Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | JOÃO GOMES DE SOUSA | ||
Descritores: | PROCESSO DE CONTRA-ORDENAÇÃO | ||
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Data do Acordão: | 10/28/2008 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | PROCEDENTE | ||
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Sumário: | I. A necessidade, prevista no artigo 62º, nº 1 do RGCO, de enviar os autos ao Ministério Público só se compagina com a possibilidade e necessidade de este exercer o controlo próprio de uma magistratura, designadamente o controle do princípio da legalidade. A fase judicial do processo contra-ordenacional só se inicia com o envio dos autos ao juiz e a fase administrativa termina com a possibilidade de revogação da decisão pela entidade administrativa. II. Cria-se, assim, uma fase intermédia entre aquelas duas naturezas do processo – a administrativa e a judicial – em que o processo se encontra na disponibilidade do MP e que podemos designar por fase “acusatória”. A tal fase só se podem entender aplicáveis, subsidiariamente, os artigos 277º e 283º do Código de Processo Penal, com as necessárias adaptações. Nesta fase acusatória o MP pode não deduzir acusação, o que corresponderá a uma revogação da decisão da entidade administrativa e à inutilidade superveniente da impugnação judicial. III. O conceito de acusação em matéria penal contido no artigo 6º da CEDH, conceito com autonomia e que deve ser interpretado no sentido da Convenção, é interpretado pelo TEDH como abrangendo o direito contra-ordenacional. É lícito ao Juiz rejeitar a “acusação” por manifestamente infundada fazendo apelo ao disposto no artigo 311º, nº 2, al. a) e 3 do Código de Processo Penal. IV. A declaração de nulidade da decisão administrativa implica a aplicação do disposto no artigo 122º do Código de Processo Penal. | ||
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Decisão Texto Integral: | Proc. Nº 1.441/08.1 Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: A - Relatório: No recurso de contra-ordenação que corre termos no 2º Juízo Criminal do Tribunal de S com o n°…, por despacho proferido em 18 de Novembro de 2007, a fls.288-295, o Exmo. Juiz, declarou a nulidade da decisão administrativa, rejeitou a acusação deduzida nos autos pelo MºPª com fundamento na manifesta improcedência da mesma por ausência de factos consubstanciadores da contra-ordenação imputada à arguida, absolveu esta e determinou o arquivamento dos autos. A decisão administrativa recorrida, proferida em 02/08/2007 pela Vice-presidente do ….. e constante de folhas 272 a 275, aplicou à arguida – R – Sociedade …A, Ldª, a coima de 2.500 euros. * Inconformado com uma tal decisão, dela interpôs o Mº Pº recurso pedindo seja concedido provimento ao mesmo no sentido de revogar o despacho recorrido na parte em que ordenou o arquivamento dos autos e ordenar a remessa destes à CCDRLVT para prolação de nova decisão que respeite os requisitos indicados no art. 58º do RGCO, evitando que se mande a arguida em paz, como se a mesma tivesse sido absolvida, com as seguintes conclusões: 1ª A decisão da CCDRLVT não contém a indicação dos factos relativos ao elemento objectivo e subjectivo da infracção praticada pelo órgão, agente ou representante da sociedade arguida, pelo que violou o disposto no art. 58º, nº 1, b) do RGCO. 2ª A falta de indicação daqueles factos constitui ela própria, também, falta de fundamentação da decisão administrativa, tal como exigido na parte final da alínea c) do nº 1 deste preceito. 3ª Não há unanimidade da doutrina e na jurisprudência sobre a qualificação do vício decorrente da inobservância dos requisitos indicados no art. 58º do RGCO, mormente os indicados nas conclusões anteriores. 4ª O aprofundar actual das exigência de defesa legitima a adopção da tese mais exigente que configura tal vício de nulidade absoluta, prevista no art. 379º, nº 1, a) do CPP, conhecida nos termos do nº 2 deste preceito. 5ª O regime das nulidades, quer especial (da sentença), quer geral (artº 118º e ss do CPP) é regido pelo princípio do máximo aproveitamento dos actos processuais, norteado pelo princípio da economia processual, princípio expressamente consagrado no art. 122º, nº 3 do CPP. 6ª Enfermando a decisão administrativa de vícios que se traduzem numa nulidade, os efeitos desta são apenas os constantes do art. 122º do CPP. 7ª Assim, em obediência a este preceito, competia ao Tribunal declarar a nulidade da decisão recorrida e determinar o reenvio do processo para a autoridade administrativa para nova decisão, a fim se suprir as deficiências indicadas e deste modo respeitar cabalmente o disposto no art. 58º do RGCO. 8ª Deste modo, o Tribunal teria dado oportunidade à autoridade administrativa de, tal como previsto no art. 122º do CPP, “repetir” o acto e de aproveitar todos os actos que ainda pudessem ser salvos, designadamente, as diligências de investigação na fase de instrução consideradas pertinentes à boa decisão da causa. 9ª Como assim não procedeu, o Tribunal violou o disposto no art. 122º do CPP. 10ª O douto despacho agora recorrido não é o que consta dos artigos 64º, nº 2 e 58º, nº 2, b), segunda parte, ambos do RGCO, nem poderia ser pois para isso seria necessária a não oposição da arguida e do Ministério Público, direito que não foram convocados a exercer previa e expressamente, sob pena de o Tribunal cometer a nulidade insanável pp pelo art. 119º, alínea f) do CPP, ex vi art. 41º, nº 1 do RGCO. 11ª O douto despacho impugnado foi proferido ao abrigo do disposto no art. 311, nº 3, alínea d) do CPP, despacho de todo ilegal, por violação dos preceitos dos artigos 62º a 64 do RGCO. Estes não comportam qualquer lacuna pois regulam de forma completa o modo como o Tribunal admite e aprecia o recurso da decisão administrativa. 12ª Quando o MP recebe o recurso juntamente com o processo contra-ordenacional, não pode deixar de o apresentar ao Juiz, não tendo legitimidade para suprir deficiências ou devolver os autos à autoridade administrativa mesmo que a decisão desta seja ilegal (art. 62º, nº 1 do RGCO). Neste contexto, é abusivo imputar qualquer tipo de deficiência à acusação do MP, pois este carece de autonomia para proferir acusação tal como consagrado no art. 283º do CPP, limitando-se a apresentar os autos a Juízo nos termos do art. 62º, nº 1 do RGCO. * Nesta Relação, a Exmª Procuradora-geral Adjunta, secundando o entendimento expresso no recurso, emitiu parecer no sentido da procedência do mesmo. Foi observado o disposto no nº 2 do artigo 417° do Código de Processo Penal. Colhidos os vistos, o processo foi à conferência. * B.1 - Fundamentação:No recurso de contra-ordenação que corre termos no 2º Juízo Criminal do Tribunal de …com o n° … o Exmo. Juiz, proferiu o seguinte despacho, na parte relevante, porque objecto do recurso “…… Por outro lado, em parte alguma do C.P.Penal, aplicável por força do já falado artº. 41º do D.L. 433/82, se permite o aperfeiçoamento ou correcção das acusações do MºPº e, assim sendo, por essa razão também não pode o Tribunal remeter os autos para o MºPº e por via dele para a autoridade administrativa recorrida afim de que seja refeita e corrigida a acusação defeituosa, o que violaria não apenas o referido principio do acusatório como também as normas do C.P.Penal aplicáveis e, bem assim, as normas do Regulamento Geral das Contra Ordenações, previstas no D.L. 433/82, de 27/10, que em parte alguma prevêem tal possibilidade. Acresce que, há que equacionar o disposto no artº. 64º do D.L. 433/82, de 27/10, que preceitua que quando o juiz decide por despacho, apenas pode ordenar o arquivamento do processo, absolver o arguido ou manter ou alterar a condenação. E nem se diga que não se está a decidir por despacho, porque o arguido e o MºPº não foram notificados para nisso consentirem. É evidente que o que estamos a proferir é um despacho e não uma sentença, por um lado e por outro lado não faria sentido, nem está previsto que, neste momento processual se peça o consentimento dos sujeitos processuais para proferir o despacho que estamos a proferir. Aqui chegados, torna-se manifesto que é um acto inútil realizar um julgamento com uma acusação do MºPº que é inepta e nula e que não poderia conduzir a qualquer outro resultado que não a absolvição da arguida, tendo aqui aplicação o princípio geral que informa todo o ordenamento juridico português previsto no artº. 137º do C.P.Civil, segundo o qual, é proibida a prática de actos inúteis e que é aplicável expressamente, por via do disposto no artº. 4º do C.P.Penal e 41º do D.L. 433/82, de 27/10. A posição que acabamos de tomar, no sentido do arquivamento dos autos perante uma decisão administrativa nula, foi também perfilhada no douto Acórdão do venerando Tribunal da Relação do Porto, de 30/05/2005, disponível em texto integral em WWW.DGSI.PT. IV-DECISÃO. Pelo exposto decidindo-se conceder provimento ao recurso interposto pela Arguida, julga-se verificada a nulidade da decisão administrativa recorrida, da acusação do MºPº e a ineptidão desta, por falta de enunciação dos factos que fundamentam a aplicação da coima em que condena a Arguida, e, em consequência, de acordo com as disposições supra citadas, decide-se não receber a douta acusação do M.º P.º, absolver a arguida e determinar o arquivamento dos autos”. ***** B.2 - O objecto do recurso penal é delimitado pelas conclusões da respectiva motivação – art.º 403, nº1, e 412º, n.º 1, do Código de Processo Penal.A questão abordada no recurso reconduz-se, pois, a apurar se - face à nulidade da decisão da entidade administrativa constatada e não posta em causa pelo recurso – deve a arguida ser absolvida e ser determinado o arquivamento dos autos ou se tal nulidade implica o reenvio dos autos para a entidade administrativa. *** O recorrente aceita, nas suas conclusões 1ª a 4ª e 6ª, a existência de uma nulidade na decisão administrativa. Apenas se insurge, em substância, com a consequência jurídica atribuída pela decisão recorrida à dita nulidade e quanto a dois argumentos utilizados por aquela decisão (conclusões 10ª e seguintes).* B.3 – O recorrente insurge-se contra o despacho recorrido por este ter afirmado a existência de uma acusação do Ministério Público, deduzida ou existente via previsão do art. 62º, nº 1 do RGCO, entendendo que o Ministério Público não pode deixar de apresentar o processo ao juiz, não tendo legitimidade para suprir deficiências ou devolver os autos à entidade administrativa face àquele normativo.Que seja muito difícil ao MP suprir deficiências da decisão e instrução dos autos administrativos, aceita-se. Que as deve sugerir à entidade administrativa competente, no uso das competências de controlo da legalidade democrática, não nos suscita dúvidas – artigos 1º e 2º, nº 2 do estatuto do Ministério Público – Lei nº 47/86, de 15-10. Mas já não se concorda com a visão do magistrado do Ministério Público quanto à restrição dos seus poderes na sequência de mera leitura literal do preceito. Não se deve confundir observância do princípio da legalidade com interpretação literal de preceitos. Dispõe o art. 62º, nº 1 do RGCO que a autoridade administrativa deve enviar os autos ao Ministério Público, “que os tornará presentes ao juiz, valendo este acto como acusação”. A interpretação literal deste preceito, feita pelo magistrado recorrente, retira toda a autonomia à magistratura do Ministério Público (artigo 2º, nº 1 do estatuto do Ministério Público e artigo 219º, nsº. 1 e 2 da CRP), transformando este num mero serviço de distribuição de papéis. Se é esse o seu papel é inútil o envio dos autos ao Ministério Público, já que é de presumir que a entidade administrativa consiga encontrar a morada do tribunal e fazer chegar os papéis ao juiz. Assim, a necessidade de enviar os autos ao Ministério Público só se compagina com a possibilidade e necessidade de este exercer o controlo próprio de uma magistratura, que é, e o sentido normativo imputado pelo recorrente ao artigo 62º, nº 1 do RGCO é claramente ilegal porque violador do Estatuto do Ministério Público e inconstitucional porque violador do artigo 219º da CRP. É necessário não olvidar que o processo contra-ordenacional tem natureza exclusivamente administrativa até uma determinada fase. De onde se pode extrair que a divisão do processo contra-ordenacional em, pelo menos, duas fases, uma administrativa, outra judicial - para além de consequências na aplicação da lei - é que algo se opõe a uma mera assunção, pelo Ministério Público, de um papel passivo de distribuição de processos administrativos, mas exige a sua autonomia e consequente assunção da responsabilidade sobre as peças que pretende ver “convertidas em acusação”. Com o assento nº 1/2001 do STJ se pode afirmar que a fase judicial do processo contra-ordenacional se inicia com a apresentação ao juiz, pelo Ministério Público, da acusação definitiva prevista no artigo 62º, nº 1 daquele diploma (“7.1 - A «entrada do processo no foro do juiz» (ou seja, o início da fase judicial do processo contra-ordenacional) opera-se, pois, não com a impugnação judicial — ante a autoridade administrativa — da acusação provisória (artigo 59.º, n.º 3), mas, apenas, com a ulterior apresentação ao juiz, pelo Ministério Público, da acusação definitiva (artigo 62.º, n.º 1).”). É a transmissão dos autos ao tribunal pelo Ministério Público que o converterá em processo com natureza judicial, tendo em vista assegurar o acesso ao tribunal e o efectivo direito ao recurso. Resta saber se a fase anterior è exclusivamente administrativa e até onde. Não obstante se aceitar que a fase judicial do processo contra-ordenacional só se inicia com o envio dos autos ao juiz (artigo 62º, nº 1 do RGCO e Assento citado) certo é que a fase administrativa termina com a possibilidade de revogação da decisão pela entidade administrativa. Cria-se, assim, uma fase intermédia entre aquelas duas naturezas do processo – a administrativa e a judicial – em que o processo se encontra na disponibilidade do MP e que designaremos por fase “acusatória”. Não sendo já uma fase administrativa (a entidade administrativa já não pode revogar a decisão) ainda não é uma fase judicial. Tal fase só se justifica pela necessidade de o MP decidir se concorda ou não com a decisão da entidade administrativa em termos de estrita legalidade (exclusão do princípio da oportunidade). O Ministério Público não se pode limitar a ser “correia de transmissão” de uns papéis de uma matéria “menor” e sem valor suficiente para justificar uma tomada de posição sobre a matéria tratada no processo. E a tal fase só se podem entender aplicáveis, subsidiariamente, os artigos 277º e 283º do Código de Processo Penal, com as necessárias adaptações. * B.4 – Naturalmente que o direito de mera ordenação social, até pela sua novidade e vizinhança próxima com o direito administrativo e o direito criminal, tem zonas de sombra na interpretação e aplicação dos seus normativos.Com o direito administrativo, desde logo, pela definição orgânica de competências para decisão e com particularidades muito próprias, de que a possibilidade de revogação da decisão (artigo 62º, nº 2 do RGCO) é mero exemplo, em contraposição com a decisão judicial regra. Com o direito penal por surgir como um direito sancionatório “de carácter punitivo”, com um acervo de sanções cada vez mais gravosas quer no seu quantum, quer na sua natureza (sanções acessórias restritivas de direitos, puras privações de direitos, encerramento de estabelecimentos, etc e, até, a possibilidade de aplicação da pena criminal de “trabalho a favor da comunidade” – artigo 89º-A do Dec-Lei nº 433/82, de 27-10). É sabido que a doutrina e a legislação portuguesa têm saudado o surgimento e plena operatividade do direito contra-ordenacional como um avanço significativo no nosso ordenamento jurídico. O direito de mera ordenação social é visto, desde os trabalhos do Prof. Eduardo Correia como um avanço civilizacional, “compagnon de route” do Estado Social, da administração ou Estado conformador (ou impositivo, consoante as visões do papel do Estado). Direito “autónomo e distinto do direito criminal” (preâmbulo do Dec-Lei nº 433/82, de 27-10), prenhe de “advertências sociais, coimas ou sanções ordenativas”, [1] ponta de lança do movimento de descriminalização, instrumento “ordenador” de uma administração cada vez mais interveniente (ou intrusiva). Sempre apresentou, apresenta e apresentará, no entanto, um pecado original: o não se distinguir “substancialmente” do direito penal, na medida em que não é um ilícito ético-socialmente indiferente. Daí a necessidade da sua distinção por referência a critérios formais. [2] [3] É sabido, porque insistentemente referido, que o regime contra-ordenacional apresenta diferenças relativamente ao direitos penais primário e secundário. E, não obstante a proclamada neutralidade ético-social do direito contra-ordenacional, certo é que a própria doutrina antevê nas alterações introduzidas no regime originário das contra-ordenações uma “contra-revolução contra-ordenacional”. [4] O que quer significar que, apesar das diferenças dogmáticas entre o direito penal e o direito contra-ordenacional, se esbatem os contornos de ambos os ramos do direito, designadamente do lado sancionatório, impondo-se, pois, um maior rigor em certos aspectos basilares, nestes avultando os direitos de defesa. Qual a relevância destas considerações para o caso sub judicio? A constatação de que a Convenção Europeia dos Direitos do Homem pode concordar com a inexistência de distinção – “substancial” – entre direito penal e direito contra-ordenacional para efeitos do direito de defesa. De facto, dispõe o artigo 6°, nº 1 (Direito a um processo equitativo) que qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja examinada, equitativa e publicamente, num prazo razoável por um tribunal independente e imparcial, estabelecido pela lei, o qual decidirá, quer sobre a determinação dos seus direitos e obrigações de carácter civil, quer sobre o fundamento de qualquer acusação em matéria penal dirigida contra ela. Dir-se-ia, à primeira vista, face ao ordenamento jurídico português e às loas ao direito de mera ordenação social que correm no “mundo” jurídico interno, que tal artigo não é aplicável no caso de estarmos perante regime contra-ordenacional. Não tem sido esse o sentido da jurisprudência do TEDH, que entende a expressão acusação em matéria penal (aliás, equivalente às contidas nos nsº 2 e 3 do mesmo preceito – “acusada de uma infracção” do nº 2 e “O acusado” do nº 3) com diferente amplitude. E tal entendimento não surge por qualquer interpretação extensiva ou analógica por referência aos processos disciplinares (nomeadamente militares) da jurisdição austríaca (acórdão Engel v. Holanda - 1976) ou contravencional da jurisdição francesa (acórdãos Peltier v. França e Malige v. França), o que sempre seria possível, sim por referência à própria legislação alemã sobre contra-ordenações (Ordnungswidrigkeit). De facto, já no citado aresto Engel o Tribunal veio a delimitar critérios que desenvolveu e repetiu nos acórdãos Ozturk v. Alemanha (1984) e Lutz v. Alemanha (1987). [5] Não obstante o governo alemão ter defendido perante o Tribunal que o artigo 6º da convenção não era aplicável aos casos na medida em que não havia uma “acusação em matéria penal”, invocando que se estava perante contra-ordenações (“Ordnungswidrigkeit”, ou na terminologia do Tribunal Europeu, "regulatory offence" ou "contravention administrative"), certo é que acabou por concluir que o artigo 6º da convenção era aplicável. Para concluir que estava perante uma acusação em matéria penal, conceito com autonomia e que deve ser interpretado no sentido da Convenção, o Tribunal utilizou os seguintes critérios: a qualificação jurídica da infracção no direito nacional; a verdadeira natureza do ilícito; a natureza e o grau de severidade da sanção. O primeiro critério – qualificação no direito nacional – tem carácter meramente formal e relativo, simples ponto de partida da análise a envidar (Engel), à luz do “denominador comum das legislações respectivas dos diversos Estados”. Os outros dois critérios não são cumulativos, sim alternativos, pelo que lhe bastou constatar que a verdadeira natureza da “infracção”, o carácter geral da norma, o seu objectivo simultaneamente preventivo e repressivo, assumiam natureza penal (Lutz), para concluir estarmos perante uma acusação em matéria penal. E é essa, a nosso ver, a realidade que o Ministério Público enfrenta. A de estar perante uma “acusação em matéria penal” [6] para os efeitos da Convenção e afirmar que, sobre ela, nada tem a dizer, estando limitado a replicar acriticamente o dito por uma qualquer entidade administrativa sem, sobre a mesma, tomar posição, quando o pode fazer já em fase judicial, isto é, depois de recebido o processo pelo juiz. A necessidade de chamar “acusação” ao envio dos autos ao juiz não se fica a dever a mera “cosmética processual” do legislador, não obstante se reconhecer e louvar a ginástica que este fez para compatibilizar o processo contra-ordenacional ao procedimento justo, ao Código de Processo Penal e às exigências constitucionais. Essa necessidade só se compreende pela existência de um controlo, mínimo que seja, da magistratura do Ministério Público sobre o “acto de acusação”, que é sua atribuição num processo caracterizado pela estrutura acusatória. E se o Ministério Público não só pode, como o deve fazer num procedimento mais complexo e num direito material mais substancial como o direito penal, também o deverá poder fazer num direito com “menor ressonância ética” mas onde não está afastado o carácter sancionatório. Assim, entende-se que a literalidade do nº 1 do art. 62 do RGCO não retira a autonomia da magistratura do Ministério Público no acto de “acusação” em processo contra-ordenacional, com a consequente possibilidade de não “deduzir” acusação, em sentido substancial, de não concordância com a decisão administrativa – em caso de manifesta ilegalidade ou dislate da entidade administrativa - sob pena de ser letra morta o previsto no art. 219º, nsº. 2 e 3 da CRP. * B.5 - Qual o destino da decisão da decisão da entidade administrativa no caso de o Ministério Público decidir não a “converter em acusação”, essa é outra questão, sendo certo que o recurso do arguido não pode ser prejudicado, invocando o mesmo a nulidade da decisão administrativa.Nesta fase “acusatória”, que o Digno recorrente reduz à previsão literal do artigo 62º, nº 1 do RGCO, o processo passa a estar no âmbito de competências do MP. No entanto, a limitação de tal fase à mera previsão literal do normativo citado parece-nos reducionista. De facto, dispõe o artigo 65º-A do RGCO - Retirada da acusação – que: 1 - A todo o tempo, e até à sentença em 1.ª instância ou até ser proferido o despacho previsto no n.º 2 do artigo 64.º, pode o Ministério Público, com o acordo do arguido, retirar a acusação. 2 - Antes de retirar a acusação, deve o Ministério Público ouvir as autoridades administrativas competentes, salvo se entender que tal não é indispensável para uma adequada decisão. Tal normativo atribui ao MP um poder de determinar o destino do processo já em fase judicial que, por arrastamento, significa o “deixar cair” a decisão administrativa, sendo dispensável a intervenção do juiz. E, nesta fase judicial – já deduzida a acusação – faz todo o sentido, em homenagem aos direitos de defesa, que o arguido deva ser ouvido e tenha que dar o seu assentimento à retirada da acusação. Já assim não será na fase anterior, na fase acusatória. Aí ainda não foi deduzida acusação, ainda não há processo judicial “contraditório” e o consentimento do arguido não faz qualquer sentido. Não tem que ser ouvido, não tem que dar opinião sobre a decisão de deduzir, ou não, acusação. Essa é matéria da exclusiva competência do MP que, caso entenda conveniente, apenas deverá ouvir a entidade administrativa. Se o MP deve, nesta fase judicial posterior, fazer o controlo da legalidade da decisão administrativa [7] e se é possível à entidade administrativa revogar a sua decisão na fase administrativa do processo contra-ordenacional com fundamento no mesmo princípio da legalidade, [8] não se vê como pode o MP demitir-se da sua autonomia e obrigação de velar pelo controlo da legalidade na fase acusatória do mesmo processo, ou seja, a obrigação de não deduzir a acusação com fundamento no princípio da legalidade. Por outro lado não se descortina como o princípio da legalidade, na concretização dada pelo Código de Procedimento Administrativo – plenamente aplicável na fase administrativa aos órgãos das entidades administrativas e plenamente vinculante da sua actuação – poderá tolher a acção do MP na fase acusatória, cujo direito subsidiário se sedia nos artigos 277º e 283º do Código de Processo Penal e é enformada pelos princípios processuais penais. O único óbice substancial e substantivo a este entendimento está na existência da impugnação judicial do arguido. Manter-se-á um valor vinculante da decisão da entidade administrativa? O não envio “automático” do processo ao juiz não será a negação efectiva do direito do arguido a ver a sua impugnação apreciada, de facto e de direito, por um tribunal? Ora, o RGCO resolve expressamente tal problema ao afirmar no artigo 65º-A do RGCO que o MP pode “retirar” o recurso a todo o tempo e até à sentença em 1ª instância. A “retirada“ da acusação pelo MP corresponde, de facto e de direito, a uma revogação da decisão da entidade administrativa. Outro não pode ser o entendimento e outras não podem ser as consequências de tal “retirada”. A decisão da entidade administrativa passa a ser não vinculante e não executória por via da revogação. Se tal conduta é possível ao MP já em fase judicial – e nesta sujeita aos requisitos de audição da entidade decisora (facultativo) e concordância do arguido (obrigatória) - nada obsta a que, em fase anterior (acusatória) o MP não tenha os mesmos poderes, apenas vinculado ao princípio da legalidade do acto e ao requisito de audição (facultativo) da entidade que decidiu. Nesta fase “acusatória”, não sujeita, em si, ao contraditório, a audição do arguido é dispensável. Relativamente ao destino da impugnação judicial do arguido ele será o mesmo da fase posterior: a não “acusação” e consequente arquivamento dos autos, corresponderá à revogação da decisão da entidade administrativa e à inutilidade superveniente da impugnação judicial. [9] Nesta fase processual nem o arguido nem o juiz têm qualquer necessidade de intervenção. Quer para o consentimento (ineficaz), quer para qualquer “homologação” da decisão do MP (fase não judicial do procedimento). Também aqui o MP é “dominus” da acusação e “garante” da legalidade, não valendo argumentar com o princípio da legalidade para, com o único apelo a uma leitura literal de preceitos, homologar práticas que violam … o princípio da legalidade. * B.6 - O recorrente insurge-se, igualmente, contra o despacho recorrido na medida em que este se socorre do disposto no art. 311º do CPP, designadamente da al. d) do seu nº 3, afirmando que os arts. 62º a 64º do RGCO não comportam qualquer lacuna que legitime o recurso àquele preceito.Entendemos que o digno recorrente não tem razão no entendimento global da matéria, apenas referindo bem que se não trata da al. d) do preceito. No caso concreto estamos perante o vício previsto na al. b) do nº 3 do artigo 311º do Código de Processo Penal. De facto, se algo caracteriza o RGCO é a existência de lacunas, correspondentes à sua indefinição conceptual, à controversa natureza material do ilícito contra-ordenacional e às hesitações quanto ao processo, de que os artigos 32º e 41º do RGCO e o acrescento de um nº 10 ao art. 32º da CRP são mero reflexo (e a abundante e contraditória jurisprudência bom espelho). Outra das suas características é a omnipresença e omnipotência das entidades administrativas em sede de um procedimento inicial administrativo, o gravame de coimas sempre em crescendo sancionatório – mais que não seja em valor material - e a pretensão de celeridade que, frequentemente, atropela direitos (de que a presente decisão é bom exemplo) num renovar constante da sua herança napoleónica. Ora, face a isto, os artigos 62º a 64º são manifestamente insuficientes para abarcar todas as hipóteses da vida judiciária. Sequer o CPP e todo o seu regime de nulidades o é. Por maioria de razão não o é o RGCO. Basta imaginar as hipóteses que se colocam em sede de processo penal. Veja-se o exemplo citado por Simas Santos, Leal Henriques, Borges de Pinho, de acusação do lesado em vez do arguido [10] ou de familiar deste em vez do arguido. Casos que podem ocorrer em procedimento contra-ordenacional. Imagine-se uma decisão administrativa que condene um empregado em vez do proprietário de uma qualquer empresa por contra-ordenação que apenas a este possa ser aplicada, tudo por erro de identidade, ou uma condenação por contra-ordenação com base em legislação entretanto revogada, etc. Poderia o Sr. Juiz recorrido, com tal enquadramento, rejeitar a “acusação” por manifestamente infundada? Convém realçar, desde logo, que a acusação em processo contra-ordenacional se caracteriza pela séria possibilidade de contaminação. De facto, os vícios da decisão administrativa contaminam a acusação devido às opções procedimentais do legislador português. Assim, na maioria dos casos, a imputação de um vício a uma acusação deduzida em processo contra-ordenacional é um mero replicar nesta do vício da decisão administrativa. Por outro lado, o actual Código de Processo Penal português perfila-se como um processo de “máxima acusatoriedade … compatível com a manutenção, na instrução e em julgamento, de um princípio de investigação judicial”, tal como afirmado pelo Prof. Figueiredo Dias em nome da Comissão de Reforma do Código de Processo Penal, [11] expressão que ficou a constar do nº 4, nº 2 do artigo 2º da Lei de autorização legislativa em matéria de processo penal, Lei nº 43/86, de 26 de Setembro. Características que – pelo menos em fase judicial – se transmitem ao procedimento contra-ordenacional. Daqui resulta, incontestavelmente, como mera assunção constitucional do princípio do acusatório, a nítida separação entre entidade acusadora e juiz de julgamento (dimensão orgânico-subjectiva do princípio do acusatório) e a distinção entre fases do processo (no caso, acusação e julgamento), no que é definido como a dimensão material daquele princípio. [12] É assim que o Código de Processo Penal e o RGCO vêm a estabelecer, de forma clara, o papel do Ministério Público, enquanto entidade dominus do processo, quanto à promoção do processo e à dedução da acusação nos artigos 48º e 53º do Código de Processo Penal e 62º do RGCO. Ao juiz de julgamento, assim impedido de se pronunciar quanto a essa fase processual – a acusação – restaria o papel de direcção da fase de julgamento, balizado e limitado pelo conteúdo da acusação, pelo thema decidendum (objecto do processo) e pelo thema probandum (extensão da cognição). Naturalmente que o nosso legislador se viu obrigado a restringir estes efeitos extremos de um processo acusatório puro, um puro “adversarial system”. Mas fê-lo de forma clara e mitigada. É esse o papel da al. a) do nº 2 e das quatro alíneas do nº 3 do artigo 311º do Código de Processo Penal. Evitar a todo o custo que casos extremos de iniquidade da acusação conduzam a julgamento um cidadão que se sabe será decididamente absolvido, pretendendo evitar sujeitá-lo, inutilmente, a um processo incómodo e vexatório. Assim, nos casos do nº 3 do artigo 311º do Código de Processo Penal, não obstante o não afirmar, o legislador veio a consagrar um regime de “vícios” da acusação que, face à sua gravidade e à intensidade da violação dos princípios processuais penais contidos na CRP, são insuperáveis, insanáveis enquanto a acusação mantiver o mesmo conteúdo material. De facto, a falta dos elementos referidos naquelas alíneas acarretaria uma gravíssima violação dos direitos de defesa do acusado, tornando inviável o exercício dos direitos consagrados no artigo 32º da CRP. Naturalmente que aquele preceito deve ser interpretado de forma tendencialmente taxativa e essa tendencial taxatividade só poderá ser ultrapassada em casos de idêntica ou mais grave natureza não previstos pelo legislador, mas de igual ou mais grave violação da constituição processual penal. Em termos práticos, se ao juiz de julgamento não é permitido, em homenagem às dimensões material e orgânico-subjectiva da estrutura acusatória do processo, imiscuir-se ex oficio, nas nulidades genericamente referidas no nº 3 do artigo 283º do Código de Processo Penal, já se lhe impõe que impeça a ida a julgamento de acusações nos casos contados previstos no nº 3 do artigo 311º. Naturalmente que face a isto é incorrecto (absolutamente inútil) o apelo ao disposto no artigo 137º do Código de Processo Civil, já que o Código de Processo Penal contém toda a regulamentação necessária, enformada por princípios estranhos àquele diploma. Ora, tais considerandos devem repercutir-se em qualquer processo contra-ordenacional, já que as hipóteses reais da vida judiciária não se acobertam todas à sombra dos artigos 62º a 64º do RGCO e os direitos de defesa dos arguidos merecem, não obstante a menor “ressonância ética”, idêntica cobertura. Por outro lado, a administração no seu afã sancionatório não goza de qualquer privilégio que impeça a actuação judicial fazendo uso do art. 311º do CPP, ex vi do disposto no art. 41º do RGCO e o juiz não tem que ficar acorrentado à literalidade formal do disposto no art. 63º, nº 1 do diploma, nem que aguardar pelo despacho a que se refere o art. 64º para conhecer de questão prévia que obsta de forma tão clamorosa ao conhecimento de mérito. * B.7 – Mas já tem o recorrente razão quanto às consequências da declaração de nulidade da decisão administrativa.De facto, não obstante o tribunal recorrido ter apontado, igualmente, para a nulidade da acusação (mera consequência das “especificidades” do procedimento contra-ordenacional), certo é que a fonte da nulidade é a decisão administrativa e, como bem refere a sentença recorrida, por violação do disposto no art. 58º, nº 1, al. b) do RGCO. Ora, a esta aplicam-se – ex vi do estatuído no art. 41º do RGCO – o regime das nulidades da sentença contido nos artigos 374º, nº 2 e 379º, nº 1, al. a) do CPP. Em concreto, é nula a decisão que não contenha a descrição – mínima que seja - dos factos imputados. Apesar de haver, também, uma acusação, não se mostra adequado aplicar no caso o regime dos vícios da acusação já que a fonte do vício é a decisão e os normativos citados mostram-se mais adequados porque prevendo vícios de acto com a mesma natureza (decisória) Ou seja, como bem refere o recorrente, existe um regime próprio para as nulidades de decisão e estas são de conhecimento oficioso – v. g. Acórdão da Relação de Évora de 17-10-2006, proc. 2.194/06, sendo relatora a Exmª Desemb. Guilhermina Freitas. Ao caso são, pois, aplicáveis os princípios relativos às nulidades processuais, designadamente o princípio do máximo aproveitamento dos actos processuais e, consequentemente, o disposto no art. 122º do CPP. Não por via da previsão do disposto no art. 410º, nº 2 do CPP – vícios de julgamento, que implicam o reenvio (não se trata aqui de reenvio porque não há erro de julgamento) – sim por via da previsão do nº 3 do art. 410º. Trata-se de requisito cominado sob pena de nulidade que se não encontra sanado. E que pode ser sanado por actividade instrutória e decisória da entidade administrativa. Por isso o recurso deve proceder, devendo o tribunal recorrido – nos termos do art. 122º do CPP - determinar a remessa dos autos à entidade administrativa para sanação do vício, com actividade instrutória, se necessário. * C - Dispositivo:Face ao que precede, os Juízes da Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora concedem provimento ao recurso e, em consequência, determinam que deve o tribunal recorrido – nos termos do art. 122º do CPP - determinar a remessa dos autos à entidade administrativa para sanação do vício, com actividade instrutória, se necessário. Notifique. Não são devidas custas. Évora, 28 de Outubro de 2008 (Processado e revisto pelo relator) João Gomes de Sousa Maria Amélia Ameixoeira ______________________________ [1] - Prof. Figueiredo Dias,in “O movimento da descriminalização e o ilícito de mera ordenação social”, Jornadas de Direito Criminal – CEJ, pag. 320, 1984. [2] - No entanto, Prof. Figueiredo Dias, in “Temas básicos da doutrina penal” – pags. 145 e segs. Coimbra Editora, 2001. [3] - Ou “materiais” e “formais”, na terminologia do Prof. Figueiredo Dias, ob. e loc. cit. [4] - Fig. Dias – in “Direito Penal – Parte Geral” – Tomo I, pags. 148 e 155. Coimbra Editora, 2004. [5] - Casos que incidiram sobre contra-ordenações estradais. Em ambos os casos estamos perante simples acidentes de viação entre veículos exclusivamente com danos materiais e aplicação de sanções pecuniárias (Geldbusse) de 125 DM mais 14 DM, por responsabilidade conjunta em acidente de viação (Lutz) e de 60 DM, por responsabilidade em acidente de viação (Ozturk). [6] - E convém não olvidar que, no dizer do Prof. Figueiredo Dias (in Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, pag. 153, Coimbra Editora, 2004), o direito contra-ordenacional “se não é direito penal, é em todo o caso direito sancionatório de carácter punitivo”). [7] - V. g. Simas Santos e Jorge de Sousa, in “Contra-ordenações”, 3ª ed. – 2006 - pag. 436 no 1º & da anotação 3). [8] - Aut. e ob. cit., pag. 437 [9] - No que estamos de acordo com António Beça Pereira, in “Regime Geral das Contra-ordenações” - Almedina, pag. 131, em anotação ao artigo 62 – 7ª edição, 2007. [10] - In “Código de Processo Penal” – 2º Vol., Rei dos Livros, pag. 202. [11] - “Grandes princípios orientadores da elaboração do projecto de Código de Processo Penal”, 1984, in “Jornadas de Processo Penal” – Revista do MP, Cadernos 2 – pag. 330. [12] - “Constituição da República Portuguesa Anotada” – Gomes Canotilho e Vital Moreira, Coimbra Editora, 1993, pag. 206. |