Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | MARIA ALEXANDRA MOURA SANTOS | ||
Descritores: | ACÇÃO DE REIVINDICAÇÃO ERRO NA FORMA DO PROCESSO FACTO IMPEDITIVO RESPOSTA À CONTESTAÇÃO FACTOS ADMITIDOS POR ACORDO TRANSMISSÃO DO ARRENDAMENTO | ||
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Data do Acordão: | 03/13/2004 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO CÍVEL | ||
Decisão: | REVOGADA PARCIALMENTE A SENTENÇA | ||
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Sumário: | I - É a acção de reivindicação e não a acção de despejo o meio próprio a utilizar quando a causa de pedir é um direito real do locador sobre o prédio e não a cessação do contrato de arrendamento, nomeadamente porque o ocupante do prédio não é o locatário. II - A invocação da transmissão de um contrato de arrendamento validamente celebrado como legitimador da ocupação do prédio reivindicado, constitui facto impeditivo do direito do proprietário pedir a sua restituição (artº 487º nº 2 do CPC). Não tendo a A. respondido a tal, terão de considerar-se os factos que a fundamentam admitidos por acordo (artºs 502º, 505º e 490º do CPC). III - O facto de não ter sido aplicada a cominação legal e, de a matéria de excepção alegada ter sido levada ao questionário, sem reclamação do R., ter sido sobre ela produzida prova e o tribunal respondido aos respectivos quesitos, não obsta a que o tribunal os tome em consideração em sede de sentença como resulta do disposto nos artºs 646º nº 3 e 659º nº 3 do C.P.C. | ||
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Decisão Texto Integral: | PROCESSO Nº 2908/02 ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA “A” intentou contra “B”, a presente acção com processo sumário pedindo que seja o Réu condenado a reconhecê-la como dona e legítima proprietária do prédio descrito nos artºs 1 a 4 da petição inicial, a entregá-lo livre e desocupado e a pagar-lhe, pela ocupação indevida o mínimo de 35.000$00/mês desde a citação e até efectiva entrega. Alega, para tanto e em resumo, que o R. ocupa um prédio urbano de que ela é dona, por como tal vir a possuí-lo há mais de 30 anos, vendo-se assim privada do respectivo rendimento, recusando-se o R. a entregá-lo apesar de instado para o fazer. Citado contestou o R. nos termos de fls. 23 e segs., contrapondo, em síntese, que sucedeu no arrendamento a sua falecida mãe, que cumpriu as formalidades legais para a transmissão do arrendamento e que a A. litiga de má fé por ter omitido a sua condição de transmissário relativamente ao contrato de arrendamento que vigorava com a sua mãe. Conclui pela improcedência da acção e pela condenação da A. como litigante má fé em multa e indemnização não inferior a 100.000$00. Foi proferido o despacho saneador com a organização da especificação e questionário, que foram objecto de reclamação de fls. 129/130, indeferida nos termos da decisão de fls. 134. Realizada a audiência de julgamento, o tribunal respondeu à matéria de facto pela forma constante de fls. 203/204 que não sofreu reclamação. Foi, por fim, proferida a sentença de fls. 207 e segs. que julgando a acção parcialmente procedente, condenou o R. a reconhecer a A. como proprietária do imóvel em apreço e a entregá-lo à A., livre e desocupado, absolvendo-o do pedido de indemnização formulado. Inconformado, apelou o Réu, alegando e formulando as seguintes conclusões: A - Verifica-se erro na forma do processo porquanto a acção própria seria (e será) a acção especial de despejo e não a acção com processo comum. B - Assim se violando o disposto no artº 55 do RAU. Por outro lado, C - A falta de resposta à contestação do R. implica, por acordo das partes, a admissão dos factos por ele alegados, ou seja, e no caso, a admissão pela A. dos factos alegados pelo R. relativamente à transmissão do arrendamento. D - Ou seja (ainda) de que a mãe do R. era arrendatária do prédio; de que falecida ela, em 04/06/95, o R. com ela coabitava há mais de um ano em comunhão de mesa e habitação E - Ao assim não o considerar a douta sentença do Mmº Juiz a quo violou o disposto nos artºs 505º e 490º nº 2 do C.P.C. e também F - Ao não ter sido declarada a caducidade do contrato de arrendamento, sendo certo que o mesmo existia em 04/06/95, data do óbito da mãe do R., arrendatária do prédio, o contrato de arrendamento mantém-se válido. G - Até porque e para além disso resulta provado que nessa data o R. com ela coabitava. H - Assim se não considerando viola-se o disposto nos artºs 50º a 52º do RAU. e mesmo que assim se não viesse a entender I - Verifica-se deficiente resposta aos quesitos 13º e 14º porquanto o testemunho prestado pela testemunha F... não pode deixar de merecer fé, conforme atrás se justificou. J - Ou seja o atrás alegado em 57 a 62 e 63 a 66 e que aqui com a devida vénia se dá por reproduzido. A final pede a revogação da sentença recorrida e a sua substituição por outra que: A - Absolva o R. da instância por erro na forma de processo. Subsidiariamente B - Dando como provado factos caracterizadores da transmissão do direito ao arrendamento do prédio dos autos para o Réu, por morte de sua mãe, anterior arrendatária, julgue válido e eficaz o contrato de arrendamento e por isso o absolva do pedido. Subsidiariamente ainda C - Porque não verificada nem declarada a caducidade do contrato de arrendamento vigente à data da morte da mãe do R., arrendatária do prédio dos autos, o contrato de arrendamento mantém-se válido e, por via disso, ser o R. absolvido do pedido. A A. contra-alegou nos termos de fls. 236 e segs. concluindo pela confirmação da sentença recorrida. * Colhidos os vistos legais, cumpre decidirComo é sabido, são as conclusões que delimitam o âmbito do recurso pelo que só abrange as questões aí contidas (artº 690º nº 1 do C.P.C.). Do que delas decorre verifica-se que são as seguintes as questões a decidir: - A relativa ao invocado erro na forma do processo. - A relativa à matéria de facto. - A relativa à subsistência (ou não) do contrato de arrendamento. * São os seguintes os factos tidos por provados na 1ª instância:Da Especificação: A - Por escritura pública lavrada na Secretaria Notarial de ... em ..., “C” doaram a “B”, sua filha, com dispensa de colação e sem qualquer reserva, um prédio urbano composto de casa de habitação com a área coberta de 24 m2, sito em ..., freguesia de ..., concelho de ..., a confrontar do Norte, Sul e Poente com o proprietário e do nascente com F..., inscrito na matriz sob o artº ..., fazendo aquele prédio parte do prédio misto descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº ... do livro ... B - Pela descrição ... da freguesia de ..., foi o prédio urbano provado em A) desanexado do prédio descrito sob o nº ... a fls. ... do livro ..., passando a corresponder-lhe o artº ... C - Pela apresentação ... foi inscrita a aquisição a favor de “B”, por doação de “C”, do prédio provado em B). D - Por participação efectuada em 10 de Janeiro de 1964 ao chefe da secção de finanças do concelho de ..., nos termos do artº 39º da Lei 2030 de 22/06/1948, foi dado conhecimento de que “D” (herdeiro) há mais de cinco anos dera de arrendamento, por contrato verbal, a “E”, pela quantia de 70 escudos, o rés-do-chão do prédio sito em ..., da freguesia de ..., inscrito na respectiva matriz sob o artº ... (o aludido em B). E - “B”, nascido a 4/01/1948 é filho de “E” e “F”. F - “F” faleceu no dia 4 de Junho de 1995, no estado de viúva de “E, com quem era casada no regime de comunhão geral de bens. G - “E” faleceu em 21 de Janeiro de 1967. H - À data da instauração da presente acção - 19 de Outubro de 1995 - o R. “B” ocupava o imóvel provado em A) e, instado a desocupá-lo não o fez. I - Em 1995 o arrendamento do imóvel provado em A) nunca seria inferior a Esc. 35.000$00. Do Questionário: 1º - “C” recebiam de “F” as rendas do prédio provado em B), passando-lhe os respectivos recibos em seu próprio nome. 2º - Muito embora com a designação de “E” (viúva). 3º - O que aconteceu mensal e sucessivamente durante algum tempo, tendo depois a “F” passado a depositar tais rendas na CGD. 5º - Após o óbito de “F”, o R. “B” comunicou a “C” tal óbito e bem assim a reclamação do direito ao arrendamento, 6º - Através de carta datada de 14 de Junho de 1995. 7º - E recebida pela A. “A”. 8º - A essa carta nunca o R. recebeu resposta de “C”, mas tão só da A. “A”, através de uma carta datada de 10 de Julho de 1995. 10º e 11º - “C” não respondeu à carta provada em 5º, e no dia 13 de Novembro de 1995 o R. escreveu uma carta àquele e outra à A., acompanhadas de certidões de registo de óbito de “F” e de nascimento do próprio R., que nessas cartas reiterou a sua vontade de suceder no direito ao arrendamento. 12º - Essas cartas foram recebidas, quer por “A”, quer por “C”. 13º e 14º - O R. viveu com sua mãe na casa locada durante alguns meses antes do óbito desta, lá comendo e dormindo. Estes os factos. I - A questão do erro na forma do processo. Se bem que a lei não o defina expressamente, sempre se tem entendido que o erro na forma do processo consiste em ter o autor usado de uma forma processual inadequada para fazer valer a sua pretensão (J. Rodrigues Bastos, “Notas ao CPC”, vol. I, p. 400/401). Tal situação verifica-se quando o A. tenha lançado mão de um processo especial em vez de processo comum ou de outro processo especial e vice-versa, ou quando tenha usado uma forma de processo comum em vez de outra (Prof. A. dos Reis, “Comentário”, vol. II, p. 477/478). Relativamente aos elementos determinantes na escolha da adequada forma de processo, a doutrina e jurisprudência dominantes vêm afirmando que é pelo pedido formulado que se determina a propriedade ou impropriedade do meio processual empregado (cfr. Prof. A. dos Reis “CPC Anotado”, vol. II, p. 288, Rodrigues Bastos, ob. cit. p. 401; Ac. STJ 30/1/81, BMJ 303,182) e de 15/6/62, BMJ 118,414). Como refere o Prof. Antunes Varela “A propriedade do meio processual empregado, abrangendo neste juízo tanto o tipo de acção escolhido (...) como a forma processual usada (...) mede-se, na verdade, em função do pedido, ou seja da pretensão de tutela jurisdicional visada pelo requerente, e não da natureza da relação substantiva ou do direito subjacente que lhe serve de base” (in RLJ, ano 115, p. 245). Como se escreveu no Ac. do STJ de 15/6/62 “Se a causa de pedir está em desacordo com o pedido, a nulidade não é erro na forma do processo mas ineptidão da petição inicial. Se a causa de pedir não justifica o pedido, não há nulidade mas improcedência” - in BMJ 118,414. É, pois, a partir da providência jurisdicional requerida pelo autor para tutela da sua situação que o juiz deve avaliar da propriedade do meio processual por ele escolhido. Ora, no caso sub judice, a A. pede, o reconhecimento da propriedade do imóvel ilegitimamente ocupado pelo apelante, e a sua entrega livre e desocupado, além da sua condenação no pagamento de uma indemnização pelo prejuízo que tal ocupação lhe causa. Trata-se, pois, de uma acção de reivindicação, a que corresponde processo comum e não especial, no caso, sumária em face do seu valor. E é, aliás, a acção de reivindicação o meio próprio para fazer valer a pretensão formulada pela A. e não a acção de despejo. É que a acção de reivindicação é uma acção real em que o proprietário requer o reconhecimento do seu direito de propriedade sobre uma coisa e a condenação do réu na sua restituição (artº 1311º do C.C.), como in casu. Diferentemente, o objecto da acção de despejo, não é o direito de propriedade ou outro direito real do locador sobre o prédio arrendado mas a cessação do contrato de arrendamento e a consequente desocupação do imóvel locado. A vulgarmente chamada acção de despejo, que segue hoje, também, a tramitação do processo comum, destina-se a fazer cessar e situação jurídica do arrendamento, o que não é o caso do pedido formulado nos autos (cfr. artºs 55º e 56º do RAU). Não se verifica pois o invocado erro na forma de processo. II - Relativamente à matéria de facto Pretende o apelante que não tendo a A. respondido à sua contestação, deveriam os factos por ele alegados, nomeadamente, quanto à transmissão do arrendamento e à coabitação com sua mãe à data do seu óbito, terem sido considerados provados por acordo. Tem razão o R. apelante. Com efeito, a presente acção é, como vimos, uma acção de reivindicação cuja causa de pedir é o facto jurídico de que deriva o direito real - artº 498º nº 4 do C.P.C.. Consagrando a nossa lei a teoria da substanciação, segundo a qual o objecto da acção é o pedido, definido através de certa causa de pedir, impõe-se que nestas acções se indique o direito cujo reconhecimento se pretende, o efeito que se quer obter e a menção do facto concreto que sirva de base ao pedido, como seja, por exemplo, a usucapião ou a presunção de propriedade derivada do registo predial. “Aos AA. cabe a alegação e prova dos factos constitutivos do direito de propriedade sobre o prédio e de que os RR. se encontram abusivamente na sua detenção. Por sua vez, compete aos RR. provar factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito dos AA, ou seja, por exemplo, que a sua detenção se baseia num contrato de arrendamento - artº 342º do C.C.” - cfr. Aragão Seia, Arrendamento Urbano, Almedina, 6ª ed., p. 333 e entre outros, Acs. da R.P de 10/1/89, BMJ 383, 603 e R.E. de 18/2/88, BMJ 374,555. Trata-se, pois, de defesa por excepção aquela que o R. deduziu na presente acção, invocando a existência do contrato de arrendamento celebrado com seu pai, por morte deste transmitido a sua mãe e que por morte desta, se transmitiu a ele próprio uma vez que à data do seu decesso, com ela convivia há mais de um ano (artº 487º nº 2 do C.P.C.). A invocação da transmissão de um contrato de arrendamento validamente celebrado como legitimador da ocupação do prédio reivindicado, constitui facto impeditivo do direito do proprietário pedir a sua restituição. Tendo sido deduzida defesa por excepção na contestação, incumbia ao A. responder na réplica à matéria desta, sob pena de serem considerados admitidos por acordo, por falta de impugnação, os factos alegados (artº 502º nº 1 e 505º do C.P.C.). Ora, in casu, não consta dos autos a apresentação de tal articulado por parte da A. apelada. Sucede, porém, que a apelada veio agora, em sede de contra-alegações, acusar a falta de tal articulado nos autos, dizendo que o apresentou por via postal, não registada, ao Tribunal de ... em 8/01/96, juntando fotocópias da carta dirigida ao chefe da secretaria do tribunal e do articulado que alega ter enviado. Refere ainda a apelada que tendo constatado no livro de registo de papéis da secção central do tribunal de ... duas entradas de papéis para o processo, as mesmas só podem referir-se à carta que capeava o requerimento e ao aludido requerimento de resposta. Por isso, protestou apresentar, em dez dias, cópia daquele registo de entradas, que segundo afirma já teria requerido e pede que “seja levada em consideração a matéria da resposta”. Acontece que até ao momento não apresentou a apelada qualquer comprovativo do que alega, não obstante protestar fazê-lo. De todo o modo, não pode deixar de estranhar-se o facto de só agora, em sede de recurso, a apelada dar por falta do articulado, sem cuidar de se certificar oportunamente da sua junção, tanto mais que nem sequer o enviou sob registo. E na verdade era exigível à A. apelada tal cuidado em face da sabida consequência que, in casu, derivava para si da falta de apresentação de resposta à contestação. Tendo optado pelo envio do articulado por correio simples e não se certificando sequer da sua entrada no tribunal, terá de aceitar que tal consequência sibi imputet. O certo é que não havendo no processo qualquer rasto da apresentação de tal articulado e não tendo a A. feito qualquer prova do seu envio, terá de se considerar que a mesma não foi apresentada. Mas, defende ainda a apelada, mesmo que assim se considere, o R. não reclamou da falta de especificação dos factos por ele alegados apenas o tendo feito relativamente ao artº 14 do questionário e, conformando-se com o despacho sobre aquela reclamação, não pode agora suscitar tal questão. Além disso, diz ainda a apelada que não carecia de responder à contestação pois os factos alegados pelo R. na contestação estavam em oposição com a p.i. no seu conjunto, razão porque tal matéria não podia ser levada à especificação. Não tem razão a apelada. Relativamente a esta última questão, desde logo, porque os factos articulados na contestação do R. são factos novos, que constituem matéria de excepção e não impugnação dos alegados pela A.. Daí a necessidade de resposta por parte da A., não podendo considerar-se que “estavam em oposição com a p.i. no seu conjunto” (artº 490º nº 2 do C.P.C.). No que respeita ao argumento da conformação do apelante com a organização da especificação e questionário e com o despacho sobre a reclamação que apresentou, pelo que não pode agora suscitar tal questão, também não assiste razão à apelada pois a omissão verificada não constituiria fundamento de reclamação que se limita aos casos de deficiência, excesso ou obscuridade (cfr. artº 511º nº 2 do C.P.C.). Mas, não tendo sido aplicada a cominação legal e, tendo os factos da matéria de excepção sido levados ao questionário, sem reclamação do R., sobre eles produzida prova e o tribunal respondido a tais quesitos, estará o tribunal impedido de os considerar agora como pretende a apelada? É evidente que não. Com efeito, reza o artº 646º nº 3 do C.P.C. que têm-se por não escritas as respostas do tribunal colectivo sobre questões de direito e bem assim as dadas sobre factos que só possam ser provados por documentos, ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes. Não opera pois, qualquer caso julgado sobre a especificação e o questionário formulados. Assim sendo, impõe-se considerar admitidos por acordo os factos alegados pelo R. na sua contestação e, em face deles, julgar de direito (artº 659º nº 3 e 646º nº 3 do CPC) A matéria de facto provada a considerar será, pois, a seguinte: I - A acima descrita, resultante da especificação. II - Os factos alegados pelo R. e admitidos por acordo por ausência de réplica, dos quais importa considerar, com relevância para a decisão da causa, os seguintes: 1 - “C” recebiam de “F” as rendas do prédio id. nos autos, passando-lhe os respectivos recibos em seu próprio nome. 2 - Muito embora com a designação de “E” (viúva). 3 - O que aconteceu mensal e sucessivamente até há algum tempo, tendo depois a “F” passado a depositar tais rendas na CGD por recusa do senhorio em as receber. 4 - Após o óbito de “F”, o R. “B” comunicou a “C” tal óbito e bem assim a reclamação do direito ao arrendamento 5 - Através de carta datada de 14 de Junho de 1995. 6 - E recebida pela A. “A”. 7 - A essa carta nunca o R. recebeu resposta de “C”, mas tão só da A. “A”, através de uma carta datada de 10 de Julho de 1995 na qual referia que o R. não havia cumprido as formalidades legais impostas pelos artºs 89º e 94º do RAU. 8 - Na carta de 14/6/95 o R. comunicou a “C” que “por óbito de sua mãe e primitiva inquilina se lhe havia transmitido o direito ao arrendamento”. 9 - No silêncio da A. a uma solução consensual pela qual providenciou, o R. escreveu-lhe uma carta com a/r datada de 13/11/95 reiterando-lhe a sua vontade de assumir o contrato de arrendamento e complementarmente a enviar-lhe a certidão de óbito de sua mãe e a sua própria certidão de nascimento. 10 - Nesse mesmo dia escreveu também ao pai da A. “C” com idêntica manifestação de vontade e ainda com o envio de fotocópias autenticadas da certidão de óbito de sua mãe e a sua própria de nascimento. 11 - Essas cartas foram recebidas, quer por “A”, quer por “C”. 12 - Quer a A. “A”, quer o seu pai “C” e anterior senhorio sabiam que o R. “B” convivia com sua mãe no arrendado e há mais de um ano, aí todos os dias dormindo, tomando refeições, fazendo a sua higiene diária e aí possuindo e usando os seus pertences e aí passando os momentos e dias de lazer. Da aplicação do direito: Resulta do artº 1051º al. d) do C. Civil que o contrato de locação caduca por morte do locatário. Esta regra geral sofre, porém, as excepções consagradas no artº 85º do RAU. No que ao caso interessa, resulta do disposto no nº 1 al. b) deste artigo que o arrendamento para habitação não caduca por morte do primitivo arrendatário ou daquele a quem tiver sido cedida a sua posição contratual, se lhe sobreviver descendente que com ele convivesse há mais de um ano. A convivência aqui referida tem implícita a ideia de que este tem a sua residência habitual com carácter de estabilidade e permanência no prédio que foi habitado pelo defunto arrendatário e, in casu, do cônjuge que lhe sobreviveu. - cfr. entre outros, Ac. R. P. de 8/6/92, BMJ 418,854 e da Lx. de 26/10/82, CJ T. II, p. 129. O transmissário não renunciante deve comunicar ao senhorio, por carta registada com a/r a morte do primitivo arrendatário ou do cônjuge sobrevivo enviada nos 180 dias posteriores à ocorrência e com ela enviar os documentos autênticos ou autenticados que provem os seus direitos. - cfr. artº 89º do RAU. Saliente-se, contudo, que a transmissão do contrato não fica prejudicada se não for feita a comunicação ao senhorio ou se não o for no prazo legal, ficando apenas o transmissário obrigado a indemnizá-lo por todos os danos derivados da omissão (nº 3 do cit. artº 89º repristinado face à declaração de inconstitucionalidade da norma do artº 1º do D.L. 278/93 na parte em que eliminou o referido nº 3 - Ac. do T.C. nº 410/97 de 23/5). Ora, tendo ficado provado que o apelante convivia com sua mãe no arrendado e há mais de um ano, aí todos os dias dormindo, tomando refeições, fazendo a sua higiene diária e aí possuindo e usando os seus pertences e aí passando os momentos e dias de lazer, tanto bastou para se ter operado a transmissão do contrato de arrendamento, sendo certo ainda que, in casu, também se provou que o apelante cumpriu o formalismo a que aludem os nºs 1 e 2 do artº 89º do RAU. Assim sendo, face à matéria de facto provada, é manifesto que o apelante detém legitimamente o imóvel ora reivindicado por se mostrarem preenchidos os requisitos de transmissão do arrendamento, por óbito de sua mãe, cônjuge sobrevivo do primitivo arrendatário, para quem o arrendamento se transmitiu. Procedem, pois, nos termos expostos, as conclusões da apelação do R., impondo-se a revogação da sentença recorrida na parte em que o condenou a entregar à A., livre e desocupado, o prédio objecto dos autos. * DECISÃONesta conformidade, acordam os Juizes desta Relação em julgar a apelação procedente e, em consequência, decidem: - Revogar a sentença recorrida no que concerne à condenação dela constante sob a al. c) da decisão e, consequentemente, absolver o R. apelante do pedido de entrega à A., livre e desocupado, do prédio urbano identificado nos autos. - Confirmar no mais a sentença recorrida. Custas pela apelada. Évora, 13.03.04 |