Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
3127/07-2
Relator: PIRES ROBALO
Descritores: PRESUNÇÃO REGISTRAL
Data do Acordão: 03/13/2008
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A SENTENÇA
Sumário:
A descrição dos prédios pode resultar de simples declarações dos interessados, não sendo facto de que o conservador se aperceba directamente ou que se certifique com os seus sentidos, o que implica que a presunção do art. 7º não pode abranger os elementos de identificação do prédio constante da descrição predial, designadamente os relativos às áreas.
Decisão Texto Integral:

Proc. n.º 3127/07-2
Acordam nesta secção cível os Juízes do Tribunal da Relação de Évora.
1. RELATÓRIO
1.1. João............. e mulher Maria ............... intentaram a presente acção declarativa com processo ordinário contra Joaquina ................. e marido Carlos ..................; e João ......................... e mulher Maria..................., pedindo:
a)- declarar-se que os autores são danos e legítimos possuidores do prédio descrito;
b)- condenar-se os réus a reconhecê-lo;
c)- condenar-se os réus a entregarem e restituírem aos autores a área de 797 m2 integrada pela área das mesmas dimensões que se continua a poente no prédio descrito;
Para tanto alegam, em síntese, que são proprietários de um prédio misto que compraram, por escritura pública, aos réus. Verificaram que a área real do seu prédio era inferior à que constava da escritura de compra e venda referida. Que os réus são proprietários de um prédio contíguo ao dos autores e, dissimuladamente, retiraram ao prédio dos autores a parte da área em falta, juntando-a ao seu prédio.
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1.2. Os RR. a fls. 47 apresentaram contestação, pugnando pela improcedência da acção, referindo para tal, em síntese:
Que os limites dos prédios (dos autores e dos réus) são os mesmos que existiam antes da referida escritura de compra e venda. Que sempre assim foram mostrados aos autores e restantes potenciais compradores. Admitem a diferença de área mas imputam-na a erro de medição aquando da separação dos prédios, que formavam, juntos, uma única unidade.
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1.3. Os AA. replicaram tendo sido ordenado o seu desentranhamento, por inadmissibilidade legal (cfr. fls. 70 e 71).
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1.4. Teve lugar a audiência preliminar tendo-se fixado a matéria de facto assente e a controvertida (cfr. fls. 124 a 127), que não sofreu reclamação.
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1.5. Procedeu-se depois a julgamento, tendo as partes apresentado alegações por escrito, nas quais os AA. pediram a condenação dos RR. em multa e indemnização por litigantes de má fé.
Foi proferida sentença a julgar a acção totalmente improcedente, absolvendo os RR. de todos os pedidos contra si formulados.
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1.6. Inconformado, apelaram os AA. tendo formulado a final as seguintes conclusões (transcritas):
«1.ª - Não é verdade que a presunção do art.º 7, do C.R.Predial, não abranja as áreas dos prédios;
2.ª – Os AA. compraram o prédio dos autos com a área declarada na escritura pública de compra e venda;
3.ª – A sentença recorrida violou por erro de interpretação e aplicação o disposto nos artigos 879, al. b), 1264, 1311, 887 e 888, todos do C. Civil.
Termos em que deve dar-se provimento ao recurso e revogar-se a sentença recorrida, substituindo-se por outra nos termos peticionados»
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1.7. Os apelados não deduziram contra-alegações.
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1.8. Os Exmºs Desembargadores-adjuntos tiveram visto nos autos.
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1.9. São os seguintes os factos considerados provados em 1ª instância. *
2.Motivação de Facto
«2.1. Os AA. são donos e legítimos possuidores do seguinte prédio misto: Prédio sito na "Courela da Carrasqueira", com a área de seis mil e oitocentos e sessenta e três metros quadrados, sito na Freguesia da sé do Concelho de Évora, formado de partes rústica e urbana descrito na Conservatória do Registo Predial de Évora sob o n. 8811, da Freguesia da Sé, inscrita na matriz cadastral respectiva sob o Art. 260 - Secção N, e inscrita na matriz urbana respectiva sob o Art. 4851 (A dos factos assentes).
2.2. Os AA., por escritura Pública celebrada em 10 de Novembro de 1999, a fls, 41 verso a folhas 44 do livro 82- do Primeiro Cartório Notarial de Évora, adquiriram por compra a plena propriedade do descrito prédio aos primeiros e segundos Réus onde consta uma área de 6.863 metros quadrados (B dos factos assentes).
2.3. Tal aquisição translativa acha-se definitivamente inscrita a favor dos AA. pela inscrição n° 8811/Sé na Conservatória do Registo Predial de Évora (C dos factos assentes).
2.4. Os AA. por si e ante possuidores detêm o referido prédio, usando-o, fruindo-o em todas as suas virtualidades arrendando, administrando, cuidando dele, reparando-o e melhorando-o, pagando as contribuições e impostos a ele respeitantes, publicamente, à vista de toda a gente, pacificamente, sem oposição de quem quer que seja, de boa fé, sem a consciência de lesar direito alheio com o espírito de proprietários, com "animus" de exercerem direito próprio e nessa total e segura convicção (D dos factos assentes).
2.5. Tais factos ocorrem há bem mais de trinta, quarenta, cinquenta anos, por isso que os Autores para além da aquisição derivada descrita, sempre seriam donos do prédio em referência por usucapião, ou seja, por via da aquisição originária que a lei contempla (E dos factos assentes). (1)
2.6. Os Réus são proprietários de um prédio de que se acha contiguamente a poente do prédio vendido (F dos factos assentes).
2.7. A área total definida pelos limites físicos instalados no terreno é de seis mil e sessenta e seis metros quadrados e oitenta e cinco centímetros quadrados (1 da base instrutória).
2.8. Os Réus, não lhe fizeram entrega de 796,85 m2 (2 da base instrutória).
2.9. No âmbito das negociações que precederam a aquisição, o prédio foi mostrado aos AA. e à procuradora que, em sua representação, interveio na escritura pública de compra e venda (4 da base instrutória).
2.10. ( ... ) tendo-lhes sido indicado os limites da propriedade e a localização dos marcos que separam, entre si, os prédios dos AA. e dos RR. (5 da base instrutória).
2.11. Os limites actuais do prédio dos AA, são os mesmos que existiam antes deles o conhecerem e comprarem (6 da base instrutória).
2.12. Os referidos marcos divisórios permanecem no mesmo local onde foram originariamente colocados (7 da base instrutória).
2.13. AA. e RR. não convencionaram o preço à razão de tanto por metro quadrado de terreno (parte rústica) nem de construção (parte urbana) (8 da base instrutória).
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3. O DIREITO
3.1. Nos termos dos art.ºs 684, n.º 3 e 690, n.º 1, do C.P.C., o objecto do recurso acha-se delimitado pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo do disposto na última parte do n.º 2, do art.º 660, do mesmo diploma.
As questões a decidir resumem-se a saber:
a) - Saber se a presunção do art.º 7, do Código Registo Predial abrange ou não as áreas dos prédios.
b) Saber se os AA. compraram ou não a área constante na escritura.
c) - Saber se a sentença em causa deve ser substituída por outra que condene os RR. nos termos peticionados.
Por uma questão metodológica vejamos cada uma das situações.
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3.1.1. - Saber se a presunção do art.º 7, do Código de Registo Predial abrange ou não as áreas dos prédios.
Segundo os recorrentes a presunção do art.º 7, do C.R.P. abrange as áreas dos prédios.
Opinião diversa foi colhida na sentença sob censura.
Vejamos.
Preceitua o art.º 7, do C.R.Predial «O registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define».
Da leitura do preceito resulta de forma clara, quanto a nós, que o mesmo respeita a factos jurídicos causais dos direitos reais, como seja a presunção de que o direito pertence ao titular inscrito, mas já não à composição física e descritiva dos prédios, como sejam as áreas, limites, confrontações. (cfr. neste sentido Ac.s do S.T.J., de 20/11/2001, 28/6/2007, Ac. da Rel. de Lisboa de 12/11/2006 e Ac. da Rel. de Évora de 5/2/2004, in www.dgsi.pt.
Como resulta dos arts. 1º, 2º e 3º do C.R.P., o registo predial não tem função constitutiva, mas apenas declarativa.
A finalidade do registo não é garantir os elementos de identificação do prédio, as suas confrontações e seus limites, a sua área, mas apenas a de assegurar que relativamente a esse prédio se verifiquem certos factos jurídicos.
Como bem é salientado no Ac. do S.T.J. de 27/01/93, In C. J. – Acs. S.T.J. -, Ano I, Tomo I, pág. 100, a descrição dos prédios pode resultar de simples declarações dos interessados, não sendo facto de que o conservador se aperceba directamente ou que se certifique com os seus sentidos, o que implica que a presunção do art. 7º não pode abranger os elementos de identificação do prédio constante da descrição predial, como sejam as áreas.
Face ao exposto não assiste razão aos recorrentes quando pretendem que a presunção do art.º 7, do C.R.P. abranja as áreas dos prédios.
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3.1.2. Saber se os AA. compraram ou não a área constante na escritura.
Antes de mais cabe referir que estamos perante uma acção de reivindicação através da qual os ora apelantes pretendem que o tribunal reconhecesse o seu direito de propriedade e a condenação dos RR. a entregarem e restituírem aos AA. a área de 797 m2 integrada pela área das mesmas dimensões que se continua a poente no prédio descrito.
Refira-se, desde logo, que os ora apelantes não pediram ao tribunal que declarasse que a área que compraram é a constante da escritura, mas apenas que os RR. fossem condenados a entregarem-lhes e a restituírem-lhe a área de 797m2 a desocuparem a faixa de terreno que alegou estar a ser ocupada.
Não vemos como se possa ora, em sede de recurso, decidir-se da verdadeira área do prédio reivindicado, sendo certo a que reivindicação não é a acção própria para determinar a verdadeira área de um prédio, pois é entendimento pacífico, não só na doutrina como na jurisprudência, que a causa de pedir nas acções de reivindicação é de natureza complexa, compreendendo tanto o acto ou facto jurídico de que deriva o direito de propriedade do A. como a ocupação abusiva por parte do R..
Assim, e face ao exposto não podem os apelantes em sede de recurso vir formular tal pretensão, quando não o fizeram em sede de 1.ª instância (cfr. neste sentido Ac. da Rel. de Lisboa, de 28 de Outubro de 2004, relatado pelo Desembargador Urbano Dias).
Assim, face ao exposto esta pretensão dos AA, em verem ser declarado se compraram ou não a área constante da escritura não pode proceder, desde logo, por tal questão não ter sido sequer solicitada em 1.ª instância, como se pode ver face ao pedido formulado, no qual como já referimos o que os AA. pedem é que – ( o tribunal reconhecesse o seu direito de propriedade e a condenação dos RR. a entregarem e restituírem aos AA. a área de 797 m2 integrada pela área das mesmas dimensões que se continua a poente no prédio descrito).
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3.1.3. Saber se a sentença em causa deve ser substituída por outra que condene os RR. nos termos peticionados.
Entendem os ora apelantes que a sentença posta em crise deve ser substituída por outra que condene os RR. como peticionado referindo para tanto que não é verdade que a presunção do art.º 7, do Código de Registo Predial não abranja as áreas dos prédios, e que a matéria de facto provada é suficiente para a elementaríssima procedência de todos os pedidos, tanto mais que a sentença recorrida eliminou, pura e simplesmente, o disposto no art.º 1264, do C.Civil.
Vejamos.
No que concerne à questão de o art.º 7, do C.R.P. abranger ou não as áreas dos prédios, já vimos in supra, ponto 3.1.1., que a presunção do preceito não abrange tais áreas.
Como vimos estamos perante uma acção de reinvindicação, desde logo, por os dois traços típicos da reivindicação – afirmação da qualidade de proprietário (a provar pelo A.) e a respectiva entrega, sendo aliás, os próprios apelantes que o afirmam nas suas alegações no ponto 1.º, ao referirem « a presente acção é como já se disse de reinvindicação».
Como se escreve no Ac. da Rel. de Évora de 19 de Outubro de 2006, relatado pelo Desembargador Almeida Simões « …de acordo com o n° 1 do artigo 1311 ° do Código Civil, o proprietário pode exigir judicialmente de qualquer possuidor ou detentor da coisa o reconhecimento do seu direito de propriedade e a consequente restituição do que lhe pertence.
Nas acções reais, a causa de pedir é o facto jurídico de que deriva o direito real alegado (art. 487º nº 4, 2.ª parte, do CPC).
A acção de reivindicação de propriedade é, assim, uma acção condenatória, sendo a causa de pedir o título aquisitivo do proprietário e o pedido a declaração do direito (... la revindica è azione do condanna in quanto rivolta al duplice intento di rendere certo il diritto e di predisporre cosi al execuzione - E. Vitucci, Nuovo Digesto Italiano, X, 691).»
Como se sabe a reivindicação tem como escopo principal fazer reconhecer o direito de propriedade do autor sobre a coisa, sendo que o pedido de restituição constitui, de igual modo, elemento essencial da reivindicação, pois se o A. pretende apenas que seja declarado dono da coisa e não pede a sua restituição já não estamos perante uma acção de reivindicação (cfr. Ac. do S.T.J. de 9/10/2007, in www.dgsi.pt.).
A respeito desta matéria cabe também referir que o A. pode assentar a sua pretensão na aquisição originária ou na aquisição deriva.
Na primeira o direito adquirido não depende da existência ou da extensão de um direito anterior – assim, por exemplo, a ocupação de móveis ou a usucapião; na segunda o direito adquirido funda-se na existência de um direito na titularidade de outra pessoa – v.g. venda, doacção, etc.
Ciente disto mesmo, no que concerne à compra e venda, o legislador limitou-se a dizer no art.º 879, do C.C. que este negócio tem como efeito essencial (além de outros) a transmissão do direito de propriedade da coisa ou da titularidade do direito (al. a).
Pires de Lima e Antunes Varela não deixam de sublinhar as diferenças (e as naturais consequências) entre as duas formas de aquisição referidas.
Assim:
«…, se o A. invoca como titulo do seu direito uma forma de aquisição originária da propriedade, como a ocupação, a usucapião ou a acessão, apenas precisará de provar os factos de que emerge o seu direito.
Mas se a aquisição for derivada, não basta provar, por exemplo, que comprou a coisa ou que esta lhe foi doada. Nem a compra e venda nem a doação se podem considerar constitutivas do direito de propriedade, mas apenas translativas desse direito (nemo plus iuris ad alium transfere potest, quam ipse habet). É preciso, pois, provar que o direito já existia no transmitente (dominium auctoris ), o que torna, em muitos casos, difícil de conseguir, Probatio diabólica lhe chamam alguns autores » ( in Código Civil Anotado, Vol II, 2.ª edição fls. 115).
Precisamente porque a prova da aquisição originária é diabólica, é que o legislador se lembrou de estabelecer uma presunção de titularidade do direito de propriedade a favor da pessoa em nome do qual a aquisição da coisa está inscrita no registo predial (cfr. art.º 7, do C.R.P.).
Posto isto, é altura de nos debruçarmos sobre o “nosso caso”.
Face aos factos provados dúvidas não restam que os RR. nunca recusaram e nunca puseram em causa o direito de propriedade dos AA. sobre o prédio com a área de 6066,85 m2, que é a área total definida pelos limites físicos instalados no terreno (cfr. facto 2.7.) – onde se refre « a área total definida pelos limites físicos instalados no terreno é de seis mil e sessenta e seis metros quadrados e oitenta e cinco centímetros quadrados).
A questão controversa reporta-se a 797 m2, de que os AA. se arrogam donos e legítimos possuidores.
Sobre esta questão os AA. alegam estarem despejados de tal área, e embora de forma não muito precisa como se refere na sentença recorrida, parecem fazer crer que os RR. se apoderaram dessa área após a realização da escritura.
Por sua vez os RR. referem que no âmbito das negociações que precederam a aquisição, o prédio foi mostrado aos AA. e à procuradora que, em sua representação, interveio na escritura pública de compra e venda. Tendo-lhes sido indicado os limites da propriedade e a localização dos marcos que separam, entre si, os prédios dos AA. e dos RR. e que os limites actuais do prédio dos AA. são os mesmos que existiam antes deles o conhecerem e comprarem, que os referidos marcos divisórios permaneceram no mesmo local onde foram originariamente colocados, impondo-se concluir que a diferença de área existente apenas se deve a erro de medição inicial.
Para se analisar esta questão cabe referir que resultou provado com interesse para a solução da questão o seguinte:
«Os AA. por escritura pública celebrada em 10 de Novembro de 1999, a fls. 41 verso a fls. 44 do livro 82 – do primeiro Cartório Notarial de Évora, adquiriram por compra a plena propriedade do descrito prédio aos segundos RR. onde consta uma área de 6.863 metros quadrados » - ( facto 2.2).
Que tal aquisição translativa acha-se definitivamente inscrita a favor dos AA. pela inscrição n.º 8811/Sé na Conservatória do Registo Predial de Évora» ( facto 2.3).
Que os RR., não fizeram entrega de 796,85 m2» ( facto 2.8.), não se tendo provado que essa área fosse retirada aos AA. e junta ao prédio poente dos RR. (resposta não provada à pergunta 3) – cfrl. fls. 126 -.
Que no âmbito das negociações que precederam a aquisição, o prédio foi mostrado aos AA. e à procuradora que, em sua representação, interveio na escritura pública de compra e venda ( facto 2.9).
( ... ) tendo-lhes sido indicado os limites da propriedade e a localização dos marcos que separam, entre si, os prédios dos AA. e dos RR. (facto 2.10.).
Os limites actuais do prédio dos AA, são os mesmos que existiam antes deles o conhecerem e comprarem (facto 2.11.).
Os referidos marcos divisórios permanecem no mesmo local onde foram originariamente colocados (facto 2.12.).
AA. e RR. não convencionaram o preço à razão de tanto por metro quadrado de terreno (parte rústica) nem de construção (parte urbana) (facto 2.13.).»
Face a esta matéria e tendo presente como já referimos in supra que a presunção do art.º 7, do C.R.P. não abrange os factores descritivos como sejam as áreas e os limites de confrontação, não podemos deixar de concordar com a decisão recorrida.
Na verdade a mencionada área de 796,85 m2 nunca foi entregue aos AA., sendo que no âmbito das negociações que precederam a aquisição, o prédio foi mostrado aos AA. e à procuradora que, em sua representação, interveio na escritura pública de compra e venda, tendo-lhes sido indicado os limites da propriedade e a localização dos marcos que separam, entre si, os prédios dos AA. e dos RR., que os limites actuais do prédio dos AA, são os mesmos que existiam antes deles o conhecerem e comprarem e que os referidos marcos divisórios permanecem no mesmo local onde foram originariamente colocados, só podemos tirar uma ilação que os AA. nunca tiveram a posse de tal área, razão pela qual não a podiam ter adquirido por usucapião, aquisição originária que invocaram mas não provaram.
Nem se diga como parecem fazer crer os recorrentes que estamos perante uma situação das previstas no n.º 1, do art.º 1264, do C.C.
Na verdade preceitua o n.º 1 do preceito « Se o titular do direito real, que está na posse da coisa, transmitir esse direito a outrem, não deixa de considerar-se transferida a posse para o adquirente, ainda que, por qualquer causa, aquele continue a deter a coisa».
O n.º 1, deste preceito contempla a situação em que o anterior possuidor passa a ter, depois do negócio, o animus alieno nomine detinendi. Ou seja, opera nos casos em o proprietário-possuidor vende um prédio, mas por acordo com o adquirente, continua a habitá-lo ou a guardá-lo ou a detê-lo (cfr. a este propósito Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil, anotado, edição 1972, fls. 25).
No caso em apreço, temos para nós, que não se verifica a situação contemplada neste preceito. Por um lado porque os AA. não alegam que os vendedores – aqui RR. – tivessem ficado na posse da área em causa por acordo. Por outro lado por se ter provado que o prédio foi mostrado aos AA. e à procuradora que, em sua representação, interveio na escritura pública de compra e venda, tendo-lhes sido indicado os limites da propriedade e a localização dos marcos que separam, entre si, os prédios dos AA. e dos RR., que os limites actuais do prédio dos AA, são os mesmos que existiam antes deles o conhecerem e comprarem e que os referidos marcos divisórios permanecem no mesmo local onde foram originariamente colocados.
Por isso, não havendo reconhecimento do direito de propriedade sobre tal área de terreno reinvindicada, não podem proceder os demais pedidos formulados.
Daqui decorre, que a pretensão dos recorrentes não pode proceder.
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(1) O facto dado como provado em 2.5. é apenas matéria de direito.
Porém, por não ter influência para a decisão da causa nada foi referido antes sobre o mesmo.
4. Decisão

Face ao exposto decide-se negar provimento ao recurso e manter a decisão recorrida.
Custas a cargo dos recorrentes.
Évora, 13 de Março de 2008

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(Pires Robalo – Relator )

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(Almeida Simões – 1.º Adjunto)

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(D´Orey Pires – 2.º Adjunto)