Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | JOSÉ LÚCIO | ||
Descritores: | PRAZO DE INTERPOSIÇÃO DE RECURSO IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO | ||
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Data do Acordão: | 10/26/2011 | ||
Votação: | DECISÃO SINGULAR | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | RECLAMAÇÃO | ||
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Sumário: | Pretendendo o recorrente a reapreciação da prova gravada, em impugnação do julgamento feito quanto à matéria de facto, o recurso interposto beneficia do prazo acrescido a que alude o art. 685º, n.º 7, do CPC, não tendo o recorrente o ónus de expressar a sua intenção dentro do prazo correspondente ao recurso apenas de direito. Sumário do relator | ||
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Decisão Texto Integral: | 1. Relatório Nos presentes autos de procedimento cautelar (suspensão de deliberações sociais), requerido por C… contra Empresa…, Lda., foi decidido por sentença conceder a providência requerida. Impugnando a sentença proferida, a sociedade requerida apresentou requerimento de recurso (de apelação, a subir de imediato, nos próprios autos e com efeito devolutivo). Todavia, o recurso não foi admitido. Com efeito, sobre ele recaiu despacho que o julgou extemporâneo, por no prazo de quinze dias correspondente ao recurso apenas de direito a parte não ter manifestado o propósito de recorrer quanto à matéria de facto, pelo que o direito a recorrer havia precludido quando deu entrada o recurso impugnando tanto o julgamento de direito como de facto. Reagindo contra tal decisão surgiu a presente reclamação, defendendo a reclamante que o recurso deve ser admitido pois deu entrada no terceiro dia útil após o final do prazo legal de 25 dias para impugnar a matéria de facto e foi acompanhado do pagamento da multa prevista no art. 145º, n.º 5, do CPC. Pelo recorrido não foi oferecida resposta. * Estabelece o art. 688º, n.º 4, do CPC, que a reclamação é apresentada logo ao relator para que este decida admitir o recurso ou manter o despacho reclamado.Não se verificando necessidade de complementar a instrução da reclamação (n.º 5), esta é decidida em face dos elementos contidos no apenso. No caso presente, afigura-se efectivamente que os elementos disponíveis bastam para uma decisão segura, sem necessidade de outros esclarecimentos ou documentos adicionais, pelo que deve decidir-se do mérito do pedido. Assim passaremos a demonstrar, apreciando e decidindo como se segue. * 2. Questão a decidirO objecto da presente reclamação resume-se à questão da tempestividade ou intempestividade do recurso da reclamante, pois é nesse ponto que reside a divergência determinante das posições opostas da reclamante e do despacho reclamado. * 3. Fundamentação3.1 Dos factos. Como resulta dos dados fornecidos (em que estão de acordo a reclamante e o despacho reclamado) a sentença proferida foi notificada às partes no dia 11 de Abril de 2011 e o requerimento de interposição do recurso deu entrada a 11 de Maio seguinte, acompanhado do comprovativo do pagamento da multa prevista no art. 145º, n.º 5, do CPC, correspondente à prática do acto no terceiro dia útil após o termo do prazo respectivo. 3.2. Do direito. A questão a decidir traduz-se, portanto, na contagem do prazo a considerar, de modo a concluir pela admissibilidade ou não do recurso interposto. Nos termos do art. 691º, nº 5, do CPC, e sendo certo que estamos perante um procedimento cautelar, o prazo de interposição do recurso em causa está fixado, em princípio, em 15 (quinze) dias. Todavia, tendo em conta o disposto no nº 7 do art. 685º do mesmo CPC, caso o recurso tenha por objecto a reapreciação da prova gravada, é acrescido de 10 (dez) dias. Ou seja, tratando-se de um recurso que impugna tanto o julgamento feito em matéria de facto como em matéria de direito o prazo a considerar passa então a ser de 25 (vinte e cinco) dias. Sobre estas afirmações também não se detecta divergência entre o despacho reclamado e a apelante/reclamante. Onde surge a incompatibilidade de pensamentos que conduziu à decisão reclamada é na afirmação exarada no despacho reclamado de que é exigível à parte que pretenda recorrer da matéria de facto que dê conhecimento desta intenção dentro do prazo de 15 dias previsto para recorrer unicamente da matéria de direito, sob pena de preclusão do seu direito a recorrer. Ora esse entendimento não pode aceitar-se, e tem aliás sido rejeitado pela jurisprudência dos nossos tribunais superiores. Com efeito, para beneficiar do prazo acrescido correspondente à impugnação da matéria de facto a parte apenas carece de impugnar efectivamente a matéria de facto, fazendo-o dentro do prazo que a lei lhe concede para tal fim. E só em face do requerimento de interposição do recurso, o qual contém as respectivas alegações e conclusões, pode verificar-se se o fez ou não. Nada na lei obriga o recorrente que pretenda impugnar matéria de facto a anunciar previamente, de forma expressa ou tácita, a sua intenção, e nem sequer a explicitá-la por declaração no requerimento de recurso. Tudo o que tem a fazer para beneficiar do prazo correspondente é proceder efectivamente à impugnação do julgamento feito quanto aos factos (veja-se, sobre situação semelhante à colocada nos autos, o acórdão da Relação de Lisboa de 17-07-2008, proc. 855/2008-1, www.dgsi.pt). “I – Querendo o Recorrente impugnar a decisão sobre matéria de facto, não só não carece de o declarar no requerimento de interposição de recurso, como tão pouco necessita de manifestar tacitamente a sua intenção de impugnar a matéria de facto fixada pelo tribunal de primeira instância. II - Tudo quanto se faz mister é que o recorrente impugnante da decisão sobre matéria de facto apresente, até ao termo do prazo que a lei para tanto lhe concede (o qual é, in casu, de quarenta dias, nos termos do nº 6 do cit. art. 698º), alegações de recurso nas quais satisfaça os vários ónus que a lei (o art. 690º-A, nºs 1 e 2, do CPC) põe a seu cargo. Se o fizer, é irrelevante que o requerimento por si apresentado no tribunal de 1ª instância, a solicitar a entrega de cópias das cassetes onde ficaram registados os depoimentos prestados pelas testemunhas inquiridas em audiência de julgamento, seja apresentado antes ou depois de transcorridos 30 dias sobre a sua notificação do despacho de admissão do recurso.” Daqui resulta a solução que nos parece decorrer límpida da regulamentação legal. Uma vez que com o recurso se visa a reapreciação da prova gravada não existem dois prazos processuais a contar de forma autónoma, primeiro um (de 15 dias) e depois o outro (de 10 dias). Existe apenas um prazo processual (de 25 dias), resultante da conjugação dos citados arts. 691º, nº 5, e 685º, nº 7, do CPC. A contagem desse prazo tem de ser feita, como manda o art. 144º, nº 1, de forma contínua, nem sequer se suspendendo durante as férias judiciais visto que se trata de acto a praticar em processo que a lei considera urgente (os procedimentos cautelares revestem essa natureza, cfr. art. 382º, n.º 1, do CPC, e acórdão do STJ de 31-03-2009). “In casu”, tendo a notificação do despacho que admitiu a apelação sido feita em 11/04/2011, o prazo para a interposição do presente recurso, de 25 dias por o recurso ter por objecto a reapreciação da prova gravada, contado continuamente, terminava em 6/05/2011, sexta-feira. Os três primeiros dias úteis seguintes, em que, de acordo com o art. 145º, nºs 5 e 6, o acto ainda poderia, pagando-se a pertinente multa, ser validamente praticado, seriam 9, 10 e 11 de Maio de 2011 (segunda-feira, terça-feira e quarta-feira, respectivamente). Por conseguinte, o dia 11/05/2011, data em que a apelante deu entrada ao seu requerimento, correspondia ao último dos três dias úteis em que ainda podia praticar o acto, apesar de excedido o prazo – desde que satisfizesse o disposto no art. 145º, n.º 5, al. c), do CPC – tal como indiscutidamente o fez. Em consequência do que fica dito, o despacho recorrido não pode subsistir. Assim se decidirá, em conformidade com o que ficou dito e tal como se segue. 4. Decisão: Face ao exposto, decide-se revogar o despacho reclamado e, ao abrigo do art. 688º, n.º 4, do CPP, admitir o recurso interposto pela reclamante Empresa de Exploração Hoteleira Salema Praia, Lda. O recurso é de apelação, e deverá subir de imediato, nos próprios autos e com efeito devolutivo (cfr. arts. 691º, n. 1, 691º-A, n.º 1, al. a), e 692º, n.º1 e nº 3, al. d), a contrario, todos do CPC). Sem custas. Notifique, e oportunamente requisite o processo como dispõe o nº 6 do art. 688º do CPC. Évora, 2011-10-26 José António Penetra Lúcio |