Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | ANA BARATA BRITO | ||
Descritores: | NOTIFICAÇÃO POR VIA POSTAL | ||
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Data do Acordão: | 11/21/2017 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | I - A notificação do despacho de encerramento do inquérito, por via postal simples, considera-se efectuada no quinto dia posterior ao do depósito da respectiva carta, atenta a data indicada na declaração lavrada pelo distribuidor do serviço postal, independentemente de se tratar de dia útil ou não. II - Na verdade, nem a letra da lei (o art. 113.° n.º 3 do CPP) refere que o quinto dia em que a notificação se presume efectuada deva ser um dia útil (diferentemente do que preceitua o n.º 2 do mesmo artigo, em que o “terceiro dia” da “via postal registada” é “útil”), nem se trata de um termo final para a prática de acto por um sujeito processual. Trata-se, sim, do início do prazo subsequente para a prática do acto pelo sujeito processual. | ||
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Decisão Texto Integral: | 1. No processo n.º 129/13.5TASTR, do Tribunal de Comarca de Santarém, foi proferido despacho de rejeição do requerimento para abertura de instrução apresentado pela assistente M, Lda., por extemporâneo. Inconformada com o decidido, recorreu a assistente, concluindo: “I. Mal andou o Douto Despacho recorrido quando rejeita o Requerimento de Abertura de Instrução apresentado pela Assistente, por considerar que o mesmo é extemporâneo; II. A ora Recorrente veio requerer a abertura de instrução, no prazo de 20 dias, contados desde a notificação do despacho de arquivamento – cfr. alínea b) do n.º 1 do artigo 287.º do CPP –, tendo sido esta efetuada por via de carta simples com prova de depósito, no dia 13.12.2016; III. A notificação à ora Recorrente considera-se efetuada no 5.º dia posterior a esse depósito, no entanto, e sendo este 5.º dia um dia não útil, a Recorrente considera-se notificada no dia 19.12.2016 (segunda-feira) – cfr.n.º 1 do artigo 103.º e n.º 3 do artigo 113.º do CCP; IV. Logo, a contagem do prazo de 20 dias inicia-se no dia 20.12.2016, suspendendo-se o mesmo no período das férias judiciais de natal (de 22.12.2016 a 03.01.2017), e terminou no dia 21.01.2017 (sábado), o que, obrigatoriamente, transfere a prática do ato para o dia 23.01.2017 (segunda-feira); V. Por seu turno, nos termos do artigo 107.º-A do CPP, o ato processual pode ser praticado dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo, ficando a sua validade dependente do pagamento imediato de uma multa; VI. O que aconteceu, pois a Recorrente apresentou o comprovativo do pagamento da multa prevista na alínea c) do artigo 107.º-A do CPP e apresentou a peça processual no dia 26.01.2017; VII. Termos em que se impõem, pelo acima exposto, a anulação do despacho recorrido, ordenando-se a prolação de outro que admita o Requerimento de Abertura de Instrução apresentado pela ora Recorrente, seguindo o processo os seus ulteriores termos.” O Ministério Público respondeu pronunciando-se no sentido da improcedência e, neste Tribunal, o Sr. Procurador-geral Adjunto acompanhou a resposta ao recurso. Ao abrigo do disposto nos arts. 417º, nº 6, al. b) e 420º, nº 1, al. a), do CPP, foi proferida decisão sumária de rejeição do recurso por manifesta improcedência. Inconformada com esta decisão sumária, veio a recorrente reclamar para a conferência. 2. O despacho recorrido é do seguinte teor: “Vem a assistente M., requerer a abertura da instrução. Junta comprovativo de pagamento da multa devida pela entrega no 3º dia útil seguinte ao término do prazo, nos termos do artigo 107º-A, al. c) do CPP. O prazo de que dispõe para o efeito é de 20 dias, contados desde a notificação do despacho de arquivamento – artigo 287º, n.º 1, al. b) do CPP. O despacho de arquivamento foi-lhe notificado por via de carta simples com prova de depósito, depositada no dia 13-12-2016 (cfr. fls. 462). Considera-se pois a mesma notificada no 5º dia posterior a esse depósito, ou seja no dia 18-12-2016 (artigo 113º, n.º 3, do CPP). O prazo em causa suspendeu-se entre os dias 22-12-2016 e 3-1-2017 (inclusive) em virtude das férias judiciais do Natal. Pelo exposto, o prazo em causa expirou no final do dia 20 de Janeiro de 2017 (sexta-feira). O terceiro dia útil seguinte ao término do prazo é o dia 25 de Janeiro de 2017. O RAI foi remetido aos autos via email às 23h41m do dia 26 de Janeiro de 2017, ou seja, é extemporâneo e esse vício não pode ser sanado nos termos do artigo 107º-A do CPP, que só permite a prática extemporânea de actos até ao 3º dia útil seguinte ao término do prazo. Pelo exposto, ao abrigo do disposto no artigo 287º, n.º 3, do CPP, rejeito por extemporâneo o RAI da assistente. Notifique e oportunamente devolva ao MºPº.” 3. Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente, a questão a apreciar consiste em saber como se conta o prazo de cinco dias a que se refere o art. 113º nº 3, do CPP, quando o quinto dia ocorre a um dia não útil. No caso sub judice, tendo esse (quinto) dia (18.12.2016) acontecido a um Domingo, defende a recorrente que se transferiria para o dia útil seguinte (19.12.2016), devendo assim o seu prazo para requerer a abertura de instrução considerar-se iniciado a 20.12.2016, e não a 19.12.2016 como foi definido nos autos. Ou seja, a recorrente considera-se notificada do despacho do Ministério Público de fls. 251 a 255 no dia 19.12.2016, e não no dia anterior (18.12.2016) por este ter sido um dia não útil. É neste ponto que reside a controvérsia, que não se estende à contagem restante, do prazo de vinte dias para requerer a abertura de instrução, sendo designadamente pacífico o cômputo da suspensão que ocorreu em férias. Por se ter considerado manifesta a ausência de razão da recorrente (quanto ao único ponto impugnado no recurso) e inequívoca a inviabilidade material da sua pretensão, decidiu-se rejeitar o recurso por decisão sumária (art. 420º, nº 1 do CPP), já que “atendendo à factualidade apurada, à letra da lei e à jurisprudência dos Tribunais superiores, é patente a sem razão do recorrente, sem necessidade de ulterior e mais detalhada discussão jurídica” (Simas Santos, leal-Henriques, Recursos em processo penal, 6ª ed., p. 119). As razões que então se consideraram são de reiterar aqui (mas agora em acórdão), dado que, como se dera logo a conhecer na decisão sumária, a senhora desembargadora adjunta sufraga o mesmo entendimento a respeito da questão jurídica objecto do recurso, entendimento que expressou na sua decisão sumária de 29-11-2016, que subscreveu nesta Relação, e que teve o sumário seguinte: “I - À contagem dos prazos para a prática de actos processuais aplicam-se, por força do disposto no n.º 1 do art. 104.º do C.P.P., as correspondentes disposições da lei do processo civil, pelo que vigora a regra da continuidade dos prazos, apenas se prevendo a transferência do termo (e não do início) do prazo para a prática dos actos processuais para o 1.º dia útil seguinte quando o mesmo recaia em dia em que os tribunais estiverem encerrados (cf. art. 138.º nºs 1 e 2 do C.P.C.)”. Assim, e como o Ministério Público refere na resposta ao recurso, a notificação do despacho de encerramento do inquérito, nos termos da lei processual penal, deve ser considerada efectuada no quinto dia posterior ao do depósito da respectiva carta com a respectiva prova de depósito. O depósito aconteceu a 13/12/2016 (v.fls. 462) e a notificação deve ser considerada efectuada no quinto dia posterior à data indicada na declaração lavrada pelo distribuidor do serviço postal, cominação essa que deve constar do acto de notificação. A cominação encontra-se efectuada no acto de notificação (v. fls. 458) e a carta foi depositada em 13/12/2016 (v. fls. 462). Na verdade, nem a letra da lei (o art. 113.° n.º 3 do CPP) refere que o quinto dia em que a notificação se presume efectuada deva ser um dia útil (diferentemente do que preceitua o nº 2 do mesmo artigo, em que o “terceiro dia” da “via postal registal” é “útil”), nem se trata de um termo final para a prática de acto por um sujeito processual. Trata-se, sim, do início do prazo subsequente para a prática do acto pelo sujeito processual. Como concluiu também a senhora desembargadora adjunta no caso idêntico ao presente e na decisão sumária de 29.11.2016 já referida, é “inequívoco que o prazo para a prática do acto se iniciou no dia seguinte ao 5º dia posterior ao depósito”. Na verdade, trata-se aqui, inequivocamente, de dois modos distintos de notificação, que a lei trata separadamente e regula diferenciadamente (respectivamente nos nºs 2 e 3 do art. 113º do CPP. Pretender equiparar o que a lei ali quis distinguir é interpretação ilegal e indefensável, a carecer de fundamento, não só literal, mas também material. A notificação por via postal registada presume-se feita “no 3º dia útil posterior ao do envio” e a notificação por via postal simples considera-se efectuada no 5º dia posterior à data indicada na declaração lavrada pelo distribuidor do serviço postal”. E esta diferença tem uma justificação e, por isso, compreende-se. No primeiro caso, a lei estabelece uma presunção de notificação feita no 3º dia útil posterior ao do envio. Trata-se de dia “útil”, porque está em causa uma contagem a partir da expedição da carta e, aqui sim, são de excluir os dias não úteis pois os serviços de correio não operam e a correspondência seguramente não circula. Diferentemente no segundo caso, trata-se já de uma notificação que se conta a partir do efectivo depósito da carta no local do destinatário, ou seja, a partir da sua entrega real na morada do destinatário. A razão que está na base da exclusão dos “dias não úteis” na regra de contagem do nº 2 do art. 113º não ocorre na hipótese prevista no nº 3. Daí que, contrariamente ao que pretende a recorrente, não se tratou apenas de olhar a letra da lei, esquecendo os restantes elementos de interpretação (e do elemento literal retira-se logo inequivocamente a solução que perfilhamos). Procurou-se compreender o seu sentido e alcance, tendo necessariamente em conta estas razões, que justificam o tratamento diferenciado. Não se diga também que este entendimento fere norma ou princípio constitucional, maxime o princípio da igualdade invocado agora pela recorrente. Como se explicou, inexiste uma situação de igualdade ou de identidade a justificar e a exigir um tratamento semelhante. 4. Pelo exposto, julga-se improcedente o recurso e confirma-se o despacho recorrido. Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 4 UC. Évora, 21.11.2017 (Ana Maria Barata de Brito) (Maria Leonor Vasconcelos Esteves) |