Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | HELENA MELO | ||
Descritores: | ALTERAÇÃO DA REGULAÇÃO DE RESPONSABILIDADES PARENTAIS PRESSUPOSTOS REGIME DE VISITAS MISSÃO NO ESTRANGEIRO ARQUIVAMENTO | ||
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Data do Acordão: | 02/07/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | JUÍZO DE COMPETÊNCIA GENÉRICA DE MOIMENTA DA BEIRA DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE VISEU | ||
Texto Integral: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Legislação Nacional: | ARTIGOS 42.º, N.º 1, DO REGIME GERAL DO PROCESSO TUTELAR CÍVEL E 611.º, N.º 1, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL | ||
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Sumário: | I – O procedimento de alteração do regime de exercício das responsabilidades parentais tem como pressupostos o incumprimento do acordo ou decisão final que fixou o regime a alterar, ou o surgimento de circunstâncias supervenientes que imponham essa alteração.
II – Tanto a superveniência objetiva como a subjetiva, podem fundamentar o pedido de alteração. A superveniência objetiva verifica-se quando os factos que configuram a alteração das circunstâncias, ocorrem depois do encerramento da discussão da causa em que foi proferida a decisão a alterar. Já a superveniência subjetiva tem lugar quando tais factos ocorrem antes daquele momento, mas chegam ao conhecimento do requerente em data posterior. Nos casos de superveniência subjetiva recai sobre o requerente o ónus de alegar e provar os factos concretos que objetivamente justifiquem o conhecimento tardio dos fundamentos da alteração. III – Se o requerente da alteração não invocou qualquer incumprimento do acordado e se a situação que pretende regular – período de férias com o menor e pagamento de alimentos pelo requerente quando está em missão – já estava regulada no acordo, e não foi invocado incumprimento, não se verificam os pressupostos da alteração. IV – Não tendo sido alegado a dificuldade no estabelecimento de contactos entre o pai e o menor quando este se encontra ausente no estrangeiro, em missão, também não há fundamento para o prosseguimento dos autos. V – A circunstância de um dos progenitores ter mudado de opinião relativamente ao acordo de regulação, não constitui fundamento da alteração. (Sumário elaborado pela Relatora) | ||
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Decisão Texto Integral: | Relatora: Helena Melo 1.º Adjunto: José Avelino Gonçalves 2.º Adjunto: Arlindo Oliveira Processo 486/22.2T8MBR.C1 Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:
I – Relatório Os presentes autos foram intentados por AA para alteração das responsabilidades parentais da criança BB, nascida a .../.../2016, alegando que o acordo celebrado na conservatória não previu um regime de contactos à distância do pai com o filho e que não se justifica a cláusula acordada de pagamento da quantia de € 300,00 a título de alimentos, quando o progenitor estiver em missão no estrangeiro, montante que é muito elevado, devendo as concretas despesas do menor serem repartidas em partes iguais por ambos os pais. Mais requereu que se alterassem os períodos de férias da criança com o progenitor, permanecendo o menor com o pai quando este se encontrar em férias das missões que realiza. A requerida CC, citada nos ternos do artigo 42.º, n.º 3 do RGPTC, veio alegar que se mostra desnecessária qualquer alteração da pensão de alimentos, que o acordo das responsabilidades parentais é omisso quanto aos contactos da criança com o progenitor, mas que nem por isso os mesmos deixam de ocorrer com normalidade e naturalidade e que inexiste qualquer necessidade de alterar o regime de férias. Após foi proferida decisão que determinou o arquivamento dos autos. O requerente não se conformou e interpôs o presente recurso de apelação, tendo concluído as suas alegações do seguinte modo: A) O acordo de regulação das responsabilidades parentais em causa nos autos prevê, quanto a férias, que o menor e seu pai passem juntos 15 dias. B) Com o objetivo de colmatar os períodos de afastamento longo entre pai e menor, em virtude das missões no estrangeiro daquele, recorrente solicitou ao Tribunal a alteração do previamente estipulado regime de férias e que permitisse a pai e menor passarem juntos todos o período de férias do pai em Portugal. C) Durante a estadia do pai em Portugal o menor ficaria entregue ao pai. D) Entendeu, erradamente, o MM. Juiz a quo, que o recorrente peticionou ao Tribunal a alteração do regime de férias dele com o menor no sentido de que o menor adequasse as suas férias às do progenitor. E) O recorrente requereu, na verdade, que o Tribunal estabelecesse que o menor ficaria entregue ao pai quando este, em período de missão, estivesse em Portugal e, quanto a tal, o Mmo. Juiz a quo omitiu a sua pronúncia nos termos do art. 615º, nº1, al. d), primeira parte do Código de Processo Civil. F) O acordo quanto ao exercício das responsabilidades parentais do menor é omisso quanto ao regime de contactos entre o menor e seu pai quando este se encontra em missão. G) O recorrente requereu ao Tribunal a inclusão dessa previsão porque, em seu entender, é necessário estabelecer uma regra a observar por ambos os progenitores. H) Decidiu o Mmo. Juiz a quo com base no alegado pela recorrida, sem mais, que não existia “(…) qualquer problema (…)” com a realização dos contactos entre menor e progenitor e, como tal, desnecessidade de alteração do regime. I) Porém, não existe regime quanto a esta matéria que é de especial importância e deve ser regulada. J) O recorrente solicitou a intervenção do Tribunal nesta matéria porque os progenitores não se entenderam quanto ao modo de a exercer. K) Segundo o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto proferido no Proc. nº301/14.0TBVCD.P1, “uma das características da jurisdição voluntária é a possibilidade que o Tribunal tem de investigar livremente os factos, coligir as provas, ordenar as diligências e recolher as informações (…)” L) O presente é um processo de jurisdição voluntária, respeita à vida e futuro de um menor e o Mm. Juiz deveria aferido com certeza o que vem sucedendo, ordenando a realização da conferência de pais nos termos do art. 35º do RGPTC e, até mesmo, a produção de prova. M) A marcação da conferência a que alude o art. 35º do RGPTC por remissão do art.º 42º, nº5 do RGPTC não devia ter sido precludida. N) Dispõe o art. 2003º, nº1 e nº2 do Código Civil que, por alimentos entende-se tudo o que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário e, in casu, compreendem, também, a instrução e educação do menor. O) O montante da prestação de alimentos é de 300,00€ (trezentos euros) mensais, acrescido de metade das despesas de saúde, no âmbito escolar ou relacionadas com atividades inseridas no âmbito escolar e despesas de vestuário e de calçado do menor. P) O recorrente paga ao menor 300,00€ (trezentos euros) mensais para prover, apenas e só, a sua alimentação. Q) Dispõe o art.º 36º da Constituição da República Portuguesa que ambos os pais gozam de iguais direitos e deveres na educação e manutenção dos filhos e na lógica de que pai e mãe contribuem com metade cada um para prover o sustento do seu filho, um menor de seis anos de idade não come nem bebe, sozinho, 600,00€ mensais. R) Não é necessário, proporcional nem adequado à luz do disposto no art.º 2003º, nº1 e nº2 e 2004º, nº1, parte final do Código Civil que o recorrente pague 300,00€ mensais para prover, apenas, a alimentação do seu filho. S) Com a douta sentença proferida, e salvo o devido respeito, o douto tribunal “a quo“ efetuou uma incorreta interpretação do preceituado no artigo 2003º, nº1 e nº2 e 2004.º do Código Civil e violou o disposto no artigo 36.º da Constituição da Republica Portuguesa. Nestes termos e nos melhores de direito, deverá o presente recurso ser recebido e julgado procedente, e em consequência ser a d. sentença recorrida revogada e substituída por outra que se pronuncie quanto à entrega do menor ao pai para que este fique ao seu cuidado no período em que o pai esteja de férias em Portugal, preveja o regime de contactos entre menor e pai quando em missão deste e adeque o montante da prestação de alimentos ao necessário e proporcional às necessidades do menor, Ou, caso assim não se entenda, determine a prossecução dos autos e a realização da conferência de pais a que alude o art. 35º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível por remissão do art.º 42º, nº 6 do mesmo diploma legal.
A requerida apresentou contra-alegações, tendo formulado as seguintes conclusões: (…).
II – Objeto do recurso De acordo com as conclusões do apelante as quais delimitam o objeto do recurso, as questões a apreciar são as seguintes: . se a decisão recorrida é nula por omissão de pronúncia; e; . se não se verificava fundamento legal para a presente causa findar, nos termos determinados pelo Tribunal a quo, devendo a mesma prosseguir os seus termos.
III – Fundamentação A situação factual é a supra referida, resultando ainda dos autos, a seguinte factualidade: O apelante iniciou os presentes autos com o seguinte requerimento inicial: .A).“1º Requerente e requerida foram casados entre si e são pais do menor BB nascido em .../.../2016. 2º Por acordo entre ambos, homologado no processo de divórcio por mútuo consentimento que correu termos na Conservatória do Registo Civil ... sob o nº ... de 2021, cuja certidão de junta sob o doc. nº... e cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido, ficou estabelecido na cláusula 13, quanto ao montante da prestação de alimentos a pagar, pelo pai, ao menor o seguinte: “A título de alimentos para o menor, o pai entregará à mãe, em depósito ou transferência bancária (…) a quantia de €150,00, atualizável anualmente conforme o índice de inflação fixado pelo I.N.E. Quando o pai se ausentar da sua residência por períodos iguais ou superiores a 30 dias e não for possível cumprir o disposto nas alíneas a) e b) da cláusula 1ª o valor a entregar será de €300,00.” 3º Mais acordaram ambos, cfr. cláusula 14, que seriam suportadas em metade pelo pai e pela mãe as despesas de saúde, no âmbito escolar ou relacionadas com atividades inseridas no âmbito escolar e despesas de vestuário e calçado do menor. 4º Tal regime foi assim fixado, uma vez que, enquanto ..., o pai do menor faz missões no estrangeiro e está ausente por longos períodos de tempo. 5º Contudo, o acordo de regulação das responsabilidades parentais não previu, como deveria, o regime de contactos por meios de comunicação à distância, do pai com o menor e, 6º Além disso, sendo que todas as despesas do menor são divididas entre pai e mãe, fixar 300,00€ na ausência do pai em missão e 150,00€ durante os restantes períodos, apenas, para alimentar o menor não é razoável, uma vez que, na lógica de que pai e mãe suportam em partes iguais o comer e beber do menor este não come e bebe, sozinho, nem 600,00€ nem 300,00€ mensais, 7º Pelo que, deve o valor da pensão de alimentos, na ausência do pai em missão ser revisto e alterado, bem como, a pensão de alimentos passar a integrar, também, as despesas de calçado e vestuário do menor. 8º Quanto às férias de Verão estipularam os progenitores na cláusula 9 que o menor passaria uma quinzena com a mãe e uma quinzena com o pai. 9º Ocorre que, quando em missão, como já referido supra, o pai do menor se ausenta por longos períodos de tempo, apenas interrompidos por períodos de férias que, por vezes, excedem os quinze dias. 10º Uma vez que, pai e menor estão separados por longos períodos, seria benéfico para ambos que pudessem passar juntos todo o período de férias do pai, o qual seria agendado mediante comunicação e contacto prévio com a mãe do menor de modo a não coincidir e a não prejudicar o período de férias do menor com esta, 11º Alteração que, ora, também se requer, quanto ao período de férias de Verão do menor com o pai. Nestes termos, requer a V.ª Ex.ª, nos termos e para os efeitos do art. 42º do RGPTC, se digne deferir: a) a alteração do estabelecido no que tange o regime de alimentos a prestar pelo pai ao menor fixando-se, unicamente, os 150,00€ (cento e cinquenta euros) mensais integrando já, também, as despesas de calçado e vestuário do menor, b) se fixe um regime de contactos entre pai, família paterna do menor e menor nos períodos em que o pai esteja ausente no estrangeiro em missão e, c) se proceda à alteração da cláusula das férias de Verão passando o menor, em período de missão do pai, com este, todo o seu período de férias a combinar, previamente, com a mãe.”
.B) No processo de divórcio que correu seus termos na Conservatória do Registo Civil/Predial/Comercial de ... foi, em .../.../2021, decretado o divórcio por mútuo consentimento entre as aqui partes e homologado o acordo quanto ás responsabilidades parentais, obtida a concordância do Ministério Público, relativamente ao menor BB.
.C) Foi estabelecido no referido acordo, nomeadamente, o seguinte: 1.a) O menor fica, alternada e semanalmente, entregue à guarda e cuidados do pai e da mãe; .5. Quando o pai do menor se ausentar em missão no território nacional, em missões de âmbito internacional ou em cursos de duração superior a 15 dias, o menor ficará entregue à guarda e cuidados da mãe. .13. A título de alimentos para o menor, o pai entregará à mãe, em depósito ou transferência bancária na conta bancária com o Iban ...27, até ao dia 5 de cada mês, com início no mês da instauração do processo de divórcio, a quantia de 150,00, atualizável anualmente conforme o índice de inflação fixado pelo INE. Quando o pai se ausentar da sua residência por períodos iguais ou superiores a 30 dias e não for possível cumprir o disposto nas alíneas a) e b) da cláusula 1ª o valor a entregar será de 300,00 euros. Se o início da ausência for o meio do mês o valor da entrega será de 300,00 euros até ao dia 5 do mês seguinte. Assim que as alíneas a) e b) retomem o cumprimento, o pai voltará a entregar à mãe, a título de alimentos para o menor, a quantia de 150,00. 14. Serão suportadas em metade, pelo pai e pela mãe: As despesas que obrigatoriamente tenham lugar no âmbito da saúde; As despesas que obrigatoriamente tenham lugar no âmbito do vestuário e calçado do menor. As despesas que obrigatoriamente tenham lugar no âmbito escolar ou relacionadas com atividades inseridas no âmbito escolar.”
Da alegada nulidade da decisão recorrida por omissão de pronúncia A sentença será nula (ou o despacho, por força do disposto no artº 613º, nº 3 do CPC), quer no caso do juiz deixar de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar, quer quando conheça de questões de que não podia tomar conhecimento (artº 615º, nº 1, alínea d), do CPC). Desde logo, importa precisar o que deve entender-se por questões, cujo conhecimento ou não conhecimento constitui nulidade por excesso ou falta de pronúncia. Como tem sido entendimento pacífico da doutrina e da jurisprudência, apenas as questões em sentido técnico, ou seja, os assuntos que integram o “thema decidendum”, ou que dele se afastam, constituem verdadeiras questões de que o tribunal tem o dever de conhecer para a decisão da causa ou o dever de não conhecer, sob pena de incorrer na nulidade prevista no artº 615, nº 1, al. d) do CPC. Por questões deve entender-se “os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e exceções invocadas e todas as exceções de que oficiosamente cumpre, ao juiz, conhecer” ( José Lebre de Freitas e outros, Código de Processo Civil Anotado, 2º volume, Coimbra Editora, 2001, pág. 670). O artº 615º, nº 1, alínea d) tem de ser interpretado em conjugação com o disposto no artº 608, nº 2, 2ª parte, do CPC, que impõe que o juiz não se ocupe senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras, devendo resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, com exceção daquelas, cuja solução esteja prejudicada pela solução dada a outras. Vem sendo jurisprudência corrente a que entende que o art. 608º, nº 2 do CPC impõe que o tribunal resolva todas as questões que as partes lhe hajam submetido a julgamento, mas não a apreciação de todos os argumentos por elas produzidos (cfr. Ac. do STJ de 08.05.2001, proc. nº 02B046, onde são citados no mesmo sentido os Acs. STJ de 16/02/95, in BMJ nº 444, pág. 595 (relator Ferreira da Silva); de 08/10/98, no Proc. 385/98 da 2ª secção (relator Silva Graça); de 09/11/99, no Proc. 814/99 da 1ª secção (relator Fernandes Magalhães); de 16/12/2000, no Proc. 266/99 da 4ª secção (relator Almeida Deveza); de 12/03/2002, no Proc. 4092/01 da 1ª secção (relator Ferreira Ramos); e de 24/04/2002, no Proc. 13/02 da 2ª secção (relator Eduardo Batista). Alega o apelante que a decisão recorrida incorreu em omissão de pronúncia porque interpretou mal a pretensão do apelante, considerando que o recorrente peticionou ao Tribunal a alteração do regime de férias dele com o menor no sentido de que o menor adequasse as suas férias às do progenitor, não se pronunciando sobre a questão concretamente colocada. Segundo entendemos o alegado pelo apelante, este vem invocar que o tribunal a quo não se pronunciou sobre o pedido de alteração do regime de férias. Efetivamente, a decisão recorrida não se pronunciou. Mas não se pronunciou, nem tinha de se pronunciar, porque não conheceu do mérito, tendo determinado o arquivamento dos autos, não tendo incorrido em qualquer omissão de pronúncia. Improcede, assim o alegado vício gerador de nulidade.
Do arquivamento Dispõe o artº 1877º do Código Civil que “os filhos estão sujeitos às responsabilidades parentais até à maioridade ou emancipação”. Por sua vez, estabelece o art. 1878º, nº 1 do mesmo Código que “compete aos pais, no interesse dos filhos, velar pela segurança e saúde destes, prover ao seu sustento, dirigir a sua educação, representá-los, ainda que nascituros, e administrar os seus bens”. Quando se verifica a rutura da vida em comum dos progenitores da criança, designadamente por divórcio, como ocorreu no caso, torna-se necessário regular os termos em que as responsabilidades parentais devem ser exercidas, após a cessação da coabitação (artº 1905º do CC). A alteração do regulado encontra-se prevista no artº 42º do Regime Geral das Providências Tutelares Cíveis (RGPTC), aprovado pela Lei 141/2015, de 8 de setembro, estatuindo o seu nº 1 do que “Quando o acordo ou a decisão final não sejam cumpridos por ambos os pais, ou por terceira pessoa a quem a criança haja sido confiada, ou quando circunstâncias supervenientes tornem necessário alterar o que estiver estabelecido, qualquer um daqueles ou o Ministério Público podem requerer ao tribunal, que no momento for territorialmente competente, nova regulação do exercício das responsabilidades parentais.”. O requerido é citado para, no prazo de 10 dias, alegar o que tiver por conveniente (42º, nº 3). Junta a alegação ou findo o prazo para a sua apresentação, o juiz, se considerar o pedido infundado, ou desnecessária a alteração, manda arquivar o processo, condenando em custas o requerente (artº 43º, nº 4). Caso contrário, o juiz ordena o prosseguimento dos autos, observando-se, na parte aplicável, o disposto nos artigos 35.º a 40.º(artº 42º, nº 5), podendo o juiz, antes de mandar arquivar os autos ou de ordenar o seu prosseguimento, determinar a realização das diligências que considere necessárias (artº 42º, nº 6). O procedimento de alteração do regime de exercício das responsabilidades parentais tem assim como pressupostos que a alteração de regime se funde em incumprimento do acordo ou decisão final que fixou o regime a alterar, ou em circunstâncias supervenientes que imponham essa alteração. No caso em apreço, como bem refere o despacho recorrido, não é invocado o incumprimento de qualquer cláusula do acordo. O acordo das responsabilidades parentais que foi junto aos autos, é um acordo exaustivo, contendo 16 cláusulas, revelando, pelo menos na época, um bom entendimento entre os progenitores, o que resulta, designadamente, do acordado na cláusula 1, em que é estabelecida a guarda alternada, na cláusula 2ª, onde se prevê que o pai e a mãe podem visitar o filho onde é que ele esteja e sempre que quiserem e na cláusula 12, onde se prevê que o referido nas alíneas a) e b) da cláusula 1, bem como o disposto nas cláusulas 3 a 11ª, pode ser pontualmente alterado, desde que haja acordo entre ambos os progenitores. O outro pressuposto do procedimento de alteração são o surgimento de circunstâncias supervenientes, ou seja, aquelas que surgem posteriormente à data do encerramento da discussão – cf. art. 611.º, nº 1 do CPC, aplicável ex vi do art. 33.º, n.º 1, do RGPTC. Importa distinguir superveniência objetiva e subjetiva, sendo que qualquer uma delas pode fundamentar o pedido de alteração. A superveniência objetiva verifica-se quando os factos que configuram a alteração das circunstâncias, ocorrem depois do encerramento da discussão da causa em que foi proferida a decisão a alterar. Já a superveniência subjetiva tem lugar quando tais factos ocorrem antes daquele momento, mas chegam ao conhecimento do requerente em data posterior. Nos casos de superveniência subjetiva recai sobre o requerente o ónus de alegar e provar os factos concretos que objetivamente justifiquem o conhecimento tardio dos fundamentos da alteração (como se defende no Ac. do TRL de 8.02.2022, proc. 6427/21.7T8LRS.L1-7, acessível em www.dgsi.pt). Ora, também nenhuma circunstância superveniente é invocada, nem objetivamente, nem subjetivamente. O regime regulado no acordo já previa as alterações a introduzir, quando o progenitor se encontrar em missão prolongada, estabelecendo que, nesses casos, o menor fica confiado exclusivamente à mãe (cláusula 5ª), em substituição da guarda alternada semanal prevista na cláusula 1ª,a) e o montante de alimentos eleva-se de 150,00 mensais, para 300,00 (cláusula 13ª). O que resulta do requerimento do progenitor é que passou a entender, o que não considerava na ocasião do acordo, que 300,00 euros, a título de alimentos, é muito, quando está em missão, e que o menor deverá passar integralmente o período de férias do progenitor consigo, quando o requerente está de férias das missões, em substituição do regime previsto nas cláusulas 6ª a 9ª, por não considerar satisfatório o então acordado. Ora, a diminuição da quantia atribuída a título de alimentos, apenas poderá ter por fundamento, a diminuição das necessidades do menor ou a diminuição de rendimentos e /ou acréscimo de despesas do progenitor, o que não foi alegado. Relativamente à necessidade de fixar os contactos entre o pai e o filho, quando aquele está em missão: É certo que não se encontram regulados estes contactos no acordo homologado, mas as situações de vida são inúmeras e, por vezes, imprevisíveis, pelo que um acordo de regulação das responsabilidades parentais não pode ter a pretensão de regulá-las a todas. Como bem se refere na decisão recorrida, nem sequer foi alegada no requerimento inicial a existência de quaisquer conflitos nos contactos estabelecidos entre o progenitor e a criança, à distância, enquanto aquele se encontra em missão. Só agora em sede de recurso, é que o apelante vem dizer que os progenitores não se entendem quanto ao modo como devem ser efetuados os contactos entre os pais e o menor nessas ocasiões. Não pode, porque a Lei não o permite, um dos progenitores, só porque mudou de opinião quanto ao acordo celebrado, pedir a sua alteração. O requerente não invocou no requerimento inicial nenhuma situação de incumprimento, e também não alegou quaisquer factos que permitam concluir que as circunstâncias que, no seu entender justificam a alteração do regime de exercício das responsabilidades parentais, tenham tido início em momento posterior à data em que outorgou o acordo que fixou tal regime. A circunstância de se tratar de um processo de jurisdição voluntária, não afasta a necessidade da verificação dos pressupostos exigidos por lei. A motivação e fundamentação da alteração do acordo de Regulação das Responsabilidades Parentais tem pressupostos expressos, constantes do artº 42º, nº 1 do RGPTC que no caso não se verificam. Nesta medida, considerando não estarem verificados os pressupostos de que depende a alteração da regulação do exercício das responsabilidades parentais, tratando-se de um pedido manifestamente infundado, porque não alicerçado em incumprimentos nem se alicerçando em factos de onde resulte ser necessária a alteração daquele regime por alteração superveniente das condições que determinaram o acordo, não resta, senão, considerar não estarem verificados os pressupostos para que os autos prossigam. Improcede, consequentemente, a apelação.
Sumário: (…).
IV – Decisão Pelo exposto, acordam os juízes desta 1ª secção cível em julgar improcedente a apelação, confirmando a decisão recorrida.
Custas pelo apelante. Not. Coimbra, 7 de fevereiro de 2023 |