Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1559-11.2TBABF.E1
Relator: MATA RIBEIRO
Descritores: DIREITOS DE AUTOR
INDEMNIZAÇÃO CIVIL
MEDIDA
Data do Acordão: 03/29/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: 1 – A nulidade da sentença a que se alude no artº 668º n.º 1 al. d) do Cód. Proc. Civil, têm-se por verificada quando o Julgador omita pronúncia sobre um dos pedidos formulados pelo autor, sendo tal pedido independente de outros sobre os quais incidiu pronúncia.
2 – No domínio do Código dos Direitos de Autor e Direitos Conexos, o pedido indemnizatório do demandante não tem, necessariamente, de ser alicerçado nos prejuízos que tenha sofrido e nos benefícios ilícitos do infrator, efetivos e reais, antes podendo ser satisfeito por apelo e com base nas remunerações que teriam sido auferidas caso o infrator tivesse solicitado autorização para utilizar os direitos em questão, as quais, por via de regra, se apresentam como um minus relativamente aqueles prejuízos, tanto assim que a atual lei não permite fixação de quantum inferior às mesmas.
Decisão Texto Integral:

Apelação n.º 1559-11.2TBABF.E1 (1ª secção cível)







ACORDAM 0S JUÍZES DA SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA



Audiogest – Associação para a Gestão e distribuição de Direitos, com sede em Lisboa, intentou no Tribunal Judicial de Albufeira (1º Juízo), ação declarativa com processo ordinário, contra B......... M. ............. – Act. Turísticas e Hot., Lda., sedeada em Praia da Falésia, Albufeira, alegando factos, que em seu entendimento, são tendentes a alicerçar a seguinte pretensão:
a) Deve a sociedade Ré ser condenada a reconhecer à Autora o direito exclusivo de autorizar a utilização/execução pública de fonogramas/videogramas no estabelecimento comercial que explora, denominado “FR Café Pub”;
b) Deve a sociedade Ré ser condenada no pagamento da remuneração de acordo com a tabela tarifária das Autoras para o ano de 2007 por contrapartida do respetivo licenciamento da Passmusica e que atualmente se cifra em 362,23 € (correspondente a 312,01 € + 50,22 €), correspondente ao capital em dívida e aos juros de mora vencidos e, bem assim, os juros de mora vincendos à taxa supletiva legal sucessivamente em vigor, desde 15 de Junho de 2011 (data da entrada da presente ação em Tribunal) até efetivo e integral pagamento;
c) Igualmente deve a sociedade Ré B......... M. ............. – Actividades Turísticas e Hoteleiras, Lda. ser condenada a pagar à Autora a quantia de 500,00 € (quinhentos Euros), devida a título de indemnização arbitrada pelos danos não patrimoniais causados pela sua conduta omissiva.
d) Deve ainda a sociedade Ré ser condenada a pagar à Autora a quantia de 1.000,00 € (mil Euros), correspondente ao ressarcimento dos encargos suportados com a proteção dos direitos lesados pela sociedade Ré, bem como, com a investigação e cessação da conduta lesiva da mesma;
e) Deve também a sociedade Ré ser condenada a pagar às Autoras a quantia diária de 30,00 €, a título de sanção pecuniária compulsória pelo atraso na prática do facto positivo da sociedade Ré.
f) Ser dada vista da presente ação ao Ministério Público por forma a que o mesmo promova o competente procedimento criminal, com fundamento da prática pela sociedade Ré de um crime de usurpação previsto e punido nos artigos 184º números 2 e 3, 195º e 197º todos do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos.
Citada a ré não deduziu contestação tendo sido considerados confessados os factos matriculados pela autora e, após alegação desta em cumprimento do disposto no artº 484º do CPC, veio a ser proferida sentença que julgou totalmente improcedente a ação e absolveu a ré do pedido.
*
Inconformada com a decisão veio, a autora, interpor recurso e apresentar as suas alegações, concluindo por formular as seguintes «conclusões» - Consignámos conclusões entre aspas, já que a recorrente limitam-se a fazer o “resumo”, em cinquenta e dois artigos, da matéria explanada nas alegações, sem apresentar umas verdadeiras conclusões tal como a lei prevê, as quais devem ser sintéticas, concisas, claras e precisas – v. Ac. STJ de 06/04/2000 in Sumários, 40º, 25; Cardona Ferreira in Guia de Recursos em Processo Civil, Coimbra Editora, 3ª edição, 73; Abrantes Geraldes in Recursos em Processo Civil, Novo Regime, 124.
, que se transcrevem:
1. O presente recurso foi interposto pela Autora Audiogest – Associação Para a Gestão e Distribuição de Direitos, ora Apelante, da douta sentença proferida a 15 de Novembro de 2011, que julgou totalmente improcedente a ação declarativa acima identificada por não provada a existência de lesão de direitos e consequentemente da existência de quaisquer danos da Autora a ressarcir.
2. O recurso merece – com o devido respeito – inteiro provimento, pois que a decisão do Mmo a quo, de julgar totalmente improcedente a ação declarativa em causa, não foi, na perspetiva desta, e com o devido respeito, a mais acertada.
3. Por um lado, o Mmo a quo, na decisão proferida, deixou de se pronunciar sobre questões/pedidos que devia apreciar, o que consubstancia uma nulidade da sentença proferida.
4. Por outro, a decisão do Mmo. Juiz a quo, contida na douta decisão recorrida, teve (na ótica da Apelante) por base uma errada análise e configuração da factualidade alegada e provada, bem como, uma errada interpretação dos preceitos legais aplicáveis em face daquela.
5. Desde logo, o Mmo. a quo, julgou como provado que o estabelecimento explorado pela Ré, denominado “FR Café Pub”, se trata de um Restaurante no qual se procedia, à data dos factos, de forma habitual, continuada e reiterada, à execução pública de fonogramas sem a competente licença e autorização.
6. Bem como, que a Autora licencia a utilização por parte dos eventuais interessados, da quase totalidade (cerca de 98%) do reportório da música grava, nacional ou estrangeira, comercializada e utilizada em Portugal.
7. Sendo que, o mencionado estabelecimento se encontrava aberto ao público e a funcionar diariamente (pelo menos 5 dias por semana), sendo certo que, pelo menos no dia 16.08.2007, aí se procedeu à execução pública de fonogramas, do reportório entregue à gestão da Autora, ora Apelante.
8. Tendo resultado igualmente provado que a Ré não possuía nem possui, qualquer autorização dos produtores de fonogramas/videogramas ou dos seus representantes, designadamente da Autora, ora Apelante, para proceder à execução pública de fonogramas/videogramas, no referido estabelecimento,
9. Bem como, nunca pagou a remuneração equitativa devida à Autora, ora Apelante, em virtude da referida atividade de execução pública de fonogramas/videogramas.
10. Sendo que, essa violação, para além de fonte de responsabilidade civil, é, igualmente, suscetível de configurar a prática de um crime de usurpação previsto pelo artigo 195º do “CDADC” e punido nos termos do artigo 197º do mesmo diploma, com pena de prisão que pode ir até 3 anos e multa de 150 a 250 dias.
11. Encontrando-se reunidos, in casu, como prescreve o Mmo. a quo., os pressupostos da responsabilidade civil da Ré (atuação ilícita, culposa e que provocou danos) e verificada a sua obrigação de indemnizar a Autora.
12. Quanto ao crime esse apresenta-se com a natureza de um crime público, pois o respetivo procedimento criminal não depende de queixa do ofendido, nos termos do disposto no artigo 200º.1 do CDADC.
13. Acresce que, confere o artigo 184º. 1 e 2 do CDADC, um direito exclusivo genérico, aos produtores, de autorização para a utilização das suas obras ou das prestações, por qualquer das formas de comunicação previstas no CDADC (nomeadamente execução pública) como forma de reconhecimento da titularidade de direitos sobre elas.
14. Ora, carecendo de autorização do produtor, designadamente, a difusão por qualquer meio dos fonogramas por si editados, a difusão ou execução pública sem tal autorização deverá ser considerada uma utilização não autorizada de tais fonogramas.
15. O que desde logo, implica a violação do disposto no artigo 184º.2 CDADC e preencherá, o tipo criminal de usurpação (artigo 195º CDADC).
16. Pelo que, face ao disposto no artigo 184º.2 CDADC, particularmente quando conjugado com o disposto no artigo 195º do mesmo normativo legal, é vedado aos utilizadores difundir ou executar publicamente fonogramas/videogramas sem para tanto obterem a prévia autorização dos produtores, enquanto titulares de direitos conexos, ou dos seus representantes, designadamente da Autora, ora Apelante Audiogest.
17. Dependendo o direito de remuneração equitativa de produtores, artistas, intérpretes e executantes em virtude de tal execução pública, prevista no artigo 184º.3 do CDADC, da existência da supra referida autorização.
18. Resultando, por força da alteração legislativa introduzida pela Lei 50/2004 de 24 de Agosto, entre as faculdades previstas no número 2 do disposto no artigo 184º CDADC, de forma clarividente que os produtores fonográficos gozam do direito exclusivo de autorizar toda e qualquer colocação à disposição do público dos seus fonogramas.
19. Decorrendo tal direito exclusivo de um imperativo comunitário – artigo 3º.2 b) da Diretiva 2001/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, relativa à harmonização de certos aspetos do Direito de Autor e dos Direitos Conexos na Sociedade de Informação e artigos 20º.1 e 21º da Convenção de Roma para a proteção dos artistas, intérpretes ou executantes, dos produtores de fonogramas e dos organismos de radiodifusão de 1961 - que os produtores fonográficos gozam do direito exclusivo de autorizar toda e qualquer colocação à disposição do público dos seus fonogramas (atribuição do chamado “exclusivo de exploração”).
20. Pelo que, quer o direito de autor quer os direitos conexos assumem a veste de direitos absolutos e exclusivos, pois da sua natureza resulta imediatamente a faculdade de “impedir” ou de “autorizar/proibir” uma dada utilização por terceiros, a que corresponde a atribuição do chamado “exclusivo de exploração” ou “Jus Proibendi”.
21. São pois direitos dotados de eficácia erga omnes, à qual, corresponde um dever geral de abstenção (obrigação passiva universal) de quaisquer atos que ponham em causa o referido “exclusivo de exploração”.
22. Corroborando nesse sentido a interpretação do artigo 184º do CDADC quando conjugada com demais disposições do mesmo normativo legal (artigos 141º4, 150º, 211º.5, 221º), bem como, com o disposto no artigo 6º do Decreto – Lei 333/97 de 27 de Novembro (respeitante à regulação da radiodifusão por satélite e retransmissão por cabo), onde se estabelece o direito exclusivo do autor autorizar a comunicação, direito exclusivo esse que é extensivo aos artistas, executantes e produtores de fonogramas ou videográficos.
23. Acresce que, o legislador sempre que quis retirar determinada utilização ao regime do direito exclusivo, fê-lo quer através do licenciamento compulsivo (cfr. artigos 8º.2, 52º, 70º.3, 144º.1 e 191º do CDADC) quer através do regime das utilizações livres (cfr. artigos 75º e 76º do CDAC).
24. Não tendo assim, qualquer sentido, conferir o direito exclusivo de autorizar e mandar aplicar o dispositivo no artigo 184º CDADC e depois interpretar essa aplicação com uma denegação do direito que foi concedido.
25. Pelo que, é inequívoco a existência do direito exclusivo de autorização na esfera jurídica dos produtores fonográficos/videográficos, sendo que, para que exista utilização é necessário que previamente se tenha verificado a respetiva autorização.
26. Bem como, a necessidade de autorização dos produtores (ou das entidades de gestão coletiva que os representem) para a comunicação pública dos seus fonogramas/videogramas, sendo que, não sendo dada qualquer autorização por parte daqueles, como ocorre in casu, o utilizador (a Ré) não poderá executar publicamente os fonogramas/videogramas daqueles.
27. Acresce ainda que, “a responsabilidade civil emergente da violação dos direitos previstos neste Código é independente do procedimento criminal a que esta dê origem…” – artigo 203º do CDADC.
28. Encontrando-se o Mmo. a quo, nos termos do disposto no art. 242º.1 b) do Código de Processo Penal, obrigado a denunciar tal crime às autoridades competentes.
29. Pelo que, tendo o Mmo. a quo, na sentença proferida se abstido de pronunciar sobre tais questões que devia apreciar, tal constitui uma nulidade da mesma, nulidade processual essa que, aqui expressamente se invoca e argui para todos os devidos e legais efeitos.
30. Por outro lado, o pedido de formulado pela Autora a título de danos patrimoniais não teve por base uma concreta violação dos direitos da Autora, ocorrida em determinada data temporalmente demarcada (16.08.2007) e pela exibição de apenas dois concretos fonogramas do reportório cuja gestão lhe cabe.
31. Na verdade, basta uma leitura atenta de toda a matéria (de facto e de direito) articulada pela Autora na petição inicial para se concluir que aquele pedido deduzido tinha como causa de pedir: a execução pública, constante sistemática e continuada, não autorizada nem licenciada de fonogramas no estabelecimento comercial explorado pela Ré e do qual é proprietária.
32. Sendo certo que a Autora ao mencionar a execução pública de dois fonogramas durante a pendência de uma ação de verificação fê-lo, apenas e tão-somente a título exemplificativo, com forma de sustentar a verdadeira causa de pedir, o que facilmente se retira das expressões “nomeadamente” e a “título exemplificativo” (inserta no artigo 39º da petição inicial).
33. Resultando de regras de experiência comum que atento o tipo de estabelecimento em questão, muitos outros foram os fonogramas aí executados publicamente, constituindo aqueles meros exemplos de tal execução reiterada e habitual naquele espaço.
34. Por outro lado, tendo ficado demonstrado que a Autora representa e licencia a utilização da quase totalidade do reportório da música gravada, nacional ou estrangeira comercializada e utilizada em Portugal, atenta a representatividade do reportório de música representada pela Autora, bem como, atento o tipo de estabelecimento em questão e a comprovada execução publica diária de fonogramas musicais, ninguém acreditará que o mesmo pudesse funcionar, no espaço temporal dos autos, sem executar qualquer música, em nenhum dos dias em que se encontra em funcionamento, cuja emissão da licença constitui prerrogativa da Autora, ora Apelante.
35. Tendo de resultar assim tal provado nos autos em face do alegado pela Autora e confessado pela Ré.
36. Impondo-se assim, que a Ré fosse condenada na totalidade do pedido deduzido a título de danos patrimoniais, sendo esta a contraprestação, a tarifa, que a Ré teria (e terá) que liquidar pela exibição continuada dos fonogramas musicais cuja gestão pertence à Autora.
37. Mas, ainda que fosse de considerar - o que não se concede - que o pedido deduzido nos presentes autos tinha como causa de pedir uma concreta violação dos direitos representados pela Autora (delimitado temporalmente ao dia 16.08.2007) e que havia sido apenas isso que tinha resultado provado – o que, uma vez mais, não se concede – ainda assim, seria forçoso concluir-se pela total procedência daquele pedido a título de indemnização por danos patrimoniais, pois que, no caso em análise é possível averiguar-se com grau de exatidão qual o valor dos danos sofridos pela Autora.
38. Na realidade, se a Ré tivesse pago (como o poderia e deveria ter feito) à Autora o licenciamento Passmusica relativo a 2007, no valor 312,01 €, o dano nunca teria ocorrido.
39. Ora, sendo o pagamento do licenciamento à Autora, a única contraprestação possível e o único meio idóneo de que a Ré poderia lançar mão para evitar a produção do dano patrimonial na esfera jurídica da Autora então, mostra-se forçoso concluir que o incumprimento daquela mesma obrigação terá de conduzir, necessariamente a uma indemnização de valor, no mínimo, equivalente, ao valor que se a obrigação tivesse sido cumprida.
40. Sendo de realçar que o valor devido pelo licenciamento seria exatamente o mesmo, independentemente do número de execuções públicas de fonogramas cuja gestão pertença à Autora, que fossem efetuadas publicamente pela Ré no seu estabelecimento, donde que, ainda que a causa de pedir se resumisse à execução pública de apenas dois fonogramas pertencentes à Autora, numa determinada data e apenas tal fosse provado, ainda assim, a Ré estaria constituída na obrigação de liquidar à Autora a supra referida quantia a título de danos patrimoniais.
41. Sendo tal indemnização (assim quantificada) a única que permite recolocar a Autora na situação em que estaria se não tivesse ocorrido os danos alegados e comprovados na ação.
42. Tendo esta posição sido defendida, entre nós, pela jurisprudência, a qual defende, igualmente que, caso assim não fosse, os Tribunais estariam a premiar as entidades prevaricadoras, beneficiando-as (sem qualquer causa que o justifique) em detrimento de todos os demais concorrentes cumpridores, ferindo, ao mesmo tempo os direitos da Autora e contrariando todos os princípios éticos subjacentes à obrigação de indemnizar, bem como as regras fixadoras da indemnização.
43. Acresce que, sem prejuízo de se mostrar necessário, in casu, chamar à colação as regras gerais relativas aos pressupostos da responsabilidade civil e os critérios de determinação do dano como conteúdo da obrigação de indemnizar, mostra-se ainda importante o disposto no artigo 13º da Directiva 2004/48/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de Abril de 2004 relativa ao respeito dos direitos de propriedade intelectual (Directiva Enforcement) segundo a qual, as autoridades judiciais ao estabelecerem o montante das indemnizações por perdas e danos deverão ter em conta aspetos como os lucros cessantes, lucros indevidos obtidos pelo infrator, danos morais, ou, em alternativa, estabelecer como indemnização uma quantia fixa com base em elementos como o montante das remunerações que teriam sido auferidas se o infrator tivesse solicitado autorização para utilizar o direito de propriedade em questão.
44. Embora a mencionada Diretiva não tenha sido transposta para o ordenamento jurídico português em data anterior ao tempo dos factos (ainda que já o devesse ter sido, pois a data limite prevista no diploma para a aludida transposição era até 29 de Abril de 2006), importa, reter os critérios indemnizatórios nela previstos.
45. Impondo-se, por isso, quanto mais não seja por recurso aos critérios explanados naquela Directiva, que a Ré fosse condenada no pagamento de uma indemnização exemplar, a qual não poderia ser, com o devido respeito, inferior ao valor peticionado a título de danos patrimoniais.
46. Impondo-se, igualmente, em face de ter sido provado a existência de dano patrimonial na esfera jurídica da Autora, resultante da lesão de seus direitos, que procedesse a pretensão desta na condenação da Ré no pedido formulado relativo à quantia correspondente ao ressarcimento dos encargos suportados com a proteção dos direitos lesados.
47. Por outro lado, da conjugação do número 2 do artigo 184º do C.D.A.D.C. com os preceitos 149º, número 3 e 108º número 2 a contrario, todos do C.D.A.D.C., resulta que sempre que a execução ou a comunicação pública não seja efetuada em privado, num meio familiar, o utilizador terá de obter a autorização prévia não só dos autores, como também dos titulares dos direitos conexos (no caso, os produtores dos fonogramas), pagando a respetiva remuneração a artistas e produtores.
48. Sendo que, todo o ato de comunicação de uma obra efetuado fora do domicílio particular, seja qual for o modo pelo qual a obra é dada a conhecer e pode ser fruída, é considerado um ato de comunicação pública.
49. Pelo que, é esse critério que determina se uma determinada execução de fonogramas é pública ou não, independentemente de o espaço (estabelecimento comercial) no qual tal atividade de execução pública de fonogramas ocorra se encontre com um ou vários clientes.
50. Não se verificando quanto a este ponto, ao contrário do sustentado pelo Mmo. a quo., qualquer deficiência da alegação da Autora na petição inicial.
51. Sendo que, mesmo que se considerasse, por mero exercício académico, como sustenta o Mmo. a quo que a presente ação de condenação havia de improceder em virtude da inexistência do dano patrimonial se ficar a dever à deficiente alegação por parte da Autora da causa de pedir, sempre se deveria entender que processualmente não deveria ter sido, desde logo, considerado o pedido manifestamente improcedente e proferida decisão de mérito absolvendo a Ré do pedido, mas sim, pelo contrário, ter sido proferido, em momento anterior, um despacho de aperfeiçoamento, mormente convidando a Autora a corrigir as insuficiências ou as imprecisões que o Mmo. a quo, entendesse que se verificavam na exposição ou concretização da matéria de facto da petição inicial – art. 508º.2 e 3 CPC.
52. Considerando tudo o exposto, e o mais que, doutamente, será suprido, a decisão recorrida violou, por erro de interpretação e de aplicação, nomeadamente o disposto nos artigos 264º, 268º, 272º, 273º, 265º.2, 484º.1, 508º. 2 e 3, 659º.1, 2 e 3, 660º.2, 668º.1 d), todos do Código de Processo Civil, bem como, o artigo 242º.1 d) do Código de Processo Penal, e ainda, os artigos108º.2, 141º.4, 149º.3, 184º, 195º, 197º, 199º, 200º, 203º, 211º e 221º, todos do Código de Direitos de Autor e Direitos Conexos e os artigos 9º, 10º da Diretiva 2004/48/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de Abril de 2004.
Não foram apresentadas contra-alegações.

Apreciando e decidindo

Como se sabe o objeto do recurso encontra-se delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, sem prejuízo das questões cujo conhecimento é oficioso, tendo por base as disposições combinadas dos artºs 660º n.º 2, 661º, 664º, 684º n.º 3 e 685º-A todos do Cód. Proc. Civil.
Assim, em síntese, do que resulta das conclusões, caberá apreciar:
1ª – Da nulidade da sentença;
2ª – Da violação por parte da ré dos direitos representados pela autora e respetivas consequências (indemnização por danos patrimoniais e encargos).
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Na decisão impugnada considerou-se assente o seguinte circunstancialismo factual:
1 Por escritura pública lavrada no 12º Cartório Notarial de Lisboa, em 26 de Novembro de 2002 foi constituída a Autora Audiogest, para a defesa dos direitos conexos e de outros direitos e interesses dos produtores de fonogramas.
2 A Autora encontra-se registada na IGAC (Inspecção Geral das Actividades Culturais).
3 A Autora Audiogest é a entidade de gestão coletiva que se encontra constituída, registada e mandatada para representar os Produtores Fonográficos em matérias relacionadas com a cobrança de direitos e, por acordos firmados com a GDA (entidade de gestão coletiva dos direitos dos artistas), a Audiogest está também mandatada para promover o licenciamento e cobrança das remunerações devidas aos artistas, intérpretes e executantes.
4 Esta atividade é presentemente desenvolvida pela Autora, em parceria com a referida GDA, através da emissão de uma licença com a referência “Passmusica”, que identifica o licenciamento conjunto de direitos conexos dos artistas, intérpretes e executantes e produtores fonográficos, habitualmente designados por “editores discográficos”.
5 Na sua atividade de licenciamento e cobrança de direitos conexos de produtores e artistas, a Autora, representa o repertório nacional e estrangeiro.
6 No que concerne ao repertório estrangeiro, a sua inclusão decorre, não só do licenciamento a companhias discográficas nacionais associadas da Autora Audiogest de fonogramas originalmente fixados noutros territórios, como também, dos acordos celebrados pela Autora com as suas congéneres estrangeiras.
7 A Autora licencia a utilização por parte dos eventuais interessados, da quase totalidade (cerca de 98%) do repertório da música gravada, nacional ou estrangeira, comercializada e utilizada em Portugal.
8 Fruto dos acordos firmados entre a Autora e a GDA, uma vez emitida a autorização, pela Audiogest, as remunerações pagas como contrapartida desta, são divididas com os artistas, em partes iguais, através da GDA ou, caso a GDA não represente, pontualmente, um determinado artista cuja prestação tenha sido fixada por um produtor fonográfico representado pela Audiogest, competirá àquele produtor pagar diretamente ao artista em causa (seja ele intérprete ou executante) a parcela a este devida, não já nos termos do acordo celebrado entre as entidades de gestão coletiva, mas nos termos de acordos individualmente firmados entre os artistas e os produtores.
9 O Restaurante denominado “FR Café Pub”, sito na Praceta do Pinhal, na Praia da Falésia, em Albufeira, propriedade da sociedade Ré B......... M. ............. – Actividades Turísticas e Hoteleiras, Lda. e explorado pela mesma, é um estabelecimento comercial aberto ao público.
10 Através de ações de fiscalização e verificação levadas a cabo por colaboradores da Autora, tomou esta conhecimento de que no referido estabelecimento, se procedeu à execução de fonogramas sem licença e autorização.
11 Durante a mencionada fiscalização que teve lugar no passado dia 16 de Agosto de 2007, período em que o estabelecimento se encontrava aberto ao público, estava a ser efetuada a execução pública de fonogramas, nomeadamente e a título exemplificativo:
Música: Hump; Superior
Artista: Black Eye Peas; Gentleman
Produtora: Universal; Sony/Bmg
12 O mencionado estabelecimento de encontrava-se aberto ao público e a funcionar diariamente, sendo certo que procede à execução pública de fonogramas em qualquer desses dias.
13 A sociedade Ré não possuía, como não possui, qualquer autorização dos produtores de fonogramas ou dos seus representantes, designadamente da Autora Audiogest, para proceder à execução ou comunicação pública, no referido estabelecimento, de fonogramas editados comercialmente ou de reprodutores dos mesmos.
14 Jamais pagou a remuneração equitativa devida à Associação Autora, em virtude da referida atividade de execução ou comunicação pública de fonogramas.
15 Foi enviada carta, em 22 de Agosto de 2007, a informar a sociedade Ré da necessidade de obter a respetiva licença e de pagar os direitos conexos devidos pela utilização de música na atividade do mencionado estabelecimento.
16 Apesar de interpelada com o envio da mencionada missiva, e bem como, toda a campanha informativa e de sensibilização levada a cabo pela Autora junto dos utilizadores sobre esta temática, através dos vários meios de comunicação social, a verdade é que, até hoje, não recebeu da sociedade Ré qualquer resposta.
17 A Autora fixa e publica os tarifários aplicáveis às várias categorias de direitos conexos e às suas diferentes formas de exploração, cobrados pela Autora, através do licenciamento identificado com a referência Passmusica, encontrando-se todos os tarifários disponíveis no site www.passmusica.pt.
18 A Associação Autora tem fixada uma tabela para as categorias de direitos de televisão terrestre ou por cabo, rádio terrestre ou via Internet, execução ou comunicação pública.
19 Na área da execução pública (utilização de música gravada em espaços abertos ao público) é fixado um tarifário, tendo em atenção a importância da música para a respetiva atividade, a área ou lotação do respetivo espaço, entre outros critérios.
20 O estabelecimento da ré é um restaurante que tem a lotação aproximada de 50 pessoas e que se encontra aberto ao público pelo menos 5 dias por semana.
21 A tarifa anual de execução pública de fonogramas fixada pela Autora para esses casos é de 312,01 € (trezentos e doze Euros e um cêntimo).
22 A Autora teve de suportar encargos, não apenas com o recrutamento, seleção e formação de colaboradores, como com as despesas inerentes ao desenvolvimento da atividade de fiscalização que desenvolve, com o tratamento da informação recolhida e ainda, com as tentativas goradas de obter o cumprimento voluntário das obrigações da agora Ré.

Conhecendo da 1ª questão
Salienta a autora recorrente que o Julgador a quo não emitiu pronúncia sobre as pretensões formuladas na al. a) e f) do petitório, o que constitui nulidade da sentença prevista no artº 668º n.º 1 al. d) do CPC.
O artº 668º n.º 1 al. d) do Cód. Proc. Civil, fulmina de nulidade a sentença em que o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não devia tomar conhecimento, sendo que a mesma está diretamente relacionada com o consignado no n.º 2 do artº 660º do CPC, servindo de cominação ao seu desrespeito.
Apreciada a arguição, constatamos que efetivamente se verifica arguida nulidade nas duas vertentes elencadas, pois nada foi explicitado, no teor da sentença, donde resulte ter o Julgador tido em atenção as aludidas pretensões, no sentido de as deferir ou indeferir.
No entanto, diremos que relativamente ao direito de autorização dos produtores ou de quem os represente (neste caso a autora) com vista à execução pública de fonogramas e videogramas e à necessidade de existência de pedido de autorização, o Julgador terá partido do pressuposto que essa era realidade, uma vez que na questão a decidir parte do princípio que esses direitos existem sendo a autora que os representa. No que se refere ao pedido de vista ao MP a omissão, certamente, deveu-se ao facto de se ter considerado a inexistência de danos indemnizáveis.
Seja como for e mesmo que se entenda que o peticionado em a) de acordo com a legislação em vigor, resulta da lei, tal não impede que no âmbito da ação e relativamente à ré em questão, o tribunal não possa sindicar tal direito, tal, como se afirmou no Ac. deste Tribunal de 14/07/2011, - Apelação 843/10.7TBABF.E1 no qual o presente relator figurou como adjunto:
Se é certo que a lei concede aos autores e aos produtores, por si ou através de quem os represente, o direito exclusivo de autorizar a emissão pública da obra musical e de fonogramas e videogramas (nº 2 do art.º 184º e art.º 149º, todos do CDADC), não é menos certo que podem os mesmos fazer valer tais direitos subjetivos em juízo, solicitando que quem viole tais direitos seja compelido a reconhecer o seu direito e a não emitir publicamente as suas obras sem que tenha a competente autorização. É nisso que materializa o exercício de um direito subjetivo. E foi isso que peticionou a A., enquanto representante de autores e produtores.
Daí que não se veja obstáculo a que o Tribunal “ a quo” se pronunciasse sobre tais pedidos por os mesmos resultarem da lei.”
Assim, ter-se-á tal em conta. - Neste sentido vide, também, Ac. TRE de 06/10/2011 na apelação 2670/09.5TBABF.E1. Donde suprindo a nulidade da sentença condenar-se-á a ré a reconhecer à autora o direito exclusivo de autorizar a utilização/execução pública de fonogramas/videogramas no estabelecimento comercial que explora, denominado “FR Café Pub”, relativamente aos autores e produtores que a mesma representa.
No que se refere ao pedido de vista ao MP o mesmo, em face da matéria dada como assente, também será deferido, para os efeitos que tiver por convenientes e adequados.
Todavia, sobre esta pretensão, não podemos deixar de dizer que se a autora vê tanto interesse que seja dada vista ao MP, porque em seu entender existe fundamento da prática pela ré de um crime de usurpação p. e p. pelos artºs 184º n.2 e 3, 195º e 197º todos do CDADC, certamente, até porque os factos são de Agosto de 2007, deveria já ter tomado a iniciativa de os participar ao MP, atendendo a que segundo afirma o crime em causa, até é crime de natureza pública.

Conhecendo da 2ª questão
A recorrente não se conforma com a absolvição da ré no que respeita aos pedidos de indemnização por danos patrimoniais formulados nas al. b) e d).
Na decisão recorrida o Julgador a quo, apesar de entender que “a ré procedeu à execução pública de fonogramas (pelo menos dois) sem autorização e sem pagar a remuneração devida” e de se tratar de “atuação ilícita (por violar direitos alheios), culposa e que provocou danos (desde logo, lucros cessantes ou, por outras palavras, os benefícios que deixaram de ingressar na esfera jurídica da autora em consequência das lesões)” concluiu pela inexistência “de um de um dano patrimonial (ou, sequer, que a execução dos fonogramas o tenha sido para o público – simplesmente porque a autora não o alega, não bastando para se chegar a essa conclusão, que se diga que houve “execução pública”, que deve sempre ser considerada como matéria de direito, sem que exista a integração dessa expressão por factos concretos – ou seja, que estejam pessoas no interior no estabelecimento).”
Em face dos factos assentes, não nos parece que esta seja a posição a ter em consideração por ser a correta e adequada.
Ao contrário do que salienta o Julgador a quo não se provou que a ré procedeu à execução pública de dois fonogramas, apenas, no dia 16/08/2007, mas sim que no estabelecimento da ré, um restaurante, que se encontra aberto ao público pelo menos 5 dias por semana, nele se procede à execução pública de fonogramas em qualquer desses dias. A alusão ao mencionado dia 16/08/2007, tem de ser visto e considerado como mero exemplo dessa execução reiterada e continuada no tempo e não como facto concreto descontínuo e desligado da realidade no âmbito da atividade do estabelecimento e da execução de fonogramas.
Donde em termos de normalidade, não se pode deixar de concluir, sob pena de ir contra as regras da experiência comum, que a ré passava publicamente os fonogramas ao longo do ano, deles retirando proveito em detrimento da autora e dos produtores dos mesmos.
Questão idêntica à em apreciação nos autos já foi decidida pelo Ac. do TRP de 27/01/2009, no processo 6702/08 (disponível em www.trp.pt) cuja argumentação, no que respeita à indemnização, não podemos deixar de sufragar e que passamos a transcrever parcialmente com os ajustes inerentes ao caso em apreço:
A interpretação do disposto no artº 211º do CDADC - “Para o cálculo da indemnização devida à parte lesada, deve atender-se à importância da receita resultante da conduta ilícita do infrator, designadamente do espetáculo ou espetáculos ilicitamente realizados.” (vigente à data da prática dos factos) - deve ser feita e que temos por mais adequada, é esta: a receita do espetáculo apenas poderá e deverá ser considerada se a autora alicerçar o seu pedido na mesma e se lhe for exigível, porque razoavelmente possível, a prova do seu valor.
Efetivamente, o pedido indemnizatório da responsabilidade civil não tem, necessariamente, de se fundar na receita do espetáculo.
O que importa é que a retribuição devida pelo uso legal e licenciado e a própria indemnização pelo uso ilícito e abusivo do fonograma se revele justa e equitativa em face dos elementos e circunstâncias emergentes do caso concreto.
Basta atentar no disposto nos artºs 165º n 3 e 178º n.2 do CDADC, que integram o conceito de remuneração equitativa e, concretamente no que ao tipo de reprodução em causa nos autos, no artº 184º nº3 o qual estatui que: «Quando um fonograma ou videograma editado comercialmente, ou uma reprodução dos mesmos, for utilizado por qualquer forma de comunicação pública, o utilizador pagará ao produtor e aos artistas intérpretes ou executantes uma remuneração equitativa, que será dividida entre eles em partes iguais, salvo acordo em contrário.»
Ou seja a lei não impõe, apriorística e inelutavelmente, que a indemnização se funde, concreta e matematicamente, na receita do espetáculo.
Antes pelo contrário, apenas pretende e se satisfaz que seja fixada uma indemnização «equitativa».
Ora esta indemnização pode ser consecutida pela perspetivação de diversos critérios ou parâmetros objetos, orientadores do juízo de equidade, que não apenas pelo da receita do espetáculo.
Assim, se o autor sufraga o seu direito à indemnização nas receitas do espetáculo, então, por via de regra, deve prová-las. Note-se, porém, que tal prova, por vezes, pode não se tornar fácil, já que a autora pode não ter acesso a elementos essenciais para provar o montante das receitas da ré. Encontrando-os, neste caso, perante a denominada diabólica probatio que poderá implicar o atenuar do ónus probandi ou fazer emergir o princípio da cooperação da ré, tudo com vista á obtenção da decisão adequada e materialmente justa.
Mas se o autor fundamenta o seu pedido noutra causa petendi, então, em princípio, sobre ela não impende o ónus da prova da receita.
Este entendimento foi, aliás, consagrado na nova redação dada ao CDADC e ao CPI, introduzida pela Lei nº16/2008 de 01 de Abril, que transpôs para a ordem jurídica portuguesa a citada Diretiva 1004/48/CE de 29 de Abril.
Em matéria de CPI, para além da introdução de um novo n.º 2 ao artigo 317º e da revogação dos artigos 339.º e 340.º, são introduzidos quinze novos artigos (artigo 338.º-A a 338.º-P) que preveem, entre outros aspetos:
- Medidas para obtenção e preservação da prova (procuram dar resposta, por um lado, à dificuldade causada pelo facto de as provas se encontrarem, normalmente, sob controlo do infrator e, por outro, à necessidade de urgência neste domínio, evitando a destruição ou ocultação de prova);
- Obrigação de prestar informação (permite que o tribunal ordene ao infrator ou a terceiros o fornecimento de dados sobre a origem e sobre as redes de distribuição de bens ou serviços em que se manifeste violação de direitos);
- Medidas provisórias e cautelares (visam impedir violações futuras ou iminentes dos direitos e proibir a continuação da alegada violação);
- Medidas decorrentes da sentença (são previstas medidas corretivas, como a retirada ou a destruição dos bens, e medidas que inibem a continuação da infração);
- Medidas atinentes à publicidade das decisões (permitem que o tribunal, a pedido do lesado e a expensas do infrator, proceda à publicitação de todas as informações respeitantes à decisão);
-Princípios a observar no cálculo das indemnizações que visam ressarcir o titular dos direitos pelos danos causados pela infração.
No âmbito do CDADC e em sede de direito de indemnização, deu-se consagração legal ao desiderato da Diretiva no sentido de que há que impedir o infrator de beneficiar da lesão dos direitos da propriedade intelectual uma vez que, na prática dos nossos Tribunais, era frequente que a sua condenação fosse inferior ao seu lucro, não sendo, por tal facto, impeditiva ou sequer dissuasora da continuação da prática ilícita.
Destarte, reza, atualmente o artº 211º:
1 - Quem, com dolo ou mera culpa, viole ilicitamente o direito de autor ou os direitos conexos de outrem, fica obrigado ai indemnizar a parte lesada pelas perdas e danos resultantes da violação.
2 - Na determinação do montante da indemnização por perdas e danos, patrimoniais e não patrimoniais, o tribunal deve atender ao lucro obtido pelo infrator, aos lucros cessantes e danos emergentes sofridos pela parte lesada e aos encargos por esta suportados com a proteção do direito de autor ou dos direitos conexos, bem como com a investigação e cessação da conduta lesiva do seu direito.
3 - Para o cálculo da indemnização devida á parte lesada, deve atender-se á importância da receita resultante da conduta ilícita do infrator, designadamente do espetáculo ou espetáculos ilicitamente realizados.
4 - O tribunal deve atender ainda aos danos não patrimoniais causados pela conduta do infrator, bem como às circunstâncias da infração, à gravidade da lesão sofrida e ao grau de difusão ilícita da obra ou da prestação.
5 - Na impossibilidade de se fixar, nos termos dos números anteriores, o montante do prejuízo efetivamente sofrido pela parte lesada, e desde que esta não se oponha, pode o tribunal, em alternativa, estabelecer uma quantia fixa com o recurso á equidade, que tenha por base, no mínimo, as remunerações que teriam sido auferidas caso o infrator tivesse solicitado autorização para utilizar os direitos em questão e os encargos por aquela suportados com a proteção do direito de autor ou dos direitos conexos, bem com a investigação e cessação da conduta lesiva do sue direito.
6- Quando, em relação á parte lesada, a conduta do infrator constitua pratica reiterada ou se revele especialmente gravosa, pode o tribunal determinar a indemnização que lhe é devida com recurso á cumulação de todos ou de alguns dos critérios previstos nos nºs 2 a 5. (sublinhado nosso)
Verifica-se, assim, que, presentemente, a indemnização assume uma tríplice vertente ou natureza, a saber: a) ressarcitória, na medida em que pretende tornar indemne danos emergentes, lucros cessantes, danos morais (que sejam considerados provados), b) Corretiva, pois que visa remover o lucro ilícito e os benefícios indevidamente obtidos pelo infrator; c) Preventiva e dissuasora já que pretende evitar que, no futuro o infrator reitere a sua atividade ilegal.
Sendo que, não obstante privilegiar a indemnização correspondente ao prejuízo efetivamente sofrido, no caso de não se apurarem factos que o concretizem, nem seja perspetivável que tal se verifique em sede de execução de sentença, sempre será possível, a título subsidiário, arbitrar tal indemnização equitativamente.
Importando ainda notar que para que esta indemnização alternativa possa ter lugar, duas restrições são impostas. O lesado não pode opor-se e o quantum não pode ser inferior às remunerações que teriam sido auferidas caso o infrator tivesse solicitado autorização para utilizar os direitos em questão e os encargos por aquela suportados com a proteção do direito de autor ou dos direitos conexos, bem com a investigação e cessação da conduta lesiva do sue direito.
O que demonstra que a lei considera que o prejuízo real e efetivo seguramente não é inferior a tais valores e, por via de regra, será até superior.
Atente-se, enfim, o aspeto preventivo – e, até, sancionatório, no plano do direito civil – que dimana da cumulação indemnizatória permitida pelo nº6 para os casos de prática reiterada ou especialmente gravosa.
Volvendo ao caso concreto reitera-se a bondade e razoabilidade da pretensão da autora. Pois que ela fundamentou o seu pedido desde logo no valor que seria devido pela emissão da licença necessária à emissão pública dos fonogramas.
Tal valor não se alcança possa ser superior aos danos decorrentes da importância da receita resultante do execução musical ilicitamente realizada, num restaurante que se encontra aberta ao público, pelo menos cinco dias por semana, com a capacidade para 50 pessoas e no qual os fonogramas em causa, dependentes de licença da autora para poderem ser executados, são emitidos diariamente.
E a causa pretendi invocada pela autora não contende ou fere normas – se bem interpretadas – do CDADC, antes se coadunando com as mesmas e com a interpretação sistemática, lógica e teleológica de todo o diploma. E se mostra a mais consentânea com a justa composição do litígio e a realização da justiça material do caso concreto.
Na verdade e se mais não houvesse – que há, como se viu – há sempre que não olvidar e ter presente que, a aplicação judiciária do direito não pode limitar-se à mera subsunção lógico-formal a conceitos legais. Mas partindo do facto, aplica a este a norma concretizadora do direito de que o facto é revelação, como sua emergência social. A decisão assumirá a função concretizadora e criativa do direito, realizando-o, no momento da sua aplicação – cfr Acórdão do STJ de 13.07.2004, in dgsi.pt, p.04B2176.

Havendo ainda que não descurar que, como se viu, na sua atual redação o CDADC expressamente consagra a possibilidade de o juiz, ex officcio, e não obstante o autor impetrar indemnização com base nos danos reais sofridos e nos lucros do infrator, poder, à míngua de prova nesse sentido ou de qualquer outra causa que impossibilite a fixação de tais danos, arbitrar, por recurso à equidade, uma quantia que não pode ser inferior à necessária para o infrator ter autorização para a utilização dos direitos em questão.
Tudo na perspetiva da obtenção da justiça na sua vertente comutativa, relativa ou comparativa.
Assim, é de revogar a sentença na parte em que absolveu a ré da condenação no pagamento da indemnização peticionada na al. b) do petitório e proceder à sua condenação no montante peticionado acrescido dos respetivos juros de mora.
Pede, também, a recorrente a revogação da sentença no que concerne à absolvição da pretensão da condenação da ré no pagamento da quantia de 1.000,00, correspondente a ressarcimento dos encargos suportados por aquela com a proteção dos direitos lesados pela sociedade Ré, bem como, com a investigação e cessação da conduta lesiva da mesma.
Também neste segmento e em face dos considerandos tecidos, porque estamos perante ressarcimento de encargos em que a componente de ordem patrimonial é exclusiva, se justifica a revogação da decisão.
Pois, como resulta do ponto 22 da matéria assente a autora teve de suportar encargos, não apenas com o recrutamento, seleção e formação de colaboradores, como com as despesas inerentes ao desenvolvimento da atividade de fiscalização que desenvolve, com o tratamento da informação recolhida e ainda, com as tentativas goradas de obter o cumprimento voluntário das obrigações da ré.
No entanto, sendo impossível determinar com rigor, o montante de tais custos em encargos, apenas com referência à ré, até porque não foram indicados quantitativos relativamente ao gasto anual da autora com tais encargos, nem números relativos a concretos infratores e respetivas grandezas a considerar, o quantitativo indemnizatório a arbitrar, sendo equitativo, não pode, a nosso ver, ser superior ao dano patrimonial real e efetivo que a autora pretende ver ressarcido e cujo quantitativo afirma ser de € 312,01, quantia esta cujo direito ao ressarcimento lhe foi efetivamente reconhecido.
Assim, no âmbito do ressarcimento dos encargos e na estrita medida da referência à atuação da ré, entendemos ser justo equitativo fixar tal montante em € 150,00.
Relevam, assim, nos termos referidos, as conclusões da recorrente, impondo-se a revogação da decisão na parte impugnada e de acordo com o supra explicitado.
Para efeitos do n.º 7 do artº 713º do Cód. Processo Civil, em conclusão:
1 – A nulidade da sentença a que se alude no artº 668º n.º 1 al. d) do Cód. Proc. Civil, têm-se por verificada quando o Julgador omita pronúncia sobre um dos pedidos formulados pelo autor, sendo tal pedido independente de outros sobre os quais incidiu pronúncia.
2 – No domínio do Código dos Direitos de Autor e Direitos Conexos, o pedido indemnizatório do demandante não tem, necessariamente, de ser alicerçado nos prejuízos que tenha sofrido e nos benefícios ilícitos do infrator, efetivos e reais, antes podendo ser satisfeito por apelo e com base nas remunerações que teriam sido auferidas caso o infrator tivesse solicitado autorização para utilizar os direitos em questão, as quais, por via de regra, se apresentam como um minus relativamente aqueles prejuízos, tanto assim que a atual lei não permite fixação de quantum inferior às mesmas.
*
DECISÂO
Pelo exposto, nos termos supra referidos, decide-se julgar procedente a apelação e, consequentemente, revogar a decisão recorrida, na parte impugnada e, em consequência decide-se:
a) Condenar a ré a reconhecer à autora o direito exclusivo de autorizar a utilização/execução pública de fonogramas/videogramas no estabelecimento comercial que explora, denominado “FR Café Pub”, relativamente aos autores e produtores que a mesma representa.
b) Condenar a ré a pagar à autora a título de danos patrimoniais a quantia de € 312,01, acrescida do montante de € 50,22 de juros de mora vencidos até 15/07/2011 e, desde esta data dos juros de mora vencidos e vincendos, contabilizados á taxa supletiva legal, até integral pagamento.
c) Condenar a ré a pagar à autora a quantia de € 150,00 a título de ressarcimento de encargos.
d) Ordenar, após trânsito, no tribunal recorrido, se abra vista ao MP para os fins tidos por convenientes.
Custas pela apelada.

Évora, 29 de Março de 2012




Mata Ribeiro



Sílvio Teixeira de Sousa



Rui Machado e Moura