Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
58606/23.6YIPRT.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: VÍTOR AMARAL
Descritores: DIREITO DO UTENTE A FACTURAÇÃO MENSAL DETALHADA
EMISSÃO DE FACTURA GLOBAL ABRANGENDO OITO MESES
RECUSA DO UTENTE EM PAGAR
SOLICITAÇÃO DE FACTURA MENSAL DETALHADA
Data do Acordão: 10/25/2024
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO LOCAL CÍVEL DA COVILHÃ
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGO 607.º, 3 A 5, CPC
ARTIGOS 302.º; 325.º; 762.º, 1; 763.º, 1; 777.º, 1 E 2 E 817.º, DO CÓDIGO CIVIL
Sumário: 1. - O preceito do art.º 10.º, n.º 1, da Lei n.º 23/96, de 26-07, tem finalidade protetiva do utente/consumidor na sua relação contratual com o prestador de determinados serviços públicos essenciais, como o serviço de fornecimento de energia elétrica, razão pela qual o legislador estabeleceu, nesta latitude do sistema, um regime prescricional especial, fixando um curto prazo de prescrição – de seis meses – para os créditos do prestador do serviço referentes ao «preço do serviço prestado».

2. - Impondo a lei o direito do utente a uma fatura que especifique devidamente os valores que apresenta, fatura a dever ter uma periodicidade mensal, devendo discriminar os serviços prestados e as correspondentes tarifas (art.º 9.º, n.ºs 1 e 2, daquela Lei n.º 23/96), o prestador do serviço público essencial (no caso, fornecimento de energia elétrica) infringe essa disposição imperativa, de proteção da parte tipicamente débil, se emite uma (única) fatura que engloba um período de aproximadamente oito meses, com um valor global de preço de € 10.359,04, apenas fazendo constar da fatura, no essencial, valores parcelares de consumo, respetivo preço e potência contratada.

3. - Se a contraparte (utente), recebida aquela fatura, solicita o envio das faturas mensais correspondentes, por haver obrigatoriedade legal de faturação mensal, razão pela qual a fatura emitida é tida por inválida e ilegal, apenas se disponibilizando para pagamento, do que viesse a mostrar-se devido, após o recebimentos das faturas mensais em falta, perante o que o prestador do serviço se recusou a proceder a tal faturação mensal, o que levou a que o utente recusasse qualquer pagamento, vindo a invocar a prescrição do crédito, tal sua conduta não configura renúncia da prescrição ou reconhecimento/confissão quanto ao direito creditório, naquele montante faturado, nem ocorre qualquer causa de interrupção do prazo prescricional.

Decisão Texto Integral:

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra:


***

I – Relatório

A..., S. A.”, com os sinais dos autos,

intentou ([1]) procedimento de injunção, posteriormente transmutado em ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato, de valor superior à alçada do Tribunal da 1.ª instância, ao abrigo do DLei n.º 269/98, de 01/09, contra

B..., Ld.ª”, também com os sinais dos autos,

pedindo o pagamento dos montantes de € 10.359,04, a título de capital, € 312,76, a título de juros de mora vencidos, bem como € 102,00, correspondente a taxa de justiça liquidada, num total, assim, de € 10.773,80.

Invocou, para tanto, que:

- no exercício da atividade comercial de cada uma das partes, estas celebraram, entre si, em 09/05/2022, um contrato de fornecimento de energia elétrica;

- âmbito em que a Requerente procedeu à emissão mensal das respetivas faturas, devendo a Requerida proceder ao seu pagamento no prazo de 30 dias contados da data do fecho da faturação, através de débito direto na conta que indicou e autorizou para o efeito;

- todavia, por ausência de saldo na conta a debitar, a Requerida não procedeu ao pagamento da fatura que identifica, no valor de € 10.359,04, à qual acrescem os juros de mora vencidos até 28/05/2023, perfazendo os aludidos € 312,76.

A Requerida, deduzindo oposição e concluindo pela improcedência da demanda, alegou, em síntese, que:

- a Requerente no requerimento injuntivo não discrimina quais as prestações de serviços (nem quanto às quantias, nem quanto às datas de emissão/faturação e de vencimento);

- as faturas mensais aludidas não constam da contabilidade da oponente, nem sequer lhe foram enviadas;

- a Requerente enviou à Requerida uma comunicação de email, reclamando o pagamento de uma fatura do valor de € 10.359,04, desconhecendo a Requerida as alegadas faturas mensais, bem como quais os respetivos serviços faturados;

- ocorre ineptidão do requerimento inicial, não tendo a Requerente concretizado a causa de pedir, limitando-se a reclamar o referido valor;

- não pode a Requerida invocar a prescrição, por desconhecer a que serviços se refere a demandante;

- o pedido formulado configura abuso do direito.

Na sequência de vicissitudes várias, julgada improcedente a invocação de ineptidão da petição inicial, e observado convite ao aperfeiçoamento do requerimento inicial, com impugnação pela contraparte, a qual, para além do mais, invocou a prescrição do direito da demandante, concluindo pela decorrente improcedência do pedido, veio a impetrante pronunciar-se sobre tal matéria de exceção, no sentido da sua improcedência, mais peticionando a condenação da contraparte por litigância de má-fé (em multa e indemnização), o que mereceu oposição desta.

Realizada a audiência final, com produção de prova, foi proferida sentença, datada de 03/05/2024, com o seguinte dispositivo/decisão:

«1 – Julgar parcialmente procedente a excepção de prescrição invocada quanto ao peticionado relativo aos períodos de consumo / prestação de serviços de 09.05.2022 a 03.06.2022; de 04.06.2022 a 30.06.2022; de 01.07.2022 a 03.08.2022; 04.08.2022 a 03.09.2022; 04.09.2022 a 03.10.2022; 04.10.2022 a 03.11.2022; de 04.11.2022 a 03.12.2022, e em consequência absolvo a R. (…) do pedido no que a esta parte concerne contra si peticionado formulado pela A.

2 – Condenar a R. (…) a pagar à A. A..., S.A., a quantia de 1.485,82€ (…), referente ao período de consumo / prestação de serviços de 04.12.2022 a 03.01.2023, a título de capital, acrescida dos juros de mora vencidos contabilizados, à taxa legal comercial, desde a data de vencimento em 02.02.2023, e dos juros de mora vincendos até efectivo e integral pagamento.

3 – Absolvo a R. do pedido de condenação em litigância de má-fé contra si peticionado.

4 - Condeno A. e R. nas custas na proporção do decaimento que se fixa, respectivamente, em 85% e 15%.».

Inconformada com o decidido (parte absolutória da sentença), vem a A. interpor o presente recurso, apresentando alegação respetiva e as seguintes

Conclusões ([2]):

«1 – À exceção do período de faturação que é superior ao que a lei determina, a fatura nº 10FT-EE23/998, remetida à recorrida em 23.01.2023 (cfr. factos provados 14 e 17), cumpre com todos os requisitos legais, e, como tal, contém todas as informações necessárias para a recorrida poder avaliar e, querendo, invocar a prescrição das quantias nela inscritas (nomeadamente, mas não só, os períodos de faturação, as quantidades de eletricidade consumidas, os demais serviços cobrados, e respetivos preços e prazos de pagamento).

2 – O incumprimento do dever de emitir faturas com periodicidade mensal não põe em causa o regime aplicável em sede de prescrição, pelo que, nesta matéria, não se verificou qualquer prejuízo para a recorrida.

3 - Mesmo que não se entenda como referido na conclusão 1, o que se refere sem conceder, haverá, então, que se considerar, em linha com a decisão a quo, que a informação constante dos documentos a que se referem os factos provados 19 e 20 é suficiente para a recorrida poder avaliar e invocar a prescrição.

4 – Tal informação não foi facultada à recorrida apenas com o aperfeiçoamento do requerimento de injunção junto aos autos em 02.10.2023, mas sim em 07.03.2023 (cfr. FP 19).

5 – No que concerne a períodos de faturação, serviços cobrados, quantidades consumidas, e preços aplicados (ou seja, os elementos necessários para verificar se os créditos reclamados pela recorrente se encontravam ou não prescritos), a informação constante do aperfeiçoamento do requerimento de injunção é a mesma que consta da fatura e dos documentos a que aludem os factos provados 19 e 20.

6 - Pelo que ao decidir que só com o requerimento de aperfeiçoamento a recorrida ficou em condições de invocar a prescrição, a decisão sob recurso desconsiderou e não valorou os documentos a que se referem os FP 14, 19 e 20, ferindo-a de erro de julgamento.

Acresce:

7 - Pela comunicação que constitui o documento identificado no facto provado 18, a recorrida reconheceu o recebimento da fatura em causa nos autos e o seu valor, reconheceu os serviços (fornecimento de energia elétrica) que lhe foram prestados pela recorrente, e assumiu a obrigação de pagar em prestações o valor da fatura, o que fez quando não podia desconhecer a eventual existência de quantias prescritas, visto que, entre o mais, nessa comunicação foi representada por advogada.

8 – A recorrida apenas invocou que a fatura era inválida por não dizer respeito a um período mensal, e por violar deveres acessórios de comunicação (que não concretizou, nem a sentença a quo reconheceu), tendo solicitado a sua substituição por faturas mensais, pretensão que a recorrente declinou por não ser possível e à qual a recorrida não reagiu (cfr. FP 19 e 20).

9 – O comportamento da recorrida mencionado nas duas conclusões precedentes, demonstra, com segurança, que a recorrida fez crer à recorrente que assumia o dever jurídico de pagar todos os valores constantes da fatura.

10 – O comportamento da recorrida mencionado nas conclusões 7 e 8, e descrito no FP 18, por si e conjugado com o teor dos documentos a que aludem os FP 19 e 20, consubstancia quer uma renúncia da prescrição estabelecida pelo nº 1 do art. 10º da Lei nº 23/96, de 26/07, quer uma interrupção do decurso do respetivo prazo (em relação, e respetivamente, aos créditos já prescritos e aos não prescritos à data dessa comunicação – 09.02.2023).

11 – Os créditos já prescritos à data da renúncia à prescrição correspondem aos valores a pagar referentes aos períodos de consumo/faturação ocorridos entre 09.05.2022 e 03.06.2022, entre 04.06.2022 e 30.06.2022, e entre 01.07.2022 e 03.08.2022.

12 – Os créditos abrangidos pela interrupção da prescrição correspondem aos valores a pagar referentes aos períodos de consumo/faturação ocorridos entre 04.08.2022 e 03.09.2022, entre 04.09.2022 e 03.10.2022, entre 04.11.2022 e 03.12.2022, e entre 04.12.2022 e 03.01.2023.

13 - Pelo que é forçoso concluir que, ao contrário do decidido pela sentença a quo, não ocorreu a prescrição do direito da recorrente ao recebimento do preço, no que concerne a todas as quantias constantes da fatura objeto do presente processo.

14 – A decisão recorrida enferma de erro de julgamento pois: (i) ao considerar que, apenas perante o teor do requerimento injuntivo aperfeiçoado, a recorrida ficou na posse da informação necessária à invocação da prescrição, desconsiderou e não valorou os documentos a que se referem os FP 14, 19 e 20; e (ii) ao considerar que não se verificou a renúncia da prescrição, nada dizendo quanto à interrupção da mesma, não valorou corretamente o teor do documento transcrito no FP 18, por si e conjugado com o teor do transcrito nos FP 19 e 20.

15 – O erro de julgamento atrás identificado, determinou uma incorreta subsunção dos factos ao direito, nomeadamente na apreciação da questão da renúncia da prescrição, e na ausência de atribuição de consequências sobre a interrupção do prazo prescricional, o que acarreta a violação, pela sentença sob recurso, do disposto nos arts. 302º e 325º do Código Civil.

Termos em que deve ser concedido provimento ao presente recurso, devendo, em consequência, ser a decisão recorrida revogada e substituída por outra que determine a improcedência da exceção da prescrição invocada pela recorrida e, por tal, condene a recorrida a pagar à recorrente o montante total de 10.359,04€ constante da fatura nº 10FT-EE23/998, acrescido de juros de mora contados desde a data do seu vencimento (02.02.2023), até efetivo e integral pagamento, tudo como é de inteira

J U S T I Ç A !».

Contra-alegou a parte recorrida, pugnando pela manutenção da decisão sob recurso.

*

O recurso foi admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo, tendo então sido ordenada a remessa do processo a este Tribunal ad quem, onde foi mantido o regime fixado.

Nada obstando, na legal tramitação, ao conhecimento do mérito do recurso, cumpre apreciar e decidir.

                                               *

II – Âmbito recursivo

Sendo o objeto do recurso delimitado pelas respetivas conclusões, pressuposto o objeto do processo delimitado nos articulados das partes, está em causa na presente apelação saber, em matéria de direito, se ocorre, ou não, a sentenciada prescrição do direito da A., designadamente, se os factos provados consubstanciam, “quer uma renúncia da prescrição” (art.º 302.º do CCiv.), “quer uma interrupção do decurso do respetivo prazo” (conclusão 10.ª), ou mesmo o reconhecimento do direito (art.º 325.º do CCiv.).

                                               *

III – Fundamentação

         A) Quanto à matéria de facto

1. - A factologia a considerar como assente/provada para decisão do recurso é a que consta da parte fáctica da sentença – por não objeto de impugnação recursiva –, com o seguinte teor:

«1) A A. e a R., no exercício da respectiva atividade comercial, celebraram entre si, em 09.05.2022, à distância, um contrato de fornecimento de energia elétrica em baixa tensão normal, tendo por objeto o CPE ...93....

2) O contrato id. em 1) foi celebrado pelo prazo de 1 ano, renovável por igual período, podendo a R. opor-se à renovação mediante o envio de carta registada à A. com a antecedência de 60 dias sobre a data da renovação.

3) Por via desse contrato, a A. obrigou-se a fornecer energia elétrica ao estabelecimento da R. sito na Rua ..., ..., e correspondente ao CPE id. em 1)

4) A R. contratou com a A. uma potência de 20,7 kVA, para um ciclo semanal sem feriados.

5) Lê-se no n.º 1 da cláusula primeira do contrato id. em 1) sob a epígrafe “preço do fornecimento de energia”:

“A título de contrapartida pelo fornecimento de energia eléctrica efectuado pela A..., o Cliente obriga-se a pagar um preço, em Euros (…), nos termos da tabela anexa:

PREÇO (ENERGIA + REDES) [€/kWh]

Simples

0,29900 (...)

6) Lê-se no n.º 2 da cláusula primeira do contrato id. em 1) sob a epígrafe “preço do fornecimento de energia”:

“Ao preço referido no número 1 acrescem:

a) Valores de potência contratada e de energia reativa de acordo com os valores fixados pela ERSE;

b) Quaisquer outros custos e encargos que, nos termos da legislação e regulamentação aplicáveis, devam ser cobrados aos consumidores finais pelos comercializadores livres;

c) calculado à taxa legal em vigor.”

7) Lê-se no n.º 1 da cláusula segunda do contrato id. em 1) sob a epígrafe “faturação e pagamento”: “O cliente declara aceitar o modo de facturação electrónica e elege como meio de pagamento o débito directo e a título de recurso, o pagamento por referência multibanco.”

8) Lê-se na cláusula 7.ª das condições gerais do contrato id. em 1) sob a epígrafe “Medição”, além do mais:

“7.1. A faturação é emitida pela A., preferencialmente, com periodicidade mensal, condicionada pela disponibilização de informação (leituras reais ou estimativas de consumo) por parte do operador de rede, e de acordo com os demais termos constantes das condições particulares, declarando o Cliente aceitar a faturação electrónica. (…)

9) Lê-se na cláusula 9.ª das condições gerais do contrato id. em 1) sob a epígrafe “Pagamento”, além do mais:

“9.1. As faturas emitidas pela A... são pagas pelo Cliente no prazo de 30 (trinta) dias contados da data do fecho da faturação, através da modalidade de pagamento acordado entre as partes e constante das condições particulares”

10) O preço indicado em 5) supra sofreu alterações, nomeadamente:

a) em 01.07.2022, passando a 0,3281 €/KWh, e;

b) em 01.01.2023, passando a Vazio = 0,159350 €/KWh, Cheias = 0,24355 €/KWh, Ponta = 0,397650 €/KWh.

11) Também assim o valor da potência contratada que sofreu alterações, nomeadamente:

a) em julho de 2022, a R. solicitou aumento da potência contratada de 20,7 kVA para 27,6 kVA, pelo que a partir de 15.07.2022 (data de ativação da nova potência contratada), o valor passou de 1,5424€/dia para 2,0232€/dia, e;

b) em 01.01.2023, e de acordo com a atualização do valor das Redes emitida pela ERSE, o valor passou a ser de 1,2187€/dia.

12) Por motivos de ordem técnica referentes à migração de dados, a A. teve um período de atraso na emissão das faturas referentes ao consumo de eletricidade.

13) A A. não emitiu mensalmente as faturas referentes aos consumos dos meses de maio a dezembro de 2022.

14) Em 20.01.2023, a A. emitiu a fatura nº 10FT-EE23/998, no valor total de 10.359,04€, relativa à energia elétrica fornecida à R.

15) Na factura id. em 14) constam faturados os seguintes períodos de consumo:

i) de 09-05-2022 a 03-06-2022

1. Consumo:1494 kWh (BTN-Energia Simples)

2. Valor: 446,7€

3. Potência contratada: 0€

ii) de 04-06-2022 a 30-06-2022

1. Consumo: 2275 kWh (BTN-Energia Simples)

2. Valor: 680,23€

3. Potência contratada: 0€

iii) de 01-07-2022 a 03-08-2022

1. Consumo: 3725 kWh (BTN-Energia Simples, Vazio, Cheias e Ponta)

2. Valor: 1.158,04€

3. Potência Contratada: 31 dias

4. Valor: 57,43€

iv) de 04-08-2022 a 03-09-2022

1. Consumo:3841 kWh (BTN-Energia Simples, Vazio, Cheias e Ponta)

2. Valor: 1.158,52€

3. Potência Contratada: 31 dias

4. Valor: 62,72€

v) de 04-09-2022 a 03-10-2022

1. Consumo: 3357 kWh (BTN-Energia Simples, Vazio, Cheias e Ponta)

2. Valor: 1.010,56 €

3. Potência Contratada: 30 dias

4. Valor: 60,7€

vi) de 04-10-2022 a 03-11-202

1. Consumo: 1857 kWh (BTN-Energia Simples, Vazio, Cheias e Ponta)

2. Valor: 568,41 €

3. Potência Contratada: 31 dia

4. Valor: 62,72€

vii) de 04-11-2022 a 03-12-2022

1. Consumo: 1512 kWh (BTN-Energia Simples, Vazio, Cheias e Ponta)

2. Valor: 475,63 €

3. Potência Contratada: 30 dias

4. Valor: 60,7€

viii) de faturação de 04-12-2022 a 03-01-2023

1. Consumo: 2882 kWh (BTN-Energia Simples, Vazio, Cheias e Ponta)

2. Valor: 887,59 €

3. Potência Contratada: 31 dias

4. Valor: 60,31€

16) Às importâncias id. em 15), consta na fatura id. 14) que acrescem as seguintes quantias e nos seguintes períodos:

i) de 04.07.2022 a 03.01.2023, no valor de 20,94€ referente ao imposto especial sobre o consumo de eletricidade (valor unitário 0,001000 x kWh);

ii) de 15.07.2022 a 03.01.2023, no valor de 2,10€ (6 X 0,35€) relativa às taxas de exploração a favor da DGEG - consumidores não domésticos;

iii) de 04.07.2022 a 03.01.2023, no valor de 17,10€ respeitante à contribuição audiovisual;

iv) de 01.07.2022 a 03.01.2023, no valor de 1.615,53€, referente ao mecanismo de ajuste (DL nº 33/2022, de 14.05 – valor unitário 0,087222 x kWh);

v) de 09.05.2022 a 03.01.2023, no valor de 18,60€, relativo à banda de reserva de regulação (valor unitário 0,001059 x kWh);

vi) IVA à taxa legal de 6%, no valor de 1,03€, que incide sobre o valor de 17,10€ id. em iii);

viii) IVA à taxa legal de 23%, no valor de 1933,67€, que incide sobres os valores id. em 15), 16) i), ii), iv), e v).

17) A fatura id. em 14) foi remetida à R. em 23.01.2023, e que a R. recebeu.

18) Por comunicação escrita, datada de 09.02.2023, remetida pela R., via e-mail, à A., consta, além do mais, o seguinte o teor:

“ De: AA ..........@.....

Enviada: 9 de fevereiro de 2023 18:01

Para: C... | BB ..........@.....

Cc: 'B...' ..........@.....

Assunto: Contrato A21489003352 - Restaurante B...

Exmo Sr. BB,

Venho pelo presente na sequência da n/ conversa telefónica, solicitar os vossos bons ofícios no sentido de nos enviar (ao m/ cliente aqui em cópia) as faturas mensais relativas aos serviços de energia prestado ao m/ cliente.

Como sabe, as faturas de serviços essenciais como a eletricidade, tem, obrigatoriamente por lei a periodicidade mensal, conforme norma imperativa do nº 2 do art. 9º da Lei 23/96 de 26/07.

Assim, a fatura nº 10FTEE23/998 no valor de €10.359,04 é invalida porque viola o estatuído na lei, motivo pelo qual o m/ cliente não poderá acordar qualquer pagamento sobre a mesma. Sendo certo, que a mesma, viola também os deveres de acessórios de informação.

Assim, solicitamos a amabilidade de procederem ao envio das faturas mensais relativamente aos meses de Julho, Agosto, Setembro, Outubro, Novembro e Dezembro de 2022. Sendo certo que recebemos no dia de hoje a fatura nº 10FTEE22/22195 relativa ao período de 27/05 a 26/06 de 2022.

Após o bom recebimento das mesmas, poderemos fazer um plano de pagamento faseado, considerando que quem está em falta é a C... que não enviou atempadamente as faturas em pagamento. Não obstante, o m/ cliente, estranhando a ausência de faturas, vos tenha contactados por inúmeras vezes sem sucesso.

Ao dispor para qualquer esclarecimento, ficamos a aguardar o envio das faturas para podermos efetuar o pagamento faseado das mesmas.

Grata pela atenção, apresento os melhores cumprimentos,(…)”

19) Por comunicação escrita, datada de 07.03.2023, remetida pela A., via e-mail, à R., consta, além do mais, o seguinte o teor:

“De: C... | BB

Enviada: 7 de março de 2023 09:33

Para: AA ..........@.....

Cc: 'B...' ..........@.....

Assunto: RE: Contrato A21489003352 - Restaurante B...

Exma. Sra. Dra. AA.

Acusamos a receção do mail infra, o qual mereceu a nossa melhor atenção, e, em resposta ao mesmo, somos a informar o seguinte.

Como já fizemos saber, por motivos de ordem técnica e à migração de dados, tivemos um período de atraso na emissão das faturas referentes ao consumo de eletricidade.

Emitida a Fatura 10FT EE23/998, não nos é possível fracionar por períodos de 30 dias os consumos cuja faturação se encontrava em atraso. Aliás, pretendemos deixar consignado, que pese embora não vislumbrarmos qualquer impedimento legal para incluir numa só fatura tais consumos.

Em face do referido, com vista a facilitar a devida compreensão da fatura atrás identificada, e não obstante tal informação constar de forma expressa da fatura em causa, sintetizamos e esclarecemos que a mesma compreende os seguintes dados de consumo relativos aos seguintes períodos de faturação:

9. Período de faturação de 09-05-2022 a 03-06-2022

1. Consumo:1494kwh

2. Valor: 446,7€

10. Período de faturação de 04-06-2022 a 30-06-2022

1. Consumo: 2275kwh2. Valor: 680,23€

11. Período de faturação de 01-07-2022 a 03-08-2022

1. Consumo: 3725kwh

2. Valor: 1075,36€

3. Potência Contratada: 31 dias

4. Valor: 62,72€

12. Período de faturação de 04-08-2022 a 03-09-2022

1. Consumo:3841 kwh

2. Valor: 1158,42€

3. Potência Contratada: 31 dias

4. Valor: 62,72€

13. Período de faturação de 04-09-2022 a 03-10-2022

1. Consumo: 3357kwh

2. Valor: 1010,56 €

3. Potência Contratada: 30 dias

4. Valor: 60,7€

14. Período de faturação de 04-10-2022 a 03-11-2022

1. Consumo: 1857kwh

2. Valor: 568,41 €

3. Potência Contratada: 31 dias

4. Valor: 62,72€

15. Período de faturação de 04-11-2022 a 03-12-2022

1. Consumo: 1512kwh

2. Valor: 475,54 €

3. Potência Contratada: 30 dias

4. Valor: 60,7€

16. Período de faturação de 04-12-2022 a 01-01-2023

1. Consumo: 2882 kwh

2. Valor: 887,59 €

3. Potência Contratada: 31 dias

4. Valor: 60,31€

Nota: Aos Valores apresentados, acresce IVA à Taxa legal em Vigor, Impostos sobre o Consumo e quaisquer outros impostos, taxas, encargos ou contribuições previstas na lei aquando da emissão da Fatura.

Em face do atraso na emissão das faturas, somos a propor o seguinte plano de pagamento em prestações, que não inclui, naturalmente, quaisquer encargos para V. Exas.

Plano Pagamento relativo à Fatura FT_CE100016264_A21489003352_20230208_3016

N.º de prestações                     valor                            data

1.º                                           575,50€                        10-03-2023

2.º                                           575,50€                        05-04-2023

3.º                                           575,50€                        05-05-2023

4.º                                           575,50€                        05-06-2023

5.º                                           575,50€                        05-07-2023

6.º                                           575,50€                        05-08-2023

7.º                                           575,50€                        05-09-2023

8.º                                           575,50€                        05-10-2023

9.º                                           575,50€                        05-11-2023

10.º                                          575,50€                        05-12-2023

11.º                                          575,50€                        05-01-2024

12.º                                          575,50€                        05-02-2024

13.º                                          575,50€                        05-03-2024

14.º                                          575,50€                        05-04-2024

15.º                                          575,50€                        05-05-2024

16.º                                          575,50€                        05-06-2024

17.º                                          575,50€                        05-07-2024

18.º                                          575,50€                        05-08-2024

Com os melhores cumprimentos, (…)”

20) Por comunicação escrita, datada de 20.04.2023, remetida pela A., via e-mail, à R., consta, além do mais, o mesmo teor da comunicação id. em 19) e aqui se reproduz na íntegra por economia processual.

21) A R. não respondeu às comunicações que a A. lhe enviou.

22) O requerimento injuntivo deu entrada em juízo no dia 28.05.2023.

23) A R. foi notificada do requerimento injuntivo id. em 22) no dia 08.06.2023.».

2. - E foi julgado como não provado:

«A) A Requerente procedeu à emissão mensal das respetivas faturas referente aos períodos id. em 15).

B) Que a A. tenha apurado os valores parciais correspondentes aos períodos de consumo e faturação, e que comunicou à R., referente ao período de faturação de 09-05-2022 a 03-06-2022: Potência Contratada: 26 dias; Valor: 40,10€; e ao período de faturação de 04-06-2022 a 30-06-2022: Potência Contratada: 27 dias; Valor: 41,64€.

C) Nas circunstâncias id. em 18), que a R. tivesse usado esse pretexto para se furtar ao pagamento.

D) Durante o mês de Outubro e Novembro de 2023, a R. não consumiu energia, porque esteve de férias e deixou todas as máquinas desligadas, incluindo frigoríficos e arcas frigorificas e demais equipamento consumidor de energia.».

                                               *

B) O Direito

Da exceção da prescrição

Conhecendo da substância do recurso, importa saber se ocorre, ou não, a excecionada prescrição do direito creditório ([3]), quanto a capital e juros respetivos, a beneficiar a R./Recorrida, como entendido na sentença (na sua vertente absolutória), com o que a A./Recorrente se não conforma, invocando, por sua vez, que deve prevalecer a “renúncia da prescrição” e a “interrupção do decurso do respetivo prazo” ou o reconhecimento do direito pelo devedor, matéria esta (de contra-exceção) cujo ónus probatório cabe, necessariamente, à A./Recorrente, por a respetiva factualidade de suporte, por si alegada, a favorecer, no sentido da neutralização/improcedência da dita exceção da prescrição.

Como visto, na decisão recorrida ([4]) foi entendido dar procedência à exceção da prescrição, começando com a seguinte fundamentação:

«Alegou a A. no requerimento injuntivo, além do mais, na exposição dos factos que “procedeu à emissão mensal respectivas das facturas, devendo a Requerida proceder ao seu pagamento no prazo de 30 dias contados da data do fecho da faturação”.

Contudo, da factualidade apurada nos autos, resultou que o período de facturação constante da (única) factura apresentada nos autos se reporta a 09.05.2022 a 03.01.2023 – v. facto provado 15).

Resulta apurado nos autos que a A. não procedeu à emissão das facturas com periodicidade mensal – v. facto provado 13).

Condessou a A. numa única factura cerca de 8 meses de facturação. Quanto à facturação, estipula a LPSE no seu artigo 9.º que:

“1 - O utente tem direito a uma factura que especifique devidamente os valores que apresenta.

2 - A factura a que se refere o número anterior deve ter uma periodicidade mensal, devendo discriminar os serviços prestados e as correspondentes tarifas.

3 - (…)

4 - Quanto ao serviço de fornecimento de energia eléctrica, a factura referida no n.º 1 deve discriminar, individualmente, o montante referente aos bens fornecidos ou serviços prestados, bem como cada custo referente a medidas de política energética, de sustentabilidade ou de interesse económico geral (geralmente denominado de custo de interesse económico geral), e outras taxas e contribuições previstas na lei.

5 - O disposto no número anterior não poderá constituir um acréscimo do valor da factura.” Estipulando ainda no seu artigo 11.º, o ónus da prova, o qual “cabe ao prestador do serviço a prova de todos os factos relativos ao cumprimento das suas obrigações e ao desenvolvimento de diligências decorrentes da prestação dos serviços a que se refere a presente lei.” (n.º 1). Por sua vez, mais estipula a Lei n.º 5/2019, de 11.01 o regime de cumprimento do dever de informação do comercializador de energia ao consumidor, sem prejuízo do disposto na Lei n.º 23/96, de 26.07, regime esse que se aplica aos comercializadores de energia no fornecimento e ou prestação de serviços aos consumidores de energia elétrica, gás natural, gases de petróleo liquefeito (GPL) e combustíveis derivados do petróleo (v. artigo 2.º, n.º 1), considerando-se, para efeitos do referido diploma, consumidores as pessoas singulares ou coletivas a quem sejam fornecidos bens, prestados serviços ou transmitidos quaisquer direitos por comercializador de energia elétrica, gás natural, GPL e combustíveis derivados do petróleo (artigo 2.º, n.º 2). Preceitua o artigo 3.º do diploma vindo de citar o dever de informação, mediante o qual “[O] comercializador de energia deve informar o consumidor das condições em que o fornecimento e ou prestação de serviços é realizada, e prestar todos os esclarecimentos que se justifiquem, de acordo com as circunstâncias, de forma clara e completa.” E já quanto ao direito ao recebimento do preço pelo fornecimento e ou prestação de serviços aos consumidores de energia elétrica, gás natural, GPL e combustíveis derivados do petróleo rege-se pelo disposto na Lei n.º 23/96, de 26 de julho, na sua redação atual – v. artigo 4.º. Com relevo para a presente decisão, mais se rege no citado diploma legal, no seu artigo 5.º, o cumprimento do dever de informação, no qual se estipula no n.º 1 que “[s]em prejuízo do disposto no artigo 3.º, o dever de informação dos comercializadores de energia elétrica e de gás natural é cumprido através da fatura detalhada, ou, não sendo possível, nos termos previstos na Lei n.º 51/2008, de 27 de agosto, que estabelece a obrigatoriedade de informação relativamente à fonte de energia primária utilizada”

E bem ainda no seu artigo 7.º, estipula o legislador a periodicidade da faturação, segundo o qual “[o]s comercializadores devem emitir as faturas com uma periodicidade mensal, salvo acordo em contrário no interesse do consumidor.” (sublinhado nosso) Concretizando no seu artigo 8.º os elementos que devem integrar na fatura periódica de eletricidade:

“1 - As faturas a apresentar pelos comercializadores devem conter os elementos necessários a uma completa e acessível compreensão dos valores totais e desagregados faturados, designadamente os seguintes:

a) Potência contratada, incluindo o preço;

b) Datas e meios para a comunicação de leituras;

c) Consumos reais e estimados;

d) Preço da energia ativa;

e) Tarifas de energia;

f) Tarifa de acesso às redes, total e desagregada;

g) Tarifas de comercialização;

h) Período de faturação;

i) Taxas discriminadas;

j) Impostos discriminados;

k) Condições, prazos e meios de pagamento;

l) Consequências pelo não pagamento.

2 - Nos casos em que haja lugar à tarifa social, a fatura deve identificar o valor do desconto.

3 - A fatura deve discriminar, nos termos da Lei n.º 51/2008, de 27 de agosto, a contribuição de cada fonte de energia para o total de energia elétrica fornecida no período a que respeita e as emissões totais de dióxido de carbono (CO2) associadas à produção da energia elétrica faturada.

4 - Os comercializadores devem incluir na fatura, sempre que possível, a distribuição do consumo médio de energia pelos dias da semana e horas do dia, sem prejuízo do legalmente estabelecido em matéria de salvaguarda dos direitos à privacidade.

5 - A fatura deve incluir informação sobre o OLMC, nomeadamente o portal Poupa Energia.

6 - A fatura deve incluir informação que permita ao consumidor, em cada momento, conhecer a sua situação contratual.

7 - A fatura deve incluir informação sobre o exercício do direito de reclamação no livro de reclamações, quer em formato físico quer em formato eletrónico.

8 - Os comercializadores devem incluir na fatura informação relativa aos meios e formas de resolução judicial e extrajudicial de conflitos disponíveis, incluindo a identificação das entidades competentes e o prazo para este efeito.

9 - O cumprimento do disposto no presente artigo não pode implicar um acréscimo do valor da fatura.

10 - A violação do disposto no presente artigo constitui uma contraordenação grave.”.

Do que antecede, dir-se-á, desde logo, que não assiste razão à A. quando afirma e transpõe para o clausulado das condições gerais do contrato sob a cláusula 7.ª que “a faturação é emitida pela A., preferencialmente, com periodicidade mensal, condicionada pela disponibilização de informação (leituras reais ou estimativas de consumo) por parte do operador de rede” [v. facto provado 8)], pois que, tal qual decorre da lei, de forma imperativa, não há lugar a qualquer “preferência” na emissão mensal das facturas mas sim devem as mesmas ser emitidas com uma periodicidade mensal. – v. artigo 7.º da Lei n.º 5/2019, de 11.01 e artigo 9.º, n.º 2 da LSPE.

(…) Acresce ainda dizer que de harmonia com o Regulamento n.º 1129/2020, de 30 de dezembro (que aprova o Regulamento das Relações Comerciais dos Setores Elétrico e do Gás e revoga o Regulamento n.º 561/2014, de 22 de dezembro, e o Regulamento n.º 416/2016, de 29 de abril), diploma esse que estabelece as regras aplicáveis às relações comerciais entre os vários sujeitos intervenientes no Sistema Elétrico Nacional e no Sistema Nacional de Gás, às condições comerciais para ligação às redes públicas, à medição, leitura e disponibilização de dados de consumo, à escolha de comercializador e ao funcionamento dos mercados de energia elétrica ou de gás (v. artigo 1.º, n.º 2), prevê na sua secção VI, sob a epígrafe “faturação”, subsecção I, no seu artigo 45.º a periodicidade da facturação, nos termos em que:

“1 - Salvo acordo em contrário no interesse do cliente, os comercializadores devem emitir as faturas com uma periodicidade mensal.

2 - Sempre que a periodicidade da faturação acordada nos termos do número anterior não for observada, o pagamento do valor exigido pode ser fracionado em prestações mensais, a pedido do cliente, considerando o período de faturação apresentado a pagamento, sem prejuízo do regime aplicável em sede de prescrição e caducidade, devendo o comercializador informar previamente o cliente do direito ao pagamento fracionado.

3 - Se o incumprimento da periodicidade da faturação resultar de facto não imputável ao cliente, às prestações mensais previstas no número anterior não podem acrescer quaisquer juros legais ou convencionados.”

Do ante exposto, no caso em apreço, não resultou demonstrado (nem sequer foi alegado) que tenha ocorrido qualquer acordo entre A. e R. na emissão da faturação com diferente periodicidade que a mensal, e logo aqui afigura-se-nos que a A. ao emitir uma única factura reportada a um período de facturação de 09.05.2022 a 03.01.2023 em discussão nos autos, cerca de oito meses, não cumpriu o disposto nas normas supra citadas quanto ao dever de informação e ao dever de facturação com uma periodicidade mensal, nos termos prescritos na lei.

A falta de emissão das facturas com periodicidade mensal é apenas imputável à A. (…)

Após apresentação de petição inicial aperfeiçoada pela Autora nos autos, no âmbito da qual discrimina os períodos de consumo faturados, veio a R. invocar a prescrição dos créditos invocados pela A., ao que esta se insurgiu contra a arguida excepção argumentando que a R. com o seu comportamento renunciou tacitamente ao direito de invocar a prescrição.

(…)

Em sede de prestação de serviços públicos essenciais, o legislador optou por fixar um prazo de prescrição de apenas seis meses com o intuito de proteger o utente.

Com efeito, preceitua o n.º 1 do art.º 10.º do citado diploma legal que o direito ao recebimento do preço do serviço prestado prescreve no prazo de seis meses após a sua prestação. E no n.º 4 da mesma norma legal, estipula que o prazo para a propositura da acção ou da injunção pelo prestador de serviços é de seis meses, contados após a prestação do serviço ou do pagamento inicial, consoante os casos.».

Enfrentando a questão da renúncia da prescrição, expendeu a 1.ª instância:

«No caso sob escrutínio, alega a A. que a R. por força do seu comportamento ao limitar-se a colocar em causa a facturação num único documento vários meses de consumo e assumido a vontade de proceder ao seu pagamento em prestações, não colocando em causa a obrigação de pagar, renunciou ao direito de invocar a prescrição, renúncia essa que deve ser estendida até ao dia 15.10.2023, data em que a R. pela primeira vez surge a invocar a referida excepção.

Antes do mais, do processado resulta que a R. veio arguir a prescrição dos créditos da A. em resposta ao articulado da petição inicial aperfeiçoada por esta, pois que em sede do requerimento injuntivo a A. não concretizou a factualidade subsumível ao crédito peticionado, o que motivou o convite ao aperfeiçoamento por despacho de 19.09.2023 (v. ref.ª Citius 36239625), nos termos em que “pese embora a Autora tenha invocado e identificado o contrato e a fatura que titula o valor em dívida, não mencionou o concretamente acordado com a Ré, e bem assim os serviços prestados e a que a fatura respeita, prazos para prestar os serviços e a Ré efetuar o correspondente pagamento e bem assim o preço convencionado.”, o que a A. veio a cumprir por requerimento de 02.11.2023 (v. ref.ª 3363718), especificando e concretizando agora com alegação de factualidade sobre os concretos períodos de consumo e facturação em causa, subjacentes à factura cujo pagamento reclama nos autos, ou seja, em momento posterior à apresentação da oposição por parte da R.

Caso a Autora tivesse tal factualidade no requerimento injuntivo, como se impunha, certamente que a R. teria invocado desde logo a prescrição, facto que até fez referir na sua oposição, em face da parca informação constante na descrição dos factos no requerimento injuntivo, em sede dos seus artigos 23.º e 24.º, ao não dispor de elementos que lhe permitissem verificar se a quantia é devida ou não devida, e no caso de existir um direito de crédito a favor da requerente, a que faturas e qual a data de emissão de cada uma das faturas e ao não poder invocar a prescrição por não desconhecer a que serviços se refere a A. por não alegados por esta.

(…)

Não incumbe à R. adivinhar a pretensão da A., conjecturar sobre facturas mensais terão sido emitidas pela A. (não identificadas) – tanto mais que se veio a apurar nos autos que não foram emitidas facturas mensais, mas, sim, uma única factura – v. factos provados 13) e 14) –, impondo-se e exigindo-se ao autor a alegação de factos e concretização da causa de pedir, (…) de molde a que seja permitido ao réu exercer o seu cabal contraditório. (…).

Pelo que, nenhuma censura merece o momento processual em que a R. arguiu a excepção da prescrição, pois que realizada em sede de contraditório à petição inicial aperfeiçoada apresentada pela A. nos termos determinados do supra citado despacho de 19.09.2023.».

E acrescentou, quanto a um eventual reconhecimento do direito (ainda que tácito), que da «comunicação escrita remetida pela R. (…) por e-mail de 09.02.2023 – v. facto provado 18) (…) não se vislumbra o reconhecimento da obrigação inserta na factura nº 10FTEE23/998 no valor de € 10.359,04, pois que a R. invoca expressamente a sua invalidade por violadora do estatuído na lei e dos deveres de acessórios de informação, não podendo a R. acordar qualquer pagamento sobre a mesma.

A R. solicita, ao invés, o envio das faturas mensais relativamente aos meses de Julho, Agosto, Setembro, Outubro, Novembro e Dezembro de 2022, e após o bom recebimento das mesmas, refere a possibilidade de fazer um plano de pagamento faseado.

O que lhe era legitimo solicitar, cogitando ainda e aliado às regras da experiência comum e do normal acontecer, submeter a sua análise as facturas mensais e respectivos períodos de consumo, discriminados de forma clara e esclarecedora para daí retirar as devidas ilações.

Do ante exposto, resulta que a R. não afirma que está obrigada ao pagamento peticionado pela A. em sede factura sub judice, sendo que a falta de emissão das facturas com periodicidade mensal apenas é imputável à A.

Nenhum facto consta como assente, de onde se possa retirar a ideia de “renúncia” à prescrição, isto é, de onde se possa concluir que a R. pretende pagar a factura cujo pagamento a A. peticiona nos autos para além do decurso do prazo dos seis meses.

A renúncia tácita à prescrição prevista no artigo 302º nºs 1 e 2 do CC reporta-se, assim, e reitera-se a um comportamento do devedor que denote o seu reconhecimento do direito após ter decorrido o prazo de prescrição. O que não ocorreu no caso em apreço.

Cogitando, por um lado, à data do envio da referida comunicação (09.02.2023), ainda não tinha decorrido o prazo prescricional de 6 meses relativamente aos períodos de consumo / serviços prestados por reporte a 04.08.2022 a 03.09.2022; 04.09.2022 a 03.10.2022; 04.10.2022 a 03.11.2022; 04.11.2022 a 03.12.2022; e de 04.12.2022 a 03.01.2023; por outro lado, quanto aos períodos de consumo / serviços prestados por reporte a 09.05.2022 a 03.06.2022; de 04.06.2022 a 30.06.2022; de 01.07.2022 a 03.08.2022, não opera a invocada renúncia tácita, pois que não se logra por demonstrado um comportamento por parte da R. que reconhecesse a existência da obrigação em discussão nos autos e tivesse o desejo de a cumprir subsumível num acto inequívoco do reconhecimento dessa obrigação e não apenas numa mera possibilidade, sendo que esta manifestada no pressuposto do envio pela A. à R. das faturas mensais relativamente aos meses de Julho, Agosto, Setembro, Outubro, Novembro e Dezembro de 2022, e já não com base na factura cujo valor é reclamado nos autos pela A.».

A Apelante insiste que a fatura (única) emitida cumpre com todos os requisitos legais, mas já se viu que assim não é, como demonstrado na sentença, bastando ter em conta que a faturação devia ser mensal, por imposição legal – o que a Recorrente não contraria –, e, no caso, foi emitida uma só fatura para um período de maio de 2022 a janeiro de 2023 (até 03/01/2023), num valor global de mais de 10.000,00 euros.

Também não adianta convocar, para além da factualidade julgada provada – que a Recorrente não deixou impugnada –, documentação junta aos autos, como complemento àquela factualidade, uma vez que, não impugnados os factos fixados na sentença, que, assim, se tornaram definitivos, é a estes – e somente a estes – que deve atender-se para decisão da causa, com aplicação do direito, e do recurso (cfr. art.º 607.º, n.ºs 3 a 5, do NCPCiv.).

E nem basta – para completude da fatura (que devia ser mensal) – a simples indicação do montante de consumo, do valor final a pagar e da potência contratada (factos 14 e 15), mesmo se ainda haveriam de acrescer as quantias discriminadas no facto 16.

Mais. Na sentença já se evidenciou, à luz da lei e sem manifestação de discordância, nesta parte, da Recorrente, quais os elementos que têm de constar da necessária fatura mensal (os indispensáveis «a uma completa e acessível compreensão dos valores totais e desagregados faturados»):

«a) Potência contratada, incluindo o preço; b) Datas e meios para a comunicação de leituras; c) Consumos reais e estimados; d) Preço da energia ativa; e) Tarifas de energia; f) Tarifa de acesso às redes, total e desagregada; g) Tarifas de comercialização; h) Período de faturação; i) Taxas discriminadas; j) Impostos discriminados; k) Condições, prazos e meios de pagamento; l) Consequências pelo não pagamento.».

Trata-se aqui, como se compreende, de uma disciplina legal protetiva – que o legislador entendeu estabelecer, por razões conhecidas, também quanto ao fixado curto prazo de prescrição ([5]) – do utente/consumidor, considerado a parte débil na relação contratual (normalmente, duradoura e complexa) e, por isso, carecida de especial proteção legal, designadamente com normas legais de feição imperativa (com pormenorização de direitos e deveres) ([6]).

Ora, com a fatura (única) aludida, se nem sequer correspondeu ao dito dever de faturação mensal – no quadro da referida relação duradoura –, é patente que a Recorrente/fornecedor não observou todos aqueles requisitos, deixando fora da fatura diversos daqueles elementos, assim faltando ao seu dever de transparente discriminação/comunicação ([7]).

Acresce dizer que a «emissão e apresentação-entrega de factura (…) junto do devedor da remuneração correspondente a contrato de prestação de serviços, sem prejuízo de ser uma obrigação legal imposta em sede do imposto IVA (arts. 1º, 1, a), 2º, 1, a), 4º, 1, 7º, 1, b), 8º, 1 e 2, 29º, 1, b), e 36º, 1 e 5, do CIVA), uma vez convencionada pelas partes (quanto ao momento da execução contratual), configura um ónus necessário (traduzido em “interpelação”) para o credor, com o significado de se assumir como uma condição de exigibilidade da (constituída e eficaz) obrigação negocial de pagamento do serviço, assim susceptível de vencimento, nos termos da vinculação a que respeitam os arts. 762º, 1, 763º, 1, 777º, 1 e 2, e 817º do CCiv.» ([8]).

Prosseguindo, não pode acolher-se o argumento no sentido de não ter sido posto em causa – com o aludido método de fatura única – o “regime aplicável em sede de prescrição”, com a consequência de não haver “prejuízo para a recorrida” (conclusão 2.ª).

Com efeito, se da fatura, que devia ser mensal, não constam todos os elementos legalmente impostos, daí tem de resultar prejuízo para a parte que o legislador quis proteger com a imposição de comunicação dos elementos que, afinal, foram omitidos (não comunicados).

Mas viu-se o cliente/utente/consumidor, por essa via, prejudicado na sua defesa perante a fatura (e inerente pretensão creditória) e na inerente tarefa de invocação da prescrição?

A resposta – salvo o devido respeito – tem de ser positiva.

Veja-se, perante a fatura em causa (emitida em 20/01/2023), a própria comunicação da R./Recorrida datada de 09/02/2023 (facto 18), pedindo, desde logo, o envio das «faturas mensais relativas aos serviços de energia prestados», afirmando tratar-se de uma “obrigatoriedade legal”, mas contando com a negativa, em resposta, da contraparte, ao aludir a “não lhe ser possível fracionar por períodos de 30 dias” (facto 19).

Insistiu a demandada que «a fatura nº 10FTEE23/998 no valor de €10.359,04 é invalida porque viola o estatuído na lei, motivo pelo qual o m/ cliente não poderá acordar qualquer pagamento sobre a mesma. Sendo certo, que a mesma, viola também os deveres de acessórios de informação.».

Ou seja, em vez de reconhecer direitos de outrem (o seu credor) ou renunciar a direitos seus (de devedor, relativamente à prescrição), o que o utente/consumidor fez foi, ao invés, comunicar que considerava a fatura inválida/ilegal, razão pela qual não poderia pagar (“acordar qualquer pagamento”).

Mais pediu o «envio das faturas mensais relativamente aos meses de Julho, Agosto, Setembro, Outubro, Novembro e Dezembro de 2022», sem sombra, pois, de renúncia da prescrição ou reconhecimento do direito creditório assim (inadequadamente) faturado.

Propunha-se, então, como consumidor que sabia ter ocorrido fornecimento e consumo, após o bom recebimento das faturas mensais, aderir a um plano de pagamento faseado (condicional), ficando a aguardar o envio dessas faturas para poder efetuar o pagamento faseado das mesmas, dependendo, obviamente, do respetivo teor (o que resultasse concreta e efetivamente faturado).

Ou seja, sempre o pagamento das faturas mensais – perante o que delas viesse a constar –, aquelas que nunca foram emitidas (as que a contraparte se recusou a emitir, apesar da imposição legal).

Nada, pois, que traduza, ainda que tacitamente, o reconhecimento/admissão da dívida invocada de mais de 10.000,00 euros, ou qualquer renúncia da prescrição.

Nesta perspetiva, perante o regime legal protetivo vigente, a parte considerada débil somente se encontraria, neste contexto, em condições de invocar cabal e razoavelmente a prescrição quando a credora acedesse à emissão e entrega das devidas faturas mensais, com discriminação de todos os elementos legalmente impostos como integrantes de cada uma das correspondentes faturas.

Porém, a credora recusou-se a fazê-lo.

Contexto em que não pode concordar-se que tenha a R. assumido a obrigação de pagar o montante faturado que lhe foi apresentado (cfr. conclusão 7.ª).

Também não poderá aquiescer-se em que a Recorrida não reagiu (cfr. conclusão 8.ª) perante a recusa da contraparte em emitir faturas mensais (de substituição da fatura única), posto a conduta da R. ser sempre de reação. Primeiro, reagiu à fatura, apelidando-a de inválida e ilegal e recusando-se a pagá-la, antes pedindo a sua substituição por faturas mensais; depois, reagiu à recusa de substituição, continuando a recusar o pagamento do montante faturado e invocando a prescrição.

Não pode, pois, acolher-se a asserção da Recorrente (cfr. conclusão 9.ª) no sentido de a R./Recorrida ter feito crer “que assumia o dever jurídico de pagar todos os valores constantes da fatura” única (os ditos mais de 10.000,00 euros).

Salvo, pois, o devido respeito, inexiste “renúncia da prescrição” (expressa ou tácita) ou qualquer causa de “interrupção do decurso do respetivo prazo” (conclusão 10.ª).

Tal como inexiste reconhecimento do invocado direito creditório ([9]): aquele a que alude a fatura única, no montante peticionado de € 10.359,04, de que a R. se não confessou devedora.

O que o utente/consumidor poderia reconhecer/admitir, em atuação de boa-fé, seria, apenas, ter havido fornecimento e consumo – como beneficiário do mesmo –, mas em montante a determinar, através da legal faturação mensal, imposição legal de adequada faturação a que a contraparte não procedeu (por se ter recusado, como visto, a fazê-lo).

Em suma, inexistindo, na sentença, violação de lei (os convocados art.ºs 302.º e 325.º do CCiv.), tem a apelação de improceder, nada havendo a censurar à decisão recorrida, com a sua, aliás, desenvolvida fundamentação de direito.

Vencida, a Recorrente deve suportar as custas do recurso (art.ºs 527.º, n.ºs 1 e 2, 529.º, n.ºs 1 e 4, e 533.º, todos do NCPCiv.).

                                               *

(…)

                                               ***

V – Decisão

Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente a apelação, mantendo-se, em consequência, a decisão recorrida.

Custas da apelação pela Recorrente (vencida no recurso).

                                               ***

Escrito e revisto pelo relator – texto redigido com aplicação da grafia do (novo) Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (ressalvadas citações de textos redigidos segundo a grafia anterior).

Assinaturas eletrónicas.

Coimbra, 25/10/2024

Vítor Amaral (relator)

Carlos Moreira

Luís Cravo


([1]) Em 28/05/2023.
([2]) Cujo teor se deixa transcrito, com destaques retirados.
([3]) Âmbito em que dispõe o art.º 10.º, n.º 1, da Lei n.º 23/96, de 26-07, que «O direito ao recebimento do preço do serviço prestado prescreve no prazo de seis meses após a sua prestação.».
([4]) Não é controversa, por não impugnada, a qualificação jurídica do contrato, tal como operada na sentença apelada: «A relação jurídica estabelecida entre Autora e Ré configura um contrato para prestação do serviço de fornecimento energia eléctrica, contrato misto, com elementos de compra e venda (artigo 874.º do Código Civil) e de prestação de serviços (artigos 1154º, 1155º, 1156º e 1157.º e ss., todos do Código Civil), regulado ainda na Lei n.º 23/96, de 26 de julho. Com efeito, como contrato atípico, de natureza comercial (cf. artigos 2.º e 13.º do Código Comercial) o contrato de fornecimento de serviços rege-se pelo convencionado entre as partes contratantes e, na sua falta, pelas normas gerais dos contratos e, se necessário, pelas normas relativas aos contratos típicos que com ele apresentem maior analogia, como seja as aplicáveis ao contrato de prestação de serviços e de compra venda. Estamos diante de um contrato sinalagmático em que uma das partes assume a obrigação de fornecer eletricidade, vinculando-se a outra a pagar o respetivo preço.». Acresce que «o objecto do presente contrato integra-se também na categoria dos serviços de interesse geral abrangidos pela Lei dos Serviços Públicos Essenciais, aprovada pela Lei n.º 23/96, de 26.07 (LSPE), na sua redacção actual introduzida pela Lei n.º 51/2019, de 29.07, no caso serviço de fornecimento energia eléctrica [artigo 1.º, n.º 1, al. b)], considerando-se utente, “para efeitos previstos nesta lei, a pessoa singular ou colectiva a quem o prestador do serviço se obriga a prestá-lo” [art.º 1.º, n.º 3], e por sua vez considera-se prestador dos serviços abrangidos pela presente lei toda a entidade pública ou privada que preste ao utente qualquer dos serviços referidos no n.º 2, independentemente da sua natureza jurídica, do título a que o faça ou da existência ou não de contrato de concessão [art.º 1.º, n.º 4].» (destaques aditados).
([5]) Cfr., inter alia, o Ac. TRC de 26-09-2023, Proc. 6922/21.8T8BRG-A.C1, com os mesmos aqui Relator e Exm.ºs Adjuntos, disponível em www.dgsi.pt, em cujo sumário pode ler-se: “O preceito do art.º 10.º, n.º 1, da Lei n.º 23/96, de 26-07, tem finalidade protetiva do utente na sua relação contratual com o prestador de determinados serviços públicos essenciais, (…) razão pela qual o legislador estabeleceu, nesta latitude do sistema, um regime prescricional especial, fixando um curto prazo de prescrição – de seis meses – para os créditos do prestador do serviço referentes ao «preço do serviço prestado» (…).”.
([6]) É patente a finalidade da Lei n.º 23/96 (sendo a versão aplicável ao caso a resultante da Lei n.º 51/2019, de 29-07), constando do respetivo preâmbulo que «Cria no ordenamento jurídico alguns mecanismos destinados a proteger o utente de serviços públicos essenciais», contando-se entre eles o «Serviço de fornecimento de energia eléctrica». Na verdade, resulta do respetivo art.º 1.º, n.º 1, que «A presente lei consagra regras a que deve obedecer a prestação de serviços públicos essenciais em ordem à protecção do utente», sendo o «Serviço de fornecimento de energia eléctrica» um dos «serviços públicos abrangidos» [como decorre do n.º 2, al.ª b)]. Já o n.º 4 do mesmo art.º 1.º reza assim (quanto à contraparte): «Considera-se prestador dos serviços abrangidos pela presente lei toda a entidade pública ou privada que preste ao utente qualquer dos serviços referidos no n.º 2, independentemente da sua natureza jurídica, do título a que o faça ou da existência ou não de contrato de concessão».
([7]) É bem conhecida a complexidade da faturação no âmbito dos contratos de fornecimento de energia elétrica em baixa tensão, como ocorre nos fornecimentos aos consumidores domésticos nacionais de eletricidade, mormente quanto aos elementos de ponderação e aos fatores/componentes que influenciam o preço a pagar em cada mês.
([8]) Cfr. o sumário do Ac. STJ de 22-02-2024, Proc. 571/20.5T8LAG.E1.S1 (Cons. Ricardo Costa), em www.dgsi.pt, aresto em cuja fundamentação pode ainda ler-se a respeito: «Esta confluência de regimes civil e fiscal – com relevância jusnormativa – tem conduzido justamente a nossa jurisprudência a encontrar neste acto jurídico – prestação de serviço sujeita ao imposto IVA – e noutros equivalentes uma verdadeira condição legal imprópria (também dita “implícita”) enquanto requisito de eficácia da obrigação negocial de pagamento da remuneração acordada como contrapartida da prestação do serviço contratado: a emissão e apresentação junto do devedor da factura (…)».
([9]) Sobre a matéria, cfr., por todos, Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol. I, 4.ª ed. revista e actualizada, 1987, Coimbra Editora, Coimbra, ps. 275 e 292, e Manuel de Andrade, Teoria Geral da Relação Jurídica, vol. II, 9.ª Reimpressão, 2003, Almedina, Coimbra, p. 462, explicando este último Autor que, pelo reconhecimento – que pode ser expresso ou tácito –, “o devedor confessa que deve”.