Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
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| Relator: | ACÁCIO ANDRÉ PROENÇA | ||
| Descritores: | CONTRATO DE TRABALHO DESPEDIMENTO FALTAS | ||
| Data do Acordão: | 04/24/2014 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
| Sumário: | I. Discutindo-se apenas a prova do motivo justificativo das faltas dadas num determinado período, tendo a trabalhadora apresentado à entidade empregadora declaração emitida pela médica de família (centro de saúde) comprovando a sua situação de doença nesse período e tendo o médico do trabalho da empresa declarado, em exame realizado logo após apresentação ao serviço findo aquele período, que a trabalhadora estava “apta condicionalmente” reconhecendo-lhe algumas limitações, não podem as faltas dadas no aludido período ser consideradas injustificadas com base num exame de verificação da situação de doença realizado nos serviços da segurança social (em que foi deliberado que não subsistia a incapacidade da trabalhadora a partir de determinada data) respeitando este exame a uma situação de doença da trabalhadora relativa a um período anterior. II. Tendo as faltas dadas nesse período sido consideradas injustificadas pela entidade patronal e constituído o único fundamento para esta despedir a trabalhadora com invocação de justa causa, tem de considerar-se ilícito o despedimento por aquela decretado por não subsistir o fundamento para o efeito invocado. III. Ainda que tais faltas fossem consideradas injustificadas, elas não integrariam justa causa de despedimento por não resultarem provadas circunstâncias que permitam concluir pela impossibilidade prática de subsistência da relação de trabalho. (Sumário elaborado pelo Relator) | ||
| Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora: No Tribunal de Trabalho de Portimão, BB veio intentar a presente ação especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento contra CC, em formulário próprio, requerendo que seja declarada a ilicitude ou a irregularidade do despedimento, com as legais consequências. Frustrada tentativa de conciliação que teve lugar, veio a Ré apresentar articulado motivador do despedimento para pugnar pela licitude e regularidade do procedimento disciplinar e da sanção aplicada, alegando em síntese que o procedimento respeitou todas as exigências legais e que na origem do processo disciplinar esteve o facto de a Ré ter, no decurso de baixa médica prolongada da autora, solicitado aos serviços da segurança social a fiscalização da incapacidade da Autora; esta compareceu ao referido exame, tendo os serviços deliberado a não subsistência da incapacidade, o que foi comunicado à Autora e à Ré; face a tal decisão, a Autora não requereu a reapreciação em 24 horas e não compareceu ao trabalho;- A Autora depois de 18/09/2012 apresentou prorrogação da baixa desde 17/09/2012 até 1/10/2012 e continuou a não comparecer ao serviço, comparência que só se verificou em 2/10/2012; sustenta que as faltas de 18/09/2012 até ao dia em que retomou o serviço, a 2/10/2012, não estão justificadas, o que torna lícito o despedimento da Autora nelas fundamentado. A Autora apresentou contestação para pugnar pela ilicitude do despedimento e formular pedido reconvencional de condenação da Ré na indemnização de antiguidade e nas retribuições vencidas desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão que declare a ilicitude do despedimento. No essencial, invocando a nulidade da nota de culpa (por falta de indicação dos dias e dos períodos em que terá faltado) e que as faltas estão justificadas, pois que a decisão da segurança social teve apenas o efeito de determinar a suspensão do subsídio de doença, estando a ausência da trabalhadora justificada pela declaração médica de baixa passada pela médica de família, sendo que se apresentou ao serviço ainda dentro do prazo que lhe era concedido para solicitar uma reavaliação da decisão da comissão da segurança social. Respondeu a Ré para pugnar pela improcedência das exceções deduzidas pela Autora bem como do pedido reconvencional. Realizou-se a audiência de julgamento e no respectivo termo foi proferido despacho fixando a matéria de facto que resultou provada e não provada. Depois foi proferida sentença julgando a ação totalmente procedente, declarando ilícito o despedimento da Autora e condenando a Ré a pagar-lhe a indemnização de 30 dias de retribuição base (€663,00) por cada ano completo de antiguidade ou fração (fixada desde 16/05/2008 até ao trânsito em julgado da presente decisão) e as retribuições vencidas e vincendas que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão, nos termos do artigo 390º, nº 1, do Código do Trabalho. Inconformada com o assim decidido apelou a Ré para esta Relação rematando a respectiva alegação com as seguintes conclusões: 1.A douta sentença recorrida analisando os autos de processo laboral supra concluiu pela ilicitude da aplicação da sanção de despedimento no caso em apreço. 2.A matéria de facto provada (designadamente os artºs 8º a 16º e 20º supra transcritos e que aqui se dão por integralmente reproduzidos) importaria necessariamente decisão diversa, bem como se afigura ter havido incorreta interpretação de Direito. 3.Na apreciação da matéria de facto provada entendeu o douto tribunal a quo considerar que efetivamente a recorrida não trabalhou de 18 de setembro a 1 de outubro, não obstante, concluiu o douto tribunal que tendo a recorrida apresentado declaração médica de prorrogação de baixa emitida pela médica de família, se encontrariam devidamente justificadas as ausências nos dias em apreço, afastando assim o diagnóstico da junta médica de verificação de incapacidade para a prestação de trabalho e em face de tal entendimento a douta sentença proferida concluiu pela inexistência de culpa da Recorrida e declarou o despedimento ilícito. 4.Não se afigura consentânea com o regime legal estabelecido na Lei nº 7/2009, a possibilidade de considerar justificadas ausências por mera declaração médica de prorrogação de baixa em contradição com declaração de insubsistência de incapacidade temporária para o trabalho proferida pela junta médica da Segurança Social. 5.O regime legal estabelecido na lei nº 7/2009 é claro no sentido de determinar que uma vez declarada a não subsistência de incapacidade temporária para o trabalho, tal diagnóstico médico apenas pode ser alterado pela intervenção da comissão de reavaliação, o que não sucedeu no caso em apreço. 6.A recorrida não solicitou a intervenção da comissão de reavaliação, tendo antes obtido declaração da médica de família prorrogando a baixa anterior. 7.Existindo procedimento específico de reavaliação, não pode o diagnóstico da junta médica designada pela Segurança Social afastada por declaração médica do clínico de medicina geral, sob pena de assim se mostrar desprover de efeito útil e se defraudar o procedimento legalmente estabelecido. 8.A ser acolhida a tese de afastamento da decisão da junta médica de aptidão do trabalhador por meio de baixa médica obtida junto do médico de família perde-se o efeito dissuasor das denominadas baixas fraudulentas, porquanto o empregador se vê desprovido de meio de combate a tal comportamento absentista não justificado. 9.Sendo certo que o entendimento sufragado na douta sentença recorrida pode dar origem à situação caricata de um comportamento absentista reiterado por parte do trabalhador ao se mostra o empregador incapacitado de fazer cessar, basta imaginar a seguinte situação:: o trabalhador inicia período de baixa médica, a empregadora solicita a sua verificação, o trabalhador é declarado apto para o trabalho mas não comparece e apresenta nova baixa médica, uma vez que no entendimento sufragado tal declaração servirá como justificação das ausências, resta ao empregador solicitar nova verificação, podendo suceder que o trabalhador é declarado apto, mas não comparece e apresenta nova baixa médica e assim sucessivamente, e de forma aparente sem qualquer limite de vezes que esta situação se poderá repetir. 10.Tal entendimento não pode proceder, sob pena de o mesmo servir para retirar sentido e utilidade ao regime de verificação de baixas médicas previsto na Lei nº 7/2012. 11. Mal andou o tribunal ao considerar como justificadas as datas de ausência sustentadas na declaração de prorrogação de baixa emitidas pela médica de família na sequência da junta médica efetuada, devendo em consequência ser revogada a douta sentença proferida a este propósito. 12.Não poderia o douto tribunal a quo ter concluído pela ausência de culpa no comportamento da recorrida porquanto os fundamentos de justa caus de despedimento expressamente previstos no artº 351º do CT constituem situação cuja verificação objetiva importam implicitamente um pré entendimento ede existência de uma grau de culpabilidade que não é possível afastar, ai se incluindo manifestamente a justa causa por faltas injustificadas em número de cinco seguidas ou 10 interpoladas no ano civil. Neste sentido, o acórdão do Venerando Supremo Tribunal de Justiça, proferido em 2 de Dezembro de 2010, nos autos de processo 637/08.0TTBRG.P1.S1, que teve por relator o Juiz Conselheiro Sousa Grandão, (aresto disponível para consulta em www.dgsi.pt) no qual pode ler-se “XI-As faltas, sendo injustificadas, integram um comportamento ilícito, presumindo-se a culpa do trabalhador (artº 799º, nº 1 do Código Civil)”. 13. Afigura-se assim que a mera obtenção de prorrogação de justificação médica de baixa não configura fundamento bastante para afastar a presunção de culpa. 14.Encontrando-se devidamente preenchidos os pressupostos de verificação de existência de justa causa de despedimento nos termos do artº 351º, al. g) do CT, os quais não foram afastados pela Recorrida, e tendo o doutro tribunal a quio concluído pela verificação de ausência entre 18 de setembro e 1 de outubro, deveria ter sido proferida sentença declarando a licitude do despedimento. 15.Perante o exposto, requer-se a este Venerando Tribunal a revogação da douta sentença recorrida e a sua substituição por outra que declare a licitude do despedimento. Termina pedido a revogação da sentença recorrida e a sua substituição por outra que absolva a Recorrente. Respondeu a Autora para pugnar pela confirmação da decisão recorrida. Admitido o recurso os autos subiram a esta Relação e foram presentes à digna magistrada do Ministério Público que emitiu douto parecer no sentido da confirmação do julgado, que mereceu resposta de ambas as partes, a da Autora congratulando-se com tal parecer e a Ré para reiterar quanto afirmou na respectiva alegação de recurso. O relator elaborou projeto de acórdão que submeteu aos ilustres colegas e, com o acordo destes, foram dispensados os vistos. Cumpre decidir. * A decisão recorrida assentou na seguinte factualidade, que não vem impugnada e relativamente à qual este tribunal entende não se verificarem os pressupostos que permitem a respectivo alteração pelo que se considera definitivamente fixada:1. Foi determinada, por despacho datado de 19 de Dezembro de 2012, subscrito pela Direção de Relações Laborais da Empregadora, a instauração de procedimento disciplinar. 2. Por carta datada de 22 de Janeiro de 2013, registada com aviso de receção (não reclamada na estação de correios) e repetida, com entrega em mão, em 11 de Fevereiro de 2013, foi a Trabalhadora notificada da nota de culpa, da possibilidade de consulta dos autos de procedimento disciplinar, do prazo de que dispunha para responder à mesma, sendo ainda informada da intenção da Empregadora proceder ao seu despedimento com justa causa. 3. À nota de culpa veio a Trabalhadora responder, requerendo a junção aos autos de 11 documentos, não requerendo a realização de qualquer diligência probatória e concluindo com pedido de arquivamento dos autos. 4. Inexistindo diligências probatórias requeridas pela Trabalhadora ou quaisquer outras diligências tidas por pertinentes, além das já previamente efetuadas nos autos, foi proferido relatório final no qual o instrutor nomeado concluiu, a final, pela adequação da aplicação da sanção de despedimento com justa causa. 5. Em 14 de Março de 2013, em face da proposta de decisão proferida pelo instrutor nomeado a Empregadora proferiu decisão final de despedimento com justa causa que comunicou à Trabalhadora por meio de carta registada com aviso de receção. 6. A Trabalhadora é colaboradora do CC e exercia funções na loja de Portimão Recomar. 7. A Trabalhadora encontrava-se de baixa prolongada desde de Fevereiro de 2012. 8. No decurso de um dos períodos de baixa da Trabalhadora que decorria de 18-08-2012 até 16-09-2012, foi solicitado aos serviços competentes da Segurança Social a fiscalização da incapacidade da Trabalhadora. 9.Tendo os serviços da Segurança social convocado a Trabalhadora para um exame médico pericial no dia 18 de Setembro de 2012. 10. No dia 17 de Setembro de 2012 a Autora esteve numa consulta com a sua médica de família e, nesse mesmo dia, recebeu um telegrama da segurança social a convocá-la para o exame da comissão de verificação de 18 de Setembro de 2012. 11. A Trabalhadora compareceu ao referido exame. 12. Em tal comissão foi deliberada a não subsistência da incapacidade temporária para o trabalho a partir de 18/09/2012, tendo sido informado à ora Autora, através de notificação com o seguinte teor: “notifica-se V. Ex.ª de que a não subsistência da incapacidade temporária para o trabalho determina a suspensão do subsídio de doença em curso, o qual cessará, nomeadamente, se não for requerida a intervenção da comissão de reavaliação (alínea d) do n.º 2 do art.º 24.º e alínea d) do art.º 41 do Decreto-Lei n.º 28/2004, de 4 de Fevereiro). Mais se informa que a deliberação da comissão de verificação é susceptível de reavaliação, desde que se verifiquem as seguintes condições: manutenção da situação de incapacidade pelos serviços de saúde; requerimento da reavaliação da deliberação, dirigido ao serviço de segurança social da área da residência, no prazo de 10 dias úteis, a contar da data da respectivo comunicação, acompanhado de fundamentação médica atendível. Informa-se, ainda, que: poderá designar um médico para o representar na comissão de reavaliação. Caso o não faça a Comissão funcionará com dois médicos designados por este serviço. As despesas com a comissão de reavaliação, quando a deliberação for desfavorável, são da responsabilidade do beneficiário. Se o exame médico se realizar no corrente ano o valor a pagar é de 28,70 Euros”. 13. Facto de que a Trabalhadora foi devidamente e de imediato notificada e de que foi dado conhecimento à entidade patronal. 14. A Trabalhadora não requereu a reapreciação do seu caso por uma comissão de reavaliação e não se apresentou ao serviço no dia 19 de Setembro de 2012. 15. A Trabalhadora apresentou à Ré uma prorrogação da baixa desde o dia 17/09/2012 a 1/10/2012, emitida pela sua médica de família. 16. A Trabalhadora só voltou a comparecer na loja no dia 29 de Setembro, mas tão só para avisar que no dia 2 de Outubro ia começar a trabalhar, mas que tinha limitações para diversas tarefas, conforme declaração médica que trazia. 17. Tendo a Trabalhadora sido avisada de que as limitações teriam que ser apuradas pelo médico de trabalho que veria a Trabalhadora no dia em que ela retomasse o serviço. 18. A Autora foi avaliada pelo médico de trabalho a pedido da Ré no dia 3 de Outubro de 2012. 19. Resultou do exame feito pelo médico de trabalho a 3 de Outubro de 2012, a pedido da ora Ré, que a Autora estava “apta condicionalmente”, tendo este recomendado que esta não deveria fazer cargas/esforços, evitar movimentos repetidos com os membros superiores. Deve evitar longos períodos em pé”. 20. A trabalhadora, ora Autora, não compareceu ao serviço desde o dia 18 de Setembro de 2012 até dia 2 de Outubro de 2012. 21. A Autora foi admitida em 16/05/2008 e auferia a retribuição mensal de € 663,00. * Como se retira das conclusões da respectivo alegação, que delimitam o objeto do recurso, a recorrente vem sustentar a licitude do despedimento da Autora na base de que, contrariamente ao entendimento da sentença recorrida, as faltas dadas pela Autora devem ser consideradas injustificadas e, porque a situação se integra num dos fundamentos de justa causa de despedimento expressamente previstos no artº 351º do CT, a culpa da Autora deve presumir-se, não podendo considerar-se afastada tal presunção com a obtenção de declaração de prorrogação de baixa, declaração esta que também não pode afastar, para efeitos de justificação das faltas, o diagnóstico de insubsistência de incapacidade temporária da Autora declarado pela junta médica da segurança social.Vejamos. Indubitavelmente as faltas dadas pela Autora que fundamentaram o procedimento disciplinar e a decisão de despedimento por iniciativa da Ré com invocação de justa causa respeitam ao período consecutivo decorrido desde o dia 18 de setembro até ao dia 1 de outubro, ambos de 2012, inserindo-se num período de baixa médica prolongada da Autora que se arrastava desde Fevereiro do mesmo ano. Como resultou provado, a Autora faltou efetivamente ao serviço no referido período; porém, relativamente ao período decorrido entre 17 de setembro e 1 de outubro, a Autora apresentou à Ré uma prorrogação dessa baixa emitida pela sua médica de família; ou seja, a Autora, não se sabe se por iniciativa própria se por exigência da Ré, comprovou a sua situação de doença nos termos exigidos pelo nº 2 do artº 254º do CT. Embora se desconheça qual fosse o período normal de trabalho da Autora bem como qual fosse o respectivo horário de trabalho, é de presumir que eram respeitados os limites legalmente estabelecidos e, portanto, que aquele período não excedia as oito horas diárias e as quarenta horas semanais (artº 203, nº 1 do CT); dado que está em causa um período de 14 dias seguidos, é óbvio que se as faltas dadas pela Autora forem consideradas injustificadas, o número de faltas ultrapassará manifestamente os cinco dias seguidos no mesmo ano civil, ainda que descontados os dias de descanso interdecorrentes, com o que ficará preenchida a previsão da al. g) do nº 2 do artº 351º do CT. A questão da justificação ou não das faltas em questão coloca-se tão só perante o pedido que foi dirigido aos serviços competentes da Segurança Social para fiscalização da incapacidade da Autora, precisamente quando decorria um dos períodos de baixa (entre 18/08/2012 e 16/09/2012). Efetivamente, a situação de doença que o trabalhador comprove nos termos do nº2 do artº 254º do CT, pode ser verificada por médico (nº 3 do mesmo preceito), a pedido do empregador (vide nº 1 do artº 17º da Lei nº 105/2009 de 14/09, diploma este que regulamenta o referido nº 3 do artº 254º do CT). Na sequência desse pedido, os serviços da Segurança social convocaram a Autora para um exame médico no dia 18 de Setembro de 2012, ao qual ela compareceu, tendo a comissão de avaliação deliberado que a Autora a partir de 18 de setembro não se mantinha na situação de incapacidade temporária para o trabalho, do que a Autora foi notificada nesse mesmo dia e do que foi dado conhecimento à entidade patronal. Quando a deliberação da comissão de verificação divirja da declaração ou atestado apresentado pelo trabalhador para comprovar a situação de doença, qualquer das partes pode requerer que o caso seja apreciado por uma comissão de reavaliação (artº 19º, nº 1 da referida lei nº 105/2009); as partes dispõem do prazo de 24 horas subsequentes ao conhecimento da deliberação da comissão de verificação para requerer aquela reapreciação (nº 1 do artº 20º); decorre ainda do artº 22º da mesma lei que “O Empregador não pode fundamentar qualquer decisão desfavorável para o trabalhador no resultado da verificação da situação de incapacidade temporária para o trabalho por doença, efetuada nos termos dos artigos 17.º ou 18.º, enquanto decorrer o prazo para requerer a reavaliação ou, se esta for requerida, até à decisão final”. Acontece que a Autora, quando notificada da deliberação da comissão de verificação, foi advertida de que dispunha do prazo de 10 dias úteis para requerer a reavaliação daquela deliberação; o certo é que a Autora não requereu a reapreciação do seu caso por uma comissão de reavaliação, mas também não se apresentou ao serviço no dia 19 de Setembro de 2012 assim continuando a proceder até ao dia 1 de outubro seguinte, só se apresentando em 2 de outubro. Pese embora, como se referiu, as faltas que se questionam nos autos tenham ocorrido desde 18 de setembro a 1 de outubro de 2012 (foi com base nas faltas dadas nesse período que a Ré puniu disciplinarmente a Autora com a sanção de despedimento com justa causa), resulta claro da factualidade provada que o pedido de verificação da doença que foi solicitado aos serviços competentes da segurança social respeitava a um período anterior. Efetivamente, como resulta do ponto 8. da factualidade provada, foi no decurso do período de baixa que decorria entre 18/08/2012 até 16/09/2012, que foi feito aquele pedido, o que significa, que a situação de doença que se pretendia fosse verificada respeitava a uma situação de doença invocada pela Autora relativamente a esse período e que esta teria comprovado pela apresentação da declaração a que alude o artº 254º, nº 2 do CT. Ora, como é bom de ver, se a situação de doença respeitava ao período que decorria entre 18/08/2012 e 16/09/2012 e o documento apresentado pela Autora para a comprovar era a ele atinente, a intervenção da comissão de verificação tinha também de respeitar a esse período. Na verdade, o que se pretendia verificar era se a Autora estava ou esteve efetivamente doente e incapacitada para trabalhar no período em referência e não em qualquer outro momento, mormente no período que se seguiria, pois que relativamente a este, como é lógico, nada podia ser verificado e seria premonitório ou futurista o que a comissão de verificação opinasse. Ora, como se retira do ponto 12. da matéria de facto provada, a comissão de verificação não se pronunciou sobre a situação de saúde da Autora no período que estava em referência, mas pronunciou-se apenas para o futuro quando deliberou “a não subsistência da incapacidade para o trabalho a partir de 18/09/2012”, ou seja, a comissão não verificou, como lhe competia, se a Autora no período em questão estava ou não em situação de doença. A realidade é que a Autora continuou a sentir-se doente e apresentou à Ré novo certificado de incapacidade temporária para o trabalho por estado de doença para o período de 17/09/2012 a 1/10/2012, emitido pela sua médica de família do Centro de Saúde de Portimão (vide doc. de fls 76 e de fls. 130 dos autos) Ora, relativamente a tal documento comprovativo da situação de doença da Autora, não foi requerida pela Ré, que se saiba, qualquer verificação nos termos do nº 3 do artº 254º do CT, sendo certo que as faltas cuja justificação se questiona estão abrangidas pelo período temporal a que aquele documento respeita. Por isso, não pode dizer-se que quanto à prova da situação de doença relativamente a esse período que a Autora apresentou, a Ré tenha obtido prova em sentido contrário por verificação dos serviços competentes da segurança social. Porém, um outro elemento coadjuva no sentido de confirmar a situação de doença da Autora. De facto, a Autora apresentou-se ao serviço em 2/10/2012 e logo no dia seguinte, a pedido da Ré, foi avaliada pelo médico do trabalho da empresa que a considerou “apta condicionalmente”, recomendando que esta não deveria fazer cargas/esforços, evitar movimentos repetidos com os membros superiores e evitar longos períodos de pé. Ora, convenhamos, se em 3/10/2012 a Autora apresentava ainda as referidas limitações, a sua situação não seria mais gravosa no período abrangido pela baixa médica imediatamente anterior em que se integra o período a que as faltas em questão se reportam?. De qualquer forma, tal opinião do médico do trabalho comprova, em nosso ver, um estado de diminuição física da Autora por qualquer doença que a afetava à data em que se apresentou ao serviço e a subsistência de alguma incapacidade que obrigaria a alguma adaptação funcional. Neste contexto, consideramos, outra não poderá ser a conclusão do que considerar verificada a situação de doença da Autora e, face ao documento comprovativo que apresentou, considerá-la incapacitada para o trabalho no período a que as faltas em causa se reportam e, por isso, justificadas as faltas que deu nesse período. Perante tal conclusão, é óbvio que não se verificava o fundamento invocado pela Ré para despedir a Autora, o que conduz a que, agora, se reconheça a ilicitude do despedimento com que foi sancionada pela Ré, como, aliás, se concluiu na decisão recorrida. Porém, mesmo que por qualquer razão as faltas em causa tivessem de considerar-se injustificadas, consideramos que as circunstâncias que as rodearam, em face do que resultou provado, não permitem considerar verificado conceito de justa causa de despedimento a que alude o artº 351º, nº 1 do CT. Efetivamente, para preenchimento do conceito genérico de justa causa contemplado naquele preceito é necessário que concorram três elementos essenciais: a)- elemento subjetivo: traduzido num comportamento ilícito, culposo e grave do trabalhador por ação ou omissão; b)- elemento objetivo: que se traduz numa situação de impossibilidade prática e imediata de subsistência da relação de trabalho;c)- um nexo de causalidade entre aquele comportamento e esta impossibilidade. Na base da justa causa há-de estar um comportamento culposo do trabalhador, mas que por si só não constitui a situação de justa causa; decisivo é averiguar se esse comportamento foi de tal forma grave que tenha por consequência tornar impossível a prossecução da relação laboral. Daí que, como tem sido entendido pela doutrina e jurisprudência, a mera verificação de qualquer dos comportamentos elencados no nº 2 do referido artº 351º seja insuficiente para decidir da existência de justa causa. A este propósito desenvolve a sentença recorrida judiciosas considerações que, por com elas concordarmos, nos abstemos de aqui reproduzir. Insistimos, no entanto, em que a justa causa no conceito legal se traduz numa situação de impossibilidade prática, de inexigibilidade no confronto dos interesses opostos das partes – essencialmente o da urgência da desvinculação do empregador e o da conservação do vínculo por banda do trabalhador. E de tal sorte que, face à vocação de perenidade subjacente à relação de trabalho, apenas se justifica o recurso à sanção expulsiva ou rescisória que o despedimento configura, quando se revelarem inadequadas para o caso as medidas conservatórias ou corretivas, representando a continuidade do vínculo laboral uma insuportável e injusta imposição ao empregador. Ora, no caso, mesmo que as faltas dadas pela Autora se reputassem de injustificadas e que por isso ela tivesse violado o dever de assiduidade, não bastava, para o preenchimento do conceito de justa causa de despedimento, a simples materialidade das faltas injustificadas, sendo necessária a demonstração do comportamento culposo do trabalhador que se revestisse de gravidade e tornasse, pelas suas consequências, imediata e praticamente impossível a subsistência da relação laboral. Ora, a Autora vinha de um período de baixa prolongada que se arrastava desde fevereiro de 2012, derivando daí que, por a situação perdurar há mais de um mês, o contrato de trabalho se encontrava suspenso (artº 296º, nº 1 do CT). Por outro lado, mesmo relativamente ao período considerado de faltas a Autora apresentou documento justificativo respeitando as exigências de prova referidas no n.º 2, do artigo 254.º do mesmo Código. Além disso, o médico do trabalho da empresa verificou que a Autora, no dia imediato ao da sua apresentação ao serviço, ainda não estava totalmente apta a todo o serviço. Neste contexto, seria impossível descortinar no comportamento faltoso da Autora a tal culpa grave a que a lei se refere. Acresce referir que a Ré nada logrou provar quanto às consequências advindas da ausência da Autora para o funcionamento da empresa Ré ou do estabelecimento explorado pela Ré, que fossem suscetíveis de justificar a rutura imediata do vínculo laboral ou que pudessem por em causa a confiança que deve presidir às relações laborais; de resto, a matéria de facto provada também não evidencia nenhuma das circunstâncias a que a lei manda atender na apreciação da justa causa (artº 351º, nº 3 do CT) por forma a viabilizar um raciocínio no sentido da sua verificação. Temos, assim, que mesmo na eventualidade da injustificação das faltas em causa, não é possível configurar o requisito da impossibilidade de subsistência da relação de trabalho, entendida esta no sentido de inexigibilidade para o empregador de prosseguir na relação. Posto isto resta concluir que o despedimento da Autora ocorreu sem justa causa, o que acarreta a respetiva ilicitude. Assim decidiu a sentença recorrida e, como tal, é de manter, improcedendo o recurso já que nele apenas se questionava essa parte da decisão. * Termos em que acordam os juízes na Secção Social desta Relação em julgar a apelação improcedente e confirmar a sentença recorrida.Custas pela recorrente. * Évora,24/04/2014(Acácio André Proença) (José António Santos Feteira) (Paula Maria Videira do Paço) |