Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
37332/13.0YIPRT.E1
Relator: ALEXANDRA MOURA SANTOS
Descritores: ACÇÃO ESPECIAL PARA COBRANÇA DE OBRIGAÇÕES PECUNIÁRIAS
SUSPENSÃO DA INSTÂNCIA
Data do Acordão: 10/22/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: 1 - Só a falta absoluta de fundamentação e não a fundamentação deficiente, medíocre ou errada, integra a causa de nulidade contemplada na al. b) do nº1 do artº 615º do CPC;
2 - Na previsão do nº 1 do artº 17º-E do CIRE quanto à suspensão e posterior extinção das “acções para cobrança de dívida” cabem não só as de natureza executiva, mas também as declarativas destinadas ao cumprimento de obrigações pecuniárias.
Sumário da Relatora
Decisão Texto Integral: APEL. Nº 37332/13.0YIPRT.E1 – 1ª SECÇÃO


ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA

(…) instaurou contra (…) – Empreendimentos Turísticos, S.A., procedimento de injunção pedindo o pagamento da quantia de € 16.116,02 correspondente ao montante das rendas em dívida (juros e taxa de justiça) pela requerida no âmbito de um contrato de arrendamento com ela celebrado e que não obstante a sua cessação em 31/10/2009, não efectuou o respectivo pagamento.
A requerida deduziu oposição nos termos de fls. 8 e segs., concluindo pela procedência da excepção de ilegitimidade deduzida ou, assim não se entendendo, pela improcedência da acção e consequente absolvição do pedido.
Pela decisão de fls. 33/35, foi o Tribunal Judicial de Albufeira julgado territorialmente incompetente e ordenada a remessa dos autos Juízos Cíveis do Tribunal Judicial da Comarca de Portimão por serem os competentes para conhecer dos presentes autos.
Remetidos os autos a este tribunal e designado dia para julgamento veio, entretanto, a requerida, a fls. 56 informar que se encontrava pendente no 1º Juízo Cível do Tribunal de Família e Menores e de Comarca de Portimão um processo especial de revitalização por ela requerido, encontrando-se o mesmo em fase de negociações e requerendo, nos termos do nº 1 do artº 17º-E do CIRE, a suspensão da presente acção “durante todo o tempo em que perdurarem as negociações, uma vez que se destina a cobrança de dívidas”.

A fls. 58 dos autos foi proferido o seguinte despacho:
Nos termos do artº 17º-E do CIRE, encontrando-se a Ré em PER, suspende-se a presente acção.
Sem efeito o julgamento designado para hoje”.
A fls. 61 foi aberta conclusão “em 18/06/2014 com informação a V. Exa. de que foi proferida decisão de homologação do PER da (…), tendo a mesma transitado em julgado em 15/05/2014”.
Nessa sequência foi proferida a seguinte decisão:
Face ao trânsito da decisão que aprovou o PER da (…), nos termos do artº 17º-E, nº 1, do CIRE, julga-se extinta a presente acção.
Custas pela Ré.
Registe e notifique”.

Foi dessa decisão que, inconformado, apelou o A., alegando e formulando as seguintes conclusões:
1 – A presente decisão é nula por não conter qualquer fundamentação.
2 – Não se encontravam em qualquer caso verificados os pressupostos de aplicação do artº 17º-E do CIRE, já que:
a) a presente acção não é uma acção para cobrança de dívidas do devedor, mas antes uma acção declarativa de condenação;
b) o plano de recuperação aprovado e homologado não contempla a dívida a que se reporta a presente acção.
3 – O aqui A. não participou nas negociações no âmbito do PER por não ter recebido qualquer convite da devedora para o efeito, em violação do disposto no artº 17º-D do CIRE.
4 – O crédito do aqui A. não veio a ser reconhecido no âmbito do PER, decisão esta que em momento algum lhe foi comunicada;
5 – O Tribunal a quo limitou-se a ex oficio consultar o processo PER no CITIUS e, tendo verificado ter sido aprovado plano de recuperação, concluiu que a presente acção deveria ser extinta.
6 – Ora, em primeiro lugar jamais o Tribunal poderia ex oficio ter assumido esta posição sem verificar se o crédito do A. estava ou não contemplado no Plano aprovado, já que é claramente pressuposto de aplicação do preceituado no artº 17º-E do CIRE.
7 – Em segundo lugar, sendo a presente acção uma acção declarativa de condenação em que o A. pede o reconhecimento de um determinado crédito, não se tratará seguramente de uma acção “para cobrança de dívidas”, nos dizeres do artº 17º-E do CIRE.
8 – O preceito legal em causa reporta-se sim às acções executivas, portanto, acções em que o credor já dispõe de um título executivo contra o devedor.
9 – Quando assim não é e sob pena de violação do princípio constitucional da proibição de denegação de justiça, o credor há-de continuar a ter direito a ver o seu crédito reconhecido.
10 – Assim decidiu o TRL em Acórdão de 11/07/2013 publicado in www.dgsi.pt.
11 – Assim, deve a presente decisão ser revogada e substituída por outra que ordene o prosseguimento dos autos.
12 – Ao decidir como decidiu violou o Tribunal, entre outras, a disposição legal vertida no artº 17º-E do CIRE.
Não foram apresentadas contra-alegações.
Em sede de despacho de admissão do recurso, nos termos dos artºs 617º, nº 1 e 641º, nº1, do CPC, a Exma. Juíza apreciou a nulidade invocada, julgando-a improcedente.
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Delimitando-se o âmbito do recurso pelas conclusões da alegação do recorrente abrangendo apenas as questões aí contidas (artºs 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do CPC), verifica-se que são as seguintes as questões a decidir:
- A invocada nulidade da decisão por falta de fundamentação;
- A relativa à aplicação ao caso do disposto no artº 17º-E do CIRE
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Apreciando:
Quanto à invocada nulidade.
Está em causa a nulidade prevista no artº 615º, nº 1, al. b), do CPC, nos termos do qual, a sentença é nula quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão.
É a sanção para o desrespeito da norma do artº 607º, nº 3, do CPC, que manda que o juiz especifique os fundamentos de facto e de direito da sentença.
Mas o dever de fundamentação decorre também de imperativo constitucional, pois o artº 205º, nº 1, da C.R.P. determina que “as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei” e ainda do artº 158º do CPC para as decisões judiciais em geral.
A necessidade de fundamentação prende-se com a própria garantia do direito ao recurso e tem a ver com a legitimação da decisão judicial em si mesma (cfr. Ac. nº 55/5 do TC de 25/03/1985, in Acs. TC, 5º-467 e ss.).
A consequência do vício da falta de especificação dos fundamentos de facto ou de direito alicerçantes da decisão é a nulidade.
Mas, como se refere no Ac. do STJ de 21/12/2005, “A nulidade (do acórdão) por falta de motivação (artº 668º, nº 1, al. b), do CPC) só é realidade quando sucede falta absoluta, ausência total de fundamentação de facto e de direito que justificam a decisão importando saber distinguir da motivação menos pródiga e/ou sábia” (proc. 05B2287.dgsi.pt).
Assim, só a falta absoluta de fundamentação e não a fundamentação deficiente, medíocre ou errada, integra a causa de nulidade contemplada na al. b) do nº 1 do artº 615º do CPC.

Ora, revertendo ao caso dos autos, verifica-se que a decisão recorrida, sendo embora parca quanto à fundamentação de facto, limitando-se a decidir, face à informação prévia da secretaria de que havia transitado em julgado a decisão de homologação do PER da (…), que “nos termos do artº 17º-E, nº 1, do CIRE, julga-se extinta a presente acção”, não sofre do imputado vício de nulidade.
Com efeito, dispõe o nº 1 do artº 17º-E do CIRE que “A decisão a que se refere a alínea a) do nº 3 do artº 17-C obsta à instauração de quaisquer acções para cobrança de dívidas contra o devedor e, durante todo o tempo que perdurarem as negociações, suspende, quanto ao devedor, as acções em curso com idêntica finalidade, extinguindo-se aquelas logo que seja aprovado e homologado o plano de recuperação, salvo quando este preveja a sua continuação”.
Temos assim que as “acções para cobrança de dívidas” extinguem-se logo que seja aprovado e homologado o plano de recuperação.
Colhida nos autos a informação da aprovação e homologação do plano de recuperação, na sequência da anterior declaração de suspensão do processo, o que pressupôs, sem oposição do recorrente, a consideração da presente acção como acção para cobrança de dívidas, o Exmº Juiz limitou-se julgar extinta a presente acção nos termos do referido artº 17-E, nº 1, do CIRE.
Pelo exposto, temos que não se verifica a falta absoluta de fundamentação da decisão recorrida, que conduza à sua nulidade nos termos do artº 615º, nº 1, al. b), do CPC.

Quanto à aplicação ao caso do disposto no artº 17º-E do CIRE
Conforme resulta das conclusões da sua alegação, defende o recorrente que “Não se encontravam em qualquer caso verificados os pressupostos de aplicação do artº 17º-E do CIRE, já que: a) a presente acção não é uma acção para cobrança de dívidas do devedor, mas antes uma acção declarativa de condenação; b) o plano de recuperação aprovado e homologado não contempla a dívida a que se reporta a presente acção.

No conhecimento da presente questão importa considerar a seguinte factualidade, constante dos autos:
- A presente acção especial destina-se ao cumprimento de obrigações pecuniárias emergente de contrato, in casu, ao pagamento de rendas alegadamente em dívida no âmbito de um contrato de arrendamento celebrado entre o A. e a Ré e que terá sido denunciado por esta.
- A Ré apresentou contestação, em 17/04/2013, conforme fls. 8 e segs.
- Em 13/07/2013 foi designado dia para julgamento – fls. 42.
- No dia 29/11/2013 a Ré apresentou nos autos o requerimento de fls. 56, com o seguinte teor:
(…) – Empreendimentos Turísticos SA” Ré nos autos em epígrafe encontrando-se agendada para o próximo dia 2 de Dezembro vem, nos termos e para os efeitos do disposto nos artºs 17º-A e segs. do CIRE, (…) informar os autos que por despacho de 08/11/2013, publicado no Portal CITIUS em 12/11/2013, foi nomeado administrador judicial provisório no Processo Especial de Revitalização requerido pela (…) – Empreendimentos Turísticos, SA, que corre termos no 1º Juízo Cível do Tribunal de Família e de Menores da Comarca de Portimão com o nº (…)/13.5TBPTM.
Encontrando-se o processo especial de revitalização supra referido em fase de negociações, nos termos do nº 1 do artº 17º-E do diploma supra citado, a presente acção deverá ser suspensa durante todo o tempo em que perdurarem as negociações, uma vez que se destina a cobrança de dívidas”.
- Consta do requerimento a notificação por fax em 29/11/2013, do Exmº Mandatário do A. ora recorrente.
- Em 02/12/2013 foi proferido despacho a suspender a presente acção, nos termos do artº 17º-E do CIRE.
- Tal despacho foi notificado ao ora recorrente por ofício certificado no CITIUS em 03/12/2013 – fls. 60.
- Consta dos autos a informação prestada pela secretaria de que “foi proferida decisão de homologação do PER da (…) tendo a mesma transitado em julgado no dia 15/05/2014” – fls. 61.

Pretende o recorrente, louvando-se no Ac. da RL de 11/07/2013, que a presente acção não é uma acção para cobrança de dívidas do devedor, mas antes uma acção declarativa de condenação pelo que não lhe é aplicável o artº 17º-E do CIRE.
A questão que se suscita é, pois, saber qual o sentido a dar à expressão “acções para cobrança de dívidas” constante deste último preceito, com base no qual o Exmº Juiz julgou extinta a presente acção declarativa, decisão de que foi interposto o presente recurso.

Efectivamente, a lei não refere quais as acções que se suspendem e posteriormente se extinguem nos termos constantes do preceito em apreço, isto é, a lei não identifica o que sejam “acções para cobrança de dívidas”.
Sobre a questão em apreço tem-se pronunciado a maioria da jurisprudência no sentido de que aquela expressão engloba todas as acções, declarativas e executivas e bem assim “acções com processo especial e procedimentos cautelares”, apenas se conhecendo, em sentido contrário o Ac. da R.L. de 11/07/2013, citado pelo recorrente e cuja doutrina, adianta-se já, não sufragamos.
Com efeito, conforme resulta do disposto no nº 1 do artº 17-A do CIRE, este processo destina-se a permitir ao devedor que, comprovadamente, se encontre em situação económica difícil, ou em situação de insolvência meramente iminente, mas que ainda seja susceptível de recuperação, estabelecer negociações com os respectivos credores de modo a concluir com estes acordo conducente à sua revitalização.
Ora, atendendo a que o que se pretende é que o devedor, através do processo de revitalização, obtenha acordo, unânime ou maioritário com os credores, tendo em vista a sua recuperação económica, para obter tal desiderato, só fará sentido que todas as acções que contendam com o património do devedor sejam suspensas e posteriormente extintas as respectivas instâncias.
Neste sentido se pronunciaram, entre outros, os Acs. da R.P. de 5/01/2015 (p. 22/13.1TTMTS.P1), de 24/02/2015 (p. 1502/13.4TJPRT-B.P1), de 07/04/2014 (p. 344/13.1TTMAI.P1), de 18/12/2013 (p. 407/12.OTTBRG.P1), da RL de 25/06/2015 (p. 7452/13.7TBCSC-B.L1), da RC de 27/02/2014, e desta R.E. de 12/03/2015 (p. 845/13.1TBABF.E1) e de 16/01/2014 (proc. 358/13.ETTPTM.E1).
A este respeito pondera este último Ac. desta R.E. de 16/01/2014, remetendo para o Ac. da R.P. de 30/09/2013 o seguinte: “Que sentido dar à expressão acções para cobranças de dívidas?
(…)
Segundo ensinamentos de Antunes Varela, M. Bezerra e Sampaio Nora “a distinção entre processo declaratório e o processo executivo apenas se estabelece em relação às acções de condenação ou relativamente às acções de outro tipo (de mera ou simples apreciação ou constitutivas), em que haja uma sentença de condenação. Há nesses casos uma cisão nítida entre o processo de cognição, que finda com a sentença de condenação, e o processo executivo que conduz à realização coactiva de uma ou mais pretensões” (Manual de Processo Civil, 1984, p. 71) (…)
Jorge Augusto Pais do Amaral defende que “A distinção entre acções declarativas e acções executivas equivale à diferença entre o simples declarar e executar, entre o dizer e o fazer. No processo declarativo é declarada a vontade concreta da lei, visando o executivo a execução dessa vontade” (Direito Processual Civil, 9ª ed., pág. 19).
O legislador da Lei 16/2012 não podia desconhecer a distinção entre as acções declarativa e executiva e dentro das primeiras aquelas a que se refere o artº 4º, nº 2, do CPC, não tendo, contudo, “abraçado” o critério seguido no referido artigo quando emprega a expressão acções para cobrança de dívidas.
Por outras palavras: no artº 17º-E nº 1 o legislador não fez distinção entre a acção declarativa e/ou executiva, a significar que nele estão incluídos ambos os tipos de acções, desde que visem a cobrança de dívidas contra o devedor, na medida em que são estas que atingem o património do devedor (para além da expressão “acções para cobrança de dívida” o legislador emprega também a expressão “acções em curso com idêntica finalidade”, não se referindo concretamente à espécie de acção mas à sua concreta finalidade).

Em auxílio à interpretação a que chegámos podemos referenciar ainda o DL 178/12, de 03/08 – diploma que criou o Sistema de Recuperação de Empresas por via Extrajudicial (SIREVE) – concretamente o seu artº 11º onde se faz referência expressa às acções executivas para pagamento de quantia certa e às acções destinadas a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias instauradas contra a empresa (determina o nº 2 do artº 11º que “O despacho de aceitação do requerimento de utilização do SIREVE obsta à instauração contra a empresa de quaisquer acções executivas para pagamento de quantia certa ou outras acções destinadas a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias enquanto o procedimento não for extinto e suspende, automaticamente e por igual período, as acções executivas para pagamento de quantia certa, ou outras acções destinadas a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias instauradas contra a empresa que se encontrem pendentes à data da respectiva prolação”).
João Aveiro Pereira defende que “embora não exista na lei adjectiva nenhuma espécie de acções de cobrança de dívidas, deve entender-se que esta expressão de reporta a acções declarativas para cumprimento de obrigações pecuniárias e a acções executivas para pagamento de quantia certa” (…) – A Revitalização económica dos devedores, em O Direito, ano 145, 2013, I/II, p. 37.

Em suma: conhecendo o legislador o tipo de acções previstas no CPC, ao se referir no artigo 17º-E, nº 1, da Lei 16/2012, de 20/04 às acções que têm por fim a cobrança de dívidas, aí fez incluir quer as acções declarativas de condenação, quer as acções executivas, desde que atinjam o património do devedor”.
Ora, com todo o respeito que nos merece o entendimento firmado no mencionado acórdão da RL (em que o aqui recorrente também se louva), afigura-se-nos ser este outro da R.P. o que mais se adequa quer à letra do dispositivo legal estabelecido no artº 17º-E, nº 1, do CIRE quando aí se faz referência a “quaisquer acções para cobrança de dívidas” e a “acções em curso com idêntica finalidade”, quer ao espírito do legislador que, de algum modo se pode inferir da exposição de motivos da Lei nº 16/2012, de 20/04, quando, a dado passo, se afirma que durante o período de negociações entre o devedor e, pelo menos um dos seus credores, período que não pode ser superior a três meses, “suspendem-se as acções que contra si (devedor) sejam intentadas com a finalidade de lhe serem cobradas as dívidas”, sem se aludir a qualquer distinção entre acções declarativas e acções executivas “assegurando-se, assim, a existência da necessária calma para reflexão e para criação de um plano de viabilidade para o devedor que se encontre em negociações”, propósito este que não é muito compatível com o prosseguimento de acções, ainda que de natureza declarativa de condenação no cumprimento de obrigações pecuniárias, como no caso vertente claramente se verifica ao pedir-se a condenação da Ré no pagamento de uma determinada quantia monetária referente a créditos laborais (…) estando-se, sem dúvida, perante uma acção em que o A./apelante se propõe obter a condenação daquela no pagamento de obrigações de natureza pecuniária e, nessa medida, uma acção instaurada com o propósito ou com uma finalidade, pelo menos idêntica, à de cobrança de dívidas, já que através dela se procura atingir o património da Ré apelada.
Na verdade, como bem se refere no mencionado Ac. da RP “no artº 17º-E, nº 1, o legislador não fez distinção entre acção declarativa e/ou executiva, a significar que nele estão incluídos ambos os tipos de acções, desde que visem a cobrança de dívidas contra o devedor, na medida em que são estas que atingem o património do devedor”. Com efeito, se o legislador tivesse pretendido referir-se apenas a acções executivas, seguramente não teria deixado de o fazer, ao invés de ter empregado as expressões que, concretamente, utilizou no mencionado dispositivo legal, com a abrangência que das mesmas se pode inferir e tendo em conta o propósito que lhe esteve subjacente”.
Subscrevemos inteiramente o entendimento vazado no acórdão que vimos de citar, de resto, também em consonância com o que a este respeito pronunciaram Carvalho Fernandes e João Labareda ao referirem ao propósito do preceito em apreço que “(…) a paralisação aqui determinada abrange todas as acções para cobrança de dívidas e não apenas as executivas, incluindo-se, assim, as acções declarativas condenatórias (…) e também acções com processo especial e procedimentos cautelares (…)” (C.I.R.E. Anotado, 2ª edição, ps. 164/165), e, bem assim, Luís M. Martins em “Recuperação de Pessoas Singulares e Empresas” (vol. I, 2ª edição, Almedina, p. 51), de acordo com o qual, o despacho de nomeação de administrador provisório, proferido nos termos da al. a) do nº 3 do artº 17º-C do CIRE, obsta à instauração de acções para cobrança de dívidas contra o devedor seja qual for a sua natureza (declarativa, executiva e injuntiva).

Assim sendo, na sequência da informação trazida aos autos pela Ré/recorrida e da decretada suspensão do processo, ambas notificadas ao recorrente, nos termos do dispositivo legal em apreço, impunha-se a prolação da decisão recorrida de extinção do presente processo logo que aprovado e homologado o plano de recuperação, como sucedeu.

Vem agora o recorrente, em sede de recurso, alegar que não participou nas negociações no âmbito do PER por não ter recebido qualquer convite da devedora para o efeito, em violação do disposto no artº 17º-D do CIRE.” que o seu créditonão veio a ser reconhecido no âmbito do PER, decisão esta que em momento algum lhe foi comunicada”.
Todavia, a existirem quaisquer vícios procedimentais no processo de revitalização, naturalmente que não é este o local nem o meio próprio da sua arguição e apreciação (sendo certo que o recorrente tomou conhecimento nestes autos da informação relativa à pendência do mesmo e da sua suspensão com esse fundamento – artº 17º-E, nº 1, do CIRE), não cumprindo ao Exmº Juiz a quo, ao contrário do que pretende o recorrente, verificar se o crédito do A. estava ou não contemplado no Plano aprovado, mas apenas e tão só, na economia de tudo o que se deixou dito, proferir a decisão de extinção da presente acção, face à homologação do plano, devidamente transitada.

Por todo o exposto, improcedem, in totum, as conclusões da alegação do recorrente, impondo-se a confirmação da decisão recorrida.
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DECISÃO
Nesta conformidade, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente o recurso e, consequentemente, em confirmar a decisão recorrida.

Custas pelo recorrente.
Évora, 22 de Outubro de 2015
Maria Alexandra de Moura Santos
António Manuel Ribeiro Cardoso
Acácio Luís Jesus das Neves