Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
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| Relator: | FERNANDO BENTO | ||
| Descritores: | RESPONSABILIDADE CIVIL DO PRODUTOR PRODUTO DEFEITUOSO | ||
| Data do Acordão: | 09/13/2007 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO CÍVEL | ||
| Decisão: | CONFIRMADA A SENTENÇA | ||
| Sumário: | I – A responsabilidade do produtor por danos causados por defeitos dos produtos é objectiva, já que existe independentemente de culpa. II – Os importadores de bens destinados a serem vendidos dentro da Comunidade Europeia estão equiparados aos produtores para efeitos de responsabilidade por danos causados por defeitos dos produtos que põem em circulação. III – Um produto é considerado defeituoso quando não oferece a segurança que legitimamente dele se pode esperar. IV – Recai sobre o lesado o ónus da prova não só do defeito mas também quanto ao nexo causal entre aquele e o dano. | ||
| Decisão Texto Integral: | * O Tribunal Judicial de … julgou improcedente a acção que ai foi proposta por “A” e mulher, “B”, por si e em representação de sua filha menor, “C”, e “D” e marido “E” - entretanto falecido e por cujo óbito foram habilitados o seu cônjuge sobrevivo e “B”, filha de ambos - contra “F” e “G” para serem indemnizados pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos no acidente ocorrido em 07-02-1999, na EN …, quando se faziam transportar no veículo de marca …, modelo …, com a matricula LZ, conduzido pelo 1º Autor - e por ele adquirido, novo, à 2ª Ré, em 15-10-1998, com a garantia geral de 2 anos dada pela 1ª Ré contra defeitos de material e de fabrico acidente esse que imputam a defeito de origem causado pelo facto de ter saltado a roda da frente esquerda por deficiência de material, nomeadamente da porca de fixação da rótula inferior da suspensão dianteira esquerda. PROCESSO Nº 1139/07 - 2 * ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA * RELATÓRIO A improcedência fundamentou-se na falta de prova do alegado defeito de material e da relação causal desse facto com o salto da roda em andamento. Inconformados, apelaram os AA para esta Relação, pugnando pela revogação da sentença em alegação que finaliza com as seguintes conclusões: 1 - Encontra-se claramente apurado nos autos que: a) No dia 7 de Fevereiro de 1999 o automóvel do recorrente “A”, de marca … com a matrícula LZ circulava cerca das 18 horas e 30 minutos, pela EN …, no sentido …/…, na zona de …; b) Nesse dia hora e local saltou-lhe a roda da frente do lado esquerdo tendo o veículo capotado, acabando imobilizado no meio da estrada; c) Era um veículo novo que havia sido comprado, cerca de 4 meses antes, à recorrida “G” e que tinha apenas 4.000 Km percorridos; d) Encontrava-se a coberto de garantia de bom funcionamento; e) Não se apurou qualquer circunstância que pudesse justificar o acidente, restando como única explicação possível a notória e indisfarçável deficiência do veículo. 2 - A douta sentença recorrida com fundamento em que competiria aos Autores o ónus da prova da deficiência da peça ou peças que estiveram na origem do desprendimento da roda e, consequente capotamento, julgou a acção improcedente uma vez que a peritagem embora requerida, se revelou inconclusiva por não ter sido possível aos peritos observar as peças suspeitas, como resulta do respectivo relatório. 3 - Antes de mais convém salientar que tais peças foram retiradas do veículo do Autor “A” pela recorrida “G” para cujas instalações, o automóvel foi rebocado em 12 de Fevereiro de 1999 (poucos dias após o acidente) conforme foi apurado nos autos. 4 - Igualmente foi apurado que "após o acidente as Rés colocaram à disposição do A. um "veículo semelhante", o que, como reconheceu a douta (recorrida, criou no espírito dos Autores a legítima expectativa de que assumiam a responsabilidade pelos danos resultantes do acidente. 5 - Circunstâncias em que o desaparecimento das peças, e a consequente impossibilidade de os perito as examinarem, não pode ser considerada acto inocente tanto mais que as Rés foram notificadas da peritagem, nomearam perito e não podiam desconhecer a importância desta prova para a boa decisão da causa, bem como a impossibilidade prática de a realizar sem a peça em questão. 6 - Inverteu-se assim, ao contrário do que resulta da douta decisão o ónus da prova, nos termos prescritos pelo n° 2 do art. 344º do CC. Por outro lado, 7 - Como também decorre de estudo citado na douta decisão recorrida - "Compra e Venda de Coisas Defeituosas" - não é exigível ao comprador que prove, em concreto, qual a peça ou peças defeituosas, bastando-lhe demonstrar que o veículo, no período de garantia, revelou incapacidade para realizar o fim que lhe é próprio e para o qual foi concebido. Ora, 8 - Um veículo com 4 meses de uso e 4.000 Km percorridos a que, sem qualquer explicação, salta uma roda em condições de utilização normais, em hipótese alguma poderá razoavelmente ser considerado isento de defeito, ou aceitável o seu desempenho, incluindo-se, por conseguinte, os danos emergentes do acidente na garantia do bom funcionamento prestada pelos fabricante e vendedor. 9 - Isto sem necessidade de enveredar pelo caminho das presunções judiciais de que o Tribunal poderia ter-se também socorrido nos termos do art. 351° do Código Civil para chegar à óbvia conclusão que o automóvel padecia de defeito gravemente comprometedor da sua segurança. 10 - Circunstâncias em que, face à garantia prestada, deve ser julgado procedente o pedido indemnizatório deduzido pejos Autores, relegando-se para liquidação em execução de sentença, a parte do pedido cuja quantificação não for possível, face à matéria, a respeito, apurada. 24 – (nº constante no original) A douta decisão recorrida violou, pelo menos, as seguintes disposições legais: art.s 344°, 351º, 361°, 499°, 913° e 921° CC: - DL 383/89, de 6 Nov. As RR contra-alegaram em defesa da subsistência da sentença recorrida. Remetido o processo a esta Relação, após o exame preliminar e vistos legais, cumpre decidir: FUNDAMENTOS DE FACTO Estavam assentes entre as partes os seguintes factos: A - No dia 15 de Outubro de 1998, o 1.º A. comprou o automóvel ligeiro de passageiros, marca …, modelo …, com matrícula LZ, no estabelecimento da 2.a Ré, sito na Av. …, …; B - Na altura da venda, o veículo era novo, sem quilómetros percorridos e sem qualquer uso; C - À data do acidente, a viatura tinha cerca de 4 meses de uso e 4 000 kms. percorridos; D - O veículo foi vendido a coberto de garantia geral dada pela 1ª Ré, pelo período de 2 anos a contar da venda, sem limite de quilometragem, contra defeitos de material e de fabrico; E - Do acidente resultou destruição do veículo, que inviabiliza a sua reparação, em virtude do valor desta ser superior a 5.000 contos; F - Após o acidente, as Rés colocaram à disposição do 1.º A. um veículo semelhante, que este utilizou até 10 de Maio de 1999, data em que aquelas lhe solicitaram a sua devolução; G - No dia 12 de Fevereiro de 1999, o veículo do 1.º A. foi rebocado para a oficina da 2ª Ré; H - Em 10 de Maio de 1999, a “F” retirou aquele veículo ao 1.º A. (o que havia sido colocado à disposição deste após o acidente); I - A Ré “F” é importadora para Portugal de veículos automóveis novos da marca …; J - A Ré “F” representa em Portugal o fabricante daqueles veículos; K - A Ré “F” presta aos adquirentes de veículos automóveis da marca … uma garantia de fabrico; L - Nos termos da garantia prestada, a Ré “F” assume a obrigação de reparar ou substituir, gratuitamente, qualquer elemento defeituoso do veículo, encontrando-se a sua responsabilidade limitada ao âmbito da garantia prestada; M - Os factos que os AA. agora trazem aos autos é deles conhecido desde, pelo menos, 10 de Fevereiro de 1999; N - A Ré “G” deve, antes de fazer entrega dos veículos, realizar inspecção pré-entrega, de acordo com o que consta no livro de Manutenção e Garantia, não tendo detectado nenhuma anomalia de funcionamento ou defeito de fabrico; O - Consta da garantia prestada pela Ré “F”, que a “F” garante que o veículo … especificado no Certificado de garantia está isento de defeitos de material e de fabrico durante um período de dois anos ( ) , acrescentando-se que durante este período a “F” irá reparar ou substituir, gratuitamente, qualquer elemento defeituoso do veículo ( ) ; P – “B” e “D” foram consideradas habilitadas para a acção, por morte de “E” na pendência da causa. Pelas respostas aos pontos controvertidos da base instrutória, apurou-se que: 1.º - O 1.° A. comprou o referido veículo por Esc. 4.930.000$00; 2.° e 23.° - No dia 7 de Fevereiro de 1999, cerca das 18h30m, o 1.º A. conduzia a viatura de matrícula LZ, na Estrada Nacional n.º …, no sentido …/…, na zona de … 3.° e 27.° - O veículo, por motivo que não se apurou, capotou, acabando por se imobilizar no meio da estrada; 4.° - A roda da frente do lado esquerdo do veículo conduzido pelo 1.º A. saltou; 8.° - No automóvel seguiam, além do 1.º A. a mulher deste, “B” - 2.ª A -, a filha menor do casal - 3.ª A. -, a 4.ª e o 5.° AA., respectivamente, “D” e “E”; 10.°. A filha dos 1.º e 2.º AA., “C”, também ficou ferida; 11.°. O 1.º A. deixou de realizar trabalho extraordinário no …, onde é …, no valor de 30.616$00, a fim de prestar assistência à filha no período, entre 8 e 22 de Fevereiro de 1999; 14.°, 15.° e 16.° - Durante a prestação de primeiros socorros, foram inutilizados (cortadas): 1 fato de saia e casaco, 1 blusa de malha, 1 conjunto de cueca e soutien, 1 par de collants, 1 cinta, pertencente à 2.ª A.; 1 blusa, 1 camisola, 1 par de calças, pertencentes à 3.ª A.; e 1 saia, 1 camiseiro, 1 camisola de malha, 1 conjunto de cueca e soutien, 1 cinta e 1 par de collants, pertencentes à 4." A., vestuário este de valor não apurado; 17.° e 22.° - A 2.ª A. sofreu: traumatismo craniano sem perda de conhecimento e hematoma da região occipital; ferida inciso do dorso da mão direita com cicatriz pouco visível medindo 1,5 cm; hematomas no cotovelo e braço esquerdo, no ombro direito, anca direita e joelho esquerdo; abalo emocional, com perturbações do sono e do humor e sensação de pânico, sendo que esta ainda actualmente se mantém; 18.° - A 2.ª A. esteve, em consequência destas lesões, incapacitada de trabalhar durante o período compreendido entre 7 de Fevereiro de 1999 e 31 de Março de 1999; 19.° e 20.° - A 2.ª A. explora por conta própria um salão de cabeleireira, o qual esteve encerrado durante o referido período; 28.°, 30.°, 31.° e 32.° - O veículo conduzido pelo 1.º A., por ser mais alto que os veículos ligeiros de passageiros, e por isso ter um centro de gravidade mais elevado, tem maior probabilidade de, ao fazer viragens bruscas, inclinar-se e capotar; 37.° - O veículo novo, ao iniciar o seu uso, desvaloriza-se desde logo; 38.° - E a simples passagem do ano civil, aumenta a desvalorização do veículo. Não se vislumbram nem foram arguidos vícios lógicos ou insuficiências no julgamento da matéria de facto justificativas da intervenção da Relação (art. 712º nº 1 e 4 CPC). FUNDAMENTOS DE DIREITO A 1ª instância julgou improcedente a acção por incumprimento pelos AA do ónus de prova da existência do defeito que, na sua perspectiva, teria sido causador do acidente e dos consequentes danos. Sustentam os apelantes, todavia, que, tendo a apelada, retirado a peça defeituosa, inviabilizou a peritagem o que, consequentemente, deveria determinar a inversão do ónus de prova (art. 344° nº 2 CC). Apreciando: Está em causa a responsabilidade civil do produtor pelos danos causados por produtos defeituosos, tratada nas Directivas nºs 85/374CEE do Conselho de 25-07-1985 e 1999/34CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 10-05-1999, publicadas no Jornal Oficial das Comunidades de 07-08-1985 e de 04-06-1999, respectivamente. Tais Directivas foram transpostas para a Ordem Jurídica Portuguesa, respectivamente, pelos DLs nºs 383/89 de 06-11-1989 e 131/2001 de 24 de Abril. Muito embora não sejam produtoras, no óbvio sentido de fabricantes, as apeladas estão a elas equiparadas, por força do art. 3° nº 2 da Directiva 85/374CEE e 2° nº 2 do DL nº 383/89, pois que importam para venda no espaço da Comunidade Europeia veículos automóveis de marca … Tal responsabilidade é objectiva, como expressamente decorre do art. 1 ° do DL nº 383/89, quando prescreve que o produtor é responsável, independentemente de culpa, pelos danos causados por defeitos dos produtos que põe em circulação. Segundo esses diplomas, um produto é defeituoso quando não oferecer a segurança que dele se pode legitimamente esperar, tendo em conta, entre outros factores, a utilização que dele se possa razoavelmente fazer (art. 6° nº 1-b) da Directiva 85/374CEE e 4° nº 1 do DL nº 383/89. Ora, de harmonia com o art. 4° da Directiva 85/374CEE, cabe ao lesado a prova do dano, do defeito e do nexo causal entre o defeito e o dano. E foi por não ter sido demonstrado o defeito que os AA viram a acção naufragar. Todavia, sustentam agora terem sido as Ré “G”, quem lhes inviabilizou tal prova, ao retirar e ao ocultar e fazer desaparecer a peça alegadamente defeituosa. E daí a inversão do ónus de prova (art. 344° nº 2 CC). Ora, esta é uma questão que no processo nunca foi colocada e sobre a qual a 1ª instância se não pronunciou nem tinha que se pronunciar. Constitui já um verdadeiro truísmo que os recursos são meios de reapreciação de decisões de problemas colocados ao tribunal inferior e não de criação de decisões sobre questões novas. E a questão que os AA agora suscitam de inversão do ónus de prova por impossibilidade do respectivo desempenho que culposamente lhes teria sido criada pelas RR é uma questão nova. Com efeito, o nº 2 do art. 344º do CC prescreve haver inversão do ónus de prova quando a parte contrária tiver culposamente tornado impossível a prova ao onerado; nesse caso, este como que beneficiaria de uma presunção legal, desobrigação ou liberação do ónus de prova. Da matéria de facto provada não resulta que a(s) peça(s) alegadamente defeituosas tivessem sido ocultadas pelas RR, facto este nem sequer alegado. É certo que os AA requereram perícia à viatura sinistrada, não a qualquer peça dela, para averiguação entre outras questões dos seguintes factos: - se o veículo capotou por lhe ter saltado a roda da frente esquerda quando se deslocava; - se existia alguma deficiência na fixação da suspensão dianteira esquerda e em que consistia; - e se tal deficiência já existia à data da entrega do automóvel. Tal peritagem não foi efectuada - muito embora os peritos nomeados pelas partes houvessem apresentado relatórios com base em observações anteriores - porque a viatura fora vendida ... pelos AA; logo, a impossibilidade de realização de exame à viatura decorreria de facto deles e não das RR. Por outro lado, os factos apurados não legitimam a interpretação que os AA sustentam: de que a roda saltou por defeito de fixação e em consequência disso a viatura capotou. Bem ao contrário, o que resulta dos factos provados foi que o veículo, por motivo que não se apurou, capotou, acabando por se imobilizar no meio da estrada (pontos 3º e 27º da base instrutória) e que a roda da frente do lado esquerdo do veículo conduzido pelo 1.º A. saltou (ponto 4º da base instrutória). Afirma-se, pois, expressamente que a causa do capotamento não foi apurada. Ora, os pontos 3º, 4º, 5º, 6º e 7º da base instrutória versavam factos fulcrais para a tese dos AA; eram do seguinte teor: 3º - Inesperadamente, (o 1º. A) perdeu o controle da viatura, tendo esta capotado por diversas vezes? 4º - O acidente resultou de ter saltado a roda da frente esquerda por deficiência de material, nomeadamente da porca de fixação da rótula inferior da suspensão dianteira esquerda? 5º - As RR reconheceram que o acidente se deveu à referida anomalia? 6º - A “G” não detectou a deficiência determinativa do acidente? 7º - Que já existia aquela data (15-10-1998, data da aquisição da viatura)? A 1ª instância respondeu da seguinte forma a estas questões de facto: 3º - Provado apenas que o veículo, por motivo que não se apurou, capotou acabando por se imobilizar no meio da estrada. 4º- Provado apenas que a roda da frente do lado esquerdo do veículo conduzido pelo Autor saltou. 5º, 6º e 7º - Não provados E expressamente a 1ª instância esclareceu, a propósito dos pontos 4º a 7º, que "o tribunal não ficou convencido que o capotamento do veículo se tivesse ficado a dever à deficiência de material - da porca de fixação da rótula inferior da suspensão da dianteira esquerda" . Se é certo que a roda da frente esquerda saltou, não é menos verdade que se desconhece se tal foi causado por deficiência do material ou pelo capotamento da viatura que os AA alegam ter sido por diversas vezes. E o que relevava era a demonstração de que o defeito preexistia ao acidente. Não tendo sido demonstrada a existência de defeito do material nem, muito menos, a relação de causa - efeito entre esse defeito e o acidente, o desfecho da acção não poderia ser outro, diverso da improcedência. Aliás, a participação de acidente elaborada pela GNR - Brigada de Trânsito refere que o condutor do veículo esclareceu que se atrapalhou quando um outro veículo o ultrapassou e que guinou repentinamente, tendo o veículo capotado em plena estrada (Cfr. doc. fls. 305 vº). Tal participação configura um documento autêntico (art. 363º nº 2, 369º nº 1, 370º nº 1 CC) e a respectiva força probatória é plena quanto às declarações que nela são atribuídas ao condutor da viatura, como "factos neles atestados com base nas percepções da entidade documentadora" (art. 371º nº 1 CC); percepções que, in casu, serão necessariamente auditivas. Logo, a impugnação da sua força probatória passaria pela arguição da falsidade, sendo certo que tal não foi suscitada (art. 372º nº 1 e 2 CC). Ora, apurou-se que o veículo, por ser mais alto que os ligeiros de passageiros, tem um centro de gravidade mais elevado e, por isso, a probabilidade de se inclinar e capotar quando faz viragens bruscas (cfr. Respostas aos pontos 28º, 30º, 31 º e 32º). Um outro argumento invocado pelos AA para o estabelecimento quer da existência de um defeito, quer da relação causal entre ele e o acidente, assenta no reconhecimento desses factos pelas RR, ao disponibilizarem aos AA uma viatura de substituição, semelhante à sinistrada, até 10-05-1999, data em que solicitaram a devolução; tal actuação configuraria uma confissão extra-judicial da existência do defeito e da relação causal entre ele e o acidente. As RR sustentam que tal disponibilização se fundava em razões comerciais, enquanto se procedia a exame e análise das peças alegadamente defeituosas e que cessou com o conhecimento das conclusões desse exame. A declaração - que não tem necessariamente que ser expressa por palavras, escrito ou qualquer outro meio directo de manifestação da vontade, bem podendo ser tácita por actos ou comportamentos que com toda a probabilidade revelem a vontade do declarante (art 217º nº 1 CC) - confessória, tem que ser inequívoca (art. 357º nº 1 CC). Ora, da disponibilização de viatura de substituição no circunstancialismo invocado apenas é lícito concluir que, para as RR, enquanto internamente se não apurar a existência de defeito preexistente ao acidente, tudo se passa como se o defeito, na realidade, existisse ... ; logo - repete-se, para as RR - à partida (e à cautela), o cliente deve ter razão .... atitude esta que só se compreende por razões comerciais de implementação da marca. Mas, mais que dever ter razão, importa, sobretudo, que a tenha efectivamente ... E não é possível formular tal conclusão a partir do sentido daquele facto. O mesmo é dizer que a interpretação dele não é inequívoca, isto é, clara, evidente, não consentindo qualquer outro significado; como se viu, se pode fundamentar um reconhecimento do direito, também se pode fundar em razões de ordem comercial. De tudo o exposto, não podemos deixar de acompanhar a 1ª instância na decisão que tomou para o conflito de interesses que lhe foi colocado. A apelação terá necessariamente que improceder. ACÓRDÃO Nesta conformidade, acorda-se nesta Relação em julgar improcedente a apelação e em confirmar a douta sentença recorrida. Custas pelos recorrentes. Évora e Tribunal da Relação, 13.09.2007 |