Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | CRISTINA CERDEIRA | ||
Descritores: | NULIDADE DA SENTENÇA EXCESSO DE PRONÚNCIA CONHECIMENTO OFICIOSO ILEGITIMIDADE CADUCIDADE | ||
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Data do Acordão: | 04/30/2015 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PROCEDENTE | ||
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Sumário: |
I) - De acordo com o disposto no artº. 615º, nº. 1 al. d) do NCPC, a sentença é nula (por excesso de pronúncia) quando o juiz se pronuncia sobre questões que nenhuma das partes suscitou no processo e de que não podia tomar conhecimento, sendo esta a sanção para o desrespeito da norma do artº. 608º, n.º 2, 2ª parte do NCPC (correspondente ao artº. 660º, nº. 2 do anterior CPC), que estabelece que o juiz só pode ocupar-se das questões suscitadas pelas partes, salvo tratando-se de questões do conhecimento oficioso do Tribunal. II) - Nos termos do disposto no artº. 333º do Código Civil a caducidade só é de conhecimento oficioso quando for estabelecida em matéria excluída da disponibilidade das partes. E assim, nos termos do disposto nº 2 deste artigo e do 303º também do Código Civil, tem que ser invocada por aquela parte a quem aproveita. III) - No caso em apreço, não tendo a Ré, na sua contestação, invocado a caducidade do direito de acção, não se defendendo por excepção, por força do disposto no artº. 333º, nº. 2 do Código Civil, uma vez que não se trata de matéria excluída da disponibilidade das partes, aplica-se a norma do artº. 303º do mesmo Código, pelo que a caducidade tem de ser invocada por aquela parte a quem aproveita, não sendo de conhecimento oficioso. IV) - Tendo a sentença recorrida conhecido oficiosamente da excepção da caducidade do direito de acção, em matéria não excluída da disponibilidade das partes, esta violou o disposto nos supra mencionados artºs 333º e 303º do Código Civil e 579º do NCPC, sendo, por isso, nula nos termos do artº. 615º, nº. 1, al. d) do NCPC, porquanto é manifesto que o Tribunal “a quo” conheceu de uma questão de que não podia tomar conhecimento. (Sumário elaborado pela Relatora) | ||
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Decisão Texto Integral: |
Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora I. RELATÓRIO BB e CC intentaram a presente acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra DD Lda., EE, FF e GG, pedindo a condenação solidária destes a proceder à reparação de defeitos que identificam e a custear a instalação dos AA. e seu agregado familiar, bem como o acondicionamento do recheio da casa durante a realização das obras e, caso não seja possível a reparação dos defeitos, a substituir a moradia em causa por outra de igual tipologia, em S..., de valor equivalente ao bairro onde habitam; em alternativa, pedem a resolução do contrato com a devolução da quantia paga a título de preço, actualizada de acordo com os índices de inflação, e das quantias despendidas pelos AA. com despesas bancárias, o pagamento do empréstimo contraído para a aquisição da moradia, despesas notariais e registrais, a liquidar em execução de sentença. Mais peticionam a condenação do RR. no pagamento de uma indemnização aos AA. por danos não patrimoniais, em quantia não inferior a € 10 000. Alegam, em síntese, que o 1º e 3º RR. foram respectivamente construtor e técnico responsável da obra, referente ao prédio urbano destinado a habitação, construído no lote que identificam no artº. 1º da petição inicial, cujo alvará de construção era da titularidade do 2º Réu. Em 26/12/2006, os AA., na qualidade de compradores, e a 4ª Ré, na qualidade de vendedora, celebraram entre si um contrato de compra e venda do mesmo prédio. Em finais de Março de 2008, o prédio começou a apresentar patologias, o que levou os AA. a contactar todos os RR. para lhes comunicar o que se passava. Só em Junho de 2008, os 1º, 3º e 4º RR. foram verificar o prédio e, ao ter confirmado que existiam defeitos, comprometeram-se a fazer as obras necessárias à reparação, as quais foram sempre adiando. Em Janeiro de 2009, os AA. solicitaram uma vistoria à Câmara Municipal de S..., que verificou as anomalias. Em 03/03/2009, os AA. remeteram aos 1º e 2º RR. uma carta que juntam, acompanhada de cópia do auto de vistoria, informando e solicitando a reparação dos defeitos da casa, sendo que em 26/03/2009 os 1º e 3º RR. fizeram uma vistoria à habitação, concluindo conforme documento nº. 8 junto com a petição inicial. Nessa sequência, os 1º e 3º RR. reconheceram a existência dos defeitos e procederam a obras no imóvel, do que os AA. deram conhecimento aos restantes Réus. Todavia, no início do mês de Dezembro de 2009, o imóvel começou a apresentar novamente os mesmos defeitos, mas com maior gravidade. Referem, ainda, que o imóvel não tem as qualidades necessárias a uma habitação salubre, devendo os RR. reparar os defeitos. Para adquirirem a habitação, os AA. contraíram um empréstimo bancário, e devido aos defeitos que apresentava a habitação, tiveram grande desgosto e arrelias, tendo a A. mulher de dormir em casa da mãe durante um ano e meio, por recomendação médica devido ao seu filho recém nascido, o que causou transtornos ao casal, obrigando-os a deslocarem-se constantemente com uma criança pequena, não podendo desfrutar do conforto do lar, devendo os AA. ser indemnizados dos danos morais por estes sofridos.
Os RR. DD Lda. e FF apresentaram contestação, na qual invocam a falta de legitimidade de algumas das entidades ou pessoas cuja responsabilidade poderia ser assacada e que não estão demandadas na presente acção, entendendo que a Câmara Municipal de S... e a técnica de concepção do projecto deveriam ser partes. Alegam, ainda, que só tiveram conhecimento dos alegados defeitos aquando da notificação pela Câmara Municipal de S... em 3 de Março de 2009, desconhecendo se, no início de Dezembro de 2009, o imóvel começou a apresentar os mesmos defeitos com maior gravidade. Mais alegam que a Câmara Municipal de S... nunca assinou o livro de obra, nem qualquer técnico dessa entidade o fez, apenas constando a assinatura do técnico da obra e ora 3º Réu. A obra foi realizada por HH e JJ, enquanto subempreiteiros da empresa ora 1ª Ré, pese embora o facto dos pagamentos terem sido directamente efectuados pelo dono de obra, o R. EE, aos subempreiteiros. O primeiro e único contacto que a sociedade Ré teve com os AA. foi através da carta datada de 3 de Março de 2009, e o R. FF só através da referida sociedade teve conhecimento da aludida carta e antes disso nunca teve conhecimento de anomalias relativas à construção da casa objecto dos presentes autos. No dia 24/03/2009 foram envidados todos os esforços, numa reunião conjunta com a Câmara Municipal de S... e os 1º e 3º RR., para avaliar os eventuais defeitos do imóvel e encetar os trabalhos necessários à sua reparação. Tal reunião foi marcada por carta registada para os AA. e para a Câmara Municipal de S..., não tendo esta última sequer respondido aos 1º e 3º Réus. Sem resposta por parte da edilidade, em 26/03/2009 os ora 1º e 3º RR. fizeram uma visita ao imóvel, da qual o 3º R. elaborou o relatório cuja cópia foi junta com a contestação. Acrescentam que não sabem quem é a 4ª Ré, nunca tendo com a mesma contactado. As obras de reparação foram realizadas pela empresa de subempreiteiros HH e JJ, que nunca se recusaram a fazer quaisquer reparações e sempre se prontificaram para tudo o que fosse necessário. Referem, ainda, que o projecto de verificação do comportamento térmico foi objecto de vistoria e aprovação por parte da Câmara Municipal de S... e o empreiteiro, ora 1º R., cumpriu o mesmo na execução da obra. Por outro lado, existe uma máquina de secar roupa na cave da casa, que não tem escoador de humidade ou qualquer tipo de ventilação dos vapores da roupa húmida, o que poderá ser uma das explicações para as humidades e fungos no imóvel. Concluem, pugnando pela improcedência da acção por: - procedência da excepção da falta de legitimidade de algumas das entidades ou pessoas cuja responsabilidade poderá ser assacada e que não são partes nesta acção; - inexistirem alegados fundamentos na concepção do projecto de obra, e se os houver, não foi demandada a parte legítima (o projectista); - por não haver fundamento na construção executada de acordo com o projecto da obra vistoriado e aprovado pela Câmara Municipal de S..., que também não é parte na presente acção; - por poder ser responsabilidade do próprio uso da casa, designadamente dos vapores condensadores de humidade da eventual utilização da máquina de secar roupa, os quais não têm saída para o exterior; referindo, ainda, que estão na disposição de fazer tudo o que estiver ao seu alcance para minorar ou reparar tudo o que esteja ou caiba na responsabilidade civil dos ora RR., se tal resultar demonstrado ser da sua responsabilidade; ou caso contrário, pedem a sua absolvição por falta de prova e de responsabilidade em sede de execução da obra.
Contestaram igualmente os RR. EE e GG, impugnando que o 2º R. tenha sido notificado em finais de Março de 2009, sendo que apenas em 3/03/2009 os AA. interpelaram o 2º R. pela primeira vez e referindo que tendo o relatório de vistoria técnica (doc. 8) sido elaborado em 26/03/2009 e o documento 9 sido produzido em 10/07/2009, é manifestamente impossível que qualquer daqueles documentos tivesse sido notificado ao 2º R. a coberto da carta de 3/03/2009. Mais alegam que desconhecem se em finais de Março de 2008, o prédio em causa começou a apresentar diversas patologias, expressão que aliás é vaga e indeterminada. Nos termos do disposto no artº. 1225º do Código Civil, apenas os vícios do solo ou da construção, ou ainda, o erro na execução dos trabalhos são aptos a desencadear a responsabilidade do construtor ou do promotor, em ordem à reparação dos respectivos defeitos. Contudo, as humidades detectadas, nomeadamente nos cantos superiores da habitação ao nível do 1º andar, não radicam em qualquer vício de construção, erro de execução ou vício do solo, mas são causados exclusivamente pela má utilização da habitação por parte dos AA., consubstanciada no facto destes terem a casa sempre fechada, sem permitir que a mesma seja arejada, mediante a livre circulação de ar, e de nela manterem três aquecedores permanentemente ligados. Referem, ainda que a casa dos AA. é geminada com outra de iguais características e construída em simultâneo com a dos AA. e com idênticos materiais, que não apresenta quaisquer vestígios de humidades. Embora os RR. tenham realizado um conjunto de obras recomendadas no relatório da vistoria efectuada pela Câmara Municipal de S... em 23/03/2009, a verdade é que persistiu o aparecimento de humidade no interior da habitação.
Em Dezembro de 2009 começaram a surgir “novamente os alegados defeitos” pela mesma má utilização da casa por parte dos Autores, os quais instalaram, ainda, uma antena parabólica no telhado, tendo fixado a antena na chaminé e deslocado peças da cobertura para a passagem da cablagem do telhado para o interior do imóvel, o que, segundo o relatório da Câmara Municipal de S..., permitia a entrada de água. As intervenções sugeridas no relatório técnico elaborado em 29/03/2011, a pedido dos RR., pelo Departamento de Energia do Instituto Superior da Qualidade, com a verificação de eventuais entradas de água pela chaminé ou entupimento das caleiras, foram recusadas pelos Autores. Terminam, pugnando pela improcedência da acção e pela sua absolvição do pedido.
Os RR. DD Lda. e FF apresentaram articulado superveniente, alegando, em síntese, que em 28/03/2011 o ISQ efectuou uma vistoria ao imóvel em causa com o objectivo de verificar a conformidade da moradia, à data do respectivo projecto (em Outubro de 2003), aos requisitos legais do Regulamento em vigor na altura (Regulamento das Características do Comportamento Térmico dos Edifícios – DL 40/90), tendo apresentado as conclusões resultantes do relatório de vistoria junto a fls. 187 a 200 dos autos. Referem, ainda, que em Janeiro de 2011, solicitou-se outro relatório térmico à empresa “KK, Consultoria e Projectos de Engenharia, Lda.” sobre a moradia em S... ou o Loteamento “Horta da P...” – Lotes 1 a 6 – S..., o qual se encontra junto a fls. 167 a 172 dos autos. Concluem, peticionando a realização de prova por inspecção pericial do LNEC ou de outro gabinete técnico, ou em alternativa por um perito a nomear pelo Tribunal, para apurar as causas das patologias apontadas nos mencionados relatórios, bem como a intervenção principal provocada da Câmara Municipal de E..., nos termos do artº. 325º do CPC.
Os AA. vieram responder ao aludido articulado superveniente, pugnando pela inadmissibilidade legal da intervenção da Câmara Municipal de E..., alegando não ser esta edilidade solidariamente responsável com os RR., perante os AA., nem gozarem aqueles de direito de regresso contra aquele Município.
Por despacho proferido em 23/01/2012, não foi admitido o incidente de intervenção principal provocada da Câmara Municipal de E....
Foi dispensada a realização de audiência preliminar e proferido despacho saneador, no qual foi admitido o articulado superveniente apresentado pelos RR. DD Lda. e FF, bem como seleccionada a matéria de facto assente e organizada a base instrutória, que sofreu reclamação por parte dos RR. EE e GG, a qual foi desatendida.
Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, com observância do legal formalismo.
Após a resposta à matéria de facto constante da base instrutória, que não sofreu qualquer reclamação, em 25/10/2013 foi proferida sentença que julgou: - verificada a excepção de caducidade prevista nos artºs 916º e 917º do Código Civil e, em consequência, absolveu a Ré GG do pedido; - a presente acção improcedente e, consequentemente, absolveu os RR. DD Lda., EE e FF do pedido.
Inconformados com tal decisão, os AA. dela interpuseram recurso, extraindo-se das respectivas alegações as seguintes conclusões [transcrição]: «1ª - A sentença a quo absolveu a 4ª R. GG por entender que não tendo ficado provado que aquela foi notificada em finais de Março de 2008 dos defeitos e tendo a acção entrado em juízo em 30.11.2010 (foi-o, porém em 29.11.2010) afigura-se excedido o prazo de 1 ano previsto no art. 916º do C. Civil. 2ª - Consequentemente, e à luz do art. 333º do C. Civil julgou verificada a excepção de caducidade, decidindo ainda ser a mesma de conhecimento oficioso. 3ª - Contudo a 4ª R., que contestou conjuntamente com o 2º R., não se defendeu por excepção, não tendo suscitado a caducidade. 4ª - Ora, nos termos do art. 333º do C. Civil a caducidade só é de conhecimento oficioso quando for estabelecida em matéria excluída de disponibilidade das partes. 5ª - No caso sub judice, porém, a matéria em causa não está excluída da disponibilidade das partes, aplicando-se o regime da norma do art. 303º do C. Civil, ex vi nº 2 do respectivo art. 333º. 6ª - Só na contestação a 4ª R. poderia ter invocado a caducidade - nº 1 do art. 489º do CPC, o que não fez. 7ª - Pelo que o Tribunal a quo não podia, oficiosamente, conhecer e declarar a caducidade. 8ª - Absolvendo a R. GG com o fundamento na caducidade da acção, a sentença impugnada violou o disposto no art. 333º e 303º do C. Civil, e no nº 1 do art. 489º do CPC. 9ª - Sendo, por isso, nula - al. d) do nº 1 do art. 615º do CPC. 10ª - Acresce que a R. GG não excepcionou a caducidade e não impugnou na sua contestação (apenas o 2º R. co-contestante o fez) que não foi notificada dos defeitos, como expressamente aceitou o conhecimento da existência dos mesmos, alegando as sucessivas obras de reparação. 11ª - É manifesto que a conduta da R. GG, confessada na respectiva contestação concretiza «um comportamento concludente», porquanto ao ter confessado ter tido conhecimento das sucessivas reparações dos defeitos do imóvel, aceitou sem reserva ter conhecimento da existência dos mesmos. 12ª - As conclusões supra encontram apoio jurisprudencial, entre outros, no Ac. T. Rel. Lx. de 15.02.2002, no Proc. 00127097, Ac. do STJ de 22.06.2005, no Proc. 0501735 e Ac. do STJ de 03.06.2005, no proc. 05A1247, todos disponíveis em www.dgsi.pt. 13ª - A sentença recorrida entendeu que, pese embora a actuação dos demais RR., não se vislumbra «a fonte de natureza contratual ou legal de onde resulta a obrigação deste(s) em indemnizar os AA.» 14ª - Pelo que, absolveu os 1º, 2º e 3º RR. do pedido. 15ª - Porém, nenhum dos referidos RR. excepcionou a respectiva legitimidade por serem alheios à relação material controvertida. 16ª - Uma vez mais a sentença recorrida vem conhecer uma excepção - ilegitimidade - que não foi processualmente suscitada. 17ª - Os 1º, 2º e 3º RR. são parte na relação material controvertida não só porque não suscitaram a respectiva ilegitimidade, como porque tal legitimidade lhes advém da norma do nº 1 do art. 1225º do CC, in fine, que responsabiliza o empreiteiro face a um terceiro adquirente do imóvel. 18ª - E no que tange a estes RR. também nenhum deles excepcionaram a caducidade, nem aliás o poderiam fazer uma vez que os defeitos foram denunciados em tempo. 19ª - Com efeito, da matéria provada resulta que os RR. procederam a diversas obras de reparação de defeitos, as últimas das quais ocorreram entre 20.07.2009 (pontos 13, 15 e 16 da matéria provada) e 15.12.2009 (data da nova denúncia, ponto 18, idem). 20ª - Os AA. denunciaram estes defeitos (os anteriores haviam sido reparados e, por isso, a data do respectivo conhecimento é irrelevante para a questão sub judice) aos RR. em 15.12.2009 (ponto 18 da matéria provada). 21ª - Ora, entre o aparecimento dos defeitos (forçosamente após 20.07.2009 e antes de 15.12.2009) e a respectiva denúncia, em 15.12.2009, decorreu menos de 1 ano. 22ª - E entre a denúncia dos defeitos - 15.12.2009 - e a propositura da acção - 29.11.2010 - decorreu menos de 1 ano. 22ª - Não ocorreu, relativamente a nenhum dos RR., incluindo a 4ª R., a caducidade do direito da acção. 23ª - Decidindo a absolvição dos 1º, 2º e 3º RR. a sentença recorrida violou o disposto no nº 1 do art. 489º do CPC (porquanto decidiu a ilegitimidade dos RR., que estes não suscitaram), violou ainda o nº 1 do art. 1225º do C. Civil, sendo nula por força do disposto na parte final da al. d) do nº 1 do art. 615º do CPC. 24ª - As conclusões supra encontram respaldo também na jurisprudência sobre citada. 25ª - Termos em que deve a sentença recorrida ser revogada, porque nula, julgando a acção procedente por provada, conforme impõe a matéria provada, assim se fazendo JUSTIÇA!»
Os RR. EE e GG contra-alegaram, formulando as seguintes conclusões [transcrição]: «1ª Os Apelantes delimitaram objectivamente o recurso à matéria de direito pelo que ao Tribunal ad quem está vedado ocupar-se da matéria de facto. 2ª A sentença recorrida absolveu o 2º R por não encontrar qualquer fonte obrigacional susceptível de o responsabilizar perante os Apelantes. E isto porque, no caso vertente, o regime aplicável é o da venda e não o da empreitada quanto é certo que os Apelantes não adquiriram ao 2º R., dono da obra. 3ª Uma vez que os Apelantes se não insurgem contra o regime aplicável, que é o da venda, ao contrário do que aqueles sempre sustentaram é de concluir que se conformam com este entendimento jurídico. Neste contexto, a decisão ora posta em crise é acertada pelo que se pugna pela sua manutenção. 4ª Sem conceder, caso assim se não entenda e designadamente que ao caso cabe aplicar o regime da empreitada, sempre terá de ser mantida a absolvição do 2º R uma vez que este, na empreitada, não é nem o construtor nem o técnico da obra. 5ª De resto, nada resulta dos factos provados que permita assacar qualquer responsabilidade ao 2º R, dono da obra, que previamente à construção diligenciou na obtenção do alvará de construção junto da Câmara Municipal de S... e, posteriormente, alvará de utilização. Ou seja: não se trata de construção clandestina ou erguida à margem e/ou contra os cânones. 6ª Relativamente à 4ª Ré, a vendedora, vale aqui, mutatis mutandis, o que se expendeu supra nas conclusões 4ª e 5ª. 7ª Não ficou provado que os Apelantes tivessem denunciado à 4ª Ré qualquer vício. Mas ficou demonstrado que os mesmos vícios terão sido denunciados aos 1º a 3º RR., em 04.03.2009. Logo, seria a partir desta mesma data que os Apelantes deveriam ter denunciado os vícios também à 4ª R, o que, se repete, jamais ocorreu. 8ª De sorte que até ser citada para a acção, o que terá sucedido entre 2 a 4 de Dezembro de 2010, à 4ª R não foram denunciados os vícios melhor identificados sob o ponto 10 dos Factos provados. Ou seja: só com a citação é que os ditos vícios foram denunciados à 4ª Ré. 9ª Ora, à luz do que dispõe o artº 916º, nº 3, do Cód. Civil, o prazo de um ano para a denúncia dos defeitos ante a 4ª R, a vendedora, achava-se expirado desde 03.09.2010. 10ª Da conjugação das conclusões 7ª e 8ª decorre uma evidência que, configurando factos instrumentais, o Tribunal a quo subsumiu ao pertinente comando normativo e, assim, concluiu pela verificação da caducidade, decretando-a. 11ª É certo que o Tribunal a quo, na sua decisão, não se baseou em factos alegados pela 4ª Ré. Porém, não é menos certo que tenha baseado a sua decisão em factos que resultam da instrução da causa, o que lhe é perfeitamente lícito, aliás em conformidade à jurisprudência firmada pelo S.T.J – V Acórdão do S.T.J., de 23.09.2003, Proc 03B1987/ITIJ/Net. 12ª Os factos estão lá. O Tribunal aplicou-lhes o direito. De extraordinário nada se vislumbra nisso. Não houve, pois, violação do que dispõe o artº 333º do Cód. Civil. Termos em que, JUSTIÇA!»
Os RR. DD Lda. e FF também apresentaram contra-alegações, formulando as seguintes conclusões [transcrição]: A) «Na verdade, não se nos afigura, em boa verdade que os Recorridos tenham responsabilidade porque: os projectos de construção teriam que estar submetidos a condicionantes e limitações decorrentes dos projectos de loteamento da Câmara Municipal de S..., uma vez que deverá existir, à partida e em princípio, uma vistoria fiscal por parte da Câmara Municipal, bem como os projectos de construção deverão ser apreciados junto da Edilidade com os seus arquitectos e engenheiros civis, e também os projectos de especialidade, bem como o “Livro de Obra”, sempre submetidos a “fiscalização” da Câmara Municipal; B) Ora, os projectos de loteamento por parte da Câmara Municipal teriam de estar de acordo com o P.D.M. (Plano Director Municipal) e por fim com o P.P. (Plano de Pormenor), e nada no projecto de loteamento Camarário aprovado pela mesma entidade, fazia prever condicionalismos aos projectos quer de construção, quer de especialidade, uma vez que as condicionantes ou limitações devem ser levadas em linha de conta na elaboração dos projectos e depois na Obra a executar, no entanto, tal tem obrigatoriamente de ser ressalvado no loteamento, sob pena de responsabilidade quer do loteador, quer da Câmara Municipal, pelo que, nada fazia prever ou ser entendido de outra forma, pelos ora Recorridos, a saber, um, na qualidade de construtor, outro, na qualidade de técnico de Obra. C) Por outro lado, também uma testemunha dos ora Recorridos disse aos costumes que: aquando da instalação do sinal da TV por satélite na respectiva moradia à responsabilidade dos ora Recorrentes, em que estes encomendaram este trabalho a uma empresa do ramo, esta empresa partiu algumas telhas e danificou os pontos de entrada de cabos junto às chaminés, o que permitiu também a entrada de águas da chuva. D) Por outro lado, como já se verificou: as construções sobre terrenos de má qualidade ou com depósitos de lençóis freáticos por baixo do terreno, onde existe água potável, (pois o que faz o ciclo da água e sua purificação e a própria terra, que a filtra), como é o caso concreto, tal construção deveria ter sido feita com uma caixa-de-ar sob a casa construída, entre o solo e a própria construção da casa, com o piso térreo feito numa laje de betão, impedindo assim o acesso de humidade à construção, (pois provado ficou que a água ascende por capilaridade), ora como tal situação aqui explanada não estava prevista nos projectos aprovados pela própria Câmara Municipal, assim os projectistas não tiveram conhecimento dessas circunstâncias, porque desde logo, a Câmara não deveria ter aprovado um loteamento de construção urbana em terreno agrícola, ou melhor, em terreno onde estão lençóis freáticos de água potável e boa para extrair e ser bebida, onde segundo parece, existia aí um poço, pois, se ainda que se construísse, mesmo num terreno húmido e de teor agrícola, teria que ter sido previsto no loteamento urbano aprovado pelos técnicos camarários, para que depois, após aprovação do loteamento, então e uma vez previsto, quer o construtor, quer o técnico de Obra, fariam a elaboração dos projectos de construção e de especialidade de acordo com a projecção de uma caixa-de-ar entre a casa e o solo, acautelando as humidades e infiltrações, de acordo com o previsto nesse loteamento, bem entendido. E) Também outro factor importante e de relevância a ter em linha de conta foi o facto de a Obra ter sido feita no Verão, a saber no mês de Agosto, altura em que a chuva é escassa e os terrenos estão secos, pelo que também a “olho nu”, não se descortina, pela evidência e a experiência do Homem Médio, se os terrenos são ou não de má qualidade construtiva e se são ou não de alto teor freático... F) Quando se impugna a decisão proferida sobre a matéria de facto, é elemento fundamental os depoimentos prestados em audiência de discussão e julgamento, os documentos e a prova pericial; G) No caso sub judice são as próprias testemunhas indicadas pelos ora Recorrentes que contrariam a tese por este desenvolvida na douta petição inicial, e confirmam os testemunhos dos AA. /Recorrentes, os factos supra expostos, acerca da linha de água e de o terreno ser agrícola. H) Não havendo qualquer outra prova em sentido contrário; I) A decisão jamais poderia ser de condenação dos ora Recorridos, mas pela evidência probatória, teria de ser a absolvição dos mesmos, pelo que o Douto Tribunal fez direito ao provar a matéria factual, tornando-a justa. Termos em que se requer a manutenção da decisão de absolvição dos ora Recorridos, FF e DD Lda., pela douta sentença, com o suprimento de V. Exas., deve a decisão da lª instância manter-se, conduzindo à sua JUSTIÇA! Mais se anexam documentos nos termos do artº. 693º-B do CPC. Como sempre, farão V. Exas., serena e objectiva JUSTIÇA.»
O recurso foi admitido por despacho de fls. 390. Por despacho proferido a fls. 406, o Mº Juiz “a quo” pronunciou-se sobre a questão da nulidade da sentença prevista no artº. 615º, nº. 1, al. d) do NCPC e invocada pelos recorrentes, por o Tribunal ter conhecido da excepção de ilegitimidade que não foi suscitada pelos RR., bem como da excepção de caducidade, que não é de conhecimento oficioso, referindo que na sentença recorrida não foi decidida qualquer excepção de ilegitimidade e quanto à caducidade, discorda do entendimento dos AA., remetendo para os fundamentos da sentença, concluindo que não se verificam tais nulidades.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. II. FUNDAMENTAÇÃO O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, tendo por base as disposições conjugadas dos artºs 608º, nº. 2, 635º, nº. 4 e 639º, nº. 1 todos do Novo Código de Processo Civil (NCPC), aplicável “in casu” por a decisão sob censura ter sido proferida depois de 1/09/2013 (artº. 7º, nº. 1 da Lei nº. 41/2013 de 26/6).
Considerando o teor das conclusões apresentadas, importa indagar se a sentença recorrida enferma das nulidades que lhe são imputadas.
Na sentença recorrida foram considerados provados os seguintes factos [transcrição]: «1. Na Conservatória de Registo Predial de S... encontra-se descrito sob o n.º 1887 o prédio urbano, com a área total de 187,4m2, sendo 84,9m2 coberta e 102,5m2 descoberta, composto de rés-do-chão e 1.º andar para habitação, garagem e quintal sito na Horta da P..., lote n.º 5 da freguesia e Concelho de S... e inscrito na matriz predial urbana da mesma freguesia sob o artigo 2556. 2. Por escritura outorgada em 26 de Dezembro de 2006 GG declarou vender a BB e CC e estes comprar, para sua habitação própria e permanente, o prédio identificado em 1) pelo preço de €100.000,00, livre de ónus e encargos; 3. Através da referida escritura BB e CC declararam-se devedores ao Banco C... da quantia de €100.000,00 entregue nessa data por esta instituição mediante a constituição a seu favor de hipoteca sobre o imóvel adquirido para garantia do pagamento da referida quantia acrescida dos respectivos juros de mora, acrescidos de uma sobretaxa até 4% ao ano, em caso de mora, a título de cláusula penal e das despesas extrajudiciais que acordaram fixar em €4.000,00. 4. Na Conservatória de Registo Predial de S... encontra-se inscrita, através da Ap.5 de 28 de Setembro de 2001, a aquisição – por compra a GG – a favor de BB no estado de casada no regime de comunhão de adquiridos com CC, do prédio identificado no ponto 1). 5. E inscrita, através das Aps.8 e 9 de 4 de Dezembro de 2006, duas hipotecas voluntárias a favor do Banco C... com o capital máximo assegurado de €130.280,00 e de €32.742,50, respectivamente. 6. O prédio identificado no ponto 1) foi construído ao abrigo do alvará de construção n.º 38/2003, emitido pela Câmara Municipal de S... a favor de EE, na qualidade de dono da obra. 7. Tendo em 7 de Dezembro de 2004 sido passado o alvará de utilização com o n.º 58/2004 também a seu favor. 8. A Ré DD Lda. efectuou a construção do prédio descrito em 1), tendo, para tanto, recorrido aos serviços dos subempreiteiros HH e JJ; 9. O Réu FF foi o técnico responsável pela obra. 10. A 4 de Março de 2009 os Autores comunicaram aos Réus DD LDA. e EE a existência, no prédio descrito em 1), de vestígios de humidade/eflorescências sobretudo nas zonas onde existem pilares e talões de viga, com maior incidência no primeiro piso, mas também observáveis no rés-do-chão, solicitando a sua reparação. 11. Em 26 de Março de 2009 os Réus DD Lda. e FF efectuaram uma vistoria à habitação. 12. Na sequência do que foi elaborado, pelo Réu FF, o relatório de vistoria técnica junto a fls. 49/55 e cujo teor se dá integralmente por reproduzido. 13. Em 10 de Julho de 2009 a Autora BB, na qualidade de proprietária, HH, na qualidade e subempreiteiro, e o Réu FF, na qualidade de técnico responsável e representante do empreiteiro, declararam acordar dar início, em 20 de Julho do 2009, à realização das obras constantes do relatório referido em 12) com vista à reparação dos problemas detectados e aí mencionados. 14. Mais acordaram que as obras seriam realizadas pela empresa A..., com sede em Alter do Chão e que, por forma a diminuir a espessura do ressalto seria realizada a placagem do rebordo sobre as peças estruturais antes da aplicação do isolamento. 15. As obras referidas nos pontos 12) e 13) foram realizadas. 16. Os Réus DD Lda. e FF realizaram obras na habitação, designadamente as que se vislumbram nas fotos de fls. 287. 17. Após a realização das obras referidas em 16 o prédio voltou a apresentar os defeitos referidos em 12. 18. O que foi comunicado pelos Autores aos Réus EE e FF por cartas datadas de 15 de Dezembro de 2009 e cujas cópias se encontram juntas a fls. 57/58 e a fls. 60, respectivamente, e cujo teor se dá integralmente por reproduzido. 19. A existência dos defeitos referidos em 12 causou desgosto aos Autores. 20. Por recomendação médica, e uma vez que o seu filho havia nascido, a Autora teve de dormir em casa da sua mãe durante cerca de um ano. 21. A humidade existente no prédio identificado em 1) constitui causa adequada à contracção de insuficiências respiratórias e infecções pulmonares. 22. Pelo que, em consequência do referido em 21, os AA. deixaram de habitar permanentemente a casa. 23. Se os Autores tivessem, à data da aquisição do imóvel identificado em 1) conhecimento dos defeitos referidos em 12), os mesmos não o haviam adquirido mesmo por preço inferior. 24. Com a aquisição do prédio referido em A) os Autores tiveram despesas com a realização da escritura e registos prediais e com o pagamento de juros decorrentes da contracção de empréstimo bancário. 25. Todos os projectos de especialidades, designadamente de verificação do comportamento térmico da construção foram apresentados com o projecto que deu entrada na Câmara Municipal de S..., e foi efectuado de acordo com o mesmo. 26. E cumprido na execução da obra com excepção do que respeita aos envidraçados, tendo sido colocados vidros duplos 5 + 8 + 5 mm, com portadas interiores. 27. A humidade detectada no prédio referido em 1) resulta de a mesma estar implantada em terreno húmido, que aconselharia a que o prédio dispusesse de uma caixa de ar, que permitisse que a mesma não contactasse directamente com o solo». * Apreciando e decidindo. Invocam os recorrentes que a sentença enferma da nulidade prevista no artº. 615º, nº. 1, al. d) do CPC, por o Tribunal “a quo” ter conhecido de questões de que não podia tomar conhecimento (excesso de pronúncia), ou seja: - à luz do artº. 333º do Código Civil julgou verificada a excepção da caducidade, decidindo ser a mesma de conhecimento oficioso, e com esse fundamento absolveu a Ré GG do pedido, sendo que esta Ré, na sua contestação, não invocou a caducidade da acção, quando o poderia ter feito, não podendo o Tribunal conhecer oficiosamente da caducidade nos termos da supra citada disposição legal, porquanto a matéria em causa não está excluída da disponibilidade das partes, aplicando-se o regime do artº. 303º “ex vi” do artº. 333º, nº. 2 do Código Civil; - conheceu a excepção da ilegitimidade e, em consequência, absolveu os 1º, 2º e 3º RR., quando nenhum daqueles RR. excepcionou a respectiva ilegitimidade por serem alheios à relação material controvertida. De acordo com o disposto no artº. 615º, nº. 1 al. d) do NCPC e na parte que ora nos interessa, a sentença é nula (por excesso de pronúncia) quando o juiz se pronuncia sobre questões que nenhuma das partes suscitou no processo e de que não podia tomar conhecimento. Esta é a sanção para o desrespeito da norma do artº. 608º, n.º 2, 2ª parte do NCPC (correspondente ao artº. 660º, nº. 2 do anterior CPC), que estabelece que o juiz só pode ocupar-se das questões suscitadas pelas partes, salvo tratando-se de questões do conhecimento oficioso do Tribunal. Dito de outro modo: Sem embargo da apreciação das questões que sejam de conhecimento oficioso, o juiz deve limitar-se às questões que tenham sido invocadas, evitando, deste modo, a nulidade da sentença por excesso de pronúncia, nos termos do artº. 615º, nº. 1, al. d), in fine do NCPC. Voltando ao caso dos autos, no que concerne à questão da ilegitimidade, como bem referem os recorrentes, nenhum dos RR. invocou a sua ilegitimidade por serem alheios à relação material controvertida. No entanto, pese embora a ilegitimidade seja uma excepção dilatória de conhecimento oficioso (artºs 577º, al. e) e 578º do NCPC, correspondentes aos artºs 494º, al. e) e 495º do anterior CPC), não vislumbramos que a sentença recorrida tenha conhecido da excepção da ilegitimidade, como referem os recorrentes nas suas conclusões, independentemente de ter sido ou não suscitada. É um facto que a sentença recorrida, a dada altura, refere o seguinte: «Relativamente aos restantes RR. [referindo-se aos 1º, 2º e 3º RR.], pese embora a actuação dos mesmos descrita na matéria de facto provada, tendo em consideração o que referimos supra relativamente ao regime jurídico aplicável à presente situação, não vislumbramos a fonte de natureza contratual ou legal de onde resulta a obrigação destes em indemnizar os AA. As relações e obrigações por estes estabelecidas foram-no com a 4ª R., a vendedora, e não com os AA.». Contudo, entendemos que aqui o Tribunal “a quo” não estava a pronunciar-se sobre a legitimidade dos RR. para serem demandados na presente acção, a qual nunca foi questionada, mas antes a explicitar, em face da factualidade apurada e do regime jurídico aplicável “in casu” (o do contrato de compra e venda), que não vislumbrava a existência de qualquer fonte de natureza contratual ou legal da qual resultasse a obrigação daqueles RR. virem a indemnizar os AA., tanto mais que as relações obrigacionais haviam sido estabelecidas entre estes e a 4ª Ré – afirmação esta que tem a ver com a procedência da acção em relação àqueles RR., e não com a questão da respectiva legitimidade, o que, aliás, determinou que os mesmos fossem absolvidos do pedido. Assim, em relação a esta questão, não se verifica o alegado vício formal da sentença recorrida, consistente no excesso de pronúncia. Relativamente à questão da caducidade, importa referir que a Ré GG, na sua contestação, não invocou a caducidade do direito de acção, não se tendo defendido por excepção. Ora, como decorre do nº. 1 do artº. 333º do Código Civil, a caducidade não é apreciada oficiosamente pelo Tribunal em matéria não excluída da disponibilidade das partes, ou seja, em matéria que verse sobre direitos disponíveis. O Tribunal deve conhecer oficiosamente das excepções peremptórias cuja invocação a lei não deixe dependente da vontade do interessado, ou seja, quando se trate de matéria que, por razões de interesse público, verse sobre relações jurídicas indisponíveis (cfr. artº. 579º do NCPC, correspondente ao artº. 496º do anterior CPC). Nos restantes casos (matéria não excluída da disponibilidade das partes), o seu conhecimento está dependente da invocação pela parte que delas pretende aproveitar (artº. 303º “ex vi” do artº. 333º, nº. 2 do Código Civil) – neste sentido vide acórdãos do STJ de 22/06/2005, proc. nº. 05A1735 e da RL de 19/02/2002, proc. nº. 00127097, acessíveis em www.dgsi.pt.
No caso em apreço e por força do disposto no artº. 333º, nº. 2 do Código Civil, uma vez que não se trata de matéria excluída da disponibilidade das partes, aplica-se a norma do artº. 303º do mesmo Código, pelo que a caducidade tem de ser invocada por aquela parte a quem aproveita, não sendo de conhecimento oficioso. Decidindo como decidiu, neste particular, a sentença recorrida, esta violou o disposto nos supra mencionados artºs 333º e 303º do Código Civil e 579º do NCPC, sendo, por isso, nula nos termos do artº. 615º, nº. 1, al. d) do NCPC, porquanto é manifesto que o Tribunal “a quo” conheceu de uma questão (caducidade do direito de acção) de que não podia tomar conhecimento. Assim, padecendo a sentença recorrida da referida nulidade que lhe é imputada pelos recorrentes, terá a mesma de ser revogada, devendo ser proferida nova sentença com base na matéria de facto dada como provada (que não foi colocada em crise por nenhuma das partes), e expurgada da questão da caducidade.
Por tudo o que se deixou exposto, terá de ser julgado procedente o recurso interposto pelos Autores. III. DECISÃO Em face do exposto e concluindo, acordam os Juízes da Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora em julgar procedente o recurso de apelação interposto pelos Autores BB e CC e, em consequência, revogar a sentença recorrida por estar ferida de nulidade, determinando que seja proferida uma nova sentença, com base na matéria de facto dada como provada (que não foi colocada em crise por nenhuma das partes), e expurgada da questão da caducidade. Custas pelos recorridos. |