazia as minhas caminhadas encontrava-me com ele estava a passear a cadela, conversávamos, eu perguntava como estão as coisas a andar (…) ele dizia está tudo a correr (…) ela a querer por-me a fazer uma vida modesta (…) um dia fui ter com ela e disse-lhe você não pode dizer ao banco (…) que me deixe de mandar tantas cartas (…) eram quase diárias (…) ela disse então está bem pronto eu trato disso (…) depois deu-me uns papeis para eu assinar (…) assinei várias coisas (…) fui sim às instalações da imobiliária (…) estava lá o arguido assim como estavam lá outras pessoas (…) eu às vezes dispensava de ir à reunião com ela (…) ela entregou-me um documento oficial do Best eu aceitei sem desconfiança (…) assim um documento por parte do arguido não (…) sempre falei com a Senhora M (…) vou-lhe exigir a ela que me arranje um cartão multibanco (…) ela meteu-me uma data de senãos a adiar o cartão (…) o que se passou foi que a M a uma certa altura veio-me dizer que o banco queria fazer umas atualizações (…) meteu-me uns impressos à frente (…) não li o que estava lá (…) assinei (…) ela deixou de ser colaboradora do Best um ano e picos antes de agosto de 2017 e ela disse-me que o banco havia de me atribuir outro gestor (…), na conversa na imobiliária o marido da Senhora M estava na secretária ao lado (…) não houve qualquer intervenção (…) ela explicou logo aquilo tudo (…) a princípio via o nome dele como gestor (…) depois começou a aparecer o nome dela (…) para mim sempre foi a Senhora M (…) segundo ela me mostrava nos mapas devia ser um milhão e duzentos mil (…) no início (…) no final seriam nove milhões (…) eu sempre ouvi dizer através dela que ele trabalhava em informática (…) só sabia que ele trabalhava numa empresa no Porto (…) ela até dizia que para fazer os meus investimentos ela tinha comprado dois programas (…) cada um no valor de 3 mil euros (…) ela também percebia de informática (…) desde 2004 e até 2016 sempre reuniu só com a Dona M (…) ela dizia que tinha umas duas velhotas como clientes (…) dizia que tinha um cliente indiano para o Alentejo que tinha um património de 40 milhões (…) quem fazia os movimentos era ela (…) a Senhora M tratou do IRS logo desde o início (…). Corroborando, importa repescar o declarado por E, companheira do Assistente recorrente que, prestando o seu depoimento, vem dizer (…) com a Senhora M tive dinheiro aplicado no Best e foi através dela que fiz essa aplicação (…) logo no início o meu marido disse-me que numa reunião que tinha tido com a Dona M que ela lhe tinha perguntado se ele se importava que (…) figurasse o marido como gestor de conta porque ela inda não tinha o processo (…) ainda não estava bem no Best (…) de início ela fazia aplicações talvez passado um ano ela disse que como o meu montante era pequeno ela ia aplicar num seguro (…) ela disse que como o meu marido já pagava comissão ela não me cobrava (…) eu não reuni muitas vezes com a Senhora M (…) na imobiliária (…) o marido da Senhora M (…) encontrei-o lá algumas vezes única e simplesmente não falava com ele dirigia-me à Drª M (…) o comportamento da Drª M nos últimos tempos ela que era sempre uma pessoa muito simpática e muito prestável estava um bocado diferente e entretanto o meu marido pedia dinheiro à Drª M e ela arranjava sempre desculpas nunca havia disponibilidade para ter dinheiro (…) o meu marido (…) encontrava o Senhor A a passear a cadela e conversavam sempre muito e ele muitas vezes chegava a casa e comentava comigo, encontrei o marido da Drª M, estivemos a conversar (…) vais falar com a V e vais-lhe contar aquilo que me tens contado em relação às atitudes da Drª M (…) estivemos nessa reunião e eu fiz-lhe a pergunta sobre (…) aquela figuração dos filhos e eu na conta como é que isso funcionava, perguntei-lhe daquele dinheiro aplicado (…) o meu marido foi-lhe dizer que a partir daquela data eu iria estar sempre presente nas reuniões (…) entretanto eu pedi-lhe a password e ela disse Ah! Mas a password está sempre a mudar (…) o marido não estava, nunca tive nenhuma reunião com ele[14] (…) ele confiava absolutamente nela, tudo o que ela dissesse era lei (…) eu nunca assisti a nenhuma reunião do meu marido com a M a não ser no dia 31 de agosto (…). Em reforço, colecione-se o que V, filha do Assistente recorrente trouxe como contributo (…) eu vi o Sr. A uma vez (…) foi numa ocasião em que me desloquei com o meu pai ao escritório na altura da Drª M em que o objetivo era o meu pai emprestar-me dinheiro para a compra de uma casa (…) nessa ocasião estivemos a discutir esta possibilidade com a Drª M com a gestora de conta do meu pai (…) ele não teve qualquer intervenção na conversa (…) a Drª A disse na altura que movimentar (…) à volta dos 400/500 mil por aí (…) que não seria muito conveniente deslocar ou mover um montante tão elevado porque ia levantar suspeita (…) esta reunião foi em agosto depois dos anos do meu pai, em agosto de 2017 (…) o senhor não teve intervenção nenhuma (…) esta foi a última vez que estive com a Drª M (…) a primeira vez foi cerca de dois anos antes (…) já no final de 2015 (…) quando a ideia seria eu e o meu irmão (…) sermos titulares da conta dele (…) nessa altura foi-nos proposto pela Drª M entrarmos como beneficiários diretos (…) nunca chegámos a ter acesso à conta do meu pai (…) esta reunião foi também neste sítio (…) quem eu tenho presente é a Drª M, o meu pai, o meu irmão, eu e a E (…). Ainda, como nota de relevo, neste particular traço, considere-se o trazido por CC, Diretor Coordenador do Banco Best, (…) o conhecimento que tem é com a Senhora M (…) vi o A uma vez (…) a M foi agente vinculada do banco durante muitos anos (…) seguramente 10 anos mais ou menos (…) durante esse período cheguei a ter reuniões com ela, ela ia ao banco também com alguma frequência (…) se não estou enganado ela foi promotora e depois passou a ser agente vinculada (…) acompanhei a Senhora M desde o princípio (…) era uma pessoa conhecida de algumas pessoas da área comercial (…) era uma pessoa bem referenciada (…) o Senhor A foi também agente vinculado do banco mas ao contrário da M não era uma pessoa tão, por isso acabou por sair mais tarde (…) com ele raramente o via, numa reunião não tenho memória de ter estado (…) vi-o uma vez (…) tenho ideia que começou o A como agente vinculado e a M era promotora depois mais tarde (…) a M passou para agente vinculado e o A não sei se ainda foi promotor e depois deixou de ser porque efetivamente (…) dentro dos nossos critérios não tinha disponibilidade para o projeto também não acrescentou valor e como tal não fazia sentido continuar (…) a M tinha uma carteira de clientes, talvez uns 40/50 (…) a informação que tenho a carteira da M também não crescia, em 2016 (…) a M mantinha-se presente (…) no caso da M foi mais o volume da carteira que estava áquem dos objetivos (…) saídas (…) superiores a 100 mil euros peço sempre a justificação e se for possível até tentamos falar com o cliente (…) neste caso concreto houve uma evolução do património que começou por ser positivo depois desceu foi evoluindo ao longo do tempo (…) eu diria que até ao final de 2009 manteve-se relativamente estável (…) seguramente em algum momento foi pedido um ponto se situação à M (…) nós não temos mecanismos que nos permitam auditar todas as transações que são feitas entre clientes do banco não há capacidade para o fazer (…) não tenho nenhum momento específico com ela (…) devo ter estado com ela 4/5 vezes (…) quando confrontada com a perda de património não tenho registo da resposta (…) foi dada uma resposta coerente (…) não sei qual (…) quando o património do Assistente começou a descer o Senhor A nem formalmente nem informalmente tinha qualquer ligação ao Banco. Por último, chame-se à colação alguns excertos do declarado por MF, mãe de M, sogra do arguido, (…) na conta do Best (…) eu não percebo nada de computadores e tudo isso era tratado pela minha filha (…) eu adoro a minha filha (…) era muito esperta portanto ela sabia que se me mostrasse alguma coisa dessas (…) eu seria o mais contra possível (…) no Banco Best nunca abri mas ela abriu em meu nome até que me pediu para eu abrir juntamente com cada um dos miúdos (…) eu nunca vi nenhum documento concreto (…) eu nunca tinha recebido extratos (…) depois da minha filha falecer (…) o meu genro foi dar com tudo, foi ver o que se passava e os cartões e essas coisas e encontrou uma carta (…) vinha dirigida a mim (…) mas com a direção deles por isso eu não recebia as cartas (…) era do Banco Best (…) a data é de 1/10/18 até 1/01/19 (…) extrato desta conta nunca recebi exceto esta (…) ela mandou-me um extrato que não tinha impresso nada do Best (…) que eu saiba o meu genro não tinha trabalhado no Best (…) ele trabalhava numa empresa que não é o Best (…) o meu genro entregou-me a carta (…) estava fechada (…) o envelope tinha o Best (…) ele disse olhe está aqui esta carta para si e entregou (…) ele é um rapaz muito atilado em contas e tudo (…) a minha filha era a mulher das contas ela é que decidia tudo e o meu genro penso que como tinha trabalhos na empresa e responsabilidades deixava um bocadinho a coisa andar nas mãos dela (…) ela é que decidia (…) ela era uma rapariga muito ativa (…) era ela que fazia isso tudo sozinha (…). Cotejando todo o acima expresso nada há que com segurança mínima permita apontar a participação do arguido em todo o esquema que terá sido montado por M, sua mulher, entretanto falecida. E isso, ao que se pensa, mostra-se devidamente tratado / analisado / trabalhado na decisão propalada, o que se pode extrair de alguns fragmentos da extensa e pormenorizada motivação da decisão de facto que, por se entenderem mais relevantes, e os mesmos se subscreverem inteiramente, se passam a reproduzir de seguida. Assim (…) A fls. 866 a 895 do processo principal consta a perícia forense efetuada aos 3 computadores apreendidos aquando da realização de busca domiciliária à habitação comum de M e do aqui arguido A (…) No primeiro equipamento (EQ01) nada de relevante é detetado com relevo para os autos (…) No segundo equipamento citado (EQ02) é detetado sistema operativo registado no nome “M”, sendo identificado, a par da conta de Administrador, a conta do utilizador “M”, cujo acesso é sujeito a aposição de password (…) apenas nesta última conta que são detetados ficheiros com a referência Banco Best e ainda documentos com referência ao assistente (irs dr C e DRC.pdf). É ainda detetado o acesso via Micosoft Internet Explorer ao site do Banco BEST. Inexiste qualquer registo de conta associado ao arguido A. (…) com especial enfoque na extensa prova documental feita carrear para os autos, designadamente documentação de origem bancária, resultarem plenamente demonstrados os factos concernentes à abertura de conta, por parte do assistente C (médico de profissão), na instituição bancária Banco BEST, na data de 24 de outubro de 2004 (…) resulta inequívoco o incremento patrimonial (relevante) do saldo da mesma, por respeito a transferências/depósitos promovidos para aquela por banda do mencionado assistente, oriundas da transferência de aplicações juntos de outras instituições bancárias e/ou por depósito de valor adveniente de alienação de património imobiliário (firmando-se o património ali detido em cerca de 1 milhão de euros) (…) resulta demonstrado que a evolução do património detido pelo assistente C em plano continuamente crescente até 2007, passando a partir desse momento a constatar-se uma maior oscilação (positiva e negativa) de ativos, sendo a tendência geral de decréscimo registada em especial a partir do final do ano de 2011 e início de 2012 (…) é também inquestionável a existência de saídas de valores económicos de montante relevante para contas bancárias tituladas por M e familiares daquela (marido, ora arguido e progenitora) (…) Não obstante a clareza e inequivocidade da demonstração de uma tal realidade, afigura-se-nos ser menos evidente e clara a intervenção e/ou conhecimento, na ação conducente a tal realidade, do aqui arguido (…) cumprirá destacar que os autos (principais) advêm de queixa/denúncia criminal subscrita pelo assistente C, única a exclusivamente contra M (…) a peça processual que desencadeia os autos, após feita plasmar (quase de forma plena ou textual) em sede de despacho acusatório, todas as ações ou comportamentos contendentes à abertura de conta, captação de investimentos, realização de investimentos, “updates” periódicos da sua evolução, reuniões periódicas, contactos conducentes ao acesso a tal conta e ação de depauperação dos montantes antes ali depositados, até ao momento final de agosto de 2017 (contemporâneo com a deslocação aos serviços centrais do Banco BEST), são assacadas, em singelo, à ação individualizada de M (…) é pois com naturalidade que se constata ser a ação investigatória direcionada, única e exclusivamente, para a pessoa de M, relativamente à qual se firmam as iniciais ações investigatórias (o mesmo sucedendo no apenso 7486/18 adveniente de denúncia firmada pela após assistente Banco BEST) (…) conta-se também o pedido e execução de mandados de busca física, a realizar na morada de escritório de M (Rua ….., em Setúbal) e na residência que a mesma, em comum, assumia com o ora arguido A (Rua ……., em Setúbal) – ressalta-se que os mandados são emitidos tendo por única referenciação subjetiva a denunciada M (…) É (..) de forma algo surpreendente (diremos mesmo incoerente face à tramitação até ali observada), que se constata desencadear tal diligência probatória a constituição, como arguido, de A, que, a partir desse momento, passa a ser sujeito da mesma atenção face à denunciada inicial (sua esposa) (…) (cerca de 1 ano e 2 meses depois), passa-se a centrar unicamente em si a atenção processual investigatória dos autos, por ocasião e em sequência do óbito de M, ocorrido em 9 de fevereiro de 2019 (fls. 656) (…) perante uma tal realidade, o posicionamento da investigação passou a ser um só, sendo destinado a procurar criar uma “ponte” eventual entre a ação (na 1ª pessoa e em plano primordial) da arguida entretanto falecida e o aqui arguido (…) este novo posicionamento, inovatório face ao inicialmente firmado nos autos, no qual se ressalta, de forma expressa, a ausência de qualquer contacto de índole, teor ou temática profissional, direto ou indireto, com A (…) afigura-se-nos, pese embora natural face à fragilização da sua posição patrimonial em virtude do perecimento da pessoa por si denunciada (M), passível de assumir-se “artificialmente” criada (…) nenhum contributo da prova testemunhal resultou relatada ou passível de extrair-se a participação ativa e real de A na gestão dos ativos financeiros do assistente, ou sequer fazer concluir pelo conhecimento, por aquele, em plano abrangente e/ou de pormenor, dos termos em que aquela temática se processava (o simples relato da presença do arguido no local físico onde, a dado momento, se passaram a efetivar reuniões entre o assistente e a mulher, ainda que na configuração de open space, sem qualquer participação ativa em tais reuniões – diga-se, a par de outros funcionários do espaço – não o poderá, por si só, fazer evidenciar) (…) a par do posicionamento passado a assumir supra, o depoimento do assistente (…) vem agora a assumir-se pelo menos parcialmente contraditado pela prova documental produzida nos autos ou pelas regras da experimentação comum (…) - O assistente, por iniciativa própria e sem que nada lhe fosse questionado, preocupa-se em ressaltar ser por si exigido que os investimentos a realizar no Banco BEST fossem seguros, declarando-se assim um investidor cauteloso ou conservador (…) isto não obstante evidencie ter a conta por si aberta naquela instituição bancária por único propósito o investimento de poupanças (ao invés do uso como conta de movimentação “corrente” (…) a análise das aplicações efetuadas, ab initio, contemplando período em que o mesmo recebia ainda na sua morada os extratos bancários, evidencia um perfil bem distinto, com carteira de ativos/investimentos detidos pelo assistente, na qual se inscrevem investimentos avultados em fundos de investimento internacionais, cuja seleção certamente não se contenderá num chamado perfil conservador de investimento (…) e em plano mais compaginável com um perfil dinâmico de investimentos (com assunção do inerente risco) emerge a realidade, permitida dar pelos extratos bancários (fidedignos) feitos juntar aos autos, que o património do assistente assume tendência geral de crescimento até 2007, sendo a partir daí que se regista uma tendência de perda (pouco expressiva num momento inicial e mais acentuada a partir de final de 2011/início de 2012 (…) tal contexto ou ocasião temporal não é, cremos, indissociável de episódio de crise no imobiliário, iniciada em 2008, com reflexos alargados e distendidos no tempo (…) afigura-se-nos que parte da perda do seu ativo poderá decorrer de riscos normais de funcionamento dos mercados e, cremos, riscos plena e conscientemente assumidos e conhecidos pelo assistente (…) pouco ou nenhum crédito se nos merece a afirmação feita, pelo assistente C, de estar convicta e genuinamente convencido de ter assegurado, em cerca de 13 anos, o reforço, em 8 vezes, do seu ativo patrimonial (passando de 1 milhão para 9 milhões de euros) com o simples recurso a aplicações seguras ou de capital assegurado, isto na medida em que é do conhecimento generalizado e comum que investimentos seguros implicam esferas ou margens de rentabilidade diminutas (…) idêntica reserva se nos assumirá a afirmação do assistente de que, não obstante os expectáveis e significativos ganhos, nunca foi o mesmo fiscalmente alvo da tributação correspetiva, pretensamente sob o pretexto de existirem “bons conhecimentos ou contactos” que o permitiriam assim suceder (…) Seria o cenário das saídas de dinheiro da conta do assistente, passando por outras contas e “perdendo-se o rasto do dinheiro” uma forma de assegurar a realização de investimentos em nome do assistente sem ditar para o mesmo a inerente e legal responsabilização tributária? (…) seria a ausência de retorno de valores para a conta de origem adveniente de investimentos de risco implicando perda de ativos? (…) seria a divulgação, por M, de informação desajustada e inverídica, destinada a ocultar tais perdas? São cenários que não descartamos de forma plena (…) ainda a propósito da postura ou comportamento do assistente (…) refere ter-lhe sido exigido, como contrapartida do desempenho funcional, como gestora dos ativos financeiros a si pertencentes, e depositados no Banco BEST, o pagamento de 10 % de comissões sobre as mais-valias auferidas. Esclarece ter acedido a tal pedido, efetuando o pagamento com recurso à emissão de cheques bancários (…) no entanto, refere nunca lhe terem sido disponibilizados recibos ou documentos de quitação dos valores entregues (…) Nada mais falso! (…) é o próprio assistente a entregar, aquando do início dos autos, documentação que tem na sua posse, na qual se contemplam recibos verdes emitidos por M (fls. 45 a 47 do Apenso). Por outro lado, aquando da efetivação da(s) busca(s), são também apreendidos recibos verdes (eletrónicos) emitidos pela mencionada M (fls. 43 e 44 do Apenso 4) (…) documentos encontram-se emitidos, como contribuinte individual, por M, não tendo qualquer alusão à atuação por intermédio do Banco BEST (…) Perante esta realidade incontornável, uma vez mais nos questionamos se a cobrança de tais valores se encerraria na referida ligação bancária tripartida ou, ao invés, seria apenas ajustada bilateralmente entre o assistente a M – no âmbito da autonomia contratual de ambos (ainda que implicando a violação do vínculo contratual da arguida perante o BEST) como pagamento dos seus serviços, os quais se constata irem além da ação de promotora (M tratava das declarações fiscais do assistente) e que, em determinados segmentos temporais, se mostram desprendidos de qualquer vínculo face ao BEST (…) é apenas este último cenário aquele que se revela digno de credibilidade, isto quando se constata que tais comissões começariam, segundo o próprio assistente, admite, ab inito a ser cobradas, isto em momento no qual nem M nem o arguido assumiam qualquer ligação ao Banco BEST (…) assim sendo questionamos, porque razão inexistem recibos emitidos por A? (…) o assistente apresenta-se em julgamento como um indivíduo vivido, dotado de estudos superiores e com desempenho alargado das funções de médico, não sendo pois um indivíduo de parca escolaridade ou diminuta experiência de vida (…) invoca ser a origem do capital investido como correspondendo às “poupanças de uma vida de trabalho”. Porém, revela (…) uma posição desinteressada ou alheada do controlo efetivo da evolução de tais poupanças, as quais entrega a uma pessoa que, não tendo uma situação de regularidade formal face ao Banco BEST, na posição de promotora, conhecera apenas do contacto de café (…) relativamente à indicação de morada diversa para o envio de correspondência postal, importa ressaltar que a mesma é complementar e indissociável à comunicação escrita feita, a fls. 735 (carta datada de 29/05/2009), pelo assistente, no sentido de passar a ser a comunicação bancária enviada para a Rua ……., em Setúbal (…) O assistente admite tal facto (a redação e assinatura da missiva supra) mas enjeita ter celebrado o contrato de aluguer/arrendamento de fls. 735v e 736, com base no qual se fundamenta a razão de ser do envio de correspondência para aquele local, afirmando ser a assinatura ali aposta falsa (…) importa considerar que tal documento é anexado à missiva primeiramente mencionada, tendo datação anterior, sendo salientado na missiva o envio de comprovativo de possuir o requerente, no novo local de notificação de correspondência postal, de gabinete profissional (sendo assim fls. 735 a 736 um único documento e não dois elementos separados) (…) o referido documento encontra-se igualmente assinado pelo representante do centro de escritórios Office Center, sem que se invoque ou demonstre o conluio ou envolvimento do mesmo na outorga de um contrato falseado (…) Tal contrato, de resto, motiva a realização dos devidos pagamentos de arrendamento, os quais se constata serem feitos em débito da própria conta bancária do BEST titulada pelo assistente (…) E disso o assistente, pretensamente, também não dá conta…(…) Relativamente à alteração do contacto telefónico o mesmo se diga (…) Não obstante referir nunca ter solicitado tal alteração, o assistente nada faz no sentido de invalidar tal alteração ou sequer de se inteirar da razão da sua comunicação, também não procurando indagar quanto ao envio – e para que local – de documentação de validação de tal ordem (…) De resto, a mesma lógica se firma quanto à disponibilização do código/password necessária à autorização de operações bancárias, a qual refere suceder a solicitação telefónica de M, com disponibilização da mesma pelo assistente, procedimento que, a deixar de suceder (…) ou pressuporia a disponibilização plena e voluntária dessa informação ou (“entregando-se o assistente à atuação da arguida”) ou, a assim não suceder, mereceria de um cidadão normal e diligente o esclarecimento sobre a razão de ser de não mais lhe serem solicitadas tais validações (…) se algumas das inconsistências ou incongruências acima apontadas se nos permitem apor, pelo menos em parte, algumas reservas em redor da plena validade do relato dos factos veiculada pelo assistente C em julgamento (…) a evidência probatória do envolvimento, participação e/ou conhecimento das ações que conduziram a tal desfecho por parte do aqui arguido é ainda mais frágil (…) a assunção, pelo arguido A, das funções de promotor dedicado da conta bancária do assistente C, a suceder (o que, diga-se, não é claro e inequívoco), é apenas formal, sendo que o próprio assistente refere nunca ter reunido com o arguido ou lidado com o mesmo a propósito das questões de gestão do seu património financeiro (…) a ocorrência de pretensas interações verbais casuais, em cruzamentos ocorridos em via pública, ou o teor (sempre genérico, quase de “circunstância”) (…) nada permite evidenciar a existência de conhecimento genérico ou pormenorizado da gestão empreendida por M (…) a circunstância de ser o mesmo a pessoa responsável pela entrega de um envelope contendo dinheiro nada evidencia, na medida em que tal sucede após conversação com M, por solicitação ou sob fundamentação que se desconhece, desconhecendo-se igualmente a origem de tal envelope ou do dinheiro que nele se encontrava (…) também de destacar que a entrega do referido envelope sucede na rua e não no escritório de M, não se relatando a ocorrência de uma qualquer interação verbal mais impressiva (…) A (…) provável presença física do arguido, a partir de determinada altura, no local onde passam a existir encontros entre C e M (…) nada evidencia ou permite concluir, sendo que, a par do arguido, outros funcionários que ali se encontravam poderiam igualmente inteirar-se das mesmas, sem que tal lhes conceda o conhecimento da situação económica ou financeira (real ou fictícia) do assistente (…) é o próprio assistente a afirmar que, no indicado local, já não ocorreram reuniões de comunicação de resultados de investimentos ou de comunicação de evolução patrimonial, mas tão somente encontros no âmbito dos quais o mesmo manifestaria o propósito de aceder a importâncias ali pretensamente detidas (…) Na decorrência das buscas efetuadas ao escritório exclusivo de M, à residência e à imobiliária onde desempenhava funções do arguido, constata-se que, no último espaço, nada é encontrado, apenas ocorrendo apreensão de documentos no escritório da arguida (em maior número e dimensão) e alguma documentação (essencialmente anotações manuscritas) na habitação comum dos arguidos (…) há documentação física que é detetada em condição de acesso estrito à arguida M (cheque guardado numa mala feminina), sendo outra documentação identificativa daquela arguida (agenda e folhas com cabeçalho identificativo daquela) (…) também não pode colher a insinuação de que seria o arguido, por titular de conhecimentos no domínio da informática, a pessoa responsável pelo auxílio de M na elaboração de mapas e documentos falsos, quando se constata que estes últimos são feitos sem maior sofisticação ou apuramento, certamente com recurso a programas de uso hoje plenamente generalizado (word, excel) (…) O segmento (…) mais fortemente passível de revelar o envolvimento do arguido na ação levada a cabo por M prende-se com a circunstância de uma das contas utilizadas para a saída de importâncias monetárias originárias da conta do assistente ser a conta titulada pelo mesmo (…) Porém, a mesma carece de ser analisada com cautela e em plano alargado (…) constata-se que outras contas bancárias são utilizadas nesse mesmo plano, designadamente a conta titulada por MF (mãe da arguida) (…) de resto, que é esta última a permitir a movimentação de quantias económicas mais expressivas (por comparação face à conta do arguido) (…) Por outro lado, demonstra-se que as importâncias por ali transferidas não permanecem por períodos temporais alargados, registando-se a sua pronta saída das mesmas (…) os depoimentos das testemunhas MF e D evidenciam (…) de forma sincera e credível, que a abertura de contas no Banco BEST, em nome de vários familiares de M, ocorrera por iniciativa daquela, tendo desde logo a motivação de permitir a obtenção da comissão devida pela sua abertura (…) também evidenciam tais depoimentos que a movimentação das mesmas sempre foi assegurada por M, a qual assumiria uma postura mais dinâmica, por contraponto ao arguido, o qual foi descrito como um indivíduo mais pacato e passivo (…) concedendo a decisão final de inquérito que assim haja sucedido quanto a MF (podendo apenas essa realidade justificar a opção pela não dedução, contra aquela, de acusação pública), porque razão não se poderá admitir que o mesmo pudesse suceder quanto à(s) conta(s) do arguido (na qual poderia até ser facilitada a movimentação por M)? (…) os autos são omissos de elementos de prova que permitam concluir ser apenas o arguido a pessoa encarregue da utilização ou acesso a tal(is) conta(s) – tal como sejam quais os cartões bancários emitidos e respetiva titularidade, existência ou inexistência de canais digitais associados e os seus acessos e utilizadores autorizados, etc (…) à luz de um agregado que se prefigura ser essencialmente matriarcal, nada nos permite concluir não ter sido M a atuar a jusante e complementarmente à ação que, individualmente, havia já iniciado (…) não se descarta por totalmente inverosímil que, pelo menos em parte, o esquema de saída de montantes da conta bancária do assistente, como passagem por outras contas e eventual destino à concretização, em seu interesse, de investimentos, pudesse ter por propósito evitar a tributação em sede de mais valias, que o próprio C referiu, a dado momento, ter interesse e benefício em ver concretizado (…) ainda que se demonstrasse ter o aqui arguido, em algum momento, percecionado a passagem pela sua conta de tais valores, nada permite clarificar ser a sua ação ou contributo destinada a uma coautoria, ou se, ao invés, numa mera cumplicidade (facilitando a ação delituosa de terceiro) (…) em plano necessariamente conexo com o antecedente, cumpre salientar que não se vislumbra, no plano atual, qualquer situação demonstrativa de conforto ou incremento patrimonial, demonstrando os autos, ao invés, que o mesmo se veio apenas a tornar, pelo decesso de M, das dívidas por aquela ou por ambos (na constância do matrimónio) contraídas (…) da análise da documentação bancária alusiva a contas pelo mesmo tituladas, as quais não evidenciam saldos de conta ou aplicações em montante expressivo (…) também sob o ponto de vista do património físico, não se vislumbra tal conforto ou incremento (…) a habitação, a mesma encontra-se hipotecada em garantia de empréstimo bancário (…) as viaturas automóveis descritas como mais “luxuosas” ou de gama mais alta, constata-se que as mesmas haviam sido utilizadas na decorrência da celebração de contratos de leasing (…) aproveitamento para lazer e férias, a prova apenas permite demonstrar a titularidade de um “time-sharing” de um apartamento no Algarve e a realização de uma viagem a Paris (…) o que a prova produzida espelha é, ao invés, uma maior contração de gastos e despesas, concretizada por exemplo pela troca de viaturas automóveis por outras de condição ou gama mais modesta, o que em tudo contrariaria a lógica refletida na acusação (…) Assim, e em síntese, do cotejo de toda a prova acima mencionada, com especial enfoque ao que é permitido retirar da análise da prova documental, a realidade permitida demonstrar é, cremos, não plenamente coincidente com a feita acolher no texto acusatório (…) em especial quanto ao envolvimento, participação ou pleno conhecimento, ou bem assim benefício real, que o ora arguido pudesse assumir, em plano de ação concertada face à entretanto falecida M, ou permitindo a esta, com facilitação material, a consumação de um plano pela mesma gizado e executado (…) O que se crê (…) é a demonstração clara e real de quem poderá ter pensado, admita-se que iludido pela atuação de M, mas sendo esta temperada por uma “dose significativa” (…) de ambição, ter encontrado uma chamada “fórmula dourada” para o seu enriquecimento rápido e fácil, porventura aceitando o risco associado a tal ensejo (…) e/ou descurando ou querendo desconsiderar a realidade comummente conhecida e aceite de que não há lucros fáceis ou soluções milagrosas para o enriquecimento e bem-estar financeiro (pelo menos em plano de legalidade ou isenção de risco) (…) a conclusão evidenciada no parecer realizado na auditoria promovida internamente pelo Banco BEST, segundo a qual não haviam sido ali detetadas outras anomalias ou fraudes relacionadas com a gestão de ativos, por M, pertencentes a outros clientes da sua carteira, poderá reforçar a ideia de que o relacionamento entendido assumir entre assistente C e a sua gestora se poderá ter concretizado em termos muito singulares, admita-se consensuais (…) - A não prova do facto A) estribou-se no conjunto da prova produzida e/ou examinada nos autos, a qual, na leitura acabada de explicitar, se nos afigurou insuficiente para fazer concluir pelo conluio face á ação de M, ou adesão ou apoio a plano gizado em comum ou unicamente por aquela. A mesma lógica impedirá a demonstração probatória plena dos factos K) a O) – os tangentes à imputação subjetiva dos lícitos assacados em acusação pública -, apenas se demonstrando possível provar que algumas importâncias terão passado por conta do arguido, à semelhança do sucedido quanto a outras contas e intervenientes, porém sem demonstração real da ação ou benefício daquele concreto arguido (…) a opção pela não prova do facto B) (…) sedimentou-se, uma vez mais, na análise da prova feita carrear nos autos, designadamente aquela que se assume demonstrativa da análise dos vínculos contratuais de M face ao BEST, demonstrando que, ao ano de 2004, a mesma não assumia ainda qualquer vínculo face àquela instituição bancária. Tal realidade careceu de ser vista à luz da afirmação assumida pelo assistente C em julgamento, no âmbito da qual lhe foi dito, nesse momento inicial, por M, que a mesma não reunia ainda as condições para exercer funções de gestão junto do BEST, sugerindo assim que, na gestão formal, figurasse o nome do arguido (o qual, por análise do suporte contratual que lhe diz respeito, também não assumia, à data de celebração do contrato de abertura de conta, qualquer ligação ou vínculo face ao BEST): Perante todo este exaustivo / esmiudado / minudenciado explicativo, de uma clareza e apreensão imediatas, o Assistente recorrente não esgrime a menor argumentação / reflexão / réplica que a possa por algum modo, ainda que ténue, abalar. Diga-se, que de todo inicialmente aqui sublinhado por força de trechos transcritos de diversos depoimentos, se mostra reforçada toda a motivação da matéria de facto executada pelo tribunal recorrido. Repare-se, ainda, como mote de interesse, que o Digno Mº Pº, ante toda a acusação por si propalada e havendo posterior decisão de absolvição, não reagiu, limitando-se a um mero seguimento, em parte, do ensejo recursivo do Assistente recorrente, diga-se, sem o esgrimir do mais pequeno argumento questionador do Acórdão proferido, resumindo-se a afirmar que (…) comunga da apreciação da prova pessoal produzida em audiência de discussão e julgamento e da prova documental constante dos autos que é empreendida pelo Recorrente na sua motivação de recurso, no que respeita aos factos ntegradores da prática pelo arguido, em co-autoria material (com a sua mulher M, entretanto falecida), de um crime de burla qualificada p. e p. pelos arts. 218º nºs 1 e 2 al. a), 217º e 202º al. b) do C.P., omitindo um mínimo qualquer suporte argumentativo de tal linha de pensamento. Na presença do expendido, considerando-se devidamente alicerçado todo o trajeto preconizado pelo tribunal a quo, nada mais resta que concluir que o Assistente recorrente não logrou demonstrar que a decisão proferida não é possível / plausível / verosímil, considerando todo o recorte probatório existente e ponderado. Antes pelo contrário, buscando sobre todo o processo decisório o que se retira é um retrato de segurança, solidez, logicidade, racionalidade, congruência e sentido. Deste modo, também aqui baqueia o intento recursivo. * Em ligação com o anterior vetor, e ao que se desbulha de todo o alegado, refulja do entendimento do Assistente recorrente, existir quanto aos aspetos que impugnou, o vício precavido no artigo 410º, nº 2, alínea c) do CPPenal - erro notório na apreciação da prova. Improcedendo a impugnação da matéria de facto, pelo trilho anteriormente enfrentado, pode ainda este Tribunal, e porque claramente decorre recursivamente e é de conhecimento oficioso, apreciar sobre a eventual modificação da decisão proferida em sede de matéria de facto se se verificarem os vícios prevenidos no nº 2 do artigo 410º do CPPenal. Os vícios decisórios previstos nas diversas alíneas do nº 2 do referido artigo 410º, para efeitos de indagação, como resulta do citado preceito, têm que exuberar da decisão recorrida, por si mesma ou conjugada com as regras da experiência comum, não sendo por isso admissível o recurso a elementos àquela estranhos, para a fundamentar, como, por exemplo, quaisquer dados existentes nos autos, mesmo que provenientes do próprio julgamento[15]. Aqui, igualmente, não se visa a realização de um segundo julgamento sobre a matéria em discordância, assumindo-se antes como um mero remédio para obviar a eventuais erros ou incorreções da decisão recorrida na forma como apreciou a prova, na perspetiva dos concretos pontos de facto identificados pelo recorrente. O que está em causa é antes uma reapreciação autónoma sobre a razoabilidade da decisão do tribunal a quo quanto aos concretos pontos de facto que o recorrente especifique como incorretamente julgados. Para esse efeito, deve o tribunal de recurso verificar se os pontos de facto questionados têm suporte na fundamentação da decisão recorrida, avaliando e comparando especificadamente os meios de prova indicados nessa decisão e os meios de prova enunciados pelo recorrente e que este considera imporem decisão diversa[16]. A apontada mácula, abrange o erro sobre facto notório incluindo os factos históricos de conhecimento geral; a ofensa às leis da natureza (vg. considerar provado um facto física ou mecanicamente impossível), a ofensa às leis da lógica (vg. incompatibilidade entre o meio de prova invocado na fundamentação e os factos dados como provados com base nesse meio de prova); ofensa dos conhecimentos científicos criminológicos e vitimológicos[17]. Mostram-se aqui incluídas todas as situações que se assumam como casos de erro “(…) evidente, escancarado, escandaloso, de que qualquer homem médio se dá conta (…) também todas as situações de erro clamoroso, e que, numa visão consequente e rigorosa da decisão no seu todo, seja possível, ainda que só ao jurista, e, naturalmente ao tribunal de recurso, assegurar, sem margem para dúvidas, comprovar que, nelas, a prova foi erroneamente apreciada”[18]. Tem-se igualmente entendido na jurisprudência configurar tal noção, tudo o “(…) que não pode ter acontecido, ou quando, usando um processo racional e lógico, se retira de um facto dado como provado uma conclusão ilógica, arbitrária e contraditória, ou notoriamente violadora das regras de experiência comum, sendo o erro de interpretação detectável por qualquer pessoa” (…) aquele erro de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores, ou seja, quando o homem médio facilmente dele se dá conta”[19]. Olhando toda a decisão recorrida não emerge erro notório na apreciação da prova, entendido como aquilo que se mostre evidente para qualquer indivíduo de médio discernimento e resulte do texto da sentença conjugado com as regras da experiência comum. Com efeito, e como acima já se salientou, ponderou e analisou o que parece ocorrer é uma mera leitura divergente da prova produzida, sendo que o Assistente recorrente exercita esse enfrentamento, de forma absoluta e cirurgicamente compartimentada, olvidando uma panóplia vastíssima de elementos existentes nos autos e que foram minuciosa e esmiuçadamente trabalhados pelo tribunal recorrido. Exulta que todo o conjunto argumentativo carreado pelo Assistente recorrente, como já se afirmou, não se mostra empoderado por forma a fazer titubear o decidido. Há aqui que chamar à colação o princípio enformador do processo penal, princípio da livre apreciação da prova – que aqui também se questiona. O tribunal ouviu, avaliou, ponderou e decidiu. E todo esse processo foi seguido de um modo sustentado, lógico, racional e justificado, não decorrendo de uma mera opção arbitrária, caprichosa e / ou leviana. Tal como já se enfatizou, por diversas formas – atente-se a todo o transcrito supra -, está detalhadamente explicada a razão para o tribunal não ter ficado convencido da linha veiculada na acusação que tendo sido trazida a juízo por iniciativa do Assistente recorrente, em primeiro e longo tempo, nunca envolveu o arguido, como já se fez notar. Calcorreando toda a motivação e no que aos vários meios de prova concerne, não exorbita qualquer contradição, falta de lógica, irracionalidade, incongruência ou fragilidade. Assim sendo, inexistindo, também, este vício de facto de conhecimento oficioso improcede todo o pretendido pelo Assistente recorrente em termos de questionamento de facto. * Em correlação com a vertente do questionamento factual, igualmente, vem o Assistente recorrente opinar no sentido de ter havido a violação do princípio da livre apreciação da prova[20], o qual tem especial expressão no inciso que constitui o artigo 127º do CPPenal.Este princípio surgido em França, em 1791, com o sistema de júri e mais tarde inscrito no artigo 342º do Code D’Instruction Criminelle de 1808 -, sendo que em Portugal o sistema da prova livre fez o seu aparecimento nas Reformas Judiciárias da primeira metade do séc. XIX (1832, 1836 e 1841) advindas da revolução liberal, onde se passou a entender que o júri se deveria pronunciar sobre as provas «não escutando senão os ditames da (…) consciência e íntima convicção» -, visando combater a possibilidade de existência de decisões injustas por força da mero uso de provas tabelares e / ou tarifadas, apresentando-se como vinculado ao princípio da descoberta da verdade material, permite ao juiz um campo de discricionariedade na apreciação e meditação a respeito das provas atendíveis que sustentam uma decisão. Ou seja, o valor e a força dos meios de prova não podem ser corretamente aferidos a priori, com o caráter de generalidade próprio dos critérios legais, mas só o devem ser com especial atenção às circunstâncias concretas do caso. No fundo, por via desta máxima – proof beyond any resonable doubt - pretende-se garantir a condenação de alguém apenas quando se mostre a certeza da sua culpabilidade e, nessa medida, para o demonstrar, reclama-se que o tribunal identificando, apontando e detalhando quais as provas de que se socorreu, concretize fundadamente as características que delas despontaram e assolaram no sentido de confirmar ou infirmar determinada factualidade. Em suma, este princípio impõe que a análise e valoração da prova não seja baseada numa operação puramente subjetiva, emocional, imotivável, impulsiva, mas antes decorrente de um percurso racional, arrazoado e crítico, assente em regras da lógica, da razão, da experiência e dos conhecimentos científicos, que permita ao julgador objetivar a apreciação dos factos[21]. Partindo de todos estes matizes, concatenando-os com todo o veredito em discussão e, bem assim, com a peça de recurso, não se retira qualquer atentado ao princípio aqui em referência, mostrando-se sim que o tribunal recorrido seguiu uma linha ponderada, acertada e devidamente alicerçada em termos de motivação da matéria de facto. Arrimando-se com uma afirmação majestática, sustentando-se o Assistente recorrente no modo em como viu / avaliou / exercitou alguns dados probatórios e apenas e só segmentos dos mesmos, pretende fazer valer a sua linha de pensamento e, como a mesma não coincide com a levada a cabo pelo tribunal recorrido, no seu entender, houve violação da dita máxima. Ora, como acima já se invocou, todo o traçado ensaiado pelo tribunal de 1ª instância, está suficiente e robustamente evidenciado, no que concerne ao peso consentido aos diversos e vastos meios de prova disponibilizados nos autos, nada exultando que desenhe alguma opção arbitrária, inconsequente, abusiva e / ou ilógica. Antes pelo contrário, procedeu-se a uma densíssima explicação sobre a prova existente, o que se fez em postura consistente e rotundamente cristalina. Nesta senda, também neste segmento, é de refutar o entendimento perfilado pelo Assistente recorrente. * Mantendo a ponderação em termos de facto, cabe ainda abordar a invocação do Assistente recorrente de que operou no (…) segmento do “enquadramento vivencial do arguido” o vício prevenido no artigo 412º, nºs 3, alínea a), do cpp pois os (…) factos provados 33) a 55) constituem, inequivocamente, meras reproduções “copy paste” do relatório social do arguido A (vd. fls. 1056 a 1059 dos autos), sendo que (…) quando num acórdão se procede à mera transcrição do relatório social, tal significa que se omitiu o devido juízo crítico sobre tal elemento probatório, redundando na omissão dos factos respeitantes às condições pessoais do arguido, o que constitui vício da insuficiência da matéria de facto provada, prevenido na al. a) do nº 2º do artigo 410.º CPP.O vício em questão - insuficiência para a decisão da matéria de facto provada - reporta-se essencialmente à existência de hiatos fatuais que podiam e deviam ter sido averiguados e se mostram necessários à formulação de um juízo seguro de condenação ou absolvição e não o foram. Pretende-se, assim, saber se a matéria de facto apurada, na sua globalidade (provada e não provada) é ou não capaz e bastante para sustentar a decisão tomada. De outro modo, o que se almeja saber através da verificação deste vício é se o tribunal, tendo em atenção o objeto processual em presença em cada caso, indagou ou não, os factos necessários ao esclarecimento daquele, independentemente do resultado dessa averiguação – confirmativo ou infirmativo do objeto processual[22]. O conceito de insuficiência da matéria de facto provada significa que os factos apurados e constantes da decisão recorrida são insuficientes para a decisão de direito, do ponto de vista das várias soluções que se perfilem – absolvição, condenação, existência de causa de exclusão da ilicitude, da culpa ou da pena, circunstâncias relevantes para a determinação desta última -. E isto porque o tribunal deixou de apurar ou de se pronunciar sobre matéria relevante alegada pela acusação ou pela defesa ou resultantes da discussão da causa, ou ainda porque não investigou factos que deviam ter sido apurados na audiência, dada a sua importância para a decisão na sua globalidade[23]. Ora, na esteira do que vem sendo uma linha seguida nos mais diversos arestos, que se entende pouco rigorosa e muitas vezes reveladora de ausência de qualquer valoração crítica, no dizer do Assistente recorrente, também aqui se alinha na opção de reprodução de partes do relatório social, sem qualquer juízo crítico. Este retrato, conforme se vem entendendo[24], é passível de conduzir à nulidade expressa no artigo 379º, nº 1, alínea a), por referência ao artigo 374º, nº 2, ambos do CPPenal, na medida em que se poderia desenhar a ausência de enumeração de factos provados necessários e suficientes para a determinação da medida da pena e, sequentemente, para a escolha da pena em concreto[25], entendendo outros, poder configurar-se a mácula constante da alínea a) do nº2 do artigo 410º do CPPenal – insuficiência da matéria de facto para a decisão[26], como parece ser a tese propugnada pelo Assistente recorrente. Conquanto, olhando ao caso concreto, ao que desponta, o conteúdo dos pontos 33 a 55, podendo em grande parte surgir do texto do Relatório Social, envergam factos e, tendo em atenção o modo como o tribunal a quo discorreu sobre este conspecto na decisão, no momento da motivação - No que tange ao enquadramento vivencial do arguido e elucidação da sua personalidade, considerou o Tribunal o relatório social feito juntar aos autos, que complementou face aos esclarecimentos prestados por MF e D -, é patente que reproduzindo trechos do relatório social, recorreu a outros elementos, sem se limitar à mera menção do ali constante, mostrando, à partida, crê-se, que tal foi objeto de ponderação e sujeito a contraditório, existindo um claro sinal / dado, minimamente consistente, de o tribunal ter considerado como provados os factos (reitera-se apenas os factos) constantes das partes que transcreveu e, assim sendo, fez todo o excurso bastamente necessário para firmar a materialidade provada. Assim, parece não emergir qualquer falha, seja ela vista como nulidade da sentença ou como o vício denotado pelo Assistente recorrente. * Como já se fez menção, em termos de facto, improcede a visão do Assistente recorrente, exceto no que tange a dois pontos, cuja alteração, como se viu, não surtem a menor consequência no desfecho final.Todavia, ainda que telegraficamente, cabe apurar se, com o apoio em toda a matéria assente, por alguma forma, há o desenho dos crimes que se pretendem assacar ao arguido, por esta via recursiva. Iniciando pelo crime de burla em que parece haver consenso entre o Assistente recorrente e o Digno Mº Pº[27], há que visitar o preceito incriminador e considerar os elementos que o retratam. O crime de burla, ao que transparece de várias normações constantes de diferentes compêndios legais, assume-se como uma forma evoluída / requintada / arguciosa de captação do alheio onde o agente, ao invés de outras formas de apropriação patrimonial, usa o engano, o erro, o artifício para que a vítima desprevenidamente se deixe espoliar[28]. Aqui, o que assola, não é tanto o assalto, a apropriação imediata e pronta, mas antes a blandícia vulpiana, o enredo subtil, a aracnídea urdidura, a trapaça, a mistificação, o embuste, a artimanha, onde se mostra, definitivamente desnecessária qualquer arma ou um agir pela calada, emergindo apenas e só o conto do vigário[29]. Perquirindo o tipo definidor do crime de burla, surge que são seus elementos constitutivos – uso de erro ou engano sobre factos, astuciosamente provocado; para determinar outrem à prática de atos que lhe causem, ou a terceiro, prejuízo patrimonial; intenção de obter para si ou para terceiro um enriquecimento ilegítimo[30] . Escalpelizando os sobreditos traços definidores, cabe dizer que o erro para ser provocado pelo agente impõe que os factos invocados sendo falsos sejam exibidos com a aparência de verdade, (…) ou são referidos pelo burlão factos falsos ou este altere ou dissimule factos verdadeiros, e actuando com destreza pretende enganar e surpreender a boa fé do burlado, de forma a convencê-lo a praticar actos em prejuízo do seu património ou de terceiro[31], sendo que tais ações além de astuciosas devem ser aptas / adequadas / bastantes a enganar, podendo o burlão utilizar expedientes constituídos ou integrados também por contratos civis. Com efeito, a astúcia exigível para o preenchimento do tipo incriminador em exame, constitui o ardil, o engenho, a fraude, a manha, o estratagema, o esmero, o refinamento esquemático, sendo, no entanto, bastante o chamado mínimo necessário / uma espécie de ponto ótimo, por forma a que o burlão consiga o seu intento e leve o burlado, por via do aproveitamento / fruição das suas características, a prestar a respetiva colaboração, viciando o consentimento / aceitação deste[32]. Diga-se, também, que a fim de caracterizar um agir astucioso não basta a mera mentira, sendo antes necessário que haja uma mentira qualificada, elaborada, manobrada, surgindo que o erro provocado pode acontecer por palavras ou declarações expressas, por atos concludentes, ou por omissão. No primeiro caso, está-se perante erro decorrente de uso de forma oral ou escrita de agir, na segunda situação, integram-se condutas que não consubstanciam, em si mesmas, qualquer declaração, mas que de acordo com as regras da experiência e os cânones ético-sociais vigentes no setor de atividade se mostram adequadas a produzir uma falsa convicção sobre um facto passado, presente ou futuro, sendo que na última hipótese, o agente não provocando diretamente o engano ao sujeito passivo, limita-se a aproveitar o estado de erro em que este já se encontra[33]. Seguidamente, necessário é que a vítima pratique atos decorrentes do erro / engano em que foi induzida, sendo certo que bastam que aqueles sejam aptos / capazes / habilitados a enganar, não se exigindo como demanda que estejam em causa processos rebuscados / engenhosos / sofisticados, podendo o agente em quadro de economia de esforço, limitar-se ao necessário perante o quadro concreto[34]. Igualmente, míster se apresenta o desenho de um prejuízo patrimonial, o qual, conforme entendimento que se pensa dominante, radica num conceito objectivo-individual de dano patrimonial e de acordo com o qual o prejuízo deverá determinar-se através da aplicação de critérios objectivos de natureza económica à concreta situação patrimonial da vítima, concluindo-se pela existência de um dano sempre que se observe uma diminuição do valor económico por referência à posição em que o lesado se encontraria se o agente não houvesse realizado a sua conduta[35], mostrando-se inquestionável que nem sempre a pessoa que foi induzida em erro ou engano é a mesma que foi lesada (titular do património lesado), ou seja, o sujeito passivo é todo aquele que venha a ter / sofrer o prejuízo[36]. Na configuração da fattispecie burla, há ainda que operar o nexo causal entre os supra ditos elementos pois que, da astúcia resulte o erro ou engano; do erro ou engano resulte a prática de acto(s) pela vítima; da prática de acto(s) resulte, finalmente, o prejuízo patrimonial, emergindo assim que em termos de imputação objetiva do evento à conduta do agente, a burla assume-se como crime complexo, que comporta um triplo nexo de causalidade. É precisamente por isso que o crime de burla constitui um crime material ou de resultado e de execução vinculada, em que (…) a lesão do bem jurídico tem de ocorrer como consequência de uma muito particular forma de comportamento (…) na utilização de um meio enganoso tendente a induzir outra pessoa num erro (…) torna-se necessário que ele consubstancie a causa efectiva da situação de erro em que se encontra o indivíduo. De outra parte, também não se mostra suficiente a simples verificação do estado de erro: requer-se, ainda, que nesse engano resida a causa da prática, pelo burlado, dos actos de que decorrem os prejuízos patrimoniais (…)[37]. Por fim, o dolo que, no caso do crime de burla tem de ser específico, ou seja, não basta o dolo de causar um prejuízo patrimonial ao sujeito passivo ou a terceiro, exigindo-se, de outra parte, que o agente tenha a intenção de conseguir, através da conduta, um enriquecimento ilegítimo próprio ou alheio, onde se apela ao conceito cível do enriquecimento sem causa: o enriquecimento de alguém com o consequente empobrecimento de outrem, o nexo causal entre a primeira e a segunda destas situações, e a falta de causa justificativa de tal empobrecimento. Nesta senda, o enriquecimento ilegítimo deve ser entendido como enriquecimento ilícito, todo aquele ao qual não corresponde, objetiva ou subjetivamente, qualquer direito. Em presença de todos os cambiantes enunciados importa então descer ao retrato aqui em presença. De todo o espetro fáctico apurado, ao que se pensa, é imediatamente apreensível que relativamente ao arguido nada há que elucide qualquer dos elementos supra enunciados. Basta atentar no mero e simples contexto reconhecido pelo Assistente recorrente, tudo sempre foi tratado com M, as únicas interações que houve com o arguido reportam-se a encontros na via pública onde havia conversa não (…) concretizada (…) era aquela conversa geral (…) corriqueira, recebeu do arguido um envelope contendo 2 mil euros na sequência de pedido feito por aquela. Acresce que o arguido, durante algum tempo, em termos formais, terá figurado como promotor dedicado da conta que o Assistente recorrente tinha no Best. Todavia, nunca houve reuniões entre ambos nem foram trocados documentos bancários ou outros entre eles, nunca foram feitas propostas pelo arguido ao Assistente recorrente, nunca houve qualquer contacto por parte do arguido dirigido ao Assistente recorrente respeitante a matérias bancárias e / ou financeiras, o arguido nunca teve qualquer intervenção nas reuniões, contactos, propostas existentes entre o Assistente recorrente e M. Ante todo este acontecido não há o menor vislumbre do preenchimento do aludido crime por banda do arguido. Centrando agora o debruce relativamente ao crime de falsificação ou contrafação de documento. Surge como entendimento que se tem vindo a revelar como pacífico que no crime de falsificação de documento o bem jurídico protegido que se acautela é a segurança e credibilidade no tráfico jurídico probatório, no que respeita à prova documental, assumindo-se como fim proteger a segurança relacionada com os documentos, tendo em conta as duas funções que o documento pode ter - perpetuação que todo o documento tem em relação a uma declaração humana e garantia, pois cada autor do documento tem a garantia de que as suas palavras não serão desvirtuadas e apresentar-se-ão tal qual como ele em certo e determinado momento, local e circunstâncias as expôs[38]. Por seu turno, e considerando a normação incriminadora invocada – artigo 256º, nº 1, alíneas a), b) e c) do CPenal – parece pretender assacar-se ao arguido um quadro de fabrico de documento totalmente falso[39], uma situação de inserção em documento verdadeiro um facto juridicamente relevante que é falso[40] e, igualmente, o caso de abuso da assinatura de outrem para falsificar ou contrafazer documento. Ou seja, de acordo com o Assistente recorrente, o arguido terá fabricado documentos na sua íntegra – fica por saber quais exatamente e em que circunstâncias -, em outros verdadeiros inseriu elementos falsos – igualmente se desconhece e não se afirmam quais – e por fim, terá abusado da assinatura do Assistente recorrente, sem se apontar quando e onde. Sendo totalmente duvidoso, crê-se, o enquadramento factual constante da acusação, em termos de detalhe e precisão[41], para elucidar todas estas vertentes da falsificação, o que levou a alguma intervenção do tribunal recorrido, neste conspecto, a verdade é que nada se provou que envolvesse o arguido no dito contexto. Há apenas e só uma testemunha, MJ, que a dado passo do seu depoimento afirma (…) sei que ele era engenheiro informático (…) sei que ele tinha um programa que tirava a marca de água das fotos (…), o que é manifestamente pouco para integrar o que quer que seja em termos criminais. Por outra banda, toda a materialidade dada como assente pelo tribunal a quo, neste particular conspecto – mormente os pontos 10, 16, 19, 20 – não desponta o menor envolvimento do arguido. Assim sendo, no que tange a tal fattispecie nada há atribuível ao arguido. Por fim, uma visita ao crime de branqueamento p. e p. pelo 368º-A, nº 1 do CPenal que pretende ver o Assistente recorrente como cometido pelo arguido. Este ilícito, ao que se conjetura, consiste essencialmente na ocultação ou dissimulação da natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou titularidade de vantagens de crimes[42], sendo que de acordo com a doutrina alemã, por branqueamento designam-se «os meios através dos quais se escondem a existência, origem ilegal ou a utilização ilegal de rendimentos, encobrindo esses rendimentos para que pareçam provir de origem licita[43]. Diga-se, também, que o branqueamento de capitais, segundo certa doutrina, passa por dois momentos distintos, money launder seguido de recycling[44]. O primeiro, constituindo o núcleo nevrálgico, conduz a que através de operações várias as vantagens ou incrementos patrimoniais resultantes do facto ilícito típico anterior, sejam expeditamente libertadas dos vestígios da referida origem criminosa. Normalmente, neste momento, as referidas «vantagens» são ainda constituídas por dinheiro em numerário, e o respetivo branqueamento concretiza-se em negócios de curto prazo – v. g. compra de bens imóveis ou outros de valor, por vias de circuito normal de mercado -, os quais dissimulam não só a sua origem, como a respetiva identificação. É, normalmente, o que se passa através da troca desse dinheiro duvidoso por outros valores monetários, designadamente por notas de maior valor, ou pela troca por outros bens facilmente transportáveis, como sejam joias, metais e pedras preciosas, títulos de participação, abertura de contas bancárias noutros países, de preferência em nome de pessoas coletivas. Relativamente ao segundo, recycling (transformação / conversão), concretiza-se em operações ou «manipulações» através das quais as vantagens patrimoniais se convertem para que ganhem aparência de se tratar de objetos de proveniência lícita, com a sua consequente reentrada no normal circuito económico. O que sucede, em regra, com a aplicação do dinheiro em grandes negócios, como pizarias e salas de espetáculos ou através da ligação a negócios bancários ou de sociedades financeiras. Destarte, há nesta figura jurídico-penal uma relação umbilical, inextricável, obrigatória, entre a ação de ocultar ou dissimular a origem ou propriedade de determinados bens e a proveniência desses bens, pois devem forçosamente ser produto direto ou indireto de um crime anterior. Outros entendem que este crime passa por três fases, seguindo a linha de pensamento do Gabinete de Acção Financeira Internacional[45], apontando-as como colocação[46], dissimulação[47] e integração[48]. Como se viu, o único sinal que poderia apontar para a existência desta figura criminal seriam as transferências e depósitos de cheques numa conta titulada pelo arguido, exclusivamente, com origem em dinheiros vindos da conta do Assistente recorrente. Todavia, como bem enfatiza o tribunal recorrido, não se antevendo qualquer obstáculo a esse entendimento, (…) os depoimentos das testemunhas MF e D evidenciam (…) que a abertura de contas no Banco BEST, em nome de vários familiares de M, ocorrera por iniciativa daquela, tendo desde logo a motivação de permitir a obtenção da comissão devida pela sua abertura (…) também evidenciam tais depoimentos que a movimentação das mesmas sempre foi assegurada por M, a qual assumiria uma postura mais dinâmica, por contraponto ao arguido, o qual foi descrito como um indivíduo mais pacato e passivo (…) concedendo a decisão final de inquérito que assim haja sucedido quanto a MF (podendo apenas essa realidade justificar a opção pela não dedução, contra aquela, de acusação pública), porque razão não se poderá admitir que o mesmo pudesse suceder quanto à(s) conta(s) do arguido (na qual poderia até ser facilitada a movimentação por M)? (…) os autos são omissos de elementos de prova que permitam concluir ser apenas o arguido a pessoa encarregue da utilização ou acesso a tal(is) conta(s) – tal como sejam quais os cartões bancários emitidos e respetiva titularidade, existência ou inexistência de canais digitais associados e os seus acessos e utilizadores autorizados, etc. Paragonando todo o expendido, há que concluir na mesma linha do tribunal recorrido. Não há elementos, para além da dúvida consistente, que liguem o arguido a esta prática delituosa. E, neste seguimento, improcede o recurso interposto pelo Assistente, havendo apenas que alterar a literalidade dos factos constantes dos pontos 18 e 26, nos termos supra referidos o que, como se foi afirmando, não tem qualquer consequência no desfecho da essência recursiva, ou seja, conversão da absolvição do arguido, na sua condenação.
III - Dispositivo Nestes termos, acordam os Juízes da Secção Criminal - 2ª Subsecção - desta Relação de Évora em negar provimento ao recurso interposto pelo Assistente C e, em consequência, manter a decisão recorrida, procedendo, no entanto, à alteração dos factos constantes dos pontos 18 e 26, nos seguintes termos: Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 4 UC (artigos 513º /1 e 514º/1 CPPenal e 8º/5 e Tab. III RCP). |