Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
| ||
Relator: | BERNARDO DOMINGOS | ||
Descritores: | CABEÇA DE CASAL PRESTAÇÃO DE CONTAS PRESCRIÇÃO | ||
![]() | ![]() | ||
Data do Acordão: | 05/20/2004 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
![]() | ![]() | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO CÍVEL | ||
Decisão: | PROCEDENTE | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário: | I - Em regra, exceptuados os direitos indisponíveis e aqueles que a lei declare isentos, todos os direitos, sejam ou não de crédito, estão sujeitos à prescrição, pelo seu não exercício durante um certo lapso de tempo (art.º 298 º n.º 1 do CC). II - O direito de exigir a prestação de contas a quem esteja, por lei ou negócio jurídico obrigado a prestá-las não é um direito indisponível nem está isento de prescrição, já que nenhuma norma legal o estabelece. Assim é evidente que pode extinguir-se pelo decurso do prazo legal de prescrição, que no caso é o prazo ordinário de 20 anos (art.º 309º do CC). III - O cabeça de casal da herança duma herança é o legal administrador da mesma pois a administração da herança é-lhe deferida por lei (art.º 2079º do CC) e é exercida até à sua liquidação e partilha. IV – O prazo de prescrição da obrigação de prestação de contas pela administração feita pelo cabeça de casal não começa nem corre, «entre as pessoas cujos bens estejam sujeitos, por lei ( como é o caso do cabeça de casal) ou determinação judicial ou de terceiro, à administração de outrem e aquelas que exercem a administração, até serem aprovadas as contas finais» - al. c) do art.º 318º do CC. | ||
![]() | ![]() | ||
![]() | ![]() | ||
Decisão Texto Integral: | * Acordam em Conferência os Juízes da Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: Proc.º N.º 807/04-2 Apelação 2ª Secção Tribunal Judicial da Comarca de ...... – Proc. n.º 349/02 Recorrente: A.... Recorrido: B..... * A...., viúva, doméstica, residente em ......................, veio intentar contra B...., reformado, acção especial de prestação de contas, pedindo que o R., na qualidade de cabeça de casal da herança aberta por óbito C....., preste contas da administração que fez dos bens dessa herança, da qual que era único e universal herdeiro D..., filho da falecida e do R. e também ele já falecido.Contestou o R. alegando a abertura da herança se deu-se 15/7/75, pelo que o prazo de prescrição do direito de exigir as contas se iniciou em 15/7/76. Assim decorridos que estão mais de 27 anos o referido direito se encontra prescrito. Respondeu a A. defendendo que por estarem em causa direitos reais não ocoore a prescrição do direito. Findos os articulados, a Sr.ª Juíza proferiu despacho saneador tendo julgado procedente a arguida excepção da prescrição e em consequência, absolveu o R. do pedido. Inconformada veio a A. interpor recurso de apelação, tendo terminado as suas alegações, com as seguintes Conclusões: «1. Salvo o devido respeito por opinião diversa, a decisão proferida pelo tribunal a quo, não foi aquela a que os elementos constantes dos Autos, deveriam conduzir se analisados e apreciados correctamente. Efectivamente,2. Considerou-se procedente a excepção de prescrição invocada pelo requerido, por errado entendimento da natureza dos direitos que se discutem; De facto, 3. Entenderam-se como direitos de crédito, o que achamos serem verdadeiros direitos reais; 4. E como direitos reais que são, não prescrevendo, a douta decisão recorrida enferma de vício interpretativo, e, como tal, susceptível de ser revogada. 5. É o que se vem pedir ao tribunal ad quem, que, nos termos da fundamentação vertida no presente recurso, declare revogada a douta sentença recorrida, porque não integradora da previsão dos artigos 298°, 2059° e 2075° do C.C. e ainda dos artigos 1014° e ss. do C.P.C.. ordenando-se a prestação de contas pelo Apelado, conforme requerido.» Contra-alegou ao recorrido, pedindo a manutenção do julgado. * Na perspectiva da delimitação pelo recorrente [1] , os recursos têm como âmbito as questões suscitadas pelos recorrentes nas conclusões das alegações (art.ºs 690º e 684º, n.º 3 do Cód. Proc. Civil) [2] salvo as questões de conhecimento oficioso (n.º 2 in fine do art.º 660º do Cód. Proc. Civil).Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. * Das conclusões de recurso resulta que a única questão a decidir é se ocorreu ou não a prescrição do direito de exigir a prestação de contas.** Vejamos. Sustenta a recorrente que a prescrição não ocorre porquanto o pedido de prestação de contas se fundamenta em direitos reais e consequentemente, nos termos do disposto no n.º 3 do art.º 298º do CC, tais direitos não prescrevem. Neste aspecto não assiste qualquer razão à recorrente, porquanto o que está em causa na acção não são os direitos reais sobre coisas integrantes da herança mas sim as contas da administração dessa herança independentemente de se virem a traduzir num crédito ou num débito. Em regra, exceptuados os direitos indisponíveis e aqueles que a lei declare isentos, todos os direitos, sejam ou não de crédito, estão sujeitos à prescrição, pelo seu não exercício durante um certo lapso de tempo (art.º 298 º n.º 1 do CC). O direito de exigir a prestação de contas a quem esteja, por lei ou negócio jurídico obrigado a prestá-las não é um direito indisponível nem está isento de prescrição, já que nenhuma norma legal o estabelece. Assim é evidente que pode extinguir-se pelo decurso do prazo legal de prescrição, que no caso é o prazo ordinário de 20 anos (art.º 309º do CC). No caso dos autos é indiscutível que à data da propositura da acção, tal prazo há muito se mostrava excedido e não tendo sido alegados, como não foram, factos que determinassem a interrupção de tal prazo, tudo apontava no sentido de que a prescrição teria ocorrido e como tal se decidiu. Porém não se averiguou se neste caso ocorreria alguma causa de suspensão do prazo prescricional! A exigência da prestação de contas tem como fundamento ser o R. o cabeça de casal da herança aberta por óbito de sua mulher e como tal o legal administrador da mesma. Efectivamente a administração da herança é-lhe deferida por lei (art.º 2079º do CC) e é exercida até à sua liquidação e partilha. Nos termos do disposto na al. c) do art.º 318º do CC a prescrição não começa nem corre, «entre as pessoas cujos bens estejam sujeitos, por lei ou determinação judicial ou de terceiro, à administração de outrem e aquelas que exercem a administração, até serem aprovadas as contas finais». O caso dos autos enquadra-se nesta previsão. Na verdade, o R. tendo a qualidade de cabeça de casal exerceu a administração da herança aberta por óbito da mulher e de que era único herdeiro o filho do casal, marido da A.. Assim entre os herdeiros e o cabeça de casal, em tudo o que respeite aos bens da herança sob administração do cabeça de casal, não se iniciou nem correu qualquer prazo de prescrição, pelo que esta não pode ter-se como verificada. * Deste modo e pelo exposto, embora com fundamento diferente do invocado na apelação, julga-se a mesma procedente e em consequência revoga-se o despacho recorrido, na parte em que julgou verificada a excepção de prescrição, devendo os autos prosseguir seus termos.** Custas pelo recorrido. Registe e notifique. Évora, em ( Bernardo Domingos – Relator) (Sérgio Abrantes Mendes– 1º Adjunto) ( José Feteira – 2º Adjunto) ______________________________ [1] O âmbito do recurso é triplamente delimitado. Primeiro é delimitado pelo objecto da acção e pelos eventuais casos julgados formados na 1.ª instância recorrida. Segundo é delimitado objectivamente pela parte dispositiva da sentença que for desfavorável ao recorrente (art.º 684º, n.º 2 2ª parte do Cód. Proc. Civil) ou pelo fundamento ou facto em que a parte vencedora decaiu (art.º 684º-A, n.ºs 1 e 2 do Cód. Proc. Civil). Terceiro o âmbito do recurso pode ser limitado pelo recorrente. Vd. Sobre esta matéria Miguel Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lex, Lisboa -1997, págs. 460-461. Sobre isto, cfr. ainda, v. g., Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos, Liv. Almedina, Coimbra - 2000, págs. 103 e segs. [2] Vd. J. A. Reis, Cód. Proc. Civil Anot., Vol. V, pág. 56. |