Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
655/09.0TBABF.E1
Relator: MATA RIBEIRO
Descritores: ASSEMBLEIA DE CONDÓMINOS
ACTAS
TÍTULO EXECUTIVO
Data do Acordão: 11/17/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO
Sumário: 1 – A acta da assembleia de Condóminos devido ao facto de ser uma lei especial que lhe atribui força executiva, serve única e exclusivamente como título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte.
2 – A exequibilidade do direito à prestação está dependente, por um lado, do dever de prestar estar consubstanciado num título, e por outro, da prestação se mostrar certa, líquida e exigível.
3 - A um documento particular só pode ser atribuída força executiva se do mesmo ressumbrar, adrede e inequivocamente, o acertamento e a vinculação para o executado da constituição ou reconhecimento de obrigações pecuniárias, sendo que no caso a acta dada à execução não se apresenta como título executivo negocial no âmbito do qual as partes em causa se vincularam ao que quer que fosse.
Decisão Texto Integral:





Apelação n.º 655/09.0TBABF.E1 (1ª Secção Cível)







ACORDAM 0S JUÍZES DA SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA


G…, S. A., veio instaurar, no Tribunal da Comarca de Albufeira (1º Juízo), execução comum, para pagamento de quantia certa contra Edifício C…, rua …, Santa Eulália, Albufeira, apresentando como título executivo uma cópia da Acta (n.º 4) de Assembleia de Condóminos, requerendo a notificação da executada para junção do respectivo original.
Em sede liminar, por considerar ser o título “manifestamente insuficiente”, o Julgador a quo indeferiu liminarmente o requerimento executivo.
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Não se conformando com esta decisão, veio a exequente interpor o presente recurso de apelação e apresentar as respectivas alegações, terminando por formular as seguintes conclusões, que se transcrevem:
I- O documento apresentado pela recorrente contém a assinatura dos devedores;
II- O documento apresentado pela recorrente importa o reconhecimento de uma dívida para com esta.
III- A obrigação reporta-se ao pagamento de uma quantia perfeitamente determinada.
IV- O documento apresentado pela recorrente como título executivo reúne pois todos os pressupostos previstos no artigo 46 n.1 da alínea c) do CPC.
V- Caracteriza-se assim, o dito documento inegavelmente como um verdadeiro título executivo.
VI- A fundamentação fáctica da instância executiva fez referência tanto à causa de pedir como ao título executivo, pelo que, se encontra correctamente descrita, não havendo deste modo fundamento para indeferir liminarmente o requerimento inicial por manifesta insuficiência do título executivo.
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Foram apresentadas contra alegações, nas quais se pugnou pela manutenção do julgado.

Apreciando e decidindo

Como se sabe o objecto do recurso acha-se delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo das questões cujo conhecimento é oficioso, tendo por base as disposições combinadas dos artºs 660º n.º 2, 661º, 664º, 684º n.º 3 e 685º-A todos do Cód. Proc. Civil.
Assim, no que ao recurso respeita, a questão é a de saber se o título dado à execução detém exequibilidade, podendo servir de suporte à pretensão executiva formulada.
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Para apreciação da questão há que ter em conta o seguinte circunstancialismo factual:
a) No seu petitório inicial a exequente apresentou como título executivo uma “Acta” de Assembleia de Condóminos e quanto aos factos fez consignar:
A Acta n. 4 junta com o presente requerimento é título executivo, sendo que a requerente prestou serviços no montante de 11.165,23€, serviços estes não pagos pela requerida. Ficou consignado na citada acta que a requerida iria proceder ao pagamento do capital em divida, pagamento este que até ao momento não efectuou. Solicita-se a V. Exa. que se digne mandar oficiar a actual administração do condomínio do Edifício C…, aqui executado, para junção aos autos de cópia certificada da referida acta n.° 4, uma vez que está em sua posse o referido documento (livro de actas). A actual administração é P…, Unipessoal, Lda., com sede na Rua …, ,8500-702 Portimão.
b) No que se refere à liquidação consta do petitório como capital em dívida a quantia de € 11 165,23 e como juros de mora a quantia de € 5 867,33.
c) Na acta n.º 4 assinada pelos condóminos presentes e representados, consta o seguinte:
Esta Acta número quatro, dá seguimento à Acta número três, processada por computador em quatro de Outubro de dois mil e três.
Aos trinta e um dias do mês de Janeiro de dois mil e quatro, pelas dez horas, na sala de Reuniões do Edifício sita na Rua …, número …, teve lugar a Assembleia-Geral Ordenaria de Condóminos do prédio em regime de propriedade horizontal denominado: Edifício C…, sito na Rua …, número … – Santa Eulália – Albufeira, legalmente convocada pela administração da G…, para deliberar sobre:
1. Análise, discussão, votação e aprovação do relatório de contas relativo ao período de Maio de dois mil e três a Dezembro de dois mil e três.
2. Eleição da Administração período Janeiro de dois mil e quatro a Dezembro de dois mil e quatro.
3. Análise, discussão, votação e aprovação do Orçamento de Condomínio para o período Janeiro de dois mil e quatro a Dezembro de dois mil e quatro.
- 4. Deliberação favorável para cobrança judicial das quotas em dívida.
5. Análise, discussão, votação e aprovação dos seguintes orçamentos:
- instalação de iluminação na parte frontal do condomínio;
- Automatização de dois portões de acesso às viaturas;
- instalação de calhas para escoamento das goteiras;
- Abertura de vala para colocação e instalação de três candeeiros no jardim;
6. Análise, discussão, votação e aprovação do pagamento ou não dos elevadores às fracções do rés-do-chão;
7. Outros assuntos de interesse geral para o condomínio..
Encontram-se presentes, conforme lista de presenças, assinada e que vai ser arquivada, os etários das seguintes fracções, cada uma delas representando em número de votos:
Fracção S – AAM…, com dois virgula quinhentos e trinta de permilagem.
Fracção AJ- AMRR…, com quatro vírgula seiscentos e vinte de
Permilagem.
Fracção L- AMFR…, com dois vírgula setecentos e noventa de permilagem..
Fracção P- ACR…, com dois vírgula novecentos e oitenta de permilagem.
Fracção O- AS…, com dois virgula oitocentos e noventa de permilagem, representado por Procuração pelo Sr. ACR….
Fracção AA- JCF…, com dois vírgula setecentos e noventa de Permilagem.
Fracção l- JLFL…, com dois vírgula quatrocentos e trinta de permilagem.
Fracção Q- JSV…, com dois vírgula seiscentos e vinte de permilagem.
Fracção A- JL…, com três vírgula novecentos e sessenta de permilagem.
Fracção AD- JGR…, com quatro vírgula cento e quarenta de permilagem.
Fracção C- LMDG…, com quatro virgula quinhentos de permilagem, representado por Procuração pelo Sr. CA….
Fracção AH- LMMV…, com três vírgula trezentos e dez de permilagem
Fracção B- MFF…, com dois vírgula oitocentos e noventa de permilagem, representado por Procuração pelo Sr. JL….
AF- MATSE…., com dois vírgula seiscentos e vinte de permilagem.
Fracção D- MAAA…, com dois vírgula seiscentos e vinte de
permilagem.
Fracção Z- MBSSH…, com dois vírgula quatrocentos e trinta de permilagem.
Fracção J- MDSRA…, com três vírgula quinhentos e dez de
Permilagem.
Fracção X- MVT…, com dois vírgula setecentos e noventa de permilagem, representada por Procuração pela ora AR….
Fracção E- OJC…, com dois vírgula quinhentos e trinta de permilagem.
Presentes pela Administração estão HT…, CM…, LS… e SN…. Presidiu a Assembleia o Sr. ACR…., proprietário da fracção P e secretariou SN….
Havendo quórum com cinquenta e nove vírgula zero três do capital do prédio, deu-se inicio à presente Assembleia pelas dez horas e trinta minutos.
Verificada a regularidade da convocatória, entrou-se de imediato na discussão do ponto número um da ordem de trabalhos.
Análise, discussão, votação e aprovação do relatório de contas relativo ao período de Maio de dois mil e três a Dezembro de dois mil e três.
O Sr. HT…, perante a insatisfação de alguns condóminos com os elevados consumos de água, apresentou, em nome da Administração, desculpas pelo facto de inicialmente e aquando da aprovação do valor para os consumos de água, o valor ter sido muito desfasado da realidade, o que se prende com o facto de ser extremamente, difícil calcular os consumos num primeiro ano de Administração. Por outro lado, as leituras bimensais por parte da Câmara Municipal de Albufeira, originam valores por metro cúbico bastante elevados. Foi salientado também que no ano anterior, os consumos apresentados de água foram referentes a dez meses. O Sr. HT… referiu também que durante este exercício foram tomados os devidos cuidados, nomeadamente com a redução dos tempos de rega, no entanto, os consumos de água do prédio serão sempre elevados e é um tema que requererá sempre muita atenção.
Foram solicitados esclarecimentos acerca dos valores recebidos para honorários jurídicos, tendo a Administração esclarecido que os mesmos não foram gastos uma vez que no foram constituídos quaisquer processos, pois todos os condóminos que ficaram como devedores na Acta anterior, regularizaram a sua situação e a utilização que os condóminos consideram indevida desta verba, não foi indevida, mas sim para liquidar outras despesas, face ao défice negativo do condomínio.
A Assembleia manifestou o seu desagrado pela apresentação de uma Factura relativa à pintura do muro, uma vez que entre outros, a Assembleia considera que este valor é da responsabilidade da Empresa Construtora, pois este pendente de construção, está abrangido pela garantia de construção do edifício. Este valor foi solicitado à Empresa Construtora em fax enviado pela Administração, pelo que, embora á priori este valor seja suportado pelo condomínio, deverá o construtor ser responsável pelo respectivo reembolso.
Posto à votação, o relatório de contas do período Maio de dois mil e três a Dezembro de dois mil e três, foi aprovado por unanimidade. Foi aprovado um valor referente ao défice do exercício anterior, no montante de cinco mil oitocentos e vinte e nove euros e onze cêntimos, que será liquidado por todos os condóminos no exercício de Janeiro a Dezembro de dois mil e quatro, com a ressalva de que não serão constituídos os Fundos de Reserva dos exercícios anteriores.
Foi proposto pelo Presidente da Assembleia que o ponto número dois da ordem de trabalhos seja alterado para o ponto número três, tendo sido aprovado por unanimidade.
2. Análise, discussão, votação e aprovação do Orçamento de Condomínio para o período Janeiro de dois mil e quatro a Dezembro de dois mi! e quatro.
A Assembleia suspendeu os trabalhos pelas treze horas, devendo a mesma ter continuidade pelas catorze horas e trinta minutos.
Pelas catorze horas e trinta minutos, retomaram-se os trabalhos.
Pelas catorze horas e trinta minutos a proprietária da Fracção Z ausentou-se da Assembleia, tendo deixado a Procuração ao Sr. ACR….
Foram apresentados à mesa as seguintes propostas, e analisadas, com base no custo total das rubricas fixas:
A- D…, com um total de dezassete mil e noventa e três euros, (Jardim com produtos, Piscina com produtos, Limpeza com produtos e Serviços Administrativos).
B- Q…, com um total de treze mil cento e cinquenta e oito euros (Jardim com produtos, Piscina com produtos, Limpeza com produtos e Serviços Administrativos).
C- E… com um total de nove mil quinhentos e oitenta euros (Jardim com produtos, Piscina com produtos, Limpeza corn produtos e Serviços Administrativos).
D- B…, Lda. com um total de onze mil quatrocentos e setenta e sete euros e noventa e três cêntimos (Jardim sem produtos, Piscina com produtos, Limpeza com produtos e Serviços Administrativos).
Depois de analisadas e postas a votação, foi aprovada por maioria a proposta C.
A Assembleia fica suspensa, sendo retomada em segunda convocatória com a nova Administração presente.
As dívidas à anterior Administração irão ser liquidadas com a maior brevidade possível, no montante de onze mil cento e sessenta e cinco euros e vinte e três cêntimos, incluindo os custos do mês de Janeiro de dois mil e quatro (Serviços Administrativos, Manutenção de Jardim, Manutenção de Piscina e Serviços de Limpeza).
A Administração cessante irá apresentar as contas do mês de Janeiro de dois mil e quatro, onde eventualmente poderão surgir outros débitos. Para esta verificação de contas, fica nomeada uma comissão constituída pelos condóminos das fracções AJ, AD e P.
Não havendo mais nada a tratar, deu-se por suspensa a presente Assembleia pelas dezasseis horas e lavrada a presente Acta, que depois de lida vai ser assinada por todos os presentes.
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Conhecendo da questão
O Julgador a quo em face da acta da assembleia de condóminos entendeu, não estarem em causa, no caso concreto, “contribuições devidas ao condomínio nem o pagamento pelos condóminos das despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e o pagamento de serviços contratados para satisfação do interesse comum” uma vez que a exequente pretende ver-se ressarcida “de uma dívida assumida pela nova administração do condomínio perante a anterior administração, no montante de € 11.165,23, pela prestação de serviços administrativos, manutenção de jardim, manutenção de piscina e serviços de limpeza, conforme resulta da acta dada à execução” encontrando-se tal dívida fora das situações elencadas no artº 6º n.º 1 do DL 268º/94 de 25/10, pelo que tal acta não pode ser aceite como título executivo.
A exequente que no seu requerimento executivo se limitou a invocar a acta da assembleia de condóminos, sem se referir a qualquer normativo legal em que alicerçasse a sua pretensão, vem agora salientar que não está em causa um documento que por disposição especial foi atribuída força executiva, a que alude a al. e) do artº 46º n.º 1 do CPC, mas simplesmente um documento particular assinado pelo devedor que reúne os requisitos exigidos pela al. c) do n.º 1 do artº 46 do CPC, não tendo o Julgador tomado tal em consideração tal vertente, ao decidir como decidiu.
Efectivamente, tendo por base o disposto no artº 6º do Dec. Lei 268/94 de 25/10 (Regime do Condomínio) e como emerge expressamente do seu teor,[1] a acta serve única e exclusivamente como título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte, e não contra outros intervenientes na assembleia, mesmo que nela se reconheçam obrigações.
A acta de assembleia de condóminos é título executivo autónomo ao qual a lei especial atribui força jurídica concreta, cujo valor apenas se mantém no âmbito da previsão normativa que o legislador quis consagrar através de lei especial.
Deste modo, e muito embora a acta da assembleia de condóminos seja um título executivo válido contra um qualquer condómino, já não o é contra a administração do condomínio ou contra o condomínio, com vista a ressarcimento de eventuais serviços prestados.
Assim o entendeu o Julgador a quo na decisão proferida, com a qual parece conformar-se a recorrente, apenas divergindo porque no seu entendimento o Julgador deveria reconhecer validade ao titulo dado à execução, enquanto documento particular assinado pelo devedor e no qual se reconhece uma dívida e, nessa perspectiva não ter indeferido liminarmente a execução.
Em nossa opinião o entendimento do recorrente não pode ser sufragado, porque desajustado da realidade formal e da realidade substancial.
No âmbito da realidade formal, diremos que o ora recorrente nunca teve em mente quando da apresentação em Juízo do seu requerimento executivo utilizar o título dado á execução como mero documento particular em que o devedor que o assina reconhece, através dele, uma dívida. Sempre o quis usar como título executivo especial referindo expressamente a “Acta” no campo do elenco do Título Executivo e reafirmando-o na exposição factual onde expressamente fez consignar que “A Acta n. 4 junta com o presente requerimento é título executivo…”.
No âmbito da realidade substancial, tal como salienta a apelada admitir o título dado à execução como documento particular válido com integração no âmbito da al. c) do n.º 1 do artº 46º do CPC, seria “alterar a causa de pedir e ampliar o objecto do pedido, inferindo tal linha de acção numa violação do princípio do pedido na sua vertente adjectiva,” dado que “no seu requerimento executivo a exequente não alega factualidade suficiente para que seja possível ao Julgador verificar se a acta em causa pode ser título executivo nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 46.º do Código de Processo Civil.”
Não há dúvida que, de acordo com o disposto no artº 46º n.º 1 al. c) do CPC, podem servir de base à execução os documentos particulares, assinados pelo devedor, que importem constituição ou reconhecimento de obrigações pecuniárias, cujo montante seja determinado ou determinável por simples cálculo aritmético.
Mas, não obstante Portugal ser “o país europeu mais generoso na concessão da exequibilidade a todo o documento particular que contenha o reconhecimento duma dívida líquida (ou liquidável por mero cálculo aritmético), ainda que não se apresente reconhecida a assinatura do devedor”[2], será de ter em atenção perante o conteúdo do mesmo, caso a caso, se essa exequibilidade dele emerge.
Mostra-se consensual para que se possa fazer uso de acção executiva, com vista à realização coactiva duma prestação, que esta deve mostrar-se certa, líquida e exigível (cfr. artº 802º do CPC), e que o dever de a prestar deve constar de um título, que há-de servir de suporte à pretensão.[3]
A certeza, decorre normalmente da perfeição formal do título e da ausência de reservas à sua plena eficácia. A liquidez é por assim dizer um plus que se acrescenta à certeza da obrigação, demonstrando quanto e o que se deve. A exigibilidade, respeita ao vencimento da dívida, sendo que, obrigação exigível é uma obrigação que está vencida, não dependendo o seu pagamento de termo ou condição, nem está sujeito a outras limitações.
O título dado à execução deve, por si só, fornecer a segurança de estarmos perante uma obrigação vencida e do respectivo direito a ela inerente.[4]
A um documento particular só pode ser atribuída força executiva se “do mesmo ressumbrar, adrede e inequivocamente, o acertamento e a vinculação para o executado da constituição ou reconhecimento de obrigações pecuniárias, sendo inclusive lícito ao julgador proceder à prévia interpretação do titulo, o qual, em caso de fundadas dúvidas sobre a presença daqueles requisitos, não é exequível.”[5]
No caso em apreço, pelo que nos é dado constatar com a acta em causa nunca se pretendeu que a mesma consubstanciasse um documento particular assinado pelo devedor que importava o reconhecimento de uma dívida, atendendo a que dele não emerge que o alegado devedor - Condomínio - se pretendeu vincular, e nunca o alegado credor – ora recorrente - entendeu esse documento enquanto tal.
A Acta não se apresenta como título executivo negocial no âmbito do qual as partes em causa se vincularam ao que quer que fosse.
Aliás, essa falta de vinculação resulta até do facto do alegado devedor – Condomínio do Edifício C… – ora executado, não ter assinado tal documento, conforme se constata pela compulsar da acta junta com a petição executiva, sendo que a sua vinculação cabia à administração em exercício, e não aos condóminos, por força do disposto no artº 1 436º do CC, já que é a esta que incumbe a realização de despesas comuns e regular a prestação de serviços de interesse comum [al. d) e g)].
Mas mesmo que se entendesse que a vinculação cabia aos condóminos ela, quanto a nós, não se poderia ter como relevante e eficaz.
Na ordem de trabalhos da aludida assembleia em nenhum dos pontos do conteúdo da convocatória se fazia alusão a dívidas da anterior administração e ao modo como estas haviam de ser liquidadas, sendo que a simples indicação de “outros assuntos de interesse geral” não permite a tomada de deliberação sobre qualquer matéria que não conste num ponto da convocatória, concretamente explicitada. A aprovação de deliberações sobre matérias não incluídas na ordem de trabalhos, só seria possível, se, se encontrassem presentes ou devidamente representados todos os condóminos, pois, de outro modo, temos de reconhecer ser a deliberação inválida.[6]
Na deliberação a que alude a cópia da Acta junta com o petitório executivo, apenas tomaram parte 59,03% da totalidade dos condóminos, ou seja, uma maioria simples, que deliberou sobre matéria alheia ao conteúdo da ordem de trabalhos e não fixou prazo para pagamento da quantia em causa consignando-se simplesmente que “as dívidas… irão ser liquidadas com a maior brevidade possível”.
Assim, também, quando se instaure execução por obrigação que em face do título, não seja exigível, “sem se demonstrar o seu vencimento, infringe-se o artº 802º” do CPC, pelo que o “juiz deve indeferir in limine o requerimento inicial,”[7] caso tenha intervenção na fase liminar dos autos.
Do exposto, tal como o Julgador a quo, entendemos ser o título dado à execução inexequível, pelo que falecem as conclusões da recorrente, não se mostrando violados os preceitos legais cuja violação foi invocada, sendo de julgar improcedente a apelação.

Para efeitos do n.º 7 do artº 713º do Cód. Processo Civil, em conclusão:
1 – A acta da assembleia de Condóminos devido ao facto de ser uma lei especial que lhe atribui força executiva, serve única e exclusivamente como título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte.
2 – A exequibilidade do direito à prestação está dependente, por um lado, do dever de prestar estar consubstanciado num título, e por outro, da prestação se mostrar certa, líquida e exigível.
3 - A um documento particular só pode ser atribuída força executiva se do mesmo ressumbrar, adrede e inequivocamente, o acertamento e a vinculação para o executado da constituição ou reconhecimento de obrigações pecuniárias, sendo que no caso a acta dada à execução não se apresenta como título executivo negocial no âmbito do qual as partes em causa se vincularam ao que quer que fosse.
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DECISÂO
Pelo exposto, nos termos supra referidos, decide-se julgar improcedente a apelação e, em consequência, manter a decisão impugnada.
Custas pela apelante.

Évora, 17 de Novembro de 2011



Mata Ribeiro


Sílvio Teixeira de Sousa


Rui Machado e Moura






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[1] - Artº 6º n.º 1 - “A acta da reunião da Assembleia de Condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer outras despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte.”
[2] - cfr. Lebre de Freitas in Os Paradigmas da Acção Executiva, numa comunicação à conferência realizada na FDL em 03/02/2001, cujo texto pode ser visualizado em:
http://www.dgpj.mj.pt/sections/informacao-e-eventos/anexos/sections/informacao-e-eventos/anexos/professor-doutor-lebre/downloadFile/file/plf.pdf?nocache=1210676672.22

[3] - v. Lebre de Freitas in A Acção Executiva, 4ª edição, 29; Fernando Amâncio Ferreira in Curso de Processo de Execução, 6ª edição, 147.
[4] - v. Alberto dos Reis in Processo de Execução, vol. I, 1985, 174.
[5] - V. Ac. TRP de 05/05/2009 in www.dgsi.pt no processo 1751/07.4YYPRT.P1
[6] - v. Ana Gomes in Assembleia de Condóminos, 22.
[7] - v. E. Lopes Cardoso in Manual da Acção Executiva, 3ª edição, 201.