Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | ALCINA DA COSTA RIBEIRO | ||
Descritores: | TRANSPORTE DE MERCADORIAS CONTRA-ORDENAÇÃO NATUREZA DA INFRACÇÃO PRESCRIÇÃO DO PROCEDIMENTO CONTRAORDENACIONAL | ||
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Data do Acordão: | 03/17/2022 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | LEIRIA (JUÍZO LOCAL CRIMINAL DE POMBAL – J2) | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | RECURSO CRIMINAL | ||
Decisão: | REVOGADA | ||
Legislação Nacional: | ART. 131.º DO CE; ARTS. 22.º, N.º 2, E 31.º, N.º 2, DO DL N.º 257/2007, DE 16-07 | ||
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Sumário: | Para todos os efeitos legais, nomeadamente para a questão da prescrição do procedimento contraordenacional, não constitui contraordenação rodoviária a contraordenação p. e p. pelo artigo 22.º, n.º 2, e 31.º, n.º 2, do DL n.º 257/2007, de 16-07. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência os juízes na 5.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra 4. O Ministério Público, em primeira instância defende a manutenção da decisão recorrida, enquanto que a Digna Procuradora-Geral Adjunta junto desta Relação entende que assiste razão parcial ao Recorrente.
II. APRECIAÇÃO RECURSO A questão a decidir consiste em saber se o do procedimento da contraordenacional prescreve nos termos do artigo 188.º, do Código de Estrada, (entendimento do tribunal recorrido), ou se, pelo contrário, prescreve conforme o disposto no artigo 27.º do Regime Geral das Contraordenações previsto no Decreto-Lei n.º 433/82, de 23 de outubro, como defende o Recorrente. Neste particular, a decisão recorrida qualificou, sem qualquer controvérsia, a contraordenação prevista e punida pelos artigos 22.º, n. 2 e 31.º, n.º 1, do Decreto Lei 257/2007, de 16/07, como contraordenação rodoviária, tendo por base o artigo 132.º, do Código da Estrada. Importa, pois verificar, se a referida contraordenação assume ou não natureza rodoviária, para efeitos de aplicação do Código da estrada. A Fiscalização e Regime Sancionatório das infracções previstas no Decreto Lei n.º 257/2007 vem regulada no seu Capitulo IV. De acordo com o artigo 21.º, n.º 1 e 2, a fiscalização do cumprimento do disposto no presente decreto-lei compete às seguintes entidades: a) Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres, I. P.; b) Guarda Nacional Republicana e c) Polícia de Segurança Pública, podendo estas entidades proceder, junto das pessoas singulares ou colectivas que efectuem transportes rodoviário de mercadorias, a todas as investigações e verificações necessárias para o exercício da sua competência fiscalizadora. Já o artigo 31.º, n.º 1, do mesmo diploma, pune com coima de € 500 a € 1500 a realização de transportes com excesso de carga. Tal infracção constitui, nos termos do artigo 22.º, uma contraordenação. A tentativa e a negligência são puníveis, sendo os limites máximo e mínimo da coima reduzidos para metade. O regime jurídico sancionatório especial Decreto Lei n.º 257/2007, muito embora se aplique ao transporte rodoviário de mercadorias (artigo 1.º) - entendido como a actividade de natureza logística e operacional que envolve a deslocação física das mercadorias em veículos automóveis ou conjuntos de veículos (artigo 2.º) - não dá a noção de contraordenação rodoviária, nem remete para o conceito estabelecido no Código da Estrada. Este, no artigo 131.º define contraordenação rodoviária, como todo o facto ilícito e censurável que preencha um tipo legal correspondente à violação de norma do Código da Estrada ou de legislação complementar e legislação especial cuja aplicação esteja cometida à Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANRS), e para o qual se comine uma coima. É, neste contexto, que surge o artigo 132.º, do Código da Estrada. As contraordenações rodoviárias aqui referidas correspondem apenas e só às mencionadas no mencionado artigo 131.º. Só estas são reguladas pelo disposto no Código de Estrada, pela legislação rodoviária complementar ou especial que as preveja e, subsidiariamente, pelo regime geral das contraordenações. Ora, a aplicação da contraordenação cometida pela arguida é uma infracção sancionada pelo regime jurídico da actividade de transporte rodoviário de mercadorias (Decreto-Lei n.º 257/2007, de 16 de julho), compete ao IMT. O processamento das contra -ordenações previstas no referido Decreto-Lei compete ao IMTT, sendo a aplicação das coimas da competência do presidente do seu conselho directivo (cf. artigo 37.º). A infração em causa não corresponde a nenhuma das previstas no Código da Estrada, nem compete à ASNR apreciar e decidir a aplicação do Decreto-Lei n.º 257/2007, não tendo, por isso, natureza rodoviária. Neste sentido, e embora a propósito de uma outra infracção, decidiu o Acórdão da Relação de Évora de 13 de novembro de 2012 (processo n.º 96/11.0TBSSB.E1) e Acórdão de 16 de dezembro de 2014 (processo n.º 2/14.9TBORQ.E1). E, a ser assim, não se mostra abrangida pelas previsões dos artigos 131.º, 132.º, e 188.º, do Código da Estrada, mas pelo Regime Geral das Contraordenações, assistindo razão ao Recorrente e à Digna Procuradora Geral Adjunta.
Vejamos, agora, o prazo de prescrição. O procedimento contraordenacional em causa prescreve no prazo de um ano [corresponde-lhe uma coima entre os 250€ e 750€ (artigos 22.º, n.º 2, e 31.º do Decreto Lei 257/2007 e artigo 27.º, alínea c) do RGCO], sem prejuízo das eventuais causas de interrupção ou suspensão. Pelo que, no caso, a prescrição teria ocorrido em 7 de novembro de 2020 - data em que se completaria o prazo de um ano após a data da notificação da arguida para o exercício da defesa (artigo 27.º n.º 1, alínea c) do RGCO) – se não existissem causas de interrupção e de suspensão. No que toca à interrupção, estatui o a artigo 28.º, da RGCO: 1. A prescrição do procedimento por contraordenação interrompe-se: a) com a comunicação ao arguido dos despachos, decisões ou medidas contra ele tomados ou com qualquer notificação; b) com a realização de quaisquer diligências de prova, designadamente exames e buscas, ou com o pedido de auxílio às autoridades policiais ou a qualquer autoridade administrativa; c) com a notificação ao arguido para exercício do direito de audição ou com as declarações por ele prestadas no exercício desse direito; d) com a decisão da autoridade administrativa que procede à aplicação da coima. Depois de cada interrupção começa a correr novo prazo de prescrição (cf. artigo 121.º, n. 2, do Código Penal). Porém, a prescrição do procedimento tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo da prescrição acrescido de metade (artigo 28.º, n.º 3, do RGCO). O prazo de prescrição do procedimento da contraordenação em análise, de um ano, acrescido de metade e do prazo de suspensão de seis meses - no artigo 27.º -A, n.º 1, alínea c) e artigo 28.º, n.º 3, ambos do RGCO – perfaz dois anos. Ora, se considerarmos que a infracção se consumou em 23 de setembro de 2019 (fls. 4), a prescrição ocorreria sempre (independentemente de outras causas de interrupção) sempre no passado dia 22 de setembro de 2021. Sucede que durante o decurso do prazo da prescrição, foi regulado o regime excepcional da suspensão pela Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março (artigo 7.º), com as alterações dadas pela Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril; na Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, na Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro e na Lei n.º 13-B/2021, de 05 de abril. Por via dos diplomas citados, entraram em vigor dois regimes excepcional de suspensão do prazo de prescrição do procedimento criminal. Um de 87 dias - desde o dia 9 de março de 2020 (artigo 5.º da Lei n.º 4-A/2020) até ao dia 3 de junho de 2020 (artigos 8.º e 10.º da Lei n.º 16/2020)] – e outro de 74 dias – desde o dia 22 de janeiro de 2021 (artigos 4.º e 6.º-B, n.º 3 da Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro) até ao dia 5 de abril de 2021 (artigo 7.º da Lei n.º 13-B/2021). Ora, se acrescentarmos 161 dias - correspondentes à soma dos 87 e 74 dias referidos - ao prazo de um ano dois anos - artigos 28, n.º 3 e 27.º, n.º 1. Alínea b) do RGCO -, constatamos que a prescrição se consolidou no dia 2 de março de 2022, sendo irrelevantes as causas interruptivas, de 7 de novembro de 2019 (fls. 9 e10); 2 de dezembro de 2019 (fls. 11 a 16 e 35-A); 29 de janeiro de 2021 (fls. 17 a 22); 11 de fevereiro de 2021 (fls. 23 a 24) e 23 de setembro de 2021. Desta feita, e por motivos diferentes dos invocados pelo Recorrente, sempre será de declarar a prescrição no dia 02 de março de 2022, por força do n.º 3, do artigo 27.º do RGCO, seja qual for a posição que se assuma relativamente à questão de saber se o regime excepcional da suspensão da prescrição vigente no estado pandémico – COVID 19 – se aplica às contraordenações,
IV. DECISÃO Em conformidade e com os fundamentos expostos, procede o recurso, declarando-se a prescrição do processo de contraordenação instaurado contra a arguida/recorrente, T..., Lda. Sem custas.
Coimbra, 17 de março de 2022
Alcina da Costa Ribeiro (relatora)
Maria Alexandra Guiné (adjunta)
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