Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
60/21.0T8MGL.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ALBERTO RUÇO
Descritores: LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA
FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO
VERSÕES FACTUAIS OPOSTAS
FACTOS INDICIÁRIOS
Data do Acordão: 06/13/2023
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO DE COMPETÊNCIA GENÉRICA DE MANGUALDE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGO 607.º, 4 E 5, DO CPC
ARTIGOS 1251.º; 1259.º, 1; 1260.º, 1 E 2; 1287.º E 1305.º, DO CÓDIGO CIVIL
Sumário: I – Para efeitos do disposto no artigo 607.º, n.º 4 e 5, do Código de Processo Civil, quando o juiz se confronta com duas hipóteses factuais que se excluem mutuamente, isso implica, logicamente, que não possam ter existido ambas no mesmo lapso de tempo.

II - Salvo se os elementos probatórios a favor de cada uma das hipóteses forem sensivelmente iguais, a convicção do julgador formar-se-á de acordo com a hipótese factual que apresentar mais indícios, mais variados e que permita ter uma compreensão global e coerente de todos os factos.

III – Do mesmo modo, quando a prova testemunhal e por declarações de parte forma blocos com versões factuais opostas, não podendo ambas ser verdadeiras, a convicção acerca da correspondência ou não correspondência dos depoimentos com a realidade deve formar-se no sentido de corresponderem à realidade histórica aqueles depoimentos que são corroborados por factos indiciários numerosos e sobretudo variados e que permitem ao juiz ter uma compreensão global e coerente acerca de uma das hipóteses factuais.

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra,

*

Juiz relator…………....Alberto Augusto Vicente Ruço

1.º Juiz adjunto………Rui António Correia Moura

2.º Juiz adjunto………José Fonte Ramos


*


(…)

*

Recorrente ………………….AA e marido BB, residentes na Rua ..., ... ..., ..., contribuintes n.ºs ...12 e ...50,

…………………………………….CC e mulher DD, residentes na Rua ..., ..., ... ..., ..., contribuintes n.ºs ...81 e ...23;

……………………………………EE, solteira, maior, residente na Rua ..., ..., ... ..., ..., contribuinte n.º ... e

……………………………………FF e marido GG, residentes na Rua ..., ..., ... ..., contribuintes n.ºs ...94 e ...36.

Recorridos ……………………HH, solteira, maior, residente na Rua ..., ..., ..., ... ..., ..., contribuinte n.º...;

……………………………………II e marido JJ, residentes na Rua ..., ..., ... ..., ..., contribuintes n.ºs ...05 e ...44;

………………………………………..KK e marido LL, residentes na Rua ..., Quinta ..., ... ..., ..., contribuintes n.ºs ...08 e ...10 e

………………………………………MM e mulher NN, residentes em 11B Rue ..., ..., ..., ..., contribuintes n.ºs ...87 e ...95.


*

I. Relatório

(a) O recurso vem interposto da sentença que julgou a presente ação improcedente.

[Quando, a seguir, se aludir a Autores e a Réus deve entender-se como compreendendo também aos pais das atuais partes]

Através dela, os Autores, agora recorrentes, demandaram os Réus, no essencial, para que ficasse definido, no confronto com eles, que o seu prédio inscrito na respetiva matriz sob o artigo ...95 tem a configuração que os Autores indicaram na petição inicial, pelo que pediram a condenação dos Réus no seguinte:

«a) reconhecerem que o prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia ..., concelho ..., sob o artigo ...95, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...15 da dita freguesia, pertence em propriedade plena e exclusiva aos autores;

b) reconhecerem que faz parte integrante do prédio dos autores indicado em a) o terreno/logradouro com a área de 201,60 m2;

c) reconhecerem que o prédio urbano, inscrito na matriz sob o artigo ... da freguesia ..., concelho ... e descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...25 da dita freguesia, confina de norte, sul e poente com o prédio propriedade dos autores inscrito na matriz sob o artigo ... da freguesia ..., concelho ... e descrito a Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...15 da dita freguesia;

d) reconhecerem que o prédio inscrito na matriz sob o artigo ... da freguesia ..., concelho ... e descrito a Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...25 da dita freguesia, tem a área total 198,75 m2 (superfície coberta 128,75 m2 e superfície descoberta de 70 m2) e confina de norte com OO, herdeiros e PP, herdeiros, sul com OO, herdeiros e QQ, nascente com OO, herdeiros e poente caminho público;

e) que seja ordenado à administração tributária – Serviço de Finanças ... que proceda à correção do prédio inscrito na matriz sob o artigo ... da freguesia ..., concelho ... e à conservatória do Registo predial ... que proceda à correção da descrição n.º ...25 da dita freguesia – ap. ...03 de 2020/08/27, passando a constar pela forma referida na alínea anterior;

f) demolirem e retirarem imediatamente e à sua custa, a estrutura escadaria em ferro fixada no solo do logradouro dos autores e na parede norte da sua casa, ao nível do primeiro andar, com largura de 1 metro e extensão de 3 metros, destinada a acesso de pé do logradouro à varanda e através desta ao primeiro andar;

g) não mais no futuro entrarem no identificado prédio propriedade dos autores, executando para exercício da reconhecida servidão de passagem a pé, com a largura de 1,30 metros, início a poente na abertura delimitada com pedras de granito situada encostada a parede da casa de habitação dos réus, colocarem quaisquer objetos ou realizarem quaisquer obras que ocupem solo, subsolo ou espaço aéreo deste perturbarem, limitarem ou dificultarem o exercício do invocado direito de propriedade;

h) pagarem aos autores indemnização no valor de €300,00 (trezentos euros), acrescida de juros de mora a taxa legal contados a partir da data de proferimento da sentença, pelos danos advenientes de a ré HH ter arrancado e se ter apoderado dos pilares e rede de vedação colocados junto ao muro de suporte da varanda, com a largura de 1,50 metros e altura de 2,50 metros e de ter derrubado o troço de pilares e rede situado defronte da sobredita porta situada no lado norte da casa, numa extensão de 10 metros; …»

Como causa de pedir invocam a posse e a propriedade sobre uma determinada porção de terreno que fica nas traseiras da casa dos Réus, para nascente, e que estes Réus fizeram constar indevidamente dos elementos relativos à identificação do seu prédio no registo predial, alegando retificação da respetiva área, sem consulta dos proprietários dos prédios vizinhos, além de invadirem este prédio e de terem colocado nele uma escada de ferro para aceder à varanda do respetivo prédio.

Os Réus responderam impugnado a factualidade alegada pelos Autores referindo que a porção de terreno reivindicada pelos Autores sempre fez parte do seu prédio, mencionando os respetivos factos.

(b) No despacho saneador foram identificadas as seguintes questões factuais a solucionar:

«1 - Saber quais as confrontações, limites e áreas (total, descoberta e coberta) do prédio rústico referido em A);

2- Saber se os réus colocaram uma escadaria em ferro encostada à parede de granito de suporte da varanda do seu prédio, para nascente desta, fixada no solo do logradouro dos autores e na parede norte da sua casa, ao nível do primeiro andar, com largura de 1,00 metros e extensão de 3 metros e na positiva, se o podiam fazer;

3- Saber se os réus no futuro, em face da configuração dos prédios em causa, não necessitam de utilizar a servidão de passagem a pé, com a largura de 1,30 metros, início a poente na abertura delimitada com pedras de granito situada encostada a parede da casa de habitação dos réus;

4- Saber se os réus colocaram quaisquer objetos ou realizaram quaisquer obras que ocupem solo, subsolo ou espaço aéreo do prédio dos autores, perturbaram, limitaram ou dificultaram o exercício do invocado direito de propriedade daqueles e na afirmativa, quais os danos daí advenientes.»

(c) Realizou-se a audiência de julgamento e depois proferida sentença com o seguinte dispositivo:

«Em face ao exposto julgo a ação totalmente improcedente por não provada e, em consequência absolvo os réus de todos os pedidos contra si formulados.

Custas pelos autores, cfr. artigo 527.º, n.º 1 e 2 do Código de Processo Civil.

Registe e notifique.»

(d) É desta decisão que vem interposto recurso por parte dos Autores, cujas conclusões são as seguintes:

«a) A prova decorrente dos depoimentos testemunhais, fundamentação da decisão do julgador quanto à credibilidade, imparcialidade e isenção dos mesmos, documental, e pericial abaixo identificada, impõem decisão diversa da recorrida quanto ponto 7 da matéria de facto considerada provada na sentença, que deverá ser alterada passando a constar “… confina de sul, norte e poente com o prédio dos réus…” no local onde consta “… confina de sul, com o prédio dos réus…”, mantendo-se o demais decidido em tal ponto.

b) Deverá também ser considerada provada a matéria de facto constantes das alíneas A), B), E), J) e K), supratranscritas.

c) A alteração da decisão proferida quanto à matéria de facto referida nas alíneas anteriores justifica-se pelo seguinte:

 - A decisão proferida, como suprarreferido, não levou em devida consideração o teor da contestação apresentada por HH que aceitou o direito de propriedade dos autores sobre a casa/edificado e parte do logradouro, como de corre dos artigos 1.º, 10.º 11.º e 12.º.

- Não levou em devida consideração a seguinte prova documental:

Certidão referente ao prédio descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...15 da freguesia ..., constante de fls. 36 a 37 dos autos, a qual comprova o registo de propriedade a favor de OO, de quem os autores são únicos e universais herdeiros, conforme escritura de habilitação de herdeiros de fls. 38 a 41 dos autos, e as áreas inscritas de 132 m2 de superfície coberta e 210,60 m2 de superfície descoberta.

Certidão referente ao prédio descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...25 da freguesia ..., constante de fls. 48 dos autos, a qual comprova o registo de propriedade a favor dos antepossuidores do prédio dos réus, e as áreas inscritas de 100 m2 de superfície coberta e 70 m2 de superfície descoberta.

Perícia / levantamento topográfico constante de fls. 456 a 494.

- Não levou em consideração a fundamentação da decisão quanto à matéria de facto, supratranscrita, extraindo desta a necessária consequência quanto à resposta das testemunhas sobre a matéria de facto impugnada decorrente da credibilidade, isenção e imparcialidade conferido a tais depoimentos.

- Finalmente a alteração da resposta à matéria de facto deverá ocorrer considerando, também, os seguintes depoimentos de parte e testemunhais:

AA: depoimento constante nos seguintes trechos da gravação CD: 01:56 a 09:00, 11:35 a 36:00, 51:03 a 59:00, 1.00:15 a 1.00:55.

RR: Depoimento constante nos seguintes trechos da gravação CD: 01:05 a 05:06.

SS: Depoimento constante nos seguintes trechos da gravação CD (3.ª gravação desta testemunha): 00:01 a 21:56.

TT: Depoimento constante nos seguintes trechos da gravação CD: 01:36 a 24:10.

UU: Depoimento constante nos seguintes trechos da

gravação CD: 02:08 a 24:54, 26:43 a 27:37, 27:55 a 29:27.

d) Todas as testemunhas, reconheceram que os autores são proprietários da casa de habitação/edificado e parte do logradouro, inexistindo qualquer prova documental ou testemunhal nos autos que contrarie tal direito de propriedade.

e) Os autores beneficiam da presunção derivada do registo (art.º 7 CRP).

f) A sobredita decisão proferida quanto à matéria de facto enferma de erro de apreciação, violando o artigo 607.º, n.º 4 do CPC.

g) - Acresce que, o decidido no ponto 7 da sentença, objeto de impugnação está em manifesta contradição com o decidido no ponto 14, por confrontado o prédio dos autores com a parede em granito da casa de habitação, não poder confinar com este nomeadamente do lado sul, tendo de necessariamente confinar de norte e poente, enfermando de nulidade – Artigo 615.º n.º 1 alínea c) do CPC

h) A ausência de assinatura dos réus confinantes no pedido de retificação de área apresentado na Conservatória do Registo Predial, e notificação da sua pendência para exercício do direito ao contraditório encontra-se provada documentalmente através documento de fls. 63 a 79 e 93 a 95 dos autos, devendo considerar-se provado, por relevante para a decisão a proferir, o seguinte facto:

- As plantas anexas ao pedido de retificação de área apresentadas pelos réus na Conservatória do Registo Predial para retificação da área do prédio dos réus não contêm assinaturas dos confinantes autores, nem estes foram notificados no processo de retificação para exercerem direito ao contraditório nem deduzir oposição.

i) Na matéria de facto considerada provada na sentença foi reconhecido que os autores são donos e legítimos possuidores do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia ..., concelho ... sob o artigo ...95.º, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...15, da dita freguesia. – Ponto 1 matéria facto provada.

Foi igualmente considerado provado que se encontra descrito com a configuração, composição, área e confinantes referidos na petição inicial - Ponto 2 sentença.

Não obstante ter sido reconhecido o direito de propriedade dos autores a ação foi julgada totalmente improcedente, não sendo reconhecido o direito de propriedade dos autores, nem os réus condenados a respeitarem tal direito conforme peticionado nas alíneas a) e c) do pedido.

Nesta parte a decisão proferida, ao julgar totalmente improcedente a ação, encontra-se em oposição com os fundamentos, enfermando de nulidade, que argui. – Artigo 615.º, n.º 1 alínea e) do CPC.

j) Os autores são proprietários do prédio identificado nos artigos 1.º, 2.º, 15.º e 16.º da petição inicial, com configuração, composição e confinantes do mesmo conforme peticionaram nas alíneas a), b), c), d) e g) do pedido.

Atento o pedido formulado nos autos a presente ação é de reivindicação, tendo os autores direito a que seja reconhecido o seu direito de propriedade, restituição do que lhe pertence, e condenação dos réus a reconhecerem e respeitarem tal direito – Violando a decisão proferida os artigos 1305.º e 1311.º CC.

k) Atento o teor da contestação de HH, depoimentos testemunhais supra indicados, que não foram contraditados por quaisquer outros meios de prova dúvidas não há que se encontra reconhecido e provado, o direito de propriedade dos autores sobre a parte do logradouro definido por uma linha imaginária que tem o inicio numa cruz talhada na pedra da varanda das casas, que se estende em linha reta no sentido noroeste/nordeste até atingir o local onde, na versão dos réus, se encontrava implantado um marco junto a uma cerejeira.

Quanto a esta parte do logradouro duvidas não há dever ser reconhecido e respeitado o direito de propriedade dos autores, e consequentemente julgados procedente os pedidos formulados quanto a tal matéria.

l) Entendem, os recorrentes que, contrariamente à versão dos réus, deverá ser-lhes reconhecido o direito de propriedade sobre a totalidade do logradouro, com a configuração, localização e confinantes indicados na petição   inicial, atento o teor da supra indicada prova testemunhal e documental, julgando-se procedentes os pedidos formulados nas alíneas a), b), c) e d) da petição inicial.

m) Decorre da matéria de facto, conforme pretensão supra, que os réus alteraram a área do logradouro do seu prédio de 70m2 para 366,75m2, e os autores/confinantes não assinaram os levantamentos topográficos que fundamentaram tais alterações, nem foram notificados pela Conservatória do Registo Predial para, no exercício do direito ao contraditório, deduzirem oposição.

A dispensa de harmonização efetuada pela Conservatória do Registo Predial somente poderia ser efetuada se a discrepância de área não excedesse 10%, sendo a discrepância a discrepância é de 523,92%, a sobredita alteração é ilegal por violar o disposto no, concretamente o disposto nos artigos 28.º-A, 129.º e art.º 131.º do Código de Registo Predial.

n) Da procedência da alteração da decisão proferida quanto à matéria de facto, decorre que a escadaria foi colocada em dezembro de 2019 (ponto 22 matéria de facto provada) em terreno propriedade dos autores, violando o seu direito de               propriedade (artigo 1305 CC), o que terá como consequência a procedência de tal pedido, devendo ser ordenada a demolição e retirada da escadaria em ferro, formulada na alínea f) do pedido.

o) - Mas mesmo que não fosse alterada a matéria de facto, o que reiteram não concedem, sempre tal pedido teria que ser julgado procedente dado que na sentença se considerou o seguinte:

“Em face de a prova produzida por autores e réus confirmar as versões opostas apresentadas pelos autores e réus nos seus articulados, não é possível da mesma retirar, com a certeza necessária de que alguma das versões apresenta maior credibilidade que a outra e consequentemente não é possível ao tribunal formar a sua convicção pela veracidade ou não da factualidade aduzida pelos autores.”

Ora, considerando o tribunal que não consegue apurar se o terreno é propriedade de autores e réus, resulta ser o terreno propriedade de ambos, pelo que, os réus implantaram a escadaria em ferro em terreno que não é sua exclusiva propriedade, devendo ser ordenada a sua demolição e retirada, por violar o direito de propriedade dos autores.

p) Ao decidir-se pela forma constante da decisão “a quo” violaram-se, por erro de interpretação e aplicação, os artigos 1305.º e 1311.º do código civil, 607.º n.º 41 e 615.º n.º 1 alínea c) CPC, 28.º-A, 129.º e art.º 131.º do CRP.

Nestes termos, e nos, melhores de direito, que serão objeto do mui douto suprimento de V.ªs Ex.ªs, deve ser concedido provimento ao recurso, alterada a decisão da matéria de facto no sentido supra indicado, e revogada a sentença recorrida nos termos supra expostos, julgando-se procedente à ação nos termos acima indicados, com o que se fará JUSTIÇA.

(e) Contra-alegou apenas a ré HH, que concluiu assim:

«1.ª O recurso interposto pelos AA./Recorrentes carece inteiramente de qualquer fundamento e prossegue na senda de manifesto uso abusivo dos meios processuais e da justiça, por atropelo clamoroso à verdade dos factos, com intuito claro de ver reconhecido um direito que bem sabem não existir.

2.ª A douta decisão proferida pelo Tribunal a quo não merece qualquer reparo.

3.ª Os recorrentes não explicam o porquê da discordância, não apontam as passagens precisas dos depoimentos – limitando-se a invocar/indicar gravações em bloco parcial e sem proceder a qualquer transcrição – que fundamentam a concreta divergência a cada ponto que consideram indevidamente julgado, nem explicam em que é que os depoimentos contrariam, ou são insuficientes, à decisão factual fixada pelo Tribunal recorrido.

4.ª Os Recorrentes limitam-se a fazer considerações vagas, genéricas e imprecisas, não cumprindo com o ónus de impugnação que vem estabelecido no artigo 640.º do Código de Processo Civil.

5.ª Pelo que o recurso sobre a matéria de facto deve ser rejeitado.

Em todo o caso e sem prescindir do que vem dito,

6.ª O Tribunal a quo decidiu corretamente a matéria de facto, alicerçando a mesma em prova documental existente nos autos, nas declarações de parte da Ré HH e nos depoimentos das testemunhas indicada pela Recorrida.

7.ª O Tribunal teve em consideração a prova documental junta aos autos pela recorrida HH, requerimento junto a fls. 225 a 228 e 340 a 342, como resulta da fundamentação da douta sentença.

8.ª Da análise criteriosa de tais documentos, só de per si, é possível extrair uma realidade bem diferente daquele que é retratada pelos AA.2

Vejamos,

9.ª Encontra-se junto aos autos, fls. 329 a 331, certidão da escritura de compra e venda lavrada no Cartório Notarial ..., no dia 30 de setembro de 1974, na qual se faz constar que VV vendeu a WW (pai dos Recorrentes) “uma casa de habitação, sita em ..., freguesia ..., a partir do nascente com XX, do norte com VV, do poente com o comprador e do sul com XX, inscrito na matriz sob o artigo duzentos e noventa e cinco (…)(negrito e sublinhado nosso).

10.ª Como resulta da mencionada escritura, o prédio dos Recorrentes, artigo ...95, não confronta de norte e poente com o prédio dos Recorridos.

11.ª A confrontação que o mesmo apresenta como sendo com o prédio dos RR., artigo ...96, é do lado Sul, XX (pai dos Recorridos).

12.ª Encontra-se junto aos autos, fls. 229 a 256, certidão dos autos de inventário obrigatório com o n.º .../87 que correu os seus termos no Tribunal Judicial ..., por óbito de WW, falecido a .../.../1987, em que foi cabeça de casal OO (os falecidos pais dos Recorrentes).

13.ª Nesse inventário a referida cabeça de casal relacionou como verba 6 o referido prédio ...95, dando-lhe a seguinte descrição “Uma casa de habitação sita no dito lugar de ..., a confrontar do nascente, norte e sul com herdeiros de YY e do poente com antecedente (Cfr. fls. 238 e 251 dos presentes autos).

14.ª E, nesse mesmo inventário foi junto, também, pela cabeça de casal, OO, a caderneta matricial do prédio urbano inscrito sob o artigo ...95 (cfr. fls. 248 dos presentes autos), onde consta que o prédio tem uma superfície coberta de 52 m2 e descoberta de 150m2.

15.ª Encontra-se junto aos autos, fls. 257 a 279, certidão dos autos de inquérito n.º 3/15...., emitida, em 22 de março de 2022, pelos Serviços do Ministério Público – DIAP ..., da qual resulta, além do mais, que a esses autos de inquérito se encontra junto a descrição da Conservatória do Registo Predial ... desse prédio, o artigo ...95, onde consta que o mesmo confronta do norte, sul e nascente com herdeiros de YY e do Poente com OO, com a área de 202 m2, sendo 52 m2 de superfície coberta e 150 m2 de superfície descoberta.

16.ª Nesses mesmos autos de inquérito 3/15.... (cfr. fls. 262 a 273 dos presentes autos) encontra-se junta uma queixa-crime apresentada, em 12 de janeiro de 2015, pela ZZ (mãe dos Recorridos) por si e na qualidade de cabeça de casal da herança aberta por óbito de seu marido, XX, contra os recorrentes por destruição dos muros e do marco que existia junto a cerejeira.

17.ª Tal queixa apresentada pela de cuius, ZZ, em 12 de janeiro de 2015, veio na sequência do claro e inesperado comportamento dos recorrentes de fazer seu um espaço (releixo/terraço/logradouro) que bem sabiam não lhes pertencer, revelando sempre uma conduta de verdadeira má fé com o atropelo dos mais elementares princípios do direito, como resulta evidenciada pelos actos que praticaram após a morte da sua falecida mãe, OO, em .../.../2012, e que resultam da prova junta pela R. HH.

18.ª É a própria recorrente, AA, num requerimento que apresentou nos referidos autos de inquérito n.º 3/15.... (cfr. fls 276 a 279 dos presentes autos) a requerer a junção a esses autos dos “Doc. 1, fotocópia simples do registo predial do artigo ...95, aonde se pode confirmar as áreas de registo deste artigo, ou seja 52 m2 de área e 150 m2 de logradouro. (…) Doc. ..., fotocópia da caderneta predial do artigo ...95, de OO, com data de inscrição de 1938.” (sublinhado nosso)

19.ª Se outros documentos não existissem, e existem (cfr. fls. 238, 248, 251, 261, 330, 332 a 335, 336 a 339 dos presentes autos), poder-se-ia, desde já, concluir, que pelo menos até ao ano de 2015, data de apresentação da referida queixa-crime, as confrontações e áreas aí mencionadas referentes ao prédio ...95 são outras bem diferentes daquelas que os recorrentes querem, agora, ver reconhecidas na presente ação.

20.ª Encontra-se junto aos autos, fls. 332 a 335, certidão da Conservatória do Registo Predial ... referente ao prédio ...95, descrito sob o n.º ...15, sendo possível verificar que tal prédio foi objeto de retificação no que diz respeito às suas áreas e às suas confrontações.

21.ª E que tal retificação ocorreu, em 18/05/2018, junto da Conservatória do Registo Predial ....

22.ª Por força desse averbamento de retificação, da descrição do prédio ...95 passou a constar áreas significativamente maiores e confrontações diferentes das que constavam anteriormente.

23.ª Encontra-se junto aos autos, fls. 336 a 339, a certidão da requisição de registo referente ao pedido de retificação à descrição do prédio ...95.

24.ª Da análise da mesma resulta que quem apresenta o requerimento de retificação e o assina, em 18/05/218, são os próprios recorrentes, AA, EE, FF e CC;

25.ª Encontram-se, ainda, junto aos autos com os vários documentos apresentados pela recorrida HH um conjunto de fotografias que, também elas, confirmam e corroboram a versão apresentada pela Recorrida HH e contrariam, claramente, a versão apresentada pelos Recorrentes (cfr. fls. 270, 271, 272, 273, 348, 349, 362, 363, 364, 365, 414, 420, 422, 429, 447, 448, 449, 450 e 451 dos presentes autos).

26.ª Da confrontação destas fotografias com as fotografias juntas pelos recorrentes com a sua petição inicial (fotografias muito mais recentes), bem como dos depoimentos de testemunhas e da restante prova documental e pericial, verificamos que o espaço envolvente aos prédios dos Recorrentes e dos Recorridos sofreu significativas alterações, introduzidas por aqueles, depois da morte da mãe deles, mais concretamente, a partir do ano de 2015.

27.ª Tais alterações introduzidas pelos recorrentes tiveram como único propósito eliminar todos os sinais/indícios que permitiam a verificação dos limites exatos de ambos os prédios.

28.ª Das declarações de parte da R. HH e das testemunhas por si arroladas, merecedora de credibilidade por parte do Tribunal a quo, resulta evidente que o releixo/logradouro/pátio existente na parte detrás, a nascente, e a norte da casa dos RR. faz parte integrante do prédio destes, do artigo ...96.º, e não do prédio dos AA., do artigo ...95.

29.ª Todas identificaram de forma clara e inquestionável os limites de ambos os prédios, indicando concretamente os sinais e marcos existentes in loco que permitiam verificar, de forma segura e exata, as estremas de ambos os prédios, alguns deles, ainda hoje, permanecem no local.

30.ª Decorre das declarações de parte e dos mencionados depoimentos que, após a morte de OO, alguns desses sinais foram destruídos ou retirados do local, designadamente, o marco, muros, o galinheiro que existia dentro dos limites do prédio dos recorrentes, a caixa de correio que se encontrava fixada no pilar construído em pedras em granito e que, em setembro de 2019, os AA. a colocaram no portão em ferro, a sul, como resulta do confronto com as fotografia junta com o documento 17 e do alegado no artigos 20.º e 22.º da petição inicial e a fotografias junto pela Recorrida com o requerimento com a ref.ª 41854611.

31.ª Toda esta prova que vem referenciada foi devidamente valorada pelo Tribunal recorrido, que referiu que todos os testemunhos e declarações de parte foram coincidentes entre si e, também, coincidentes e condizentes com a prova documental existente nos autos.

32.ª Como bem refere o Tribunal a quo “para que o autor logre fazer prova do seu direito de propriedade, para além da existência de um título translativo, necessita ainda de demonstrar que o direito já existia no transmitente, implicando assim, a demonstração da existência de uma das formas de aquisição originária (usucapião, ocupação ou acessão)…” (sublinhado nosso).

33.ª Ora, analisada toda a matéria de facto dada como provada e toda a prova existente nos autos, não é possível concluir que o direito de que se arrogam os AA. existia na esfera jurídica do transmitente, tal como o configuram na sua petição inicial. Mas, antes, pelo contrário.

34.ª Os AA. alegam no artigo 3.º e 4.º da sua petição inicial que o prédio identificado no artigo 1.º dessa peça processual se encontra inscrito na matriz – artigo ...95 - em nome de OO e que o mesmo adveio à sua posse por sucessão deferida em partilha judicial por óbito do seu falecido marido WW.

35.ª Ora, analisando a certidão de processo de inventário obrigatório com o n.º .../87, por óbito referido WW, que se encontra junto aos autos, fls. 229 a 256, verifica-se que a cabeça de casal OO relacionou o prédio ...95 com a seguinte descrição:

“Uma casa de habitação sita no dito lugar de ..., a confrontar do nascente, norte e sul com herdeiros de YY e do poente com antecedente (Cfr. fls. 238 e 251 dos presentes autos). Tendo, ainda, junto a esses autos, a caderneta matricial do prédio urbano inscrito sob o artigo ...95 (cfr. fls. 248 dos presentes autos), onde consta que o prédio tem uma superfície coberta de 52 m2 e descoberta de 150m2.

36.ª Verifica-se, pois, que a descrição que os AA. dão, hoje, ao referido prédio ...95 não é a mesma que foi dada pela cabeça de casal OO e que a caderneta matricial e a descrição não têm, também elas, correspondência com os documentos juntos pelos AA. com o seu articulado da petição inicial.

37.ª Mais, da análise dos documentos que se encontram junto aos autos, fls. 332 a 335, certidão da Conservatória do Registo Predial ... referente ao prédio ...95, descrito sob o n.º ...15, verifica-se que o mesmo foi objeto de retificação, no dia 18/05/2018, junto da Conservatória do Registo Predial ..., no que diz respeitos às suas áreas e às suas confrontações, passando a constar da descrição áreas significativamente maiores.

38.ª E, encontra-se junto aos autos, fls. 336 a 339, a certidão da requisição de registo referente ao pedido de retificação à descrição do prédio ...95, do qual se pode extrair que o requerimento foi apresentado, em 18/05/2018, e assinado pelos próprios recorrentes, AA, EE, FF e CC;

39.º A jurisprudência e pacifica em estabelecer que a presunção que decorre do registo predial se limita à titularidade do direito inscrito, mas não abrange as respetivas áreas, limites ou confrontações.

40.ª O registo predial no nosso sistema jurídico não tem eficácia constitutiva, servindo apenas fins de declaração ou publicidade perante terceiros.

41.ª Deste modo, não é possível afirmar, a partir do registo, sem mais, que a área em disputa do logradouro faz parte integrante do prédio dos AA..

42.º Os Recorrentes tinham, antes, o ónus de alegar e provar factos conducentes a uma aquisição originária, o que não lograram fazer como bem referiu o Tribunal a quo.

TERMOS em que deve ser negado provimento ao presente recurso.

E assim se decidindo, Excelentíssimos Senhores Desembargadores, será feita sã e habitual Justiça!»

II. Objeto do recurso.

As questões que o recurso coloca são as seguintes:

(a) Rejeição do recurso. Os Recorridos alegam que «3.ª Os recorrentes não explicam o porquê da discordância, não apontam as passagens precisas dos depoimentos – limitando-se a invocar/indicar gravações em bloco parcial e sem proceder a qualquer transcrição – que fundamentam a concreta divergência a cada ponto que consideram indevidamente julgado, nem explicam em que é que os depoimentos contrariam, ou são insuficientes, à decisão factual fixada pelo Tribunal recorrido. 4.ª (…) não cumprindo com o ónus de impugnação que vem estabelecido no artigo 640.º do Código de Processo Civil. 5.ª Pelo que o recurso sobre a matéria de facto deve ser rejeitado.»

(b) Nulidades de sentença. 1 - Os recorrentes dizem que «g) (…) o decidido no ponto 7 da sentença, objeto de impugnação está em manifesta contradição com o decidido no ponto 14, por confrontado o prédio dos autores com a parede em granito da casa de habitação, não poder confinar com este nomeadamente do lado sul, tendo de necessariamente confinar de norte e poente, enfermando de nulidade – Artigo 615.º n.º 1 alínea c) do CPC.»

2 – Alegam ainda que a sentença padece de nulidade, porquanto, não obstante ter sido reconhecido o direito de propriedade dos autores a ação foi julgada totalmente improcedente, não sendo reconhecido o direito de propriedade dos autores, nem os réus condenados a respeitarem tal direito conforme peticionado nas alíneas a) e c) do pedido.

Nesta parte a decisão proferida, ao julgar totalmente improcedente a ação, encontra-se em oposição com os fundamentos, enfermando de nulidade, que argui – Artigo 615.º, n.º 1 alínea e) do CPC.»

(c) Impugnação da matéria de facto. 1 – Os recorrentes pretendem que o ponto 7 da matéria de facto considerada provada seja alterado passando a constar «… confina de sul, norte e poente com o prédio dos réus…» no local onde consta «… confina de sul, com o prédio dos réus…», mantendo-se o demais decidido em tal ponto.

2 – Pretendem também que seja declarada provada a matéria declarada não provada constante das alíneas A), B), E), J) e K).

(d) Acréscimo de mais um facto. «h) A ausência de assinatura dos réus confinantes no pedido de retificação de área apresentado na Conservatória do Registo Predial, e notificação da sua pendência para exercício do direito ao contraditório encontra-se provada documentalmente através documento de fls. 63 a 79 e 93 a 95 dos autos, devendo considerar-se provado, por relevante para a decisão a proferir, o seguinte facto:

- As plantas anexas ao pedido de retificação de área apresentadas pelos réus na Conservatória do Registo Predial para retificação da área do prédio dos réus não contêm assinaturas dos confinantes autores, nem estes foram notificados no processo de retificação para exercerem direito ao contraditório nem deduzir oposição.»

(e) Aplicação do direito. 1 – Os autores alegam que resulta dos factos provados que são proprietários do prédio identificado nos artigos 1.º, 2.º, 15.º e 16.º da petição inicial, com configuração, composição e confinantes do mesmo conforme peticionaram nas alíneas a), b), c), d) e g) do pedido.

Atento o pedido formulado nos autos a presente ação é de reivindicação, tendo os autores direito a que seja reconhecido o seu direito de propriedade, restituição do que lhe pertence, e condenação dos réus a reconhecerem e respeitarem tal direito. – Violando a decisão proferida os artigos 1305.º e 1311.º CC.

2 – Além disso, considerando os factos provados por acordo, resultantes do teor da contestação de HH, tem de se considerar assente que os Autores são, no mínimo, proprietários da parte do logradouro definido por uma linha imaginária que tem o início numa cruz talhada na pedra da varanda das casas e que em linha reta no sentido noroeste/nordeste vai deste ponto até atingir o local onde, na versão dos réus, se encontrava implantado um marco junto a uma cerejeira.

Quanto a esta parte do logradouro o pedido tem de ser julgado procedente.

3 – Com a procedência da impugnação da matéria de facto, deve ser reconhecido aos Autores o direito de propriedade sobre a totalidade do logradouro, com a configuração, localização e confinantes indicados na petição   inicial, julgando-se procedentes os pedidos formulados nas alíneas a), b), c) e d) da petição inicial.

4 – Da procedência da alteração da decisão proferida quanto à matéria de facto, decorre que a escadaria foi colocada em dezembro de 2019 (ponto 22 matéria de facto provada) em terreno propriedade dos autores, violando o seu direito de propriedade (artigo 1305 CC), o que terá como consequência a procedência de tal pedido, devendo ser ordenada a demolição e retirada da escadaria em ferro, formulada na alínea f) do pedido.

5 – Além disso, os Autores alegam que «…considerando o tribunal que não consegue apurar se o terreno é propriedade de autores e réus, resulta ser o terreno propriedade de ambos, pelo que, os réus implantaram a escadaria em ferro em terreno que não é sua exclusiva propriedade, devendo ser ordenada a sua demolição e retirada, por violar o direito de propriedade dos autores.

III. Fundamentação

(a) Rejeição do recurso

É certo que os Recorrentes não contruíram uma argumentação através da qual se possa concluir, como num silogismo, que resultam provados os factos que impugnam; nem transcreveram os trechos das gravações dos depoimentos que sustentariam tal argumentação.

Os recorrentes servem-se das considerações feitas na sentença acerca daquilo que cada testemunha referiu, indicando o nome das testemunhas e certo lapso de tempo da gravação que serão favoráveis à sua tese.

Porém, percebe-se quais são os factos impugnados e que as testemunhas   indicadas terão ao «minuto...» dito algo no sentido de confirmarem a ocorrência de tais factos.

Afigura-se que foram cumpridos os requisitos mínimos da impugnação, não sendo uma situação clara de rejeição do recurso, razão pela qual se analisará a impugnação.

 (b) Nulidades de sentença

1 - Os recorrentes dizem que «g) (…) o decidido no ponto 7 da sentença, objeto de impugnação está em manifesta contradição com o decidido no ponto 14, por confrontado o prédio dos autores com a parede em granito da casa de habitação, não poder confinar com este nomeadamente do lado sul, tendo de necessariamente confinar de norte e poente, enfermando de nulidade – Artigo 615.º n.º 1 alínea c) do CPC.»

No facto provado 7 refere-se que o prédio dos Autores confronta a sul com o prédio dos Réus e no facto 14 diz-se que o prédio dos Autores confina de norte e poente com os Réus.

Não se afigura que haja contradição, desde que se estabeleçam os pontos cardeais a partir do prédios dos Autores no facto 7 e no facto 14 a partir do prédio dos Réus.

Se se considerar o prédio dos Autores, o prédio dos Réus fica a sul; se se considerar o prédio dos Réus o prédio dos Autores fica a norte/poente ( do prédio dos Réus).

2 – A sentença padecerá de nulidade porquanto não obstante ter sido reconhecido o direito de propriedade dos autores a ação foi julgada totalmente improcedente, não sendo reconhecido o direito de propriedade dos autores, nem os réus condenados a respeitarem tal direito conforme peticionado nas alíneas a) e c) do pedido.

Nesta parte a decisão proferida, ao julgar totalmente improcedente a ação, encontra-se em oposição com os fundamentos, enfermando de nulidade, que argui – Artigo 615.º, n.º 1 alínea e) do CPC.»

Não se verifica esta nulidade.

A nulidade de sentença nesta hipótese consiste num erro lógico patenteado pelo raciocínio exposto na sentença, ou seja, há nulidade de sentença quando o dispositivo da sentença está em contradição com as premissas antes adotadas pelo juiz (não com as premissas que ele deveria ter adotado).

Por conseguinte, deteta-se esta nulidade quando o juiz conduz a argumentação que consta da fundamentação jurídica da sentença num certo sentido e, depois, no dispositivo da sentença, tira uma conclusão inesperada, isto é, contraditória com a argumentação anterior.

É nisto que consiste a contradição apontada na referida norma.

Ora, tal contradição não ocorre no caso dos autos.

Com efeito, se um leitor hipotético fizer o exercício de ocultar o dispositivo da presente sentença e ler de seguida apenas a respetiva fundamentação, se esse leitor tivesse que escrever a decisão concluiria no mesmo sentido que consta do dispositivo da sentença sob recurso, isto é, concluiria do mesmo modo que consta do dispositivo da sentença.

Poderá existir, sim, erro na aplicação do direito aos factos, mas não a mencionada nulidade.

Improcede, por conseguinte, a invocada nulidade de sentença.

 (c) Impugnação da matéria de facto

1 – Antes de iniciar a apreciação cumpre deixar indicadas, sucintamente, as ideias gerais que nortearão a decisão que será tomada nesta sede.

Temos nos autos duas hipóteses factuais que se excluem uma à outra, ou seja, ou o «pátio» foi vendido em 1974 aos Autores ou foi vendido aos Réus.

Só uma destas hipótese pôde ter existido, pois a realidade é só uma em cada momento histórico e não há indícios de uma terceira hipótese.

Uma regra a ter em consideração é esta: todo o facto que existiu ocorreu num contexto factual mais vasto; existiu num fundo factual composto por toda a realidade existente nesse momento histórico, refletindo-se nela ou recebendo reflexos dela.

Por isso, todo o facto que efetivamente existiu teve a sua génese noutros factos anteriores e produziu, em regra, outros factos que são seus resultados ou consequências e todos estes factos se inserem necessariamente num modelo explicativo (dada a natureza nomológica da realidade), que permite afirmar que o facto existiu «porque …», sendo relevante para a formação da convicção mostrar quer os seus antecedentes factuais diretos ou laterias, quer os efeitos ou consequências que produziu.

Logicamente, o facto afirmado que não existiu não é explicável, ou seja, o que não existiu não se inseriu num processo factual com antecedentes e consequentes, pelo que não se consegue explicar algo que não ocorreu, salvo ficcionando uma realidade inexistente, ainda que seja mesclada com factos reais.

Dada a estrutura nomológica da realidade, a hipótese factual que corresponde à realidade histórica apresenta caraterísticas ou sintomas de verdade que denotam a sua correspondência com a realidade, como a circunstância dessa hipótese factual ser apoiada por meios de prova diversificados, não ser refutável por provas cuja veracidade esteja estabelecida, a sua simplicidade aferida pelas regras da experiência, isto é, de acordo com aquilo que habitualmente ocorre na natureza ou é habitual verificar nas ações humanas, a circunstância das provas se inserirem num todo coerente, a própria probabilidade do facto ter ocorrido, tendo em conta o conjunto dos factos consensualmente admitidos entre as partes e as regras da experiência convocáveis pela natureza dos factos.

Em termos de raciocínio prático, o juiz olhando ao mesmo tempo para a totalidade dos factos sob prova e para as provas, alinhando os dados probatórios que corroboram cada uma das hipóteses e verificará que provas corroboram ou refutam cada uma das versões, sendo certo que a versão que corresponde à realidade histórica apresentará os aludidos sintomas de verdade que conduzem à convicção da sua existência como factualidade real [Sobre esta problemática, de modo mais detalhado, da autoria do ora relator, Prova e Formação da Convicção do Juiz, 2.ª edição (2.ª reimpressão), Almedina, 2018, págs. 333-349].

No caso em apreço, não podendo ambas as hipóteses ser verdadeiras, cumpre optar pela mais provável face aos factos conhecidos e esta hipótese é a que obtiver mais comprovações e mais diversificadas.

Vejamos então.

2 - Tendo isto presente e sabendo-se que os prédios de Autores e Réus foram comprados ao mesmo dono e no mesmo dia, em 30 de setembro de 1974 – cfr. ambas as escrituras juntas aos autos, a dos Réus com a petição e a dos Autores junta pelos Réus em 4 de abril de 2022.

Na escritura relativa ao prédio dos Autores vê-se o número 86, correspondente à folha do livro onde foi exarada a escritura, e na escritura do prédio dos Réus o número 87, o que significa que ambas as escrituras foram celebradas uma a seguir à outra, primeiro a do prédio dos Autores e depois a outra.

Na falta de indicação em contrário, temos de considera, por ser o habitual e não existir nos autos algo em contrário, que quer os pais dos Autores, quer os pais dos Réus ficaram a saber, quando celebraram a escritura, que prédio compraram e que área descoberta compraram.

Nesse tempo, e hoje continua a ser assim, as pessoas não desprezavam os bens que compravam e não lhes era indiferente saber ou ignorar os limites daquilo que acabavam de comprar.

Quer isto dizer que neste caso concreto, em 1974, morando ambos os compradores nas casas que compraram, sendo vizinhos, tendo comprado à mesma pessoa e no mesmo dia, cada um dos compradores ficou a saber o que comprou e a vendedora não vendeu a mesma coisa, entenda-se o mesmo «pátio» aqui objeto de litígio, quer aos antecessores dos Autores, quer aos antecessores dos Réus.

É de excluir esta hipótese, a de ter sido vendido o mesmo pátio a ambos.

E se tivesse sido vendido parte do pátio a cada um dos compradores estes teriam feito a respetiva delimitação e isso não ocorreu.

Portanto o pátio foi vendido «inteiro» a uma das partes.

Na tese dos Réus tal delimitação foi feita: pela linha reta imaginária, tirada da dita cruz na pedra da varanda até ao marco implantado mais para nascente, junto à cerejeira que aparece nas fotografias.

Mas contra esta hipótese (cruz/marco) levanta-se o facto do artigo matricial vendido aos antecessores dos Réus (artigo ...96 da freguesia ...) ser composto apenas por 70 m2 de superfície descoberta.

Ao invés, constava do artigo matricial ...95 (freguesia ...), comprado pelos antecessores dos Autores, que a área de «L», ou seja, do logradoiro, era de 150 m2, área que ultrapassava, de modo relevante, ostensivo, a área compreendida e delimitada pela tal linha imaginária (cruz/marco), que será, mais metro, menos metro, de uns 85 m2.

Por conseguinte, não se afigura plausível que sendo o artigo matricial ...96 constituído por uma superfície descoberta de 70 m2 tivesse na realidade 330,13 m2, que é a área descoberta que os Réus dizem corresponder ao seu prédio (cfr. planta topográfica de fls.  484).

E, ao invés, que o prédio do artigo ...95 (dos Autores) tivesse uma área descoberta de 150 m2 e na realidade apenas tivesse cerca de metade desta área, os tais 85 m2, que é a área compreendida dentro da tal linha reta imaginária (cruz/marco).

Trata-se de um erro demasiado ostensivo, visível, para ser cometido por todos, pelos compradores e pelos vendedores.

Deste modo, aquilo que se apresenta como mais credível é que, em 1974, cada um dos prédios comprados e vendidos foi comprado e vendido com a área que constava dos artigos matriciais, sem prejuízo de oscilação para mais ou para menos metros quadrados, dada a irregularidade dos polígonos prediais.

E é menos credível que o prédio com a área matricial mais pequena, o dos Réus, tivesse afinal, na realidade, uma área muito maior, ao mesmo tempo que o prédio dos Autores que tinha uma área descoberta mais de duas vezes superior ao outro, ao dos Réus, afinal tivesse na realidade apenas metade da área referida na matriz.

A área descoberta comprada pelos Autores foi de 150 m2 e essa área vai, mais ou menos, até onde os Réus colocaram o portão em rede que se vê na fotografia n.º 15, junta com a petição inicial.

Dir-se-á que a área que consta da matriz pode não corresponder à realidade e esta afirmação é em regra verdadeira, pois os prédios normalmente formam polígonos com vários lados, irregulares, pelo que as áreas são calculadas com pouco rigor, mas os erros não são «garrafais», isto é, da ordem dos 50% ou 75%, mas apenas de 10% ou 20%.

Por isso, se os Autores compraram o prédio ao mesmo dono que depois vendeu no mesmo dia o prédio contíguo aos Réus, é de supor que ao vender aos Autores 150 m2 de logradouro, lhes vendeu de facto essa área, sem prejuízo de haver erro e de lhe ter vendido mais (170/180 m2) ou menos (140/130m2).

Se os vendedores e os Autores colocaram na escritura 150 m2 é de supor, na falta de indicações em contrário, que o fizeram para representar algo de real e não algo de falso.

Até porque eles estavam a vender um prédio que confinava com outro prédio que lhes pertencia e que iam vender de seguida e sabiam que deviam ficar bem definidas as estremas entre ambos.

Por isso, numa primeira consideração, face à área que consta da matriz do artigo ...95, o prédio dos Autores ultrapassava, para sul (consideram-se os pontos cardeais que constam da planta topográfica junta pelo perito), a tal linha reta tirada da tal «cruz» ao «marco», mas não chegava à entrada feita em pedra que se vê na fotografia de fls. 469 (Foto 3).

Sendo assim, sai enfraquecida a hipótese factual sustentada pelos Réus.

Pelas áreas que constam das plantas juntas pelo Sr. perito, a área total reivindicada pelos Autores dá 216,25 m2, o que excede, em 66,25 m2 os referidos 150 m2.

Esta última área vai, como se disse, vai mais ou menos até ao portão feito em gradeamento que se vê na fotografia de fls. 469 (Foto 4).

Por outro lado, como se vem dizendo, o prédio que os Réus compraram ao mesmo vendedor, na mesma data, foi vendido como tendo um logradouro de 70 m2.

É a área descoberta que consta da matriz predial ...96 que se encontra a fls. 67, onde se refere que o prédio dos Réus confronta de Poente com caminho e dos restantes lados com AAA.

A confrontação nascente com AAA apoia a tese de que o pátio pertence ao artigo ...95 vendido aos Autores, pois na matriz do artigo ...95 – fls. 248 –, como já se referiu, este prédio pertencia ao mencionado  AAA (7/32) e à vendedora  VV (25/32), o qual  confrontava de poente com YY, sendo este Sr. YY o pai da vendedora VV [ A testemunha BBB  –  minuto 09:27 – referindo-se à vendedora disse que era a filha do Sr. YY; a testemunha SS disse o mesmo – minuto 23:55 –, que a Sra. VV era herdeira do Sr. YY e que – minuto 25:08 – aqueles prédios eram deste Sr. YY, tanto uma casa como a outra foram compradas a YY.]

Se os Réus compraram um prédio com 70 m2 de logradouro, poderão ter comprado um logradouro maior ou menor, mas não superior a 80/90 m2 ou inferior a 50/60 m2.

É de presumir, porque é o que costuma acontecer, que o mesmo dono não tenha vendido mais tarde aos Réus o mesmo logradouro ou parte dele, que tinha acabado de vender aos Autores.

Verifica-se que na parte poente do prédio dos Réus estes têm um logradouro que vai até à estrada, o qual, só por si, preenche e ultrapassa os 70 m2, o que implica que os Réus não possam ter qualquer área de logradouro nas traseiras da sua casa, para nascente, para onde teriam, contudo, de poder transitar, como os Autores admitem, para aceder à cave (loja e adega) da casa. 

Por conseguinte, nesta primeira análise histórica, baseada nas informações constantes das escrituras, matrizes e do registo predial, a tese dos Autores obtém corroboração parcial (até ao local onde foi colocado o portão do gradeamento) e a tese dos Réus não obtém qualquer corroboração, sendo, sim, excluída.


*

Além disso, há ainda outro fator a considera que é este: agravamento da situação de encravamento do prédio dos Autores.

Não se vê qualquer razão para agravar o encravamento do prédio urbano vendido aos Autores, quando é certo que o mesmo prédio estava rodeado de prédios da mesma família.

Como se vê da matriz predial do artigo ...95 – fls. 248 –, este prédio pertencia a AAA (7/32) e a VV (25/32) e confrontava do nascente, norte, sul e poente com YY (pai da vendedora VV).

Por isso, não é verosímil que os vendedores tivessem vendido aos Autores um prédio e agravassem a situação de encravamento, pela simples razão de que lhes podiam vender um prédio cujo logradouro podia chegar ao caminho que existia (e existe) a sul.

Em regra, ninguém compra um prédio encravado se o puder comprar desencravado e ninguém vende um prédio agravando a situação de encravamento se o puder evitar, pois este agravamento torna o prédio menos valioso.

Ora, se o pátio fizesse parte do prédio vendido aos Réus a situação de encravamento do prédio vendido aos Autores era agravada.

Se, por hipótese, o pátio pertencesse originalmente ao prédio vendido aos Réus, os vendedores podiam aliviar a situação de encravamento relativa ao prédio vendido aos Autores, dividindo o pátio ao meio no sentido norte/sul, ficando a parte poente para o prédio dos Réus, para poderem passar e entrar nas portas da loja e da adega e a parte nascente para os Autores, para poderem passar para a sua casa de habitação, a partir do caminho existente a sul.

Se o prédio dos Autores tivesse sido vendido com a confrontação indicada pelos Réus, então esse prédio ficaria numa situação de forte encravamento, hipótese que se afigura, pelo exposto, inverosímil.


*

Outro fator a considera: o preço de ambos os prédios.

Em 1974, os Réus compraram por 22.000$00 e os Autores por 20.000$00.

O prédio dos Réus tem uma área coberta de 132,15 m2 [mais um coberto com 20,10 m2 construído pela Ré HH, segundo o referido pela Autora AA – minuto 13:37. A ré HH referiu – minuto 06: 57 – que depois de comprarem a casa foram mantendo a casa como ela estava].

A área coberta do prédio dos Autores é de 68,90 m2 (ver plantas de fls. 483 e 484), ou seja, a área coberta dos Réus, a parte habitacional, é o dobro da dos Autores.

Esta proximidade de preços só se explica se ambos os prédios se equivalessem em valor comercial.

Mas para os prédios se equivalerem em termos de valor de mercado, tal implica que o prédio dos Autores só alcance tal paridade tendo um logradouro maior que aquele que os Réus lhes reconhecem, que é de aproximadamente 85 m2 (todo o coberto com a chapa metálica da planta de fls. 483 (62,15 m2), mais um triângulo de terreno com uns 13 m2, a norte/poete da casa dos Autores, mais uns 10 m2 de terreno que fica entre a área coberta e a linha imaginária entre a cruz e o marco).

E isto, mesmo que se coloque a hipótese de a vendedora D. VV ter feito um preço mais favorável ao Sr. XX, pelo facto dele ter sido feitor dela.

Porém, não há qualquer indício de que tenha existido este favorecimento.

Por conseguinte, à proximidade dos preços de venda de ambos os prédios, tinha de ter correspondido também uma proximidade quanto ao valor de mercado de ambos os prédios.

Essa aproximação de valor só é possível se se considerar que o tal «pátio» a nascente da casa dos Réus foi vendido aos Autores.

E mesmo assim tal paridade valorativa não é certa, se se considerar, como na tese dos Autores, que parte desse «pátio» ficou a servir de passagem aos vizinhos (Réus) para os «baixos» da sua habitação, uma loja de animais e uma adega.

Por conseguinte, considerando esta situação existente ao tempo dos negócios, em 1974, dir-se-ia, sem hesitação, que o pátio a nascente, integrou o prédio vendido aos pais dos Autores, sob pena de não se compreender a proximidade dos preços de compra e venda de ambos os prédios vendidos pelos mesmos vendedores e no mesmo dia a compradores vizinhos.


*

Outro fator a considera: As confrontações que constam das escrituras celebradas no mesmo dia, no mesmo cartório, uma a seguir à outra.

(I) Prédio vendido aos antecessores dos Autores:

Nascente – XX

Norte – VV

Poente – comprador

Sul – XX

(II) Prédio vendido aos antecessores dos Réus:

Nascente – VV

Norte – WW

VV

Poente – CCC

Sul – Estrada.

Como se vê, consta da escritura de compra e venda celebrada pelos antecessores dos Réus que o prédio comprado por estes confrontava do sul com «estrada».

Como a única estrada que ali passa se situa a poente, considerando os pontos cardeais indicados nas plantas topográficas juntas pelo Sr. perito, temos de considerar que aquela estrada a sul é a mesma estrada, que na realidade passa a poente.

Então, se se considerar que os pontos cardeais indicados pelo Sr. perito são os corretos, o sul da escritura é o poente real; o poente da escritura é o norte real, o norte da escritura é o nascente real e o nascente da escritura é o sul real.

A confrontação real da escritura é então esta:

Nascente – WW

Norte – CCC

Poente – Estrada

Sul – VV

Ora, a nascente (WW, pai dos Autores) fica o pátio aqui em questão, ou seja, o prédio vendido aos Réus confrontava com o dito pátio.

Fazendo a mesma rotação relativamente às confrontações indicadas na escritura quanto ao prédio dos Autores, temos:

Nascente – VV

Norte – comprador

Poente – XX

Sul – XX

 Estas confrontações estão de acordo com a tese dos Autores, pois o pátio confronta a poente com XX e a casa dos Autores confronta a sul com a casa (artigo ...96) do mesmo XX.

Concluindo, as confrontações reais constantes das escrituras corroboram a tese dos Autores.


*

Ainda outro fator a considera: Ausência de vedação do pátio.

Esta ausência de vedação pode ser explicada se se considerar que não existia necessidade de fazer qualquer vedação, pela circunstância do pátio a nascente, na altura das compras e vendas, fazer parte apenas de um dos prédios, no caso, do prédio dos Autores, como se vem dizendo.

Os Réus dizem que existia uma divisão, a tal linha reta imaginária.

Mas, como se disse, esta hipótese é inverosímil pelas razões que vêm sendo expostas, sendo certo que a vendedora não tinha necessidade de vender um prédio agravando o seu encravamento, nem era do interesse do comprador adquirir um prédio fortemente encravado, podendo ser vendido e adquirido a confrontar com o caminho situado a sul.


*

Chegados a este ponto, cumpre referir que estamos perante duas hipóteses factuais que se excluem mutuamente, o que implica, logicamente, optar por uma delas, porque não podem ter coexistido ambas no passado e ao longo dos anos até ao presente.

Nestas condições, a convicção do julgador tem de se formar de acordo com uma delas.

Não pode ser de outro modo, salvo se os elementos probatórios a favor de cada uma das hipóteses fossem sensivelmente iguais, mas no caso não são.

Por conseguinte, a convicção do julgador formar-se-á de acordo com a hipótese factual que apresentar mais indícios, mais variados e que permita ter uma compreensão global e coerente de todos os factos.

Até ao momento, os indícios referidos estão todos do lado da tese dos Autores, faltando verificar se os depoimentos se harmonizam ou contradizem estes indícios.

Logicamente, se alguns dos depoimentos se harmonizarem com os indícios antes mencionados, a convicção do juiz tenderá a considerar que são estes os depoimentos que correspondem à realidade histórica, pois têm apoio nesses indícios, e não de acordo com os outros depoimentos, porquanto estes outros não gozam de quaisquer apoios, pois não podendo ser todos verdadeiros ao mesmo tempo, por se excluírem mutuamente, uns têm de ser preteridos e outros acolhidos.

3 - Vejamos agora o que as provas testemunhais ou outras aportam a favor ou contra cada uma destas hipóteses.

[A indicação que a seguir se faz dos minutos nem sempre é rigorosa, podendo existir uma diferença de cinco ou dez segundos; outras vezes indica-se apenas o inicio temporal daquilo que foi dito um pouco mais adiante]

1 – Depoimento de parte da autora AA.

Referiu, sinteticamente, que – minuto 28:37 – nasceu na casa dos Autores referidas nos autos e que – minuto 12:21 – as escrituras dos prédios foram feitas no mesmo dia, em 1974, comprados a VV e no dia da  escritura – minuto 14:20 – os vendedores e compradores deslocaram-se aos prédios para definir o que tinha sido vendido – tendo a depoente dito, examinado as fotografias de fls. 18 e 19, que – minuto 14:34 – no dia da escritura vieram lá eu estava ao cimo das escadas.

A varanda não tinha divisão, regulávamo-nos por um pau. Disse – minuto 17:24 – que foi feita uma cruz no granito da parede adjacente à varanda destinada a dividir a varanda.

Varanda que mais tarde foi dividida através da colocação de uma parede de blocos.

Que nesse dia – minuto 26:02 – a vendedora disse, quando o Sr. CC fez a cruz, pronto agora o Sr. DDD põe ali uma parede de blocos para dividir a varanda; o Sr. DDD tem aqui o pátio para virar o seus boizinhos aqui, lá em cima para o lameiro, o pátio é seu.»

Quanto aos atos de posse disse, referindo-se ao «pátio», que – minuto 05:34 – aquele terreno esteve a vida inteira na nossa posse; que o pai da depoente tinha uma junta de bois; no rés do chão havia lojas; tinha os bois, carro de bois, trator – minuto 32:45 – toda a gente via e sabia,

Que – minuto 07:09 – no tempo próprio punham nesse terreno o feijão em toldos da azeitona, debulhávamos o feijão e ficava aí a secar – minuto 25:27 – e – minuto 01:19:05 – que os pais da depoente deitavam (sic) os porcos no pátio.

Relativamente ao uso dos Réus disse – minuto 26:47 –  que os Réus utilizavam o pátio a pé para irem para a adega; que carregavam o vinho a pé. Que os pais da depoente e os pais dos Réus eram compadres e davam-se todos bem; mas quando colocavam as dornas do vinho fora da adega pediam autorização.

Que os Réus nunca passaram no terreno com trator – minuto 32:45 – e que -  minuto 51:10 – o logradouro dos Réus foi sempre à frente da casa deles; o pai (referiu-se ao Sr. XX) até cortava ali a lenha e levava-a com um carrinho para trás, para a primeira porta, que – minuto 51:57– a parte de trás nunca a utilizaram porque aquilo era utilizado pelo meu pai e por nós.

Relativamente ao apontado marco que estava junto da cerejeira disse – minuto 56:04 –  que não foi colocado qualquer marco junto à cerejeira, não foi falado na altura nesse marco, não havia ali marco nenhum, existiam apenas pedras do muro.

Testemunha RR (perito avaliador das finanças). Pronunciou-se apenas acerca daquilo que viu quando examinou o local em serviço, devido à reclamação que tinha sido apresentada no serviço de Finanças: fui lá com o chefe de finanças ver o que se passava porque houve uma reclamação (minuto 01:26); foi para ver o que lá estava e o que estavam a pedir. Queriam criar mais área que a existente e ambos indicavam a mesma área – minuto 02:41. A participação da alteração de área sobrepunha-se sobre outro artigo – minuto 07:54. Havia lá umas pedras no chão, mas não me pareceram ser um marco – minuto 03.14/03:54

Testemunha SS. Referiu que o marido da AA era seu compadre (o WW), morreu há uns 30 anos, depois dele morrer foi poucas vezes à casa – minuto 01:00 a 02:05. Disse mesmo que já há mais de 20 anos que não ia lá à casa – minuto 21:57.

Disse que – minuto 23:55 – a D. ZZ,  mãe da D. HH, e o XX era o marido da Sr. ZZ; que a Sra. VV era talvez a dona da casa onde está agora …, era uma senhora que era herdeira do Sr. YY e que – minuto 25:08 – aqueles prédios eram deste Sr. YY, tanto uma casa como a outra foram compradas a YY; o XX era feitor desse tal YY – minuto 25:33 – e comprou-lhe a casa hoje dos Réus, também tomava conta da casa que é hoje dos Autores, por ser o feitor.

Que – minuto 34: 35 – o WW morreu primeiro que o XX (o feitor), que ambos começaram por se relacionar bem e depois mal – minuto 36:45.

Identificou o local aqui em disputa como sendo «um pátio» e que nesse pátio o seu compadre e a mulher punham lá o carro de bois, a charrua, os haveres deles que pertenciam à agricultura, os bois e mato para deitar os bois – minuto 03:24/52.

Que – minuto 15:56 – deixaram de ter a junta de bois e mais tarde tiveram uma «burreca».

Referiu ainda – minuto 06:48 – que o seu compadre às vezes «cascava» lá o milho (entenda-se no pátio); que o seu compadre punha lá (no pátio) a grade, estrume – minuto 28:00.

Que os antecessores dos Réus não ocupavam o pátio todo com aqueles haveres (minuto 04:06 – «o pátio todo não ocuparia», mas ocupava a maior parte). No resto do pátio a testemunha disse que nunca lá viu nada – minuto 04:20.

Também referiu que o Sr. XX, dono da casa dos Réus, via os vizinhos ocupar o pátio, como referido, e nunca disseram nada (Ele via-nos lá – minuto 06:05 – nunca lhe ouvi dizer nada ao XX – minuto 06:29).

Também referiu que os antecessores dos Réus tinham um alpendre à frente da casa – minuto 07:26.

Disse (minuto 08:32) que nunca viu o XX ocupar o pátio, muito embora este tivesse direito a passar por lá para entrar para a cave da casa dele, pois tem duas portas a abrir para o pátio, mas nunca o viu lá passar.

Identificou a área descoberta do prédio dos Réus como o espaço livre adjacente á estrada que passa ali do lado poente da casa (minuto 10:21: a outra casa tem um releixo para o lado da estrada; minuto 21:07: os Réus têm um logradouro em frente à estrada).

Não soube dizer se o XX tinha algum terreno nesse pátio após a parede da casa dele («não digo que não, não sei») – minuto 14:26/36.

Mas, mais tarde, já referiu – minuto14:34 – que o pátio dos réus (do «EEE», como lhe chamou) chegava à casa do vizinho, que este só tinha ali passagem.

Quanto a «marcos, disse que nunca vi marcos a dividir o pátio – minuto 16:03.

Que depois de ter falecido o seu compadre, a viúva continuou a ter os haveres dela no pátio – minuto 17:58 –, mas hoje não sabe quem ocupa a parte de trás (o pátio) – minuto 26:57.

Que – minuto 18:30 -  foi lá colocada uma escadaria de ferro, nunca lá tinha existido e que os problemas só começaram – minuto 22:19 – depois de colocada a escada de ferro.

Testemunha FFF, 63 anos, primo da Sra. AA, pelo lado do pai da testemunha, esposa do EEE».

Referiu que – minuto 03:20 – conhece a casa desde pequeno onde ia com regularidade – minuto 04:00; que – minuto 11:10/40 – a sua prima e marido DDD tinham vacas e bois e colocavam-nos no pátio, em todo ele, ocupavam o pátio todo e nós trabalhávamos ali, tinham lá o carro de bois, tudo, e há poucos anos trás esteve lá um trator a levar milho; que – minuto 12:11 – Eles passavam ao lado da casa deles para a adega; que – minuto 12:49 –  a partir do portal grande, a partir daí era o pátio dos «GGG», dos pais dos Autores, que – minuto 13.55 – os pais dos Réus só passavam, nunca os vi por nada no pátio, iam á adega ele e a mulher – minuto 23:55 – passavam rente à casa ocupavam um metro mais ou menos.

Disse que – minuto – 14:35 – o pátio chegava à parede da casa do vizinho; que – minuto 17:26 – o pátio só era ocupado pela minha prima e marido e depois pelos filhos; minuto 20:35 – aquele pátio foi sempre o pátio dos «GGG» e que –  minuto 18:25 – da parte dos Réus só vi ocupar o pátio com uma escada, posta – minuto 18:55 – há poucos anos, talvez 5 anos, não chega a 10– minuto 19:20.

Que – minuto 21:08 – a D. HH tem um logradouro em frente à casa dela com uns 70 m2, entre a estrada e a casa – minuto 21:35.

Que – minuto 21:55 – no tempo do Sr. XX nunca houve discussões acerca do pátio; que – minuto 22:15 – os problemas só surgiram depois de colocada a escada.

Relativamente à fotografia fls. 451 – minuto 36:20– disse que o galinheiro não estava lá tanto quanto era da sua lembrança e que a caixa do correio no pilar agora já lá não está.

Quanto ao documento 4 de fls. 450 – minuto 40: 57 – disse que não se lembrava de ver as telhas e a pedra (marco), havia lá uma cerejeira e um muro. Não se lembra de ver lá a pedra ao alto.

Que – minuto 42:08 – havia ali junto ao pilar de fls. 451 uma videira que já secou há muito tempo; minuto 43:11 – não havia qualquer parreira junto à casa dos Réus; que – minuto 44:36 – aquele pátio não tinha divisões, era fechado pela porta de entrada e cancela que dava para os lameiros (a nascente) e que – minuto 49:27 – os conflitos começaram desde que morreu a minha prima AA.

Testemunha OO (63 anos) referiu que quando era nova costumava ir aquela casa (dos Autores) – minuto 01:38 – e conhecia também a casa ao lado da D. HH, conheceu os pais dela - minuto 05:10.

Referiu - minuto 07:28 – que os pais dos Autores colocavam o carro dos bois no pátio e as ferramentas de trabalho e até malhavam lá o milho e que nunca viu mais ninguém - minuto 08:35 -  ocupar o pátio; que – minuto 11:25 –  os Autores tiveram vacas e mais tarde tiveram um burro. Que – minuto 29:05 o seu pai andou nesse pátio a serrar madeira e que – minuto 28: 03 – já tem deixado o seu cão, quando passa dias fora de cassa, com a ré EE e fica nesse pátio.

Que – minuto 09:310 – a D. ZZ e marido tinham uma adega nos baixos da casa e passavam no pátio a pé para ir para a adega – minuto 10:03 –   encostados á casa deles; que - minuto 10:55 - nunca lá puseram nada, só a AA e o marido; que os pais dos Réus – minuto 11:12 – não tinham animais nesses baixos da casa.

Que nunca viu – minuto 16.14 – qualquer marco junto da cerejeira; que o pátio da D. ZZ – minuto 17:17 – fica à frente da casa, até á estrada.

Que a escada em ferro – minuto 21:18 –  foi posta há pouco tempo.

Depoimento da ré HH (67 anos, tinha 19 anos quando os prédios foram comprados).

Referiu que – minuto 6:45 – o pátio era da sua família e que os Autores apenas tinham acesso através dele para irem para a sua casa.

Que o limite entre ambos os prédios é dado –  minuto 09:18 – pela cruz talhada na varanda e a linha reta até ao marco existente junto de uma cerejeira que já é dos Autores; que – minuto 11:04 –  junto ao marco havia um lancil de pedras, deitadas e enterradas em direção à cruz na varanda.

Que – minuto 21:47 – a escada de ferro deve ter uns 20 anos e que serve de acesso para apanhar a lenha e ir à adega, para o serviço menos limpo.

Que – minuto 22:40 – tiveram bois na porta que não serve de adega, depois de terem comprado a casa – minuto 43:50, mas não soube dizer quando deixaram de ter bois, pois esteve ausente, tendo regressado do Brasil em pelo ano de 1983 e nessa altura o seu pai já não tinha bois.

Que -  minuto 47:00 – os pais dos Autores tinham bois e dormiam lá ao fundo passavam onde nós passávamos. Viravam os bois debaixo da parreira deles  e os seus pais tinham o dever de dar o caminho.

Que – minuto 47:54 – nós e eles passávamos e levávamos coisas de trator, lenhas; tinham uma parreira – minuto 48:13 – ao longo de toda a casa; que – minuto 48:31 – nós púnhamos lá lenha, eles não.

Testemunha SS (nascido em 1955) referiu que o réu CC é seu cunhado.

Disse que nasceu perto da casa dos Réus – minuto 05:15; que – minuto 11:04 – morou ali até aos 12/13 anos e depois passava lá ao ir para a escola. Que – minuto 01:21:07 – casou com uns 24 anos e fui viver para casa da sogra e deixou de estar ali com tanta regularidade.

Que esteve no local quando foi fazer o muro – minuto 33:28 – a pedido da D. HH, há 7/8 anos – minuto 32:37.

Que – minuto 07:24 – existia uma cruz e um marco e que quando fez o muro ligou um fio dessa cruz ao marco, porque – minuto 07:44 – o marco delimitava o terreno da D. HH com os outros herdeiros dos «GGG» (Autores); que – minuto 12:19 – havia ali uma carreira de pedras antigas e – minuto 20:39 –  existia lá um monte de telha, sendo esse marco e telhas visíveis –  minuto 20:57 – na fotografia de fls. 450; que - minuto 01:42:04 - havia lá um murete de pedra desalinhada.

Identificou o marco na fotografia de fls. 449.

Disse que não foi o próprio a construir o muro, mas sim um empregado – minuto 23:14 –  mas ia lá ao meio dia buscá-lo para comer.

Referiu que – minuto 46:56 – no seu entender o espaço por trás da casa é da D. HH, porque foi fazer o muro da cruz ao marco.

Que –  minuto 01:38:06 –  foi a D. HH quem lhe indicou o sítio para fazer o muro, e foi por lá existir a cruz e o marco.

Que – minuto 01:28:00 – os Rés descarregavam a lenha no pátio, o trat or ia embora e depois recolhiam-na na loja, mas também deixavam lenha fora.

Que – minuto 57:05 – a D. HH colocava as lenhas no pátio e cortava-as ali. Que – minuto 01:25:22 – não me lembrava dos pais da D. HH terem bois.

Quanto aos Réus disse que – minuto 01:23:00 – tinham vacas e ovelhas e guardavam-nas no barracão e que –  quando era pequeno – minuto 01:24:50 – via passar as vacas e ovelhas e passava o caro de bois não se lembrando onde o colocavam; que – minuto 01:25:22 –  nunca ouviu discussões por causa disso.

Sobre se sabia de quem era o pátio referiu que não, que não sabia de quem era o pátio – minuto 01:37:50

Testemunha HHH (manobrador de máquinas, 49 anos) referiu ser neto do S. XX e sobrinho da ré HH e que conhecia a casa que foi dos seus avós.

Que – minuto 02:02 – os seus avós na parte de trás da casa tinham lá lenha e a testemunha ia lá rachar lenha e tinham lá uma parreira que também era deles.

Disse que – 03:06 –  andei lá a fazer o muro em pedra a pedido da tia HH, mas através do patrão da testemunha.

Que para o efeito – minuto 06:50 – esticaram um fio da cruz na parede da casa ao marco consoante a sua tia lhes disse e viu que existiam lá esses sinais – minuto 07:05.

Que –  minuto 07:26 –  o Sr. CC (Autor) também esteve lá. Para ele confirmar os marcos – minuto 08.10 – e que ele disse que estava bem «podia começar» – minuto 08:39.

Que – minuto 23:20–  os seus avós usavam a parte de trás para colocar lenha que depois arrumavam; ficava fora alguns dias, coberta com um plástico e iam arrumando, mas deixavam um espaço para os Autores passarem.

Que não se lembrava de ver lá alguma parreira – minuto 34:32.

Referi que – minuto 48:45 – ia a casa dos meus avós 2 ou 3 vezes por mês.

Que foi a sua tia HH que disse onde esticar o fio para fazer o muro – minuto

51:42 – e foi para ver isso que a testemunha foi fui chamar o Sr. CC, que morando em lisboa estava lá – minuto 52:06.

Quanto á escada de ferro disse que – 05:43 da última gravação – quando o avô da testemunha faleceu já lá estava a escadaria de ferro

Relativamente aos Autores – minuto 09:27/11:00 da última gravação – disse que eles tinham uma vaca, galinhas e ovelhas, as quais dormiam na parte debaixo nas lojas e eles moravam do outro lado que dá para a rua. Tinham uma carroça e deixavam-na na parte de trás desviado da parte dos meus avós mais ou menos ao lado do galinheiro.

Referiu – minuto 11:29 da última gravação – que o terreno era dos seus avós porque viu os marcos, nunca lhe haviam dito antes por onde eram as estremas, nem ele tinha perguntado tal coisa.

Testemunha BBB (nascido em 1935, vizinho).

Disse – minuto 11:32 – que o prédio dos Réus tem espaço do lado poente e do lado nascente, do nascente é para o lado dos seus terrenos; que – minuto 13:29 tem duas portas uma onde metiam os animais e outra da adega á frente da dos animais havia lá uma parreira

Referiu que aquilo era dos Réus porque - minuto 15:11 – tinham aquilo dividido desde uma cruz na parede até um marco e sabe disto porque – minuto 15:37 – viu lá esses sinais, mas o marco agora não está lá.

Que – minuto 16.13 –  cada um fazia os despejos dentro da sua atestada; que o XX – minuto 16:35 – tirava as dornas (da adega) e punha-as no pátio encostadas ao que era do Sr. SS.

Que os pais dos Réus – minuto 18:52 – colocavam lenhas no pátio, cortavam e arrumavam e havia a passagem para o outro pátio (dos Autores).

Referiu que sabe destas coisas porque – minuto 21:56 – sempre viveu ali, era agricultor e passava ali

Disse que os prédios já estavam divididos antes da compra – minuto 28:36 – e o marco foi feito na estrema depois que compraram em 70 e tal.

Que – minuto 29:41 – a escada está lá há uns 20 anos.

Que - minuto 43:30 – a partir do marco havia umas pedras «na direção da estrema de um e do outro, ao modo de um lancil na terra, eram grandes, compridas»

Que – minuto 53:42 – depois do XX ter falecido deixaram de ter bois, nunca mais vi, mas iam lá uns tratores – minuto 54:50 – descarregar lenha e iam embora – minuto 55:22 – rachavam e arrumavam

Que – minuto 01:07:57 – a própria senhora que vendeu fez a divisão.  Eu não estive lá, mas há testemunhas que assistiram.


*

Vejamos agora alguns factos indiciários:

1. Galinheiro dos Autores.

Como foi dito por algumas testemunhas, os Autores tinham um galinheiro localizado do lado direito da escadaria de pedra, considerando a posição de quem sobe e que se vê na fotografia de fls. 451.

Certamente os Autores libertariam as galinhas para «andarem à solta» no logradouro, mas nesse caso teriam o cuidado de vedar o que era seu e não consta que tal vedação existisse.

Além disso, seria mais adequado ter o galinheiro no logradouro, muito embora se possa responder que no local onde se vê fica mais resguardado da chuva, vento e até do frio.

Esta ausência de vedação desabona a tese dos Autores, porquanto o proprietário tende a delimitar o que é seu, para que não haja dúvidas.

Mas o mesmo argumento vale para os Réus, pois estes também não colocaram qualquer vedação no logradouro ou colocaram a qualquer «sinal» com capacidade para significar, frente aos Autores que o logradouro lhes pertencia.

Mas como já se referiu acima, se o logradouro fosse apenas de um dos proprietários não havia necessidade de vedar.

2. Caixa de correio.

Vê-se uma caixa de correio no pilar de pedra de fls. 451.

Dir-se-ia que a caixa de correio se coloca à entrada do prédio e é verdade, pelo que a caixa de correio está colocada onde se inicia, segundo os Réus, o logradouro dos Autores.

Tal colocação ocorre em muitos casos, mas esta regra não é absoluta.

A colocação da caixa de correio na entrada do logradouro carecia de um pilar onde pudesse ser fixada e no local onde foi fixada podia ser aproveitada a construção que lá existia.

Por outro lado, como disse a testemunha OO – minuto 41:54 – o habitual era o carteiro meter as cartas pelo espaço que fica entre o limite inferior da porta e a soleira (em linguagem corrente, meter a carta por debaixo da porta), pelo que, pode concluir-se que a colocação da caixa do correio onde foi colocada, só por si, não assume relevo probatório, carecendo de outros apoios.

3. Marco junto à cerejeira.

Como referiu José B. Casanova, «Para distinguir, quando fôr necessário, os marcos das outras pedras que podem encontrar-se sobre o perímetro dum campo, colocam-se, d’um lado e do outro do marco, duas metades d’uma mesma pedra. Estas são as testemunhas do marco (fig. 35) – Manual de Agrimensura, Levantamento de Planta e Nivelametos. 1.ª edição, Lisboa, Papelaria Progresso, 1930, pág. 29.

O facto das duas metades serem de uma mesma pedra servirá para, quando unidas, se poder verificar que ambas provinham de uma mesma pedra, o que revelava a intenção de fazer delas testemunhas do marco.

Na prática raramente se terá seguido esta boa técnica.

Algumas das testemunhas acima referidas, as indicadas pelos Réus, afirmaram que havia ali um marco.

Examinando as fotografias de fls. 449 e 450, parece de fato um marco, pois é uma pedra isolada cravada na terra, parecendo estar ali colocada com alguma intencionalidade.

No entanto, mesmo que se coloque a hipótese de ser um marco, tal não implica que esteja ali a delimitar os prédios aqui em questão.

Principalmente tendo em conta o que já foi dito, que apoia a tese dos Autores.

Aliás, para o marco delimitar ambos os prédios, então deveria tratar-se de um marco colocado na altura da compra e as testemunhas não referiram isso.

Por outro lado, o anterior proprietário não tinha interesse em ter ali um marco a dividir terreno que era seu, salvo se se tratasse de um marco que ali estivesse a demarcar outros terrenos.

Pode colocar-se a hipótese de ser um marco que dividiu aquele prédio de outros prédios situados para nascente, mas nenhuma testemunha disse isso.

Apenas a testemunha HHH referiu algo neste sentido quando disse - minuto 01:05:41, apreciando a fotografia doc. 12 da petição, «…eu vejo aqui uma pedra que é a tal … é uma pedra, do marco que delineia o caminho para baixo com o marco que se diz estava na cerejeira», ou seja, a testemunha deu a entender que aquele marco junto à cerejeira faria alinhamento com a pedra que se vê nessa fotografia e que separaria o logradouro do prédio adjacente, situado para nascente.

Concluindo, não é certo que se tratasse de um marco, mas sendo um marco, não há elementos que mostrem que tivesse sido colocado ali para assinalar a estrema entre o prédio comprado pelos Autores e o prédio comprado pelos Réus.

4 - Quanto a atos de posse.

As testemunhas indicadas pelos Autores referiram que tal espaço era ocupado pelos Autores e as testemunhas indicadas pelos Réus disseram que tal porção de terreno era ocupada pelos Réus, em ambos os casos com a ações acima referidas nos respetivos depoimentos.

Como resulta dos depoimentos atrás mencionados, foram praticados atos materiais sobre o terreno, quer pelos Autores, quer pelos Réus.

Afigura-se que os atos de posse mais variados foram praticados pelos Autores.

Com efeito, os Autores possuíram vacas, carro de bois, charrua, uma burra, galinhas, uma cabra, porcos, e utilizavam diariamente o logradouro, pois tinham de transitar por ele para saírem e chegarem à casa de habitação, vindos da rua.

Logicamente tinham de ter lenha para se aquecerem no inverno e o local apropriado para o depósito era o logradouro, fosse debaixo da superfície coberta para estar seca, fosse ao ar livre.

Da parte dos Réus apenas se refere que estes ocupavam o espaço do logradouro para passarem para os baixos da casa e para descarregarem lenha, a qual era depois partida e recolhida no interior da casa ou na varanda, como se vê, neste caso, pela fotografia de fls. 451, ou para cuidar da manutenção das dornas que tinham na adega.

Estes atos dos Réus são menos extensos em quantidade e variedade (passar e depositar lenhas durante alguns dias, cuidar das dornas, talvez uma vez em cada ano), sendo certo que o ato de passar é também compatível com o mero exercício de um direito de servidão de passagem.

Por conseguinte, em termos de atos possessórios temos atos praticados por ambas as partes.

A importância de uns e outros e o seu significado, se como proprietários ou titulares apenas de um direito de passagem, ou mesmo tolerância dadas as boas relações existentes entre os pais de ambas as partes, tem de ser decidido numa avaliação global integrando todos os elementos probatórios.

Além disso, a credibilidade dos testemunhos tem de ser aferida face à sua harmonização com os restantes elementos de prova e regras de experiência emergentes do contexto em que ambos os prédios foram adquiridos.

Tendo em consideração o que já foi referido, a convicção forma-se no sentido da tese factual alegada pelos Autores, ou seja, o dito pátio integrava o prédio do artigo matricial ...95, vendido em 1974 aos Autores, e os atos de posse aos quais estava e esteve subjacente um animus correspondente ao de proprietário residiu na mente dos Autores, porquanto:

 (I) O prédio que os Réus compraram ao mesmo vendedor, na mesma data, foi vendido como tendo um logradouro de 70 m2 e esta área existe a poente do seu prédio, adjacente à estrada que passa a poente. Sendo certo que aos Autores foi vendido um prédio com um logradouro de 150 m2 e esta área só existe no prédio dos Autores se o logradouro chegar junto ao caminho que passa a sul.

(II) Não se vê qualquer razão para os vendedores venderem aos Autores o prédio agravando a sua situação de encravamento, quando é certo que o mesmo prédio estava rodeado de prédios da mesma família e a sua situação de encravamento podia ser atenuada, se o logradouro confrontasse com o caminho.

(III) Considerando esta situação existente ao tempo dos negócios, em 1974, o pátio a nascente teve de integrar o prédio vendido aos pais dos Autores, sob pena de não se compreender a proximidade dos preços de compra e venda de ambos os prédios vendidos pelos mesmos vendedores, no mesmo dia, a compradores vizinhos.

(IV) As confrontações reais que constam das escrituras celebradas no mesmo dia, no mesmo cartório, uma a seguir à outra, indicam que o pátio integrava o prédio vendido aos Autores.

(V) Tendo em consideração que a prova testemunhal e por declarações das partes forma blocos com versões factuais opostas, como normalmente ocorre nestes casos, não podendo ambas ser verdadeiras, então a convicção deve formar-se no sentido de corresponderem à realidade (no seu essencial, não necessariamente nos pormenores) os depoimentos que apoiam a tese dos Autores, porquanto são os que se harmonizam com o referido em «I, II, III e IV».

5 - Pelo exposto, julgar-se-á a impugnação de acordo com esta convicção.

Assim:

(1) Os recorrentes pretendem que o ponto 7 da matéria de facto considerada provada seja alterado passando a constar «… confina de sul, norte e poente com o prédio dos réus…» no local onde consta «… confina de sul, com o prédio dos réus…», mantendo-se o demais decidido em tal ponto.

Este ponto será tratado mais abaixo.

(2) Os Recorrentes pretendem que seja declarada provada a matéria declarada não provada constante das alíneas A), B), E), J) e K), isto é:

● «A. Do prédio urbano identificado em 1) faz parte integrante o terreno/logradouro com a área de 201,60 m2;».

Provado apenas que «O terreno/logradouro, com área não apurada, mas que vai até ao caminho situado a sul, representado na planta junta em audiência pelo Sr. perito, é parte integrante do prédio urbano identificado no facto provado n.º 1.»

Não se suscitam dúvidas que o logradouro se estende até ao caminho a sul, mas não foi feita prova que o logradouro vendido se estendesse até à porta aberta na parede que se pode ver na fotografia de fls. 110 (Doc. 13 da P.I.), e que tenham existido atos de posse sobre esta área.

Não se indica qualquer área precisa porque não se dispõe do cálculo da área até ao caminho.

Porém, os limites ficam definidos com precisão porque o caminho está assinalado nas plantas topográficas juntas aos autos.

Este facto será acrescentado sob o n.º 34.

● «B. Os autores, por si, e por quem o antecedeu, têm andado na posse do prédio identificado em 1) até ao limite do logradouro referido no facto provado 34., desde tempos há mais de 30 anos, à vista de toda a gente, sem oposição de quem quer que seja, de forma pacífica, exclusiva, ignorando que lesavam o direito de outrem e ininterruptamente, ocupando o logradouro nomeadamente com carros de bois, lenha, fruindo os seus proventos, na convicção de exercerem direito próprio;»

Este facto será acrescentado sob o n.º 35.

Também carece de ser acrescentado aos factos provados o facto não provado da al. D), sob pena de contradição, excluindo, no entanto, o segmento «…e propriedade dos autores» e o ponto cardeal «sul».

Ou seja, «O terreno/logradouro situado para norte e nascente das paredes em granito da casa de habitação do prédio dos réus é parte integrante do prédio identificado no facto provado n.º 1.»

Este facto será acrescentado sob o n.º 36.

● «E. O prédio dos autores confina de poente com o prédio propriedade dos réus identificado em 7);»

Este facto será acrescentado sob o n.º 37.

● «J. O logradouro do prédio urbano dos réus situa-se unicamente para poente da casa de habitação, correspondente ao espaço situado entre a parede de granito poente e a estrada;»

Este facto será acrescentado sob o n.º 38.

● «K. Na documentação referente ao artigo urbano ...96, nomeadamente escrituras, certidões da administração tributária e descrição predial sempre constou que o seu logradouro tinha a área de 70 m2 que a ré HH ampliou para 366,75 m2 sem que tenha adquirido a área ampliada (296,75 m2) ou existisse erro de medição;»

Este facto será acrescentado sob o n.º 39.

(d) Aditamento de mais um facto.

«h) A ausência de assinatura dos réus confinantes no pedido de retificação de área apresentado na Conservatória do Registo Predial, e notificação da sua pendência para exercício do direito ao contraditório encontra-se provada documentalmente através documento de fls. 63 a 79 e 93 a 95 dos autos, devendo considerar-se provado, por relevante para a decisão a proferir, o seguinte facto:

- As plantas anexas ao pedido de retificação de área apresentadas pelos réus na Conservatória do Registo Predial para retificação da área do prédio dos réus não contêm assinaturas dos confinantes autores, nem estes foram notificados no processo de retificação para exercerem direito ao contraditório nem deduzir oposição.»

Procede esta pretensão.

Efetivamente consta dos documentos acabados de mencionar.

Será acrescentado aos provados sob o «n.º 25-A».

(e) 1. Matéria de facto – Factos provados

1. Os autores são donos e legítimos possuidores do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia ..., concelho ..., sob o artigo ...95, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...15 da freguesia ...;

2. O prédio identificado em 1) encontra-se descrito com as seguintes confrontações e áreas: “Edifício com dois pisos – rés-do-chão e 1.º andar – e logradouro, sito na Rua ..., ..., freguesia ..., concelho ..., a confrontar de norte com III e ZZ, herdeiros, sul com QQ e ZZ, herdeiros, nascente com III, caminho fazendeiro e MM e poente com ZZ, herdeiros, JJJ, via pública e outro, com a superfície coberta de 132,00 m2 e descoberta de 201,60 m2, num total de 333,60m2;

3. O prédio identificado no anterior artigo encontra-se inscrito na matriz em nome da cabeça de casal da herança de OO, contribuinte n.º ... e foi relacionado no processo de imposto de selo aberto por óbito desta, apresentado no Serviço de Finanças ...;

4. O referido prédio era propriedade de OO, viúva, tendo advindo à sua posse por sucessão deferida em partilha judicial por óbito de seu falecido marido WW;

5. OO faleceu em .../.../2012, sem testamento ou qualquer outra disposição de última vontade, tendo deixado a suceder-lhe, como únicos e universais herdeiros:

a) AA, filha, casada segundo o regime de comunhão de bens adquiridos com BB.

b) CC, filho, casado segundo o regime de comunhão de bens adquiridos com DD.

c) EE, filha, solteira, maior.

d) FF, neta, casada segundo o regime de comunhão de bens adquiridos com GG, filha da sua pré-falecida filha KKK;

6. Os herdeiros de OO identificados em 5) aceitaram a herança desta, não tendo ainda procedido à partilha dos bens que a compõem;

7. O prédio dos autores identificado em 1) e 2) confina de sul com o prédio propriedade dos réus, casa de habitação de rés-do-chão e primeiro andar sito na Rua ..., ..., freguesia ..., concelho ..., inscrito na matriz predial urbana da freguesia ..., concelho ..., sob o artigo ...96, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...25 da dita freguesia;

8. O prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia ..., concelho ..., sob o artigo ...96, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...25 da dita freguesia encontra-se inscrito na matriz em nome da cabeça de casal da herança de XX, contribuinte n.º ... e foi relacionado no processo de imposto de selo aberto por óbito deste apresentado no Serviço de Finanças ...;

9. O prédio identificado em 8) foi propriedade de XX e mulher ZZ, casados segundo o regime da comunhão geral de bens, por o terem comprado a VV por escritura de compra e venda celebrada em 30.09.1974 no Cartório Notarial ..., exarada a fls. 85 verso do livro ...19...;

10. XX faleceu em .../.../1999, sem testamento ou qualquer outra disposição de última vontade, tendo deixado a suceder-lhe, como únicos e universais herdeiros:

a) ZZ, viúva, cônjuge sobrevivo.

b) HH, filha, solteira, maior.

c) II, filha, casada segundo o regime de comunhão de bens adquiridos com JJ.

d) KK, filha, casada segundo o regime de comunhão de bens adquiridos com LL.

e) MM, casado segundo o regime de comunhão de bens adquiridos com NN;

11. ZZ faleceu em .../.../2017, deixando testamento no qual deixou a quota disponível a HH, que deverá começar a ser preenchida com o artigo urbano ...96 da freguesia ..., tendo deixado a suceder-lhe, como únicos e universais herdeiros, os seguintes filhos:

a) HH, solteira, maior.

b) II, casada segundo o regime de comunhão de bens adquiridos com JJ.

c) KK, filha, casada segundo o regime de comunhão de bens adquiridos com LL.

d) MM, casado segundo o regime de comunhão de bens adquiridos com NN;

12. Os herdeiros de XX e ZZ identificados em 11) aceitaram a herança destes, não tendo ainda procedido à partilha dos bens que a compõem;

13. A ré HH anda na posse do prédio identificado no anterior artigo 8.º, nomeadamente residindo na casa de habitação e realizando obras de construção civil;

14. O prédio dos autores tem o seu términus na zona de confinância com o prédio dos réus nas paredes em granito da casa de habitação e na parede em blocos de cimento que veda e delimita uma varanda situada na estrema norte/poente do prédio dos réus;

15. Na varanda situada na confinância norte/sul dos prédios de autores e réus foi há mais de 20 ou 30 anos, construído um muro de vedação em blocos de cimento, passando a existir a partir daquela data duas varandas distintas e autónomas, delimitadas pelo muro, pertencendo a confinante com o prédio dos autores a este prédio e a confinante com o prédio dos réus aquele prédio;

16. Desde a referida data de demarcação e até à presente, autores e réus utilizam em exclusivo a parte da varanda confinante com o seu prédio até ao muro de tijolos, à vista de toda a gente, sem oposição de quem quer que seja, ignorando que lesavam o direito de outrem e ininterruptamente, utilizando a mesma para aceder ao seu prédio e para depósito de objetos, na convicção de exercerem direito próprio de propriedade;

17. A área do logradouro paralelo à fachada posterior das moradias dos autores e dos réus encontra-se registada no prédio inscrito na matriz em nome da cabeça de casal da herança de OO e no prédio inscrito na matriz em nome da cabeça de casal da herança de XX;

18. Em setembro de 2019, os autores implantaram no solo, a distância não concretamente apurada das paredes norte e nascente da casa dos réus, pilares em ferro e fixaram nestes rede de vedação, deixando abertura (porta) no limite norte/poente, próximo do muro de suporte da varanda, que impedia o acesso à parte restante do logradouro;

19. A ré HH em dezembro de 2019, na zona situada próximo da identificada abertura (porta) situada no lado norte da casa, arrancou pilares e rede de vedação colocados junto ao muro de suporte da varanda;

20. A ré HH derrubou o troço de pilares e rede situado defronte da sobredita porta, deixando-os inclinados para norte, próximo da escadaria de acesso ao primeiro andar do prédio dos réus;

21. Sobre o logradouro, paralelo à fachada posterior da moradia dos réus encontra-se constituída uma passagem a pé, com a largura de 1,25m que depois inflete de uma forma desordenada ao encontro das moradias;

22. A ré HH em dezembro de 2019 colocou uma escadaria em ferro encostada à parede de granito de suporte da varanda do seu prédio, para nascente desta, que fixou no solo, destinada a acesso de pé do logradouro à varanda e através desta ao primeiro andar;

23. Na administração tributária e conservatória do registo predial o prédio dos réus tinha a seguinte descrição: “Casa de habitação de r/c e 1.º andar com a superfície coberta de 100 m2 e descoberta de 70 m2, a confrontar de norte com WW e herdeiros de CCC, sul VV, nascente MM e III e poente estrada.”;

24. A ré HH em 30.01.2020 apresentou no Serviço de Finanças ... declaração para atualização de prédio urbano na matriz (modelo ...) através da qual solicitou a correção de área e atualização de confinantes do artigo urbano ...96 da freguesia ..., indicando o seguinte:

- Área total 495,00 m2 (superfície coberta 128,25 e descoberta 366,75).

- Confinantes: nortes herdeiros de PP, sul QQ, nascente herdeiros de XX e MM e poente caminho;

25. Com a declaração de IMI indicada em 24) a ré HH anexou plantas de localização nas quais incluiu no prédio urbano sua propriedade, o logradouro em causa nos autos;

25-A.  As plantas anexas ao pedido de retificação de área apresentadas pelos réus na Conservatória do Registo Predial para retificação da área do prédio dos réus não contêm assinaturas dos confinantes autores, nem estes foram notificados no processo de retificação para exercerem direito ao contraditório nem deduzir oposição.

26. O Serviço de Finanças ... atualizou a área do artigo urbano ...96 da freguesia ..., passando o prédio a constar com a área total de 495 m2, correspondendo 128,75 m2 à superfície coberta e 366,75 à superfície descoberta;

27. Os autores apresentaram requerimento em 07.05.2020 no Serviço de Finanças ... no qual invocaram que através da atualização foi incluída no artigo urbano ...96 área do logradouro do artigo urbano ...95, sua propriedade, existir duplicação de inscrição de área e solicitaram a reversão da atualização passando a constar a anterior área de 70 m2;

28. Na sequência do requerimento referido no anterior artigo em 14.08.2020 o chefe de finanças proferiu o seguinte despacho: “Face a tudo o exposto, o meu projeto de decisão vai no sentido da correção oficiosa do artigo ...96, urbano, da freguesia ..., de forma a anular as modificações introduzidas pelo modelo 1 de IMI entregue em 31/01/2020, harmonizando-se assim a descrição entre a matriz e o registo. (…) Notifique-se o titular do artigo ...96, urbano, da freguesia ..., para efeitos do artigo 60º da LGT. Prazo: 15 dias”;

29. A primeira ré opôs-se ao projeto de decisão referido no anterior artigo invocando, além do demais, já ter procedido à correção de área na descrição predial, tendo o chefe de Finanças alterado o projeto de decisão para o seguinte: “Considerando o alegado, tratou este Serviço de Finanças de ter acesso à certidão permanente do artigo ...96, urbano, da freguesia ..., constatando-se, pela sua consulta, a alteração da descrição, em 27/08/2020, feita pela conservatória do Registo predial ..., existindo, a partir dessa data, perfeita correspondência entre a descrição na matriz e o descrito no registo. (…) Ou seja, consolidou-se, por via do disposto no artigo 7º do código de registo predial, a propriedade do artigo ...96, urbano, da freguesia ..., descrita nos termos e com as áreas postas em cauda pela requerente.

É de concluir, assim, e perante a evolução dos factos, a falta de competência destes Serviço de Finanças para dirimir a presente situação, pois embora os elementos pressentes no processo permitam afirmar que a duplicação de áreas existe, uma Ação de Processo Comum eventual correção da matriz, se assim fosse decidido, não produziria os respectivos efeitos no registo predial.

Deve, então, toda a controvérsia entre as partes ser resolvida em sede própria, concretamente pela via judicial.

DESPACHO

Face a tudo o exposto, o meu projecto de decisão evolui no sentido de indeferimento do pedido.”

30. O projeto de decisão referido no anterior artigo foi convertido em definitivo por despacho de 20.10.2020;

31. A ré HH em 27.08.2020 apresentou requerimento na conservatória do Registo predial ..., relativamente ao prédio descrito sob o n.º ...25 da freguesia ..., concelho ..., correspondente ao artigo matricial urbano ...96, de averbamento de alteração no qual requereu a correção de áreas e confinantes, declarando o seguinte: “A apresentante na qualidade de cabeça de casal da herança aberta por óbito de ZZ, pretende que se atualize a descrição para que passe a constar a área de 495 m2, sendo a superfície coberta de 128,75 e a superfície descoberta de 366,75 m2. O prédio confronta actualmente de norte com herd. De PP; Sul QQ; Nascente com herd. de LLL e MM e de poente com caminho público, o que tudo já consta da matriz.

Mais declara que a divergência provém de simples erro de medição e não houve alteração do prédio”;

32. A ré HH instruiu o pedido de alteração com certidão da administração tributária contendo a correção de áreas indicada em 31);

33. Na sequência do requerimento constante em 31) a conservatória do Registo predial ... procedeu à correção de área e confinantes, passando a constar pela forma requerida, a partir de 27.08.2020 através da ap. ...03.

34 - O terreno/logradouro, com área não apurada, mas que vai até ao caminho situado a sul, representado na planta junta em audiência pelo Sr. perito, é parte integrante do prédio urbano identificado no facto provado n.º 1.

35 - Os autores, por si, e por quem o antecedeu, têm andado na posse do prédio identificado em 1) até ao limite do logradouro referido no facto provado n.º 34, desde tempos há mais de 30 anos, à vista de toda a gente, sem oposição de quem quer que seja, de forma pacífica, exclusiva, ignorando que lesavam o direito de outrem e ininterruptamente, ocupando o logradouro nomeadamente com carros de bois, lenha, fruindo os seus proventos, na convicção de exercerem direito próprio;

36 - O terreno/logradouro situado para norte e nascente das paredes em granito da casa de habitação do prédio dos réus é parte integrante do prédio identificado no facto provado n.º 1.

37 - O prédio dos autores confina de poente com o prédio propriedade dos réus identificado em 7.

38 - O logradouro do prédio urbano dos réus situa-se unicamente para poente da casa de habitação, correspondente ao espaço situado entre a parede de granito poente e a estrada.

39 -  Na documentação referente ao artigo urbano ...96, nomeadamente escrituras, certidões da administração tributária e descrição predial sempre constou que o seu logradouro tinha a área de 70 m2 que a ré HH ampliou para 366,75 m2 sem que tenha adquirido a área ampliada (296,75 m2) ou existisse erro de medição.

2. Matéria de facto – Factos não provados

A.  (Passou para os provados).

B. (Passou para os provados).

C. Os réus por si e pelos seus antecessores, andam há mais de 20 e 30 anos e ininterruptamente na posse do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia ..., concelho ..., sob o artigo ...96, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...25, com a área total de 495 m2, sendo a área coberta de 128,25 m2 e descoberta de 366,75 m2, a confrontar do norte com herdeiros de PP, do sul com QQ do nascente com herdeiros de XX e MM e do poente com caminho público, posse esta que vem sendo exercida à vista da generalidade das pessoas, pacificamente e sem oposição de ninguém, de boa fé, em nome próprio e na convicção de que o prédio lhes pertence com exclusividade, ocupando o releixo, com a colocação de lenhas, vides, materiais agrícolas, pipos, garrafões de vinho, enfim, fruindo todas as utilidades que o prédio é sucessível de proporcionar e dispondo dele livremente como seus únicos e exclusivos donos;

D. (Passou para os provados).

E. (Passou para os provados).

F. Na varanda situada na confinância norte/sul dos prédios de autores e réus foi em data anterior a aquisição do prédio por XX construído muro de vedação em blocos de cimento, passando a existir a partir daquela data duas varandas distintas e autónomas, delimitadas pelo muro, pertencendo a confinante com o prédio dos autores a este prédio, e a confinante com o prédio dos réus aquele prédio;

G. Sobre o logradouro do prédio urbano dos autores encontra-se constituída servidão de passagem a pé a favor do prédio dos autores com a largura de 1,30 metros, início a poente na abertura delimitada com pedras de granito situada encostada a parede da casa de habitação dos réus, no primeiro troço no sentido poente/nascente, no segundo no sentido sul/norte e no terceiro no sentido nascente/poente para acesso à casa de habitação através de duas aberturas (portas) com largura de 1,30 metros e altura de 2,00 metros, situadas no rés-do-chão, a primeira situada a meio da parede da nascente e a segunda na parede norte próximo da parede de suporte da varanda;

H. Para delimitarem parcialmente o local onde se situa a servidão dos réus, os autores, em setembro de 2019, implantaram no solo, à distância de 1,30 metros das paredes norte e nascente da casa dos réus, pilares em ferro e fixaram nestes rede de vedação, com altura de 1,50 metros e extensão de 18 metros, deixando abertura (porta) no limite norte/poente, próximo do muro de suporte da varanda, com 1,20 metros de largura, que impedia o acesso à parte restante do logradouro;

I. Deixando livre a parte do logradouro do prédio dos autores onerada com servidão de passagem de pé e de carro a favor de outros prédios, que não o dos réus, a nascente e sul implantaram no solo pilares de ferro, fixaram nestes rede de vedação, com altura de 1,50 metros, colocaram na vedação sul portão em ferro e rede com duas portas e largura de 3,00 metros;

J. (Passou para os provados).

K. (Passou para os provados).

L. O Serviço de Finanças ... atualizou a área do artigo urbano ...96 da freguesia ..., sem ter procedido à audição dos autores;

M. Os pilares e rede retirados pelos réus e a recolocação da rede derrubada causaram um prejuízo aos autores no valor de €300,00.

(f) Apreciação das restantes questões objeto do recurso

Passando à aplicação do direito aos factos provados.

1 – Os Autores alegam que resulta dos factos provados que são proprietários do prédio identificado nos artigos 1.º, 2.º, 15.º e 16.º da petição inicial, com configuração, composição e confinantes do mesmo conforme peticionaram nas alíneas a), b), c), d) e g) do pedido.

Vejamos, concisamente, porquanto se afigura desnecessário um enquadramento legal exaustivo, uma vez que as questões cruciais do recurso incidiam sobre a matéria de facto; quanto ao direito, a matéria reveste-se de simplicidade, pois todos conhecem o alcance dos preceitos legais aplicáveis.

Resulta dos factos provados n.º 1, 2, 14, 34, 36 e 37 que o prédio vendido aos Autores confronta com as paredes norte e nascente do prédio dos Réus e que o logradouro do prédio dos Autores se estende até ao caminho que passa a sul, tudo com os limites que resultam das plantas topográficas juntas aos autos pelo Sr. perito, em 5 de abril de 2022, a fls. 452 a 493, mais concretamente a fls. 481 a 486.

Como referiu Antunes Varela, «A ideia de que na aquisição derivada não basta para provar a existência do direito do reivindicante a alegação do negócio de aquisição (da compra e venda, da doação, da permuta, etc.), nem o registo deste negócio, porque pode faltar o direito do transmitente, é perfeitamente compreensível e justificada.

Mas já não assim quando o transmitente seja o último titular (do direito) inscrito no registo – facto que, naturalmente, necessita de ser provado.

Quando assim suceda, mesmo que o último inscrito no registo não esteja apoiado numa cadeia ininterrupta de transmissões desde a descrição e a primeira inscrição do imóvel no registo (por falta ou por não aplicação do princípio do trato sucessivo), a prova do direito do adquirente beneficia já da presunção de existência do direito do transmitente, que resulta do registo.

Seria um absurdo exigir, mesmo nesse caso, a prova da cadeia ininterrupta de transmissões do imóvel até se encontrar um título de aquisição originária» - Revista de Legislação e de Jurisprudência, Ano 120, pág. 221.

No caso dos autos certamente ocorre esta situação, pois consta da escritura de compra e venda que o prédio vendido aos Autores estava registado.

Porém, da certidão do registo predial existente nos autos só consta o registo em nome dos pais dos ora Autores, o que se mostra insuficiente para o efeito pretendido.

Por conseguinte, cumpre verificar se há factos para a aquisição originária.

É o caso. Resulta do facto n.º 35 que os Autores possuem este prédio, incluindo o logradouro aqui objeto de disputa, há mais de 30 anos, à vista de toda a gente, sem oposição de quem quer que seja, de forma pacífica, exclusiva, ignorando que lesavam o direito de outrem e ininterruptamente, ocupando o logradouro nomeadamente com carros de bois, lenha, fruindo os seus proventos, na convicção de exercerem direito próprio.

Esta factualidade permite concluir que os Autores são proprietários do identificado prédio por terem adquirido a propriedade pela via da usucapião.

Com efeito, «A posse do direito de propriedade ou de outros direitos reais de gozo, mantida por certo lapso de tempo, faculta ao possuidor, salvo disposição em contrário, a aquisição do direito a cujo exercício corresponde a sua actuação: é o que se chama usucapião» - art.1287.º do Código Civil.

A posse, nos termos do artigo 1251.º do Código Civil, «... é o poder que se manifesta quando alguém actua por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade ou de outro direito real.»

Pressupõe a existência simultânea dum poder de facto sobre a coisa (corpus) e a intenção de exercer um direito correspondente ao poder exercido (animus), elementos estes que resultaram provados, como se vê do conteúdo do facto provado n.º 35.

A posse é de boa fé «… quando o possuidor ignorava, ao adquiri-la que lesava o direito de outrem» - n.º 1, do artigo 1260.º do Código Civil.

No n.º 2 deste artigo determina-se que «A posse titulada presume-se de boa fé, e a não titulada, de má fé».

Diz-se titulada a posse fundada em qualquer modo legítimo de adquirir, independentemente quer do direito do transmitente, quer da validade substancial do negócio jurídico – n.º 1 do artigo 1259.º do Código Civil.

No caso, a posse é titulada e dura há mais de 30 anos, pelo que, sem necessidade de mais considerações, cumpre concluir pela aquisição da propriedade do prédio pela usucapião.

Sendo o prédio identificado nos factos provados, como é, propriedade dos Autores, face ao disposto no artigo 1305.º (Propriedade das coisas) do Código Civil, onde se determina que «O proprietário goza de modo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição das coisas que lhe pertencem, dentro dos limites da lei e com observância das restrições por ela impostas», tal implica a procedência dos pedido formulados sob as als. a), b), c) e g) do pedido constante da petição inicial, nos seguintes termos:

Condenação dos Réus a «a) reconhecerem que o prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia ..., concelho ..., sob o artigo ...95, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...15 da dita freguesia, pertence em propriedade plena e exclusiva aos autores.»

(Os Réus não questionaram esta propriedade, mas apenas que este prédio compreendesse o logradouro aqui em disputa).

Condenação dos Réus a «b) reconhecerem que faz parte integrante do prédio dos autores o terreno/logradouro identificado nos factos provados n.º 34 e 36.»

Não se indica a área do logradouro por não estar determinada, mas é determinável face ao teor da planta topográfica constante dos autos elaborada pelo Sr. perito (cfr. fls. 481 a 486).

Condenação dos Réus a «c) reconhecerem que o prédio urbano, inscrito na matriz sob o artigo ... da freguesia ..., concelho ... e descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...25 da dita freguesia, confina de norte e nascente com o prédio propriedade dos autores inscrito na matriz sob o artigo ... da freguesia ..., concelho ... e descrito a Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...15 da dita freguesia;»

(Eliminou-se a confrontação sul constante do pedido porque não resultou provado que o logradouro inclua o caminho a sul; não o incluindo, o prédio dos Réus não confronta a sul dom o dos Autores, só a norte e a nascente).


*

Relativamente ao pedido constante da al. d), com este teor:

«d) reconhecerem que o prédio inscrito na matriz sob o artigo ... da freguesia ..., concelho ... e descrito a Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...25 da dita freguesia, confina de norte e nascente com os Autores com OO, herdeiros e PP, herdeiros, sul com OO, herdeiros e QQ, nascente com OO, herdeiros e poente caminho público;

Não se profere condenação nestes termos porque quanto às confrontações entre os prédios, as mesmas já resultam das condenações anteriores e quanto às áreas a sua definição não é relevante; por outro lado, tudo indica que a área descoberta do prédio dos Réus, a poente, seja superior aos referidos 70 m2.

Relativamente ao pedido constante da al. g), com este teor:

«g) não mais no futuro entrarem no identificado prédio propriedade dos autores, executando para exercício da reconhecida servidão de passagem a pé, com a largura de 1,30 metros, início a poente na abertura delimitada com pedras de granito situada encostada a parede da casa de habitação dos réus, colocarem quaisquer objetos ou realizarem quaisquer obras que ocupem solo, subsolo ou espaço aéreo deste perturbarem, limitarem ou dificultarem o exercício do invocado direito de propriedade.»

Os Autores não questionam o direito de passagem dos Réus para a loja e adega que existem nos baixos do prédio destes últimos.

Porém, não ficou definida nos factos provados a área ocupada pelo leito dessa servidão.

Sendo assim, não pode ser proferida condenação incluindo o segmento «… com a largura de 1,30 metros, início a poente na abertura delimitada com pedras de granito situada…»

Este pedido procede, por isso, nestes termos:

«g) não mais entrarem no identificado prédio propriedade dos Autores, colocando aí quaisquer objetos ou realizarem quaisquer obras que ocupem solo, subsolo ou espaço aéreo deste, salvo passando a pé, de sul para norte e vice-versa, junto à parede da casa de habitação dos Réus, para acederem à loja e adega.

2 – Quanto à questão acima formulada em 2.º lugar (No ponto «(e) Aplicação do direito.», parte « II. Objeto do recurso»), ficou prejudicada pela solução dada à 1.ª questão.

3 – Quanto à questão acima formulada em 3.º lugar (No ponto «(e) Aplicação do direito.», parte « II. Objeto do recurso»), ficou prejudicada pela solução dada à 1.ª questão.

4 – Relativamente ao pedido formulado sob a al. f), com este teor:

«f) demolirem e retirarem imediatamente e à sua custa, a estrutura escadaria em ferro fixada no solo do logradouro dos autores e na parede norte da sua casa, ao nível do primeiro andar, com largura de 1 metro e extensão de 3 metros, destinada a acesso de pé do logradouro à varanda e através desta ao primeiro andar».

Resulta dos factos provados que escadaria em ferro foi colocada em terreno propriedade dos autores, violando o seu direito de propriedade, pelo que, face ao disposto no artigo 1305.º do Código Civil, acima já transcrito, a mesma deve ser retirada pelos Réus.


*

Face ao exposto, entende-se que o recurso procede no essencial, no que respeita à utilidade prática do pedido.

As custas refletirão a parte da indemnização pedida que não foi objeto do recurso, bem como a menor área do logradouro que acabou por ser reconhecida.

Custas na proporção de 15% para os Autores e 85% para os Réus.

IV. Decisão

Considerando o exposto, julga-se o recurso parcialmente procedente e condenam-se os Réus nos seguintes termos:

1 – A reconhecerem que o prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia ..., concelho ..., sob o artigo ...95, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...15 da dita freguesia, pertence em propriedade plena e exclusiva aos autores

2 – A reconhecerem que faz parte integrante do prédio dos Autores o terreno/logradouro identificado nos factos provados n.º 34 e 36.

3 – A reconhecerem que o prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo ... da freguesia ..., concelho ... e descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...25 da dita freguesia, confina de norte e nascente com o prédio propriedade dos Autores inscrito na matriz sob o artigo ... da freguesia ..., concelho ... e descrito a Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...15 da dita freguesia.

4 –  A não entrarem no identificado prédio propriedade dos Autores, colocando aí quaisquer objetos ou realizarem quaisquer obras que ocupem solo, subsolo ou espaço aéreo deste, salvo passando a pé, de sul para norte e vice-versa, junto à parede da casa de habitação dos Réus, para acederem à loja e adega.

5 – A demolirem e retirarem imediatamente e à sua custa a escadaria em ferro fixada no solo do logradouro dos autores e na parede norte da sua casa.

6 – No mais mantém-se o decidido em 1.ª instância.

7 – Custas pelos Réus na proporção de 15% para os Autores e 85% para os Réus


*

Coimbra, …