Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | ALMEIDA SIMÕES | ||
Descritores: | SIMULAÇÃO | ||
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Data do Acordão: | 01/11/2007 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO CÍVEL | ||
Decisão: | CONFIRMADA A SENTENÇA | ||
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Sumário: | A simulação consiste num desacordo intencional entre a vontade real e a declarada, determinada pelo intuito de enganar terceiros. | ||
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Decisão Texto Integral: | * “A”, engenheiro, demandou, no Tribunal de …, “B”, advogado, e mulher “C”, pedindo a declaração de nulidade, por simulação, nos termos do artigo 240° do Código Civil, do contrato de compra e venda outorgado por escritura pública celebrada no cartório notarial de …, em 26 de Novembro de 1999, relativo a um prédio misto sito em … e … ou …, freguesia de …, concelho de …, descrito na Conservatória do Registo Predial de …, sob o nº 907, de …, bem como a condenação dos réus no pagamento dos respectivos registos e na quantia de 2.800.000$00, correspondente aos frutos já percebidos, acrescida de juros de mora desde a citação. PROCESSO Nº 2757/05 ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA * Alegou, no essencial, que o réu marido patrocinou “D”, irmão do autor, no inventário aberto por morte dos pais de ambos, tendo licitado, em nome do seu constituinte, o prédio atrás referido, pelo valor de 3.500.000$00. Tendo seu irmão falecido a 2 de Janeiro de 2000, o autor é agora seu único e universal herdeiro. No entanto, o irmão do autor passou procuração, em 15 de Julho de 1999, ao réu marido, apesar de já se encontrar muito doente e debilitado, atribuindo-lhe poderes para alienar o prédio em causa, incluindo o de celebrar negócio consigo mesmo, o que permitiu ao mesmo réu adquiri-lo pelo preço declarado de 2.000.000$00, intervindo na escritura como comprador e na qualidade de representante do vendedor, sendo que a escritura teve lugar dois dias antes do internamento hospitalar do irmão do autor, que se encontrava em condições de grande degradação física e intelectual, mantendo-se no hospital até à sua morte. Acresce que o seu irmão nunca recebeu qualquer importância pela venda, que o réu nunca apresentou nota de honorários e que o valor declarado na escritura. é muito inferior ao valor de mercado, uma vez que o imóvel vale entre 38.000.000$00 e 40.600.000$00, tendo o réu marido arrecadado 2.800.000$00, em Agosto de 2000, pela venda de 400 arrobas de cortiça. Na contestação, os réus excepcionaram a legitimidade do autor para a acção e negaram a existência de acordo simulatório, referindo que o prédio valia cerca de 6.000.000$00, mas que o réu marido, que é advogado, era credor de honorários, pelo que o irmão do autor acordou receber apenas 2.000.000$00 pela venda do prédio, de modo a saldar a dívida, estando ele, na altura, na posse de todas as sua faculdades mentais. Impugnaram ainda o valor da venda da cortiça, estimando-a em cerca de 400.000$00. Houve réplica e lavrou-se despacho saneador a julgar, para além do mais, improcedente a excepção de (i)legitimidade, tendo sido também descritos os factos assentes e organizada a base instrutória (Os réus agravaram da decisão que julgou o autor parte legítima, mas o recurso foi julgado deserto, por falta de alegações). Posteriormente, foi admitido um articulado superveniente apresentado pelo autor e aditado um novo artigo à base instrutória, vindo, depois, no início da audiência de julgamento a proceder-se a alteração da lista dos factos assentes e da base instrutória (fls. 246 e 462). Feito o julgamento, foi proferida sentença a julgar a acção improcedente, absolvendo-se os réus do pedido. Inconformado, o autor apelou, tendo alegado e formulado as conclusões que se transcrevem: A) No tocante à matéria de facto: 1ª. O presente recurso é interposto da sentença de fls., que julgou improcedente a presente acção, por entender que a putativa compra e venda não se encontra ferida de nulidade por vício de simulação, nem anulável por abuso de representação, nem que a conduta dos réus tenha lesado patrimonialmente e de modo injustificado a família do autor, pelo que também não os condenou a custearem os emolumentos destinados a regularização registral, nem a restituírem ao autor o valor dos frutos percebidos desde a pretensa alienação do imóvel em questão até à data da sua efectiva restituição ao proprietário. 2ª A factualidade dada como provada alicerçou-se, segundo o Tribunal, na análise crítica de toda a prova produzida. 3ª. É, todavia, entendimento do recorrente que os referidos meios de prova encarados de per si e conjugados com as regras da experiência comum não permitiam ao Tribunal dar como provada a matéria constante dos quesitos 8°, 11°, 12°, 13°, 15°, 16°, 17° e 19°, responder como respondeu aos nºs. 1, 5, 10, 17 e 18 da base instrutória, bem como considerar não provados os factos vertidos nos quesitos 2°, 3°, 4° e 21°. 4ª. Assim, foram incorrectamente julgados os factos constantes dos pontos acima referidos e, de uma forma geral, tudo o que ex-adverso ... 5a. Quanto ao valor da extracção da cortiça dado como provado nas respostas aos quesitos 5° e 18°, o mesmo não corresponde à prova produzida, porquanto, por um lado, o relatório dos peritos (doc. de fls. 290 e segs., mais concretamente fls. 294, e ainda esclarecimentos dos peritos quanto à extracção de 1999, insertos a fls. 346, 4° parágrafo) determinou o número de arrobas extraídas entre 1999 e 2002, concretamente 1010 @, sendo 201 @ de desboia, o que corresponde a uma média anual aproximada de 246 @, por outro, a testemunha dos RR, …, afirmou que pagou essa cortiça a Esc. 4.500$00 a arroba (Cassete 4 - lado A / Falas: 03.008 - 03.180 com as seguintes rotações: 02.978; 02.979 e 02.983) e ainda porque essa mesma testemunha afirmou que no ano de 1999 não foi extraída cortiça da propriedade em questão (Cassete 4 - lado A , Falas: 03.008 - 03.180 de rotações 02.898 e 02.948); 6a. Aliás, o réu, antes de "corrigir o tiro", e ter dito que recebeu pela cortiça 1.200 contos no ano de 2000 e 600 contos no ano de 2002, "fugiu-lhe a boca para a verdade" e, a instâncias da Sra. Juíza, revelou números mais consentâneos com a realidade das arrobas efectivamente extraídas e do valor líquido da arroba indicado pelo autor, de Esc. 8.000$00, ao invés dos meros Esc. 4.500$00 referidos pela testemunha do réu (Cassete 1 -lado A / Falas:00.236 - 00.186 de rotações 00.066). 7a. Assim, se tivermos em consideração os valores constantes do quadro inserto no relatório de peritagem (fls. 294) em apreço e tomando em conta a produção média indicada na sua última coluna (média de 246 @ / ano), obteremos os montantes que se indicam: a) Ano de 1999 a 2002 - 809 @ (920 @ - 201 @ de desboia) x 4.500 $/@ = Esc. 3.640.500$00 ou 18.158,74 euros; b) ou partindo da média: Ano de 1999 a 2002 - 246 @ / Ano = 4.280 contos ou 22.086,77 euros. 8a. Mesmo dando de barato um dado totalmente irreal e absurdo constante do relatório dos peritos que é a atribuição da produção de 120 @ de cortiça de desboia (cortiça virgem), em 2002, em montado, atendendo às características do povoamento existente no prédio (árvores quase tosas velhas), quando foram intervencionadas nesse ano mais de 300 árvores, bem como aceitar-se o valor de 4.500$00 líquido atribuído à arroba de cortiça, quando esse valor se situava, pelo menos, nos 8.000$00 / 10.000$00, como era facto público e notório em inúmeras publicações (jornais, revistas, artigos de opinião, televisão) quando tratavam do valor da cortiça na Serra de Monchique (Veja-se a este propósito algumas das passagens do depoimento de … , Cassete 3 - lado A - Cassete 3 - lado B / Falas: 01.945 - 02.567 de rotações 02.047; 02.049; 02.052; 02.057; 02.063; 02.065; 02.067; 02.069; 02.076; 02.077 02.079; 02.084; 02.089; 02.093; 02.097; 02.099; 02.100; 02.115; 02.116; 02.117; 02.149; 02.150; 02.156; 02.158; 02.159; 02.160; 02.162; 02.167; 02.288; 02.292; 02.293; 02.294; 02.304; 02.306; 02.308; 9a. Daí que os quesitos 5 e 18 devem merecer uma das seguintes respostas: a) De 1999 a 2002 foram extraídas 1010 @ de cortiça, sendo 201 @ de desboia que, na aproveitável, foi vendida a pelo menos 4.500$00 a arroba; b) ou, com recurso à equidade, o Tribunal pode facilmente concluir que da extracção da cortiça resultou para os réus um apuro líquido superior a Esc. 3.640.500$00 ou 18.158,74 euros. 10a. Também quanto à determinação do valor do prédio, o Tribunal errou, e bastava-lhe tão somente ter tomado atenção aos seguintes elementos: a) Portaria 980/95, de 22 de Março de 1996 aliada à Circular do I.F.A.D.A.P n°. 4/96, que entrou em vigor em 22MAR96; b) relatório do perito dos réus e do Tribunal de fls. 290 a 299; c) "esclarecimentos" destes peritos a fls. 345 a 347; d) relatório do perito do autor a fls. 312 a 323; e) documento de fls. 323; f) depoimento de … (Cassete 3 - lado A - Cassete 3 - lado B / Falas: 01.945 - 02.567) com as seguintes rotações: 01.976; 01.977; 01.979; 01.997; 01.998; 02.000; 02.004; 02.007; 02.008; 2.010; 02.012; 02.017; 02.020; 02.022; 02.122; 02.123; 02.125; 02.210; 02.211; 02.239; 02.242; 02.243; 02.244; 02.525; 02.531; 02.535; 02.553 e 02.555); g) e ainda o depoimento de … (Suporte(s): Cassete 1 - lado B - Cassete 2 - lado A / Falas: 00.789 - 01.208) de rotações 00.920; 00.923; 00.924; 00.926; 00.928; 00.929; 00.930; 00.932; 00.935; 00.936; 00.938; 00.986; 00.989; 01.030 e 01.038); 11ª. Face a todos estes elementos objectivos não se compreende nem se aceita porque é que o Tribunal a quo foi "levado" a considerar que o prédio sub judice valia apenas 89.654,00 euros, valor que essa Relação, naturalmente, nunca poderá aceitar, tanto mais que é fácil de vislumbrar no relatório assinado pelo perito dos réus e pelo perito do Tribunal, que estes dois senhores utilizaram uma taxa de cinco por cento para os casos que não têm rendimento, para os casos que têm rendimento utilizaram a taxa de sete por cento. Isto mereceu o natural comentário da testemunha … 02.012 "... não percebo!". E é mesmo para não perceber e, consequentemente, para não aceitar esta "engenharia financeira"; 12ª. Diversas Circulares do I.F.A.D.A.P, nomeadamente a nº. 4/96 que entrou em vigor em 22MAR96, impõem critérios de valorização de prédios rústicos para o Algarve, "terra nua", em concreto no concelho de Monchique, com uma variação de 2% a 5% e nunca de 7%, concluindo-se que o perito dos réus e do Tribunal assinaram um relatório contrário à própria lei e às instruções do Ministério da Agricultura. 13ª. Como é evidente, a aplicação de uma taxa de 7% para a valorização do prédio faz diminuir drasticamente o seu valor em mais de 36.000 euros ou 7.217.352$00, montante muito significativo e que não pode ser desprezado, pelo que o ora apelante, por requerimento entrado em juízo em 3-2-2003, tentando repor a verdade, pediu alguns esclarecimentos a estes peritos; 14ª. Por despacho de fls. 341, tal pedido foi deferido, nomeadamente ao ordenar que respondessem à Oitava questão onde, sumariamente, se perguntava, porque é que utilizaram uma taxa de 7% e não de 5%, e qual o valor do prédio se fosse aplicada uma taxa de 5% ? (o autor juntou com esse requerimento um documento (doc. 1), que corresponde a uma tabela publicada com o aval do Ministério da Agricultura demonstrativa de que o valor da terra "nua" no Algarve, nomeadamente em …, é obtido através de rendas máximas de 2% a 5%); 15ª. Os peritos do Tribunal e dos réus reconheceram alguns dos seus erros, mas recusaram-se a responder cabalmente à Oitava questão (vide fls. 346 in fine e 347). O Tribunal conformou-se com esta atitude de cândida desobediência e até parece tê-la premiado, quando aceitou como boa a resposta destes no que concerne ao valor do prédio. 16ª Face a esta recusa, o apelante irá demonstrar, por simples cálculo aritmético, qual era o valor real do prédio à data da virtual compra e venda, Novembro de 1999: - valor da Propriedade determinado à taxa uniforme de 5% (0,05): Parte Urbana Sub Total ------------------------------------- 19. 186,20 euros Parte Florestal Sobreiros 468,52 euros: 0,05 x 8,6560 ha = 81.110,18 euros (taxa capitalização 0,05) Eucaliptos 748,20 euros: 0,05 x 3,000 ha = 44.892,00 (taxa capitalização 0,05) Mato 673, 38 euros (taxa capitalização 0,05) C.A.R. 13.946,45 euros (taxa capitalização 0,05) Sub Total ------------------------------------- 140.622,01 euros Total ------------------------------------------ 159.8O8,21 euros 16ª. Verifica-se, deste modo, que a mera alteração da taxa de capitalização (no que respeita a duas das produções do prédio) de 0,07 para 0,05 aumenta o valor da propriedade em 36.000,65 euros (159.808,21 euros - 123.807,56 euros). 17ª. Nesta análise foi seguido o mesmíssimo processo de apresentação do cálculo efectuado pelos peritos dos réus e do Tribunal. Somente foi alterada a taxa de capitalização para 5% (0,05) nos dois casos em que por eles foi utilizado o valor de 7% (0,07), conforme se demonstrou através de fórmulas matemáticas plasmadas nas páginas 10 a 12 da presente alegação. 18ª. Donde, o quesito 10 deve merecer uma das seguintes respostas: a) O bem imóvel, objecto da escritura de compra e venda referida em "H", tinha naquela data, pelo menos o valor de 89.654,00 euros (num tratamento mais simplificado da questão); b) O bem imóvel, objecto da escritura de compra e venda referida em "H", tinha naquela data, o valor de 159.808,21 euros (numa análise mais profunda e rigorosa de todos os elementos objectivos citados supra). 19ª. No que concerne ao estado de saúde o recorrente reconhece que, à data da outorga de procuração, 15 de Julho de 1999, o seu irmão não se encontrava impossibilitado de gerir os seus negócios, bem como de entender e querer. 20ª. Pelo contrário, quando foi celebrada a escritura de compra e venda, a 26 de Novembro de 1999, o estado físico do seu irmão era já muito debilitado fisicamente. 21ª. Isto apesar de o irmão do apelante ter um quadro clínico preocupante muito anterior à data outorga da procuração, que se agravou substancialmente até ser internado no Hospital do Barlavento Algarvio, conforme se extrai das instâncias da Sr.a. Juíza à depoente … (Suporte(s): Cassete 1 - lado B / Falas: 00.695 - 00.717 com as seguintes rotações: 00.492 (Vide também doc. 8 junto com a p.i.), do depoimento do médico, … (Suporte(s): Cassete 3 - lado A Falas: 01.677 ~ 01.944 a rotações 01.798; 01.802; 01.805; 01.806; 01.808; 01.828; 01.867; 01; 01.873; 01.899; 01.903; 01.906; 01.908; 01.910; 01.912; 01.925; 01.926; 01.927; 01 01.929; 01.931; 01.933; 01.935; 01.936 e 01.937), e ainda do depoimento da testemunha, … (Suporte(s): Cassete 3 - lado B ~ Cassete 4 - lado A Falas: 02.568 ~ 02.843 com as seguintes rotações: 02.631; 02.632; 02.633; 02.634; 02.635; 02.637; 02.639; 02.642; 02.643; 02.645; 02.738; 02.739; 02.740; 02.741; 02.743 e 02.745), 22 ª. Deste modo, é no mínimo estranho que algumas testemunhas tenham, inicialmente, querido dar a impressão que o “D” era "são que nem um pero", e que uma pessoa com graves problemas cardíacos, que sofreu diversos enfartes do miocárdio, que conduziram a vários internamentos e a episódios de urgência em hospitais, de que resultaram inúmeras faltas ao serviço hospitalar por motivo de doença, tenha conseguido esconder tal patologia a pessoas que lhe estavam tão próximas, como a sua secretária pessoal e o seu colega e amigo, o médico …, e iludir as demais pessoas que o rodeavam para o seu estado físico debilitado, muito anterior a Novembro de 1999; 23a. O pedido de alteração da resposta dada ao quesito 21 ° não tem a ver com a sua essencialidade para a decisão de mérito nos presentes autos, que até nem é, tem é a ver com uma exigência de rigor geral que se impõe e deve imperar em todas as sentenças, nomeadamente quando existem elementos nos autos que desmentem facilmente a resposta errada que foi dada. Para tanto, nesta situação, teria bastado ao Tribunal ouvir os depoimentos abaixo reproduzidos e consultado um calendário gregoriano para verificar que no dia 26 de Novembro de 1999 o “D” já se encontrava acamado na sua residência e até necessitava de um tripé para se deslocar. 24ª. Pelo que, o quesito 21, se cotejarmos o doc. n° 8 junto com a petição inicial, o doc. 1 junto com o requerimento do autor entrado em juízo em 7/01/2002, o doc. 1 junto pelo autor com o seu requerimento de 28/03/2001, a ficha clínica do Hospital do Barlavento Algarvio, enviada a juízo em … e remetida ao autor em …, com os depoimentos do médico, …, da secretária do falecido “D”, …(Suporte(s): Cassete 1 - lado B / Falas: 00.695 ~ 00.717 de rotações 00.422; 00.423; 00.455; 00.457; 00.534; 00.535; 00.568; 00.569; 00.571; 00.572 00.573; 00.576; 00.577; 00.579; 00.581; 00.582; 00.583; 00.584; 00.585; 00.586; 00.587; 00.595; 00.596; 00.597; 00.598; 00.599; 00.600; 00.601; 00.602; 00.604; 00.607; 00.608; 00.684; 00.688; 00.690; 00.692; 00.697; 00.698), e do seu sobrinho, … (Suporte(s): Cassete 3 - lado B ~ Cassete 4 - lado A Falas: 02.568 ~ 02.843 de rotações 02.647; 02.648; 02.649; 02.651; 02.653; 02.654; 02.655; 02.671; 02.672; 02.673; 02.674; 02.675; 02.676; 02.677; 02.679; 02.680; 02.681; 02.688; 02.689; 02.691; 02.694 e 02.695), deverá o mesmo ser dado como parcialmente provado no sentido de que: - Em 26-11-1999, o “D” já se encontrava doente na sua residência. 25ª. No que diz respeito à alegada falta de liquidez, cumpre dizer que o irmão do recorrente era um Médico conceituado, Director Clínico do Hospital do …, proprietário de uma Clínica Fisiátrica, possuidor de um considerável património, que ia desde carros, barco, prédios urbanos e rústicos e contas bancárias devidamente provisionadas (apresentavam um saldo conjunto, à data da outorga da procuração, 15.07.1999, de Esc. 13.293.460$00 docs. 6 a 8 juntos com o requerimento do autor de 26-06-2001), pelo que é risível admitir que não tivesse dinheiro para pagar as sua virtuais dívidas, ou que alguma vez tivesse invocado falta de liquidez para não cumprir as suas obrigações. 26a. O “D” era tido como uma pessoa honesta que não gostava de dever nada a ninguém. Era visto como uma pessoa ciosa dos seus bens e zelosa com o seu dinheiro, consciente do valor do seu património, conforme o comprovam os depoimentos infra. 27ª. Só O réu marido, em sede de depoimento de parte, cujas regras, efeitos e valor processuais são sobejamente conhecidos, secundado de modo totalmente inconsistente e parcial pela sua secretária, …, alegou tamanha estória. 27ª (Repetida no original) O Tribunal recorrido, ao valorar como valorou o depoimento de parte, subverteu as regras do depoimento de parte, aproveitando-o para aquilo que podia favorecer o réu, algo que processualmente lhe estava vedado (arto. 5540 do Código de Processo Civil), tanto mais que os restantes depoimentos colhidos vêm descredibilizar por completo as declarações do réu marido. 28ª. Nomeadamente as prestadas por … (Suporte(s): Cassete 4 - lado A ~ Cassete 4 - lado A / Falas: 03.008 ~ 03.180 de rotações 03.147; 03.148; 03.149; 03.150; 03.154; 03.155; 03.156; 03.157; 03.158; 03.159; 03.160; 03.161; 03.162; 03.163; 03.164 e 03.166) pelo depoente, … (Suporte(s): Cassete 1 - lado B ~ Cassete 2 lado A / Falas: 00.789 ~ 01.208 com as rotações seguintes: 00.873; 00.876 e 00.878), pela testemunha, … (Suporte(s): Cassete 2 - lado A ~ Cassete 2 - lado A / Falas: 01.209 ~ 01.507 de rotações 01.322; 01.328; 01; 01.331; 01.332; 01.333; 01.336; 01.337; 01.340; 01.341; 01.342 AA; 01.343; 01.362; 01.363; 01.364; 01.365; 01.366; 01.367; 01.372; 01.373; 01.374; 01.375; 01.378; 01.379; 01.382; 01.383 e 01.428), por … (Suporte(s): Cassete 3 - lado B ~ Cassete 4 - lado A Falas: 02.568 ~ 02.843 de rotações 02.720; 2.803; 02.804; 02.805; 02.806 e 02.812), e, finalmente, as prestadas por … (Suporte(s): Cassete 4 – lado A – Cassete 5 – lado A / Falas: 03.181 – 03.971 de rotações 03.520; 03.521 e 03.523). 29ª. Assim, acreditar que “D” tivesse invocado indisponibilidade financeira para satisfazer as suas obrigações, é quase como considerar verdadeira a hiperbólica anedota da família muito pobre em que o pai, a mãe, os filhos, o mordomo, a governanta, as damas de companhia, os cozinheiros, os serviçais, o caseiro e o motorista eram todos muito pobres. Motivo pelo qual estamos perante mais um erro notório de julgamento, tanto mais que nada em concreto foi referido ao longo do julgamento sobre esta questão, e não pode ser o depoimento do réu a fazer prova da sua versão, diga-se, absurda, sob pena de total subversão das regras probatórias e do efeito e alcance do depoimento de parte, tudo nos termos do disposto nos artºs 554º e 617º do Código de Processo Civil. 30ª. Donde, a resposta dada ao quesito 8º (nº 21 do elenco dos factos dados por provados na sentença a fls. 516) deverá ser a de não provado. 31ª. Quanto à virtual compra e venda e pagamento verifica-se que “D” nunca recebeu do “B” fosse o que fosse pela venda do prédio misto denominado … e …, nem sequer o valor da diferença entre o valor da licitação em sede de inventário e o da venda virtual (docs 6, 7 e 8 juntos com o requerimento do autor de 26.06.2001 donde se extrai que não foi registado em seu nome qualquer depósito efectuado pelo “B”, ou qualquer depósito realizado por ele, “D”, em cheque ou numerário no montante de Esc. 2.000.000$00 ou mesmo valor aproximado, em data próxima da outorga da procuração ou mesmo até ao momento da sua morte ocorrida já em Janeiro de 2000), nem sequer em casa do falecido, “D”, não foi encontrada qualquer quantia em dinheiro de valor significativo. 32a. Não obstante, o autor requereu em sede no ponto IV dos seus meios de prova, e para contraprova dos nº. 4, 15 e 16 da Base Instrutória, que os réus viessem juntar aos autos todos os extractos bancários de todos os bancos de que são clientes, em relação ao período compreendido entre o dia 1 de Julho de 1999 e o dia 15 do mesmo mês, ou, em alternativa, viessem informar o Tribunal do nome dessas instituições, para que as mesmas viessem juntar tal informação confidencialmente nos autos. O Tribunal indeferiu, mal, tal pedido por despacho de fls. 208 por entender que como o réu tinha alegado o pagamento em numerário, sem indicação de proveniência, seria inútil apurar os movimentos bancários do mesmo. 33a. O réu “B”, quer como advogado, quer para se evitarem especulações sobre a proveniência dos dinheiros, tinha todo interesse em fazer contraprova da alegação do ·autor, mas, mesmo assim, nunca juntou aos autos qualquer comprovativo de ter movimentado esse valor na data da outorga da procuração, e nunca juntou qualquer comprovativo de ter levantado de qualquer das suas contas bancárias 2.000 contos em notas para pagar ao “D”. 34a. Acresce que nenhuma das testemunhas arroladas pelo “B” se "atreveu" a dizer que tinha tido conhecimento efectivo do negócio ou que tipo de negócio é que, eventualmente, foi celebrado com o “D”, nem sequer que tenha visto o “B” a entregar notas ao “D” e qual o seu valor. 35a. Donde, o património do seu irmão, aquando da sua morte, não apresentou, de forma verdadeira e apropriada, em todos os aspectos materialmente relevantes, a realidade substancial que lhe estaria subjacente, ou seja, um pagamento que se deu como provado mas que, na realidade, é inexistente. 36a. Em súmula, os quesitos 11° a 13°, 15° a 17° e 19°., deverão merecer a resposta de "não provados" porquanto: 1º) Nenhuma testemunha, mesmo as arroladas pelos réus (…, … e …), respondeu ter conhecimento directo que, alguma vez, o “D” tenha proposto vender o imóvel referido nos autos ao “B”; 2º) Nem que tenham tido conhecimento que entre eles tenha sido celebrado um contrato de compra e venda; 3º) Os documentos 6 a 8 juntos aos autos com o requerimento, de 26-06-2001, demonstram que, na data em que é outorgada a procuração e naquele mês, não deu entrada em qualquer conta bancária do “D” a referida quantia de 2.000 contos, nem sequer valor aproximado; 4º) Vasculhados todos os "papéis" do “D”, tal como afloraram as testemunhas … (Suporte(s): Cassete 1 - lado B ~ Cassete 2 - lado A / Falas: .0.0.789 ~ .01.2.08) com as rotações seguintes: .0.0.879; .0.0.888; .0.0.896; .0.0.898 e .0.0.899) e …, não foram localizados vestígios de tal quantia nem pagamentos em numerário que pudessem indiciar que o “D” tivesse recebido 2.000 contos; 5º) Nenhuma testemunha, tal como ocorrera em relação ao "negócio", em momento algum afirmou ou pôde garantir que dentro de "um envelope castanho" estivessem 2.000 contos ou para que é que se destinava esse envelope, conforme se retira com toda a clareza dos seguintes depoimentos: (i) … (Suporte(s): Cassete 4 - lado A ~ Cassete 5 - lado A / Falas: .03.181 ~ .03.971 de rotações .03.265; .03.266; .03.267; .03.268; .03.275; .03.276; .03.28.0; .03.282; .03.291; .03.292; .03.3.07; .03.3.08; .03.31.0; .03.311; .03.312; .03.337; .03.338; .03.339; .03.548; .03.549; .03.55.0; .03.551; .03.556; .03.557; .03.616; .03.617; .03.618; .03.619; .03.62.0; .03.621; .03.622; .03.623; .03.625; .03.626; .03.627; .03.853; .03.854; .03.855; .03.856; .03.858 .03.859; .03.86.0; .03.865; .03.869; .03.87.0; .03.873; .03.875; .03.879; .03.881; .03.882; .03.883; .03.884; .03.885; .03.886; .03.891; .03.892; .03.893; .03.894; .03.928; .03.93.0; .03.931; .03.933; .03.934; .03.935; .03.936; .03.937; .03.938; .03.939; .03.940 e .03.941); (ii) …(Suporte(s): Cassete 5 - lado A ~ Cassete 5 - lado B / Falas: .03.972 ~ .04.613 a rotações .04.261; .04.262; .04.348; .04.349; .04.354; .04.355; .04.358; .04.359; .04.364; .04.365; .04.367; .04.534; .04.535; .04.536; .04.544; .04.545; .04.548; .04.549; .04.558; .04.559; .04.56.0; 04.561; 04.562; 04.563; 04.570 e 04.607) (iii) … (Suporte(s): Cassete 4 - lado A ~ Cassete 4 - lado A / Falas: 03.008 ~ 03.180 a rotações 02.923; 02.924; 03.143 e 03.144); 36ª. Verifica-se, assim, que só o Tribunal a quo conseguiu espreitar para dentro do misterioso envelope castanho e nele encontrar 2.000 contos em numerário, bem como ouvir aquilo que ninguém disse, ou seja, que o “B” e o “D” celebraram um contrato de compra e venda, em que o segundo vendia ao primeiro o prédio dos autos; 37ª. Como as provas coligidas não permitem ao Tribunal recorrido extrair tal conclusão, os Quesitos 3° e 4° terão de ser dados como provados e, consequentemente, os quesitos 11°. a 13°., 15°. a 17°., e 19° têm de ser dados como não provados. 38ª. Quanto às despesas processuais (custas, preparos, certidões, selos das procurações, etc.) que, eventualmente, o “D” pudesse dever ao recorrido marido, também nenhuma das testemunhas referiu saber se o “D” pagou ou não as custas e preparos dos dois inventários. Também o réu não juntou a estes autos prova de qualquer pagamento efectuado do seu "bolso" a este respeito. 39ª. Elucidativo quanto a tal propósito é o depoimento da secretária do réu … (Suporte(s): -Cassete 5 - lado A ~ Cassete 5 - lado B / Falas: 03.972 ~ 04.613 - quando a ele se refere nas seguintes rotações: 04.455; 04.456; 04.457; 04.458; 04.459; 04.463; 04.464; 04.476; 04.477; 04.478; 04.479; 04.480; 04.481; 04.482 e 04.485), bem como o da amiga do réu a depoente … (Suporte(s): Cassete 4 - lado A ~ Cassete 5 - lado A / Falas: 03.181 03.971 a rotações 03.824; 03.827; 03.844 e 03.845). 40ª. Motivo pelo qual não se entende em que elementos de prova a sentença se baseou o Tribunal para afirmar que o “D” nem sequer pagou as despesas processuais? Em nada, porque nada em concreto foi dito em julgamento a tal respeito, não tendo o Tribunal fundamentado minimamente as suas respostas e decisão quanto a este aspecto, o que gera a nulidada da sentença (al. b), do n°. 1, do artº. 668° do C.P.C.); 41ª. Deste modo, e independentemente daquilo que já se deixou escrito a propósito do virtual negócio de compra e venda e do mirífico recebimento de 2.000 contos em notas, o Tribunal recorrido não poderia ter dado como integralmente provada, sem qualquer esclarecimento, a matéria de facto constante dos Quesitos 10° e 17°, nomeadamente de que no final do inventário foram feitas as contas às despesas, e que com a outorga da procuração ficaram saldados os "créditos recíprocos". 42ª. Finalmente, quanto aos honorários devidos ao réu, o recorrente nunca negou que o mesmo a eles tivesse direito, e desde sempre se comprometeu a liquidá-los, após a respectiva e devida apresentação de contas; 43ª. Mas o réu conseguiu chegar à fase da sentença sem prestar contas nem fornecer ao Tribunal a sua nota de despesas e honorários. Algo com que o Tribunal, tacitamente, acredita-se que involuntariamente pactuou e, deste modo, continuamos sem se saber, exactamente, com que montante injustamente este se locupletou, enriquecimento sem causa e à custa alheia. 44ª. Não obstante, o ora recorrente juntou à acção uma nota de despesas e honorários apresentada pelo Ilustre Advogado que o representou no primeiro Inventário (doc. 3 junto com o requerimento do autor de 16/12/2003). A mesma totaliza, sem IVA, a quantia de Esc. 347.000$00 ou 1.730,29 euros, e destinava-se à prova e contraprova da matéria de facto constante do quesito 2°. 45ª. O documento referido só foi junto aos autos (requerimento do autor de 16/12/2003) porque o réu desobedeceu ao Tribunal e não cumpriu o que lhe houvera sido ordenado por despachos de fls. 208 e 225. Este é um documento meramente indiciário e não lapidar, mas que poderá ser determinante para a resposta a dar ao quesito 2°, mais que não seja por via da equidade, que deverá ser sempre alicerçada em elementos objectivos. 46ª. No segundo inventário nunca foi apresentada ao apelante uma conta formal de despesas e honorários, mas o recorrente afirma que pagou ao Distinto Causídico pouco mais de Esc. 400.000$00, também sem IVA, o que totaliza, nos dois inventários, menos de Esc. 800.000$00. 47ª. Assim, verifica-se que o valor real com que se locupletou o réu, ao dizer que pagou pelo prédio Esc. 2.000.000$00 (e o que é certo é que não foi feita prova que o “D” tenha celebrado um contrato de compra e venda com o réu, independentemente da procuração outorgada), é enormemente superior aos honorários que lhe caberiam, atento ao tempo gasto, à dificuldade do assunto, à importância do serviço prestado, às posses do interessado, ao resultado obtido, à prática do foro e estilo da comarca, mesmo se estivermos a pensar no patrocínio global do inventário e da venda sub judice. 48ª. Por último, tem de se dizer que "vasculhada" ao pormenor toda a "papelada" do seu irmão, o recorrente não conseguiu descobrir um único recibo de despesas ou honorários passado pelo “B” ao seu irmão, nem qualquer nota discriminativa de despesas e honorários apresentada ao “D” pelo trabalho realizado. 49ª. Convém sublinhar que, apesar do comportamento desrespeitador do réu, o certo é que o Tribunal nunca o chegou a cominar com qualquer sanção. 50ª. Sobre os honorários e eventual dívida depuseram as seguintes testemunhas, depoimentos de que se retiram os aspectos que o apelante considera mais relevantes e que são: (i) … (Suporte(s): Cassete 5 - lado A ~ Cassete 5 - lado B / Falas: 03.972 ~ 04.613 a rotações 04.147; 04.148; 04.179; 04.180; 04.441; 04.442; 04.443 e 04.444); (ii) … (Suporte(s): Cassete 4 - lado A ~ Cassete 5 - lado A / Falas: 03.181 ~ 03.971 a rotações 03.831; 03.832; 03.833; 03.834; 03.835; 03.836; 03.837; 03.838; 03.839; 03.840; 03.841; 03.847; 03.848; 03.849; 03.851 e 03.852); (iii) … (Suporte(s): Cassete 1 - lado B ~ Cassete 2 - lado A / Falas: 00.789 ~ 01.208) quando lhe perguntavam se os honorários devidos ao réu advogado rondariam os Esc. 3.000.000$00 pelos dois inventários, ele respondia do modo constante das seguintes rotações: 00.827; 00.828; 00.834; 00.835; 00.836; 00.837; 00.848; 00.849; 00.850; 00.851; 00.852; 00.854; 00.855 e 00.856. 51ª. Face a tudo aquilo que aqui se deixou dito sobre os honorários do réu, entende o apelante que existe um défice de indagação instrutória quanto à avaliação dos mesmos, imputável ao Tribunal a quo, motivo pelo qual essa Relação pode socorrer-se da equidade e considerar que o Quesito 2° deve ter a seguinte resposta: Sendo os honorários devidos ao réu por “D” de pelo menos 800.000$00; 52a. Ou, então, manda baixar o processo à primeira instância, para que esta obrigue o réu a apresentar contas, e estas possam ser, finalmente, sujeitas a um laudo de honorários na Ordem dos Advogados, de molde a que se possam apurar, com rigor, os prejuízos patrimoniais que a sua conduta tem causado à família do recorrente e ao acervo hereditário. 53ª. De facto, passados em revista todos os supra citados depoimentos, bem como toda a espessa prova documental elencada, de nenhum deles se deduz ou permite retirar os factos que o Tribunal dá como provados nos quesitos 8°, 11°, 12°, 13°, 15°, 16°, 17° e 19°, responde nos nºs. 1, 5, 10, 17 e 18 da base instrutória, bem como considera não provados nos quesitos 2°, 3°, 4° e 21°, concluindo-se que a sentença recorrida padece dos vícios previstos nas al. b) e c) do n°. 1, do art° 668° do C.P,C., por um lado por insuficiência probatória para a decisão de certa matéria de facto dada como provada, por outro por falta válida da especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificaram a decisão, e, fundamentalmente, erro notório na apreciação da prova (al a) e b), do n°. 1, do art°. 6900-A do C.P.C.), a qual, por vezes, devia ter merecido uma decisão diametralmente oposta àquela que vingou e foi dada como provada pelo Tribunal a quo, o que teve necessariamente consequências na decisão que veio a ser proferida. 54ª. Motivo pelo qual não pode nem deve vingar aqui o Princípio da Livre e Íntima Convicção do Julgador (nos. 1 e 2, do art°. 655° do C.P.C.), face a tamanha prova testemunhal produzida e à expessa prova documental constante dos autos que nos conduz, inapelavelmente, para caminhos muito diferentes daqueles que foram trilhados pelo Tribunal a quo. B) No tocante à matéria de direito: 55ª. Mesmo que por mera hipótese não procedesse o recurso da matéria de facto, e mesmo que essa Relação considerasse que os factos foram correctamente julgados e que os meios probatórios constantes dos autos não impunham decisão diversa da recorrida, da matéria de facto dada como assente, quer por acordo das partes, quer daquela que resultou provada do julgamento, bem como daqueles factos que ninguém pode colocar em causa por serem óbvios, é possível vislumbrar na conduta do réu uma simulação, uma dação, um negócio usurário, um abuso de representação que conduziram a benefícios excessivos e injustificados para o réu. 56a. Da matéria de facto que pode ser dada como insofismável, e que foi apresentada nas páginas 44 a 49 da presente alegação (com realce para os depoimentos aí transcritos), torna-se por demais evidente que o recorrido não só nunca prestou contas ao autor do "negócio" que diz ter celebrado, como também nunca prestou contas ao seu cliente, o “D”, por impossibilidade temporal manifesta, uma vez que, desde a data da outorga da procuração até à data da sua morte, nunca mais o viu, contactou ou foi contactado, motivo pelo qual se conclui que não lhe foram apresentadas as contas devidas. 57ª. Quanto à procuração, e apesar de se poder considerar que essa procuração abrange o acto, mesmo assim o seu teor não impede o recorrente de poder reagir contra o conluio e contra a "infidelidade" da representação (Ac STl, de 27JUN00, in CJ, II, 135), tanto mais que está demonstrado que o negócio celebrado consigo mesmo pelo recorrido (negotium a semet ipso) sacrificou os interesses patrimoniais do representado em benefício dos do representante, sendo de todo irrelevante a procuração que foi passada ao apelado porque este a utilizou no seu próprio interesse, prejudicando o seu mandante e os legítimos interesses dos seus herdeiros, e ainda porque essa Procuração não é irrevogável nem isenta o mandatário de prestar contas ao mandante, ou caso este falecesse entretanto, como aconteceu, ao seu herdeiro. 58ª. Também é evidente, independentemente da resposta dada aos quesitos 5° e 18º, que o prédio em questão, mesmo ao abandono e sem qualquer investimento, produz um rendimento anual considerável, que se traduz em valores que quase excedem o ridículo montante de Esc. 2.000.000$00 que o réu diz ter pago pelo prédio. 59a. O prédio tem uma área total de 140.080 m2, dos quais 639,34 m2 são urbanos, está bem localizado, tem mais de 500 sobreiros, tem pinheiros, eucaliptos, medronheiros, minas de água e acesso à estrada. 60ª. O réu conhecia o prédio há pelo menos uma década, uma vez que tratou dos dois inventários por morte dos progenitores do seu cliente. Conhecia obrigatoriamente as suas características e potencial produtivo (além de ter afirmado em Tribunal que queria uma casa no campo), tal como o “D”, pelo que é impensável admitir que o irmão do recorrente tivesse querido vender um prédio por um valor que este lhe proporcionaria ao fim de apenas um ano e em frutos (nomeadamente extracção de cortiça). 61ª. Acresce que se o prédio misto denominado "…" e "…" valia no mínimo 90.000 euros (na verdade vale muito mais como facilmente se demonstrou supra), verifica-se que o réu ao comprar para si o bem por apenas 2.000.000$00 (menos de 10.000 euros) não acautelou, como podia e devia, os interesses do seu cliente. 62a. Assim, o recorrido celebrou um contrato economicamente ruinoso aos interesses do mandante, exercendo ilegitimamente o mandato, ou seja, o direito que lhe houvera sido conferido (artº, 334º 1ª parte e in fine do C.C.), porque não só não prestou quaisquer contas ao seu mandante nem ao herdeiro deste, como actuou de modo substancialmente contrário aos fins da representação (artº. 1161º e art. 269° ex vi nº. 1 do artº. 1178° do C.C.), pelo que estamos perante um negócio usurário (artº. 282° do C.C.) e um abuso de representação (artº. 269° do C.C.). 63ª. Deste modo, o réu nunca chegou a celebrar um verdadeiro contrato de compra e venda. Outrossim, pretendeu incorporar o bem no seu património e pagar com ele os seus honorários ou parte deles que entendia ter direito em virtude do exercício do mandato oneroso que lhe havia sido conferido (artigos 1157°, 1158° n°. 1 e 2, 1161º, 1167° e 1175°, todos do Código Civil); 64ª. O réu afirmou que, ao celebrar o negócio consigo mesmo, quis garantir o pagamento dos seus honorários. Ora, se assim é, então não estamos perante um contrato de compra e venda, mas perante uma dação (artº. 837° e segs. do Código Civil), que só serviu para encobrir o verdadeiro propósito do ora recorrido, pelo que estamos perante uma simulação quanto ao verdadeiro negócio celebrado, se é que se pode chamar negócio a um "fazer justiça com as próprias mãos"! 65ª. Assim, considerando que a verba n.º 12 foi licitada, na conferência de interessados, por apenas Esc. 3.500.000$00, quando podia ter sido licitada até Esc. 6.000.000$00 (apesar de ser notório que para qualquer pessoa que este era um valor "irrisório" ou uma "pechincha", pelo que este montante máximo visava não inflacionar o inventário), quando o prédio valia, no mínimo dos mínimos, 90.000 euros ou mais de Esc. 18.000.0000$00, quando a escritura foi celebrada pelo ridículo montante de Esc. 2.000.000$00, quando o valor produtivo anual do prédio, mesmo ao abandono, não anda longe do valor declarado para a escritura, e quando o réu conhecia o prédio pelo menos desde 1989 e queria "uma casa no campo ... "; resulta destes factos objectivos e de modo inequívoco que os valores declarados são completamente falsos e a escritura fictícia, estando indiciado ou mesmo provado a prática do crime de fraude fiscal previsto e punido, à data da prática dos factos, pela alínea c) do nº. 2 do arto. 23° do RJIFNA (DL nº. 20-A/90, de 15 de Janeiro) e actualmente na alínea c) do n°. 1 do arto. 103° do RGIT (DL nº. 15/01, de 5 de Junho). 66ª. Ao declarar no acto de pagamento da sisa e no da escritura de compra e venda um valor do bem muito inferior ao real, tudo leva a crer que advogou contra lei expressa e utilizou para tanto expedientes censuráveis. 67ª. O que se traduz numa simulação por ocultação de factos e valores que devem ser revelados à administração fiscal, bem como pela celebração de negócio simulado quanto ao valor real da suposta compra e venda. 68ª. Não obstante, o certo é que “D” nada recebeu pela venda do prédio, nas suas contas bancárias não foi registado qualquer movimento de Esc. 2.000.000$00 ou mesmo de valor, aproximado, em data próxima com a da outorga da procuração ou mesmo até ao momento da sua morte e em sua casa também não foi encontrada qualquer quantia em dinheiro de valor significativo. 69a. O irmão do recorrente, Médico conceituado, Director do Serviço de Fisiatria do Hospital do …, proprietário de uma Clínica Fisiátrica, possuidor de um considerável património, que ia desde carros, barco, prédios e contas bancárias, não era pessoa para aceitar, receber ou necessitar de receber em notas 2.000 contos, e seguramente que não vivia em economia paralela, permitindo-se receber misteriosos envelopes "castanhos". 70ª. Em rigor, conforme se demonstrou supra, ninguém VIU entregar 2.000 contos ou outra qualquer quantia ao “D”, nem ninguém respondeu ter conhecimento de que o “B” e o “D” celebraram um contrato de compra e venda ou qualquer outro negócio relacionado com o prédio dos autos. 71ª. Logo, estamos perante uma simulação que, em rigor, não foi cometida pelo de cujus, mas pelo apelado e em conluio consigo próprio. Simulação esta sui generis, pois foi praticada por um único simulador. 72a. Do art.º 259° do Código Civil infere-se que, sendo o negócio feito por intermédio de um representante, a falta de vontade geradora da simulação é, em princípio, a que nele se registar; o representante e não o representado é o declarante ou declaratário a que se refere o art.º 2400 do mesmo Código. 73ª. Dos elementos objectivos constantes dos autos verifica-se que estão cumulativamente reunidos os três requisitos da simulação, a saber: (i) intencionalidade da divergência entre a vontade e a declaração (o contrato não configura uma compra e venda); (ii) acordo entre declarante e declaratário (que é a mesma pessoa); (iii) com intuito de enganar terceiros, o qual tanto pode revestir a característica de simulação inocente, se houver mero intuito de enganar terceiros sem os prejudicar, ou de simulação fraudulenta, quando há intenção de prejudicar terceiros ilicitamente ou de contornar qualquer norma da lei. 74ª. A este propósito, em primeiro lugar, não é por demais voltar a citar o esclarecido despacho de fls. 166 e 167 proferido por outro Magistrado que não aquele que acabou por presidir à audiência de discussão e julgamento, que diz o seguinte: "Ora, dúvidas não restam que, a ser verdadeira a versão do autor de que o preço da compra e venda é fictício e que o imóvel seu objecto tinha um valor muito superior ao que ao réu seria devido a título de honorários, não tendo ocorrido um correspondente retorno patrimonial para a massa da herança do seu irmão, desse modo engrossando a sua quota hereditária, dizíamos, a ser verdadeira esta versão factual, o autor tem efectivo interesse em invocar a nulidade de um tal negócio." 75ª. Em segundo lugar, e apesar de se tratar de outro "foro", o disciplinar, não deixam de ser elucidativos os dois Acórdãos proferidos pelo Conselho Superior da Ordem dos Advogados sobre este caso, nomeadamente o Acórdão do Conselho Superior da Ordem dos Advogados de …, proferido no Processo nº. … (doc. 20 junto com a petição inicial), e publicado na Revista da Ordem dos Advogados, Ano …, Dezembro …, pags. … e segs., e o Acórdão do Conselho Superior da Ordem dos Advogados de …, proferido no Processo n°. … (doc. 2) 76ª. Assim, o “B” - ao ficar para si com um bem de valor muito elevado e manifestamente superior ao que eventualmente teria direito a título de honorários - não correspondeu às responsabilidades que lhe foram conferidas e, aparentemente, serviu-se do mandato para prosseguir objectivos ou benefícios pessoais, tanto mais quando os honorários pagos a advogado devem ser saldados em dinheiro e não por compensação ou dação, conforme dispõem n°. 2 do artº. 65° do E.O.A; 77ª. No que tange à legitimidade do apelante, a mesma é indiscutível (vide, entre outros, art.º. 240°, 242° n.º. 2, 259° e 286°, todos do Código Civil; Ac. RL, de 3/02/83, in CJ, I, 709; Ac STJ, de 18/02/66, in RLJ, ano 990. pag. 352; Ac STJ, de 26/04/81, in BMJ n.º. 306, pag. 244; Ac STJ, de 3JUN92, in BMJ n.º. 418, pag. 732; Ac. STJ, de 25/11/92, in BMJ, n.º 421, 380; Ac. STJ, de 27JUN00, in CJ, II, 135; e ainda "Simulação e Tutela de Terceiros", estudo de L. A. Carvalho Fernandes, separata dos estudos em memória do Prof. Dr. Paulo Cunha. 78ª. Por último, embora este seja um facto a latere, os ora recorridos, inclusive, chegaram no ano de 2002 a extrair cortiça e a não inscreverem, sabe-se lá porquê, talvez para se escamotear o real valor produtivo anual do prédio, com tinta indelével e de forma visível, sobre a superfície explorada de alguns sobreiros, o algarismo das unidades do ano da tiragem da cortiça, conforme impõe o n°. 4, do artº. 13°, do DL 169/2001, de 25 de Maio. 79ª. Ao decidir como decidiu a sentença recorrida violou por erro de interpretação e inaplicação o disposto nos artigos 240°, 259°, 282°, 334° 1ª parte in fine, 1157°, 1158° n°. 1 e 2, 1161°, 1167°, 1175º e 1178°, todos do Código Civil; nos artºs. 554°, 617°, 655° nº.s 1 e 2, 668° n°. 1 al. b) e c) e 690º-A n°. 1 al. a) e b), todos do Código de Processo Civil; na Portaria 980/95, de 22 de Março de 1996, aliada à Circular do I.F.A.D.A.P nº. 4/96, que entrou em vigor em 22MAR96; na alínea c) do n°. 2 do artº. 23° do RJIFNA (DL n°. 20A/90, de 15 de Janeiro) e actualmente na alínea c) do n°. 1 do artº. 103º do RGIT (DL n°. 15/01, de 5 de Junho); no n°. 4, do artº. 13°, do DL 169/2001, de 25 de Maio; bem como os artºs. 65°, 76° n°. 1 e 2, 78º al b), 79° al a) e c), artº. 83° al c), d), f) e i) e 95° todos do Estatuto da Ordem dos Advogados, e ainda o que preceitua o art.º. 4°, 5º e 6° do Regulamento dos Laudos, afora o artº, 3° do Regulamento Disciplinar. 80ª. Assim, caso V. Exas. decidam não ser necessária a renovação da prova para se determinar com rigor os honorários eventualmente devidos ao recorrido, e deste modo determinar o prejuízo excessivo e injustificado causado ao acervo hereditário, sempre com o douto suprimento de V. Exas., deverá ser dado provimento ao presente recurso, no sentido plasmado nas conclusões supra e conforme pedido formulado aquando da propositura da acção. Os réus contra-alegaram a pugnar pela confirmação da sentença. Colhidos os vistos, cabe decidir. São os seguintes os factos que a 1ª instância deu como provados: 1. Por morte dos pais do ora autor e de “D” foram abertas duas heranças, que deram origem a dois inventários facultativos, tendo o inventário por óbito da progenitora de ambos, terminado por sentença de 12/2/99, transitada em julgado. 2. Nessa sentença ficaram definidas as operações de partilha e foram adjudicados aos interessados os bens que compuseram os respectivos quinhões, sendo que se habilitaram como únicos herdeiros o ora autor e o seu irmão “D”, que partilharam entre si os bens dos pais. 3. O advogado de “D” nesse inventário era o ora réu. 4. Em 2 de Janeiro de 2000, faleceu “D”. 5. O autor é o único e universal herdeiro de “D”. 6. A verba que constituiu o nº 12 do Activo da Relação de Bens do Inventário referido em 1. e 2. foi licitada em sede de conferência de interessados, realizada em 2 de Dezembro de 1998, pelo aqui réu, “B”, em nome do seu constituinte, “D”, vindo a ser-lhe adjudicada pelo valor de 3.500.000$00, resultante da licitação. 7. “D”, em 15 de Julho de 1999, habilitou o réu, “B”, com procuração notarial onde lhe eram conferidos os poderes de venda, em seu nome, do prédio misto correspondente à dita verba 12, e tudo o mais para cabal cumprimento do mandato, incluindo o de celebrar negócio consigo mesmo. 8. Em 5 de Novembro de 1999, o réu “B”, procedeu ao pagamento do imposto de Sisa na qualidade de comprador do mencionado prédio misto, vindo a celebrar escritura de compra e venda do mesmo consigo próprio em 26 de Novembro de 1999. 9. O valor declarado pelo ora réu como preço da compra e venda dita em 8. aquando do pagamento da Sisa e na escritura de compra e venda foi de 2.000.000$00. 10. “D” foi internado dois dias depois da data da celebração da escritura de compra e venda dita em 8., permanecendo no hospital até à sua morte. 11. A referida escritura de compra e venda teve em vista o pagamento pelo referido “D” de honorários devidos ao ora réu, “B”, pelos serviços prestados no âmbito da sua profissão de advogado. 12. O réu, em Julho de 2000, extraiu arrobas de cortiça colhidas em alguns sobreiros da propriedade em referência. 13. O réu “B” nunca prestou ao autor contas da compra e venda a que se alude em 6., 7. e 8. 14. O bem imóvel objecto da escritura de compra e venda referida em 8. tinha naquela data o valor de 89.654,00 euros. 15. O réu “B” vendeu a cortiça extraída a que se alude em 12. pelo preço global de 1.200.000$00. 16. Para efeitos de licitações no âmbito do processo de inventário referido em 1., o valor máximo que “D” atribuiu ao prédio em questão foi de 6.000 contos. 17. Desde 1989 que o réu vinha prestando serviços profissionais de advocacia a “D”, quer nos dois inventários por morte dos pais, quer noutros assuntos da sua vida pessoal e profissional. 18. Designadamente na preparação de uma acção de divisão de coisa comum, a propor contra o ora autor, relativamente a um apartamento que aquele habitava com a sua família e que era pertença de ambos, em compropriedade. 19. E, por tais serviços, nunca o réu recebeu honorários. 20. Terminado o segundo inventário referido em 1. e toda a demais actividade profissional do réu para com “D”, foram feitas as contas de despesas e honorários que lhe eram devidos; 21. E porque “D” invocou indisponibilidades financeiras para dar cumprimento ao pagamento dos honorários do réu, propôs então ele próprio vender ao réu um dos prédios de que se tornara proprietário. 22. Foi então que ambos acordaram que o prédio a ser vendido seria o denominado "…" ou "…" e acertaram igualmente o preço do mesmo. 23. Sendo o valor declarado aquando do pagamento da Sisa e na escritura de compra e venda dita em 8. aquele que ficou combinado com “D” e que ele aceitou. 24. Pela necessidade de proceder a determinadas correcções dos elementos identificadores e constituintes do prédio, não era possível de imediato celebrar a respectiva escritura definitiva de compra e venda. 25. Tendo, por isso, acordado ainda que “D” outorgaria a favor do réu a procuração referida em 7., contra a entrega da quantia de 2.000 contos. 26. Com a outorga da procuração e sua entrega ao réu, em 15.07.99, este entregou-lhe aquela quantia, em numerário. 27. Dando-se por saldados e compensados os créditos recíprocos. 28. O réu “B” procedeu à extracção de cortiça do prédio referido em 7", que vendeu pelo preço global de 3.000,00 euros. 29. “D”, no ano de 1999, não procedeu à venda da cortiça existente na propriedade da … porque já a considerava propriedade do réu “B”. Ver também a questão da nulidade invocada Atentas as conclusões do apelante, que delimitam, como é regra, o objecto do recurso, as questões a resolver respeitam à nulidade da sentença, por infracção ao estabelecido no art. 668° nº 1 al. b) do CPC, à modificação da matéria de facto fixada pela 1ª instância e à nulidade do contrato de compra e venda. Vejamos, então: No que concerne à 1ª questão, é manifesto que a sentença recorrida não omitiu a especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificaram a decisão, uma vez que se mostram devidamente elencados os factos tidos como provados e indicados os normativos que basearam o segmento dispositivo da sentença. De outro lado, as considerações tecidas na sentença sobre os factos provados, se forem desacertadas, integram erro de julgamento e não a apontada nulidade ou outra qualquer. Improcede, portanto, a arguida nulidade da sentença. No que respeita à segunda questão, importa deixar claro que, no respeitante à modificação das respostas à base instrutória, a garantia do chamado duplo grau de jurisdição, em matéria de facto, não desvirtua, nem subverte, o princípio da liberdade de julgamento, na afirmação que o juiz aprecia livremente as provas e decide segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto (art. 6550 CPC). Mas esta liberdade de julgamento não constitui um poder arbitrário do juiz, antes está vinculada a uma análise crítica das provas, bem como à especificação dos fundamentos que foram decisivos para a formação da sua convicção (art. 6530 do CPC). Por isso, os acrescidos poderes da Relação sobre a modificabilidade da matéria de facto, em resultado da gravação dos depoimentos prestados pelas testemunhas em julgamento, bem como da avaliação das perícias e do acervo documental junto aos autos, não atentam contra a liberdade de julgamento do juiz da 1ª instância, permitindo apenas sindicar a correcção da análise das provas, segundo as regras da ciência, da lógica e da experiência, prevenindo o erro do julgador e corrigindo-o, se for caso disso. Na situação em apreço, o apelante insurge-se, desde logo, quanto ao valor do prédio misto objecto do contrato de compra e venda, entendendo que deve ser-lhe atribuído o valor de 159.808,21 euros, ou que se corrija a resposta da 1ª instância no sentido de que, na data da escritura, o prédio valia, pelo menos, 89.654,00 euros. Como se sabe, a avaliação de terrenos e de prédios, em geral, traduz-se numa questão de ordem predominantemente técnico-construtiva, para cuja apreciação cognitiva se exigem conhecimentos que o Juiz, em regra, não possui. Assim, quanto ao valor do prédio (cf. 14. supra), o senhor Juiz analisou criticamente as provas produzidas para responder à matéria do art. 10 da base instrutória, nomeadamente, quanto à divergência dos peritos, não se encontrando motivo para modificar o valor a que se chegou, reportado à data da escritura. De resto, o valor dos prédios não é mera aritmética, varia de acordo com o mercado, podendo sofrer oscilações em períodos curtos, sendo que deve entender-se o valor indicado como aproximado e não como valor absolutamente rigoroso. Acresce que o prédio foi licitado pelo irmão do autor, por 3.500.000$00, em Dezembro de 1998, no processo de inventário, ou seja, um ano antes da data da escritura, sendo este, seguramente, um valor que o autor entendeu, então, razoável. Quanto ao valor da cortiça extraída, não tendo sido feita prova segura do respectivo montante pecuniário, o senhor juiz aceitou - e bem - o que a esse propósito "confessou" o réu no depoimento de parte: que vendeu cortiça, por duas vezes, tendo recebido 1.200.000$00, de uma vez (no ano de 2000), e 3.000,00 euros, da outra (no ano de 2002). Não há, portanto, razão para modificar as respostas aos artigos 5° e 18° da base instrutória (cf. 15. e 28. supra), mas ficando a indicação dos anos a que se reportam as vendas. De igual modo, inexiste motivo para alterar as respostas negativas aos artigos 2° e 21 ° da base instrutória, por ausência de prova quanto aos factos aí indagados, bem como a resposta positiva ao artigo 19° (cf. 29. supra), pelos fundamentos invocados no despacho de apreciação crítica das provas, maxime, em razão do depoimento da testemunha …; quanto ao art. 3° da . base instrutória, foi o mesmo eliminado, conforme se vê do despacho de fls. 461 e 462, por conter matéria conclusiva. No que concerne aos demais artigos da base instrutória impugnados pelo apelante, entende-se que, nem a prova testemunhal produzida em audiência - e que se encontra gravada -, nem a prova documental junta aos autos, permitem resposta afirmativa aos artigos 8º, 10º, 11º, 12º, 13º, 15º, 16º, 17º (cf. 18., 20., 1., 22., 23., 25. e 26. supra), tendo-se como não provada a respectiva materialidade factual aí perguntada. Sendo também de considerar como não provado o teor do art. 40 da base instrutória, em resultado da falta de prova relevante no sentido de que o “D” não recebeu do réu marido a importância indicada na escritura como preço da venda. Na verdade, para além do que se mostra descrito nas alíneas G) e L) do rol dos factos assentes (cf. 7. e 11. supra), nada mais se pode haver como comprovado quanto aos motivos da outorga da procuração e do preço que ficou a constar da escritura, nomeadamente, se o réu apresentou a conta de despesas e honorários ao “D”, se o réu entregou ou não entregou a quantia de 2.000 contos ao “D” e se o réu “B” trabalhou na preparação de uma acção de divisão de coisa comum, dada a insuficiente consistência do depoimento das testemunhas … e … da ausência de prova documental; em substância, a testemunha … referiu ter visto nas mãos do “D” um envelope castanho que antes vira nas mãos do réu e a testemunha …, que é funcionária no escritório do réu “B”, relatou uma conversa telefónica com o “D”, insusceptível de comprovação, durante a qual este pediu para a testemunha dizer ao “B” que queria receber 2.000 contos em dinheiro, na altura da outorga da procuração, e que viu um envelope castanho nas mãos do “B”; no entanto, nenhuma das testemunhas sabe o que continha esse envelope, não sendo legítima a ilação de que no mesmo estavam 2.000 contos em notas. Deste modo, consideram-se apenas apurados os factos que seguem: I - Por morte dos pais do ora autor e de “D” foram abertas duas heranças, que deram origem a dois inventários facultativos, tendo o inventário, por óbito da progenitora de ambos, terminado por sentença de 12/2/99, transitada em julgado. II - Nessa sentença ficaram definidas as operações de partilha e foram adjudicados aos interessados os bens que compuseram os respectivos quinhões, sendo que se habilitaram como únicos herdeiros o ora autor e o seu irmão “D”, que partilharam entre si os bens dos pais. III - O advogado de “D” nesse inventário era o ora réu. IV. Em 2 de Janeiro de 2000, faleceu “D”. V. O autor é o único e universal herdeiro de “D”. VI. A verba que constituiu o n° 12 do Activo da Relação de Bens do Inventário referido em I. e II. foi licitada em sede de conferência de interessados, realizada em 2 de Dezembro de 1998, pelo aqui réu, “B”, em nome do seu constituinte, “D”, vindo a ser-lhe adjudicada pelo valor de 3.500.000$00, resultante da licitação. VII. “D”, em 15 de Julho de 1999, habilitou o réu, “B”, com procuração notarial onde lhe eram conferidos os poderes de venda, em seu nome, do prédio misto correspondente à dita verba 12, e tudo o mais para cabal cumprimento do mandato, incluindo o de celebrar negócio consigo mesmo. VIII. Em 5 de Novembro de 1999, o réu “B” procedeu ao pagamento do imposto de Sisa, na qualidade de comprador do mencionado prédio misto, vindo a celebrar escritura de compra e venda do mesmo consigo próprio em 26 de Novembro de 1999. IX. O valor declarado pelo ora réu como preço da compra e venda dita em VIII., aquando do pagamento da Sisa e na escritura de compra e venda, foi de 2.000.000$00. X. “D” foi internado dois dias depois da data da celebração da escritura de compra e venda dita em VIII., permanecendo no hospital até à sua morte. XI. A referida escritura de compra e venda teve em vista o pagamento pelo referido “D” de honorários devidos ao ora réu, “B”, pelos serviços prestados no âmbito da sua profissão de advogado. XII. O réu, em Julho de 2000, extraiu arrobas de cortiça colhidas em alguns sobreiros da propriedade em referência. XIII. O réu “B” nunca prestou ao autor contas da compra e venda a que se alude em VI., VII. e VIII. XIV. O bem imóvel objecto da escritura de compra e venda referida em VIII. tinha, naquela data, o valor aproximado de 89.654,00 euros. XV. O réu “B” vendeu a cortiça extraída a que se alude em XII. pelo preço global de 1.200.000$00. XVI. Para efeitos de licitações no âmbito do processo de inventário referido em L, o valor máximo que “D” atribuiu ao prédio em questão foi de 6.000 contos. XVII. Desde 1989 que o réu vinha prestando serviços profissionais de advocacia a “D”, quer nos dois inventários por morte dos pais, quer noutros assuntos da sua vida pessoal e profissional. XVIII. E, por tais serviços, nunca o réu recebeu honorários. XIX. Pela necessidade de proceder a determinadas correcções dos elementos identificadores e constituintes do prédio, não era possível de imediato celebrar a respectiva escritura definitiva de compra e venda. XX. O réu “B” procedeu, no ano de 2002, à extracção de cortiça do prédio referido em VII., que vendeu pelo preço global de 3.000,00 euros. XXI. “D”, no ano de 1999, não procedeu à venda da cortiça existente na propriedade da … porque já a considerava propriedade do réu “B”. Fixada a matéria de facto a atender, importa agora determinar se o negócio de compra e venda padece da invocada invalidade. Como se sabe, a simulação consiste num desacordo intencional entre a vontade real e a declarada, determinada pelo intuito de enganar terceiros, sendo sancionado o negócio simulado com a nulidade (art. 2400 CC). Ensina Antunes Varela que são três os requisitos da simulação: divergência entre a vontade real e a vontade declarada, intuito de enganar terceiros e acordo simulatório (Cód. Civil anotado, vol. I, pg 155). Na simulação, os outorgantes, mancomunados para enganar terceiros, criam a aparência de um contrato que efectivamente não desejam no seu conteúdo, não tendo a intenção de dar aos seus interesses a regulamentação jurídica que do acto se depreende: se nenhuma quer, a simulação será absoluta; se querem outra diversa, a simulação será relativa. Por isso, a prova da simulação exige uma indagação sobre a vontade real das partes, sobre a sua verdadeira intenção quando efectuaram o negócio jurídico, cabendo a quem alegar judicialmente uma divergência entre estes elementos, que normalmente se harmonizam, a respectiva prova (art. 324° nO 1 CC). Ora, da prova produzida, no caso sub judicio, não pode extrair-se que o “D” não quis vender ao réu o prédio indicado nos autos e que este não quis proceder à sua compra; resulta, antes, que o negócio foi querido por ambos - transmissão da propriedade, mediante o pagamento de uma retribuição - e realizado no âmbito da satisfação de honorários devidos ao adquirente, pelos serviços profissionais por este prestados ao vendedor (cf. XI. supra). Por outro lado, o réu interveio na escritura de compra com os poderes conferidos pela procuração outorgada pelo “D”, cuja certidão está junta a fls. 47, através da qual são dados amplos poderes ao réu para vender o prédio a quem entender e pelo preço que entender, facultando ainda ao procurador a efectivação do negócio consigo mesmo, nada permitindo supor que não tenha sido pretendida por ambos nos precisos termos que dela constam e que o “D” não estivesse lúcido no momento em que a assinou, após a ouvir ler em voz alta. De qualquer modo, mesmo que pudesse entender-se que o contrato de compra e venda ocultaria um negócio de dação em cumprimento, através do qual o réu era pago dos honorários de advogado, sempre estaria ausente o requisito de o negócio ter tido em vista enganar o autor, pois nenhuma prova foi feita nesse sentido. E sempre estaria afastado o preenchimento desse requisito, de resto, porquanto, não sendo o autor herdeiro legitimário do “D” (cf. art. 2157° CC), não é "terceiro", por não ser interessado, isto é, titular de qualquer relação cuja consistência, tanto jurídica, como prática, pudesse ser afectada pelo negócio. Na verdade, podendo o “D” dispor livremente dos seus bens, sem qualquer constrangimento, mesmo que tivesse realizado negócio simulado (simulação relativa, no caso, segundo o art. 241 ° do CC), não poderia prefigurar-se uma situação juridicamente relevante de conluio dos contraentes para enganar o autor. Por último, cabe atentar que esta não é uma acção de prestação de contas, nem de honorários, nem é a sede adequada a apurar (e muito menos a sancionar) se o réu actuou, nas relações com o seu cliente, de acordo com as regras deontológicas da profissão. Ante todo o exposto, julgando improcedente a apelação, acorda-se em confirmar a sentença. Custas pelo apelante. Évora, 11 de Janeiro de 2007 |