Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | FONTE RAMOS | ||
Descritores: | PENHORA DE BENS COMUNS EM EXECUÇÃO MOVIDA CONTRA UM DOS CÔNJUGES SEPARAÇÃO DE BENS | ||
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Data do Acordão: | 04/05/2022 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | JUÍZO DE EXECUÇÃO DE VISEU DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE VISEU | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇAO | ||
Decisão: | CONFIRMADA POR UNANIMIDADE | ||
Legislação Nacional: | ARTIGO 740.º, N.º 2, DO CPC. | ||
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Sumário: | Se na partilha dos bens comuns, requerida por tais bens terem sido penhorados em execução movida contra um só dos cônjuges, estes acordarem na adjudicação dos bens ao cônjuge não executado, nada dizendo quanto a tornas devidas ao executado, permanece a penhora dos bens comuns até nova apreensão de bens. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I. Na execução para pagamento de quantia certa movida por N..., S. A., contra AA, e outros, instaurada a 18.02.2019, suscitada pela Agente de Execução (AE) a questão relativa ao levantamento da penhora que incide sobre o prédio adjudicado à interessada BB, ex-cônjuge do executado AA, a Mm.ª Juíza a quo proferiu o seguinte despacho (a 17.11.2021): «Ressalvando sempre melhor juízo, entendemos que assiste razão à exequente. De acordo com o disposto no artigo 740º, n.º 2 parte final do CPC a penhora permanece até à nova apreensão dos bens do executado, ou seja, a garantia do exequente mantém-se até que possa ser substituída por outros bens que tenham cabido ao executado nessa partilha. Ora, de acordo com a certidão judicial junta aos autos, o executado celebrou um acordo de partilha com a sua ex-cônjuge do qual resulta ter aceite que todos os bens a partilhar lhe fossem adjudicados, nada tendo ficado consignado quanto às tornas a que teria direito. Neste conspecto, e por maioria de razão, o acordo de partilha em questão, tendo subtraído da esfera patrimonial do executado todos os bens comuns, não poderá conduzir ao levantamento da penhora, tendo também em mente o que dispõe o artigo 819º do CC. (...)» Inconformada, a referida BB apelou formulando as seguintes conclusões: 1ª - O acordo de partilha celebrado no âmbito do processo de inventário, pelo qual a recorrente ficou com os dois bens que constituíam o património conjugal, incluindo o imóvel aqui em causa, e assumiu todo o passivo que consistia nos empréstimos concedidos pelo credor reclamante e o valor das prestações dos empréstimos pagas desde a data do divórcio até à data da partilha, é apenas a formalização de um acordo verbal celebrado aquando do divórcio e que traduz a realidade desde essa data. 2ª - Os valores dos bens não foram impugnados pela exequente que tinha legitimidade para o fazer no âmbito do processo de inventário, dado que é interessada e tinha conhecimento de tal processo de inventário. 3ª - Tendo assumido o passivo, a recorrente assumiu dívidas de valor muito superior ao valor dos bens que lhe foram adjudicados, razão pela qual o citado executado, seu ex-cônjuge, não tinha direito a receber qualquer valor a título de tornas, pelo que, nada ficou consignado quanto a isso. 4ª - Quem tinha direito a tornas seria a recorrente, tendo delas prescindido. 5ª - É certo que o art.º 740º, n.º 2 do Código Processo Civil (CPC) que se, na partilha os bens penhorados não couberem ao executado, podem ser penhorados outros que lhe tenham cabido, permanecendo a anterior penhora até à nova apreensão. Sucede que já existe um bem do executado penhorado no âmbito dos presentes autos, mais concretamente o seu salário, pelo que não existe razão para se manter a penhora sobre o imóvel adjudicado à recorrente. 6ª - Acresce que a falta de apreensão de outros bens, a ocorrer, será por razões não imputáveis à ex-cônjuge do executado (recorrente), nem ao executado, na medida em que foi adjudicado àquela o imóvel penhorado, que também assumiu todo o passivo que é superior ao valor aos bens adjudicados e, como tal, o executado não tem direito a qualquer valor a título de tornas. 7ª - Não pode prosseguir a execução quanto ao imóvel em causa pois o que estabelece o art.º 740º, n.º 2 é que a penhora permanece até nova apreensão de outros bens, não determinando o prosseguimento da execução quanto ao imóvel já partilhado e adjudicado à ex-cônjuge do executado, pois o prédio já não pertence ao executado. 8ª - Se assim não fosse, a citação do ex-cônjuge do executado para requerer o inventário para partilha dos bens comuns de forma a salvaguardar a sua meação e o próprio processo de inventário não teriam razão de ser. 9ª - Como decidiu o Ac. da RP de 19/09/2002, “se os bens penhorados deixaram de ser bens comuns do casal e passaram a pertencer, em exclusivo, à mulher não podem responder por um crédito que a autora tem sobre o marido, uma vez que só este é executado no processo” (Proc.º 0231033, dgsi). 10ª - Pelo exposto, não terá sido feita a melhor e mais correta interpretação e aplicação ao caso das pertinentes disposições legais, nomeadamente dos art.ºs 740º, n.º 2 do CPC e 818º e 819º do Código Civil (CC). Remata pedindo a revogação da decisão recorrida e o levantamento da penhora que incide sobre a fração autónoma, identificada pela letra ..., descrita na Conservatória do Registo Predial ... com o n.º ...72 e inscrita na matriz predial sob o art.º ...90. Não houve resposta. Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objecto do recurso, importa conhecer e/ou reapreciar, apenas, se a penhora do imóvel deverá permanecer conforme prevê o n.º 2 do art.º 740º do CPC. * II. 1. Para a decisão do recurso releva o que consta do relatório e o seguinte:[1] a) Em 10.01.2020/17.01.2020[2] foi penhorada nos autos a fração autónoma destinada a habitação, identificada pela letra ... ( ...), do prédio urbano constituído em propriedade horizontal, sito na Urbanização ..., descrita na Conservatória do Registo Predial ... com o n.º ...28... e inscrita na matriz predial sob o art.º ...90.... b) Por carta registada de 20.12.2019, a AE notificou M... Unipessoal, Lda., na qualidade de entidade patronal do executado AA, para iniciar “os descontos sobre o vencimento daquele dentro dos limites legalmente previstos, no próximo processamento de salários”. c) Em auto de penhora com data de 06.02.2020, e para pagamento da quantia exequenda de € 33 789,71 e despesas prováveis, fez-se constar a penhora do «vencimento auferido pelo executado (AA) na qualidade de funcionário da sociedade “M... Unipessoal, Lda.”, dentro dos limites legalmente previstos para pagamento da quantia exequenda, juros e demais encargos com o processo.» d) Desconhece-se a existência de “descontos sobre o vencimento do executado, à ordem dos presentes autos”.[3] e) A recorrente foi citada na execução, por carta da AE de 11.02.2020, nos termos do art.º 740º do CPC, «tendo o prazo de 20 (vinte) dias para requerer a separação de bens ou juntar certidão comprovativa da pendência de ação em que a separação já tenha sido requerida, sob pena da execução prosseguir sobre os bens comuns, melhor identificados no auto de penhora anexo.» f) Ficou exarado em despacho da Mm.ª Juíza a quo de 04.6.2020: «Tome-se em consideração que a execução prossegue apenas contra os executados AA e CC, tendo sido extinta relativamente aos demais.[4] / Nos termos do artigo 740º, n.º 2 do CPC suspendo a execução até à partilha dos bens do extinto casal composto por DD e executado AA. / Notifique.» g) O correspondente processo de inventário (para partilha subsequente ao divórcio[5]) foi instaurado em 05.3.2020.[6] h) Da relação de bens sujeitos a inventário fez-se constar, como verbas do ativo, a fração autónoma dita em a) com o valor patrimonial de € 45 492,30[7] e o veículo automóvel ligeiro de passageiros com a matrícula ..-EH-.., a que foi atribuído o valor de € 3 000, e, como verbas do passivo, a dívida ao B..., S. A., garantida por hipoteca sobre a fração autónoma aludida em a), no valor de € 67 269,98; a dívida à mesma Instituição Bancária, referente a “Acordo de Regularização de Responsabilidades” (em 27.10.2020), no montante de € 5 840,73 e, ainda, a dívida do “casal à ex-cônjuge” referente às “prestações do empréstimo contraído para a aquisição do imóvel identificado na verba n.º 1 por ela pagas desde dezembro de 2010, que à data ascende a cerca de € 53 280”. i) Em audiência realizada em 14.9.2021, os interessados na partilha acordaram “em adjudicar à cabeça de casal BB” os bens que integravam o ativo e reconheceram “o valor relacionado como passivo, que é assumido pela cabeça de casal”; a mencionada Instituição Bancária não se opôs ao acordo, sem prejuízo das “garantias associadas ao empréstimo”, “o que foi aceite pelos interessados”. j) De seguida, no mesmo ato, foi proferida a seguinte sentença: «Em face do exposto, atenta a qualidade dos intervenientes homologo por sentença o acordo de partilha, nos seus exatos termos, sendo os bens adjudicados nos moldes ali constantes. / Custas em partes iguais, nos termos do artigo 1130º do Código de Processo Civil. / Valor da causa: o indicado pela requerente. / Registe e Notifique.» k) A referida sentença transitou em julgado a 19.10.2021.[8] l) A dívida ao B..., S. A., dita em h), garantida por hipoteca sobre o referido imóvel, respeita a (dois) empréstimos de capital no montante inicial de € 56 405,60 e de € 30 000, efetuados a 23.6.2008, o primeiro, “destinado à liquidação de um empréstimo contraído no Regime Geral junto do C..., S. A., em 27.8.1996 que se destinou a aquisição de habitação própria e permanente” e, o segundo, “destinado a fazer face a compromissos financeiros”.[9] m) Por requerimentos de 03.11.2021 e 09.11.2021, a recorrente, na qualidade de ex-cônjuge do executado AA, veio informar que «o processo de inventário já terminou por acordo de partilha homologado por sentença, que transitou em julgado no passado dia 19/10/2021», e requereu o cancelamento da penhora sobre a aludida fração autónoma designada pela letra ... [cf. alínea a), supra]. n) A exequente opôs-se, pugnando pela manutenção da penhora, nos termos do n.º 2 do art.º 740º do CPC. o) Na execução dos autos principais foi apresentada, como título executivo, uma livrança no valor de € 32 430,01, datada de 20.3.2018 e com vencimento a 30.3.2018, subscrita por I..., Lda. e avalizada (“aval à firma subscritora”), entre outros, pelos executados indicados em f). 2. Cumpre apreciar e decidir com a necessária concisão. Não sendo a obrigação voluntariamente cumprida, tem o credor o direito de exigir judicialmente o seu cumprimento e de executar o património do devedor, nos termos declarados neste código e nas leis de processo (art.º 817º do CC). O direito de execução pode incidir sobre bens de terceiro, quando estejam vinculados à garantia do crédito, ou quando sejam objeto de ato praticado em prejuízo do credor, que este haja procedentemente impugnado (art.º 818º do CC). Sem prejuízo das regras do registo, são inoponíveis em relação à execução os atos de disposição, oneração ou arrendamento dos bens penhorados (art.º 819º do CC). Sendo penhorado algum crédito do devedor, a extinção dele por causa dependente da vontade do executado ou do seu devedor, verificada depois da penhora, é igualmente inoponível à execução (art.º 820º do CC). A liberação ou cessão, antes da penhora, de rendas e alugueres não vencidos é inoponível ao exequente, na medida em que tais rendas ou alugueres respeitem a períodos de tempo não decorridos à data da penhora (art.º 821º do CC). Se a coisa penhorada se perder, for expropriada ou sofrer diminuição de valor, e, em qualquer dos casos, houver lugar a indemnização de terceiro, o exequente conserva sobre os créditos respetivos, ou sobre as quantias pagas a título de indemnização, o direito que tinha sobre a coisa (art.º 823º do CC). Quando, em execução movida contra um só dos cônjuges, forem penhorados bens comuns do casal, por não se conhecerem bens suficientes próprios do executado, é o cônjuge do executado citado para, no prazo de 20 dias, requerer a separação de bens ou juntar certidão comprovativa da pendência de ação em que a separação já tenha sido requerida, sob pena de a execução prosseguir sobre os bens comuns (art.º 740º, n.º 1 do CPC). Apensado o requerimento de separação ou junta a certidão, a execução fica suspensa até à partilha; se, por esta, os bens penhorados não couberem ao executado, podem ser penhorados outros que lhe tenham cabido, permanecendo a anterior penhora até à nova apreensão (n.º 2). 3. A Mm.ª Juíza a quo expendeu e concluiu que a penhora permanece até à nova apreensão dos bens do executado, ou seja, a garantia do exequente mantém-se até que possa ser substituída por outros bens que tenham cabido ao executado nessa partilha; o executado celebrou um acordo de partilha do qual resulta ter aceite que todos os bens a partilhar fossem adjudicados à recorrente, nada tendo ficado consignado quanto às tornas a que teria direito; o acordo de partilha em questão, tendo subtraído da esfera patrimonial do executado todos os bens comuns, não poderá conduzir ao levantamento da penhora, tendo também em mente o que dispõe o artigo 819º do CC. 4. O referido enquadramento e o decidido não merecem o menor reparo. Na verdade, o descrito quadro fáctico e normativo não convoca resposta diversa, como vem sendo defendido na doutrina e na jurisprudência. 5. Preceitua o art.º 740º, n.º 2 do CPC que, nas situações em que o bem penhorado é adjudicado ao cônjuge do executado, em inventário para separação de meações, deve ser entendido que a garantia de pagamento do crédito do exequente resultante da primitiva penhora (que incidia sobre um bem comum do casal) transfere-se para os bens que hão de constituir o quinhão do executado/devedor, solução que também decorre do regime previsto nos art.ºs 819º e seguintes do CC - a penhora transfere-se para os bens que hão-se constituir o quinhão do cônjuge devedor (inclusive, e eventualmente, o valor das tornas), sobre ele passando a incidir a garantia do pagamento do crédito. No citado art.º 819º do CC consagra-se o princípio da ineficácia, em relação ao credor, dos atos de disposição ou oneração dos bens penhorados, ressalvadas as regras do registo - o devedor pode alienar ou onerar os bens penhorados, mas a execução prossegue, como se esses bens pertencessem ao executado, justamente, na medida em que aquela concreta operação possa ofender os interesses da execução. A ineficácia não carece de ser declarada pelo tribunal. Ademais, a tese de que a penhora do direito se converte imediatamente na penhora dos bens com que a quota do executado foi preenchida só poderá ser aceite se o penhorante tiver intervindo como interessado, na realização da partilha e a tiver aceitado.[10] 6. Assim, se o bem imóvel penhorado for adjudicado ao cônjuge do executado, ficando (ou devendo ficar) o executado com a sua meação preenchida com o direito às tornas, a garantia de pagamento do crédito do exequente resultante da primitiva penhora (que incidia sobre um bem comum do casal) transfere-se automaticamente para os bens que passaram a constituir o quinhão do executado/devedor; a penhora anterior permanece até que a segunda tenha lugar, para eficácia da garantia do credor/exequente. Daí, qualquer acordo de composição dos quinhões que tenha sido estabelecido pelos cônjuges no inventário, por via do qual se obste àquele resultado deve ser considerado ineficaz em relação à execução (art.ºs 740º, n.º 2 do CPC). Se porventura forem devidas tornas, fica o executado (ou o cônjuge do executado) obrigado a entregar as tornas no processo executivo; enquanto tal não suceder, a penhora que incide sobre o imóvel (bem comum do casal) tem que se manter, pois que, conforme decorre do disposto no art.º 740º, n.º 2 do CPC a penhora primitiva mantém-se (“permanece”) “até à nova apreensão”.[11] 7. Ao executado, interessado no inventário para partilha dos bens comuns do dissolvido casal, (formalmente) nada foi atribuído; nada lhe coube! Contudo, existe um bem imóvel (cujo valor de mercado será superior ao respetivo valor patrimonial tributário[12]) e um veículo automóvel, bem como uma dívida hipotecária.[13] Ora, nada nos diz que se tenha procedido a uma adequada ponderação dos interesses envolvidos, inclusive, da exequente. Por conseguinte, a penhora realizada deverá permanecer conforme prevê o n.º 2 do art.º 740º do CPC. Importa promover/atuar a legalidade e a eficácia do ato de penhora (e a inerente e consequente ineficácia da partilha em relação à exequente)[14], sendo que a eventual não intervenção da exequente no inventário (como parece ter sucedido) não poderá levar a diverso desfecho.[15] 8. Soçobram, desta forma, as “conclusões” da alegação de recurso. * III. Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida. Custas pela apelante. * 05.4.2022 [1] Desrespeitando o tempo de todos, podendo/devendo os autos de recurso ser instruídos com um consideravelmente menor suporte físico (retirando porventura ¾ ao atual volume), não há documento ou requerimento que não esteja multiplicado - por exemplo, o (extenso) requerimento da credora reclamante B..., S. A., foi junto a fls. 121, 165, 211, 260 e 349 verso! [2] Cf., por exemplo, os documentos de fls. 17/27 verso e 20/31. [3] Aparentemente, quanto à penhora do vencimento do executado ..., é provável que não existam quaisquer descontos, atendendo aos montantes mensais que foram declarados como auferidos (cf., v. g., documentos de fls. 96 verso e seguintes) e às limitações previstas no art.º 738º do CPC. [4] No requerimento executivo figuram 7 (sete) executados, todos, pessoas singulares. [5] Processo de divórcio n.º 325/10.7TBLMG. [6] Consta da certidão reproduzida a fls. 340 verso e seguintes que lhe foi atribuído o n.º 1194/20.4T8VIS. [7] Determinado no ano de 2018 (cf., v. g., o documento de fls. 49 verso). [8] Cf. certidão de fls. 337/340 verso. [9] Em 02.11.2020, encontrava-se em dívida o capital de € 43 814,40 quanto ao primeiro empréstimo e de € 23 455,50 quanto ao segundo (parcelas do crédito hipotecário reclamado e incluído na dita relação de bens). [10] Vide Pires de Lima e Antunes Varela, CC Anotado, Vol. II, 4ª edição, Coimbra Editora, 1997, págs. 91 e seguinte (citando, nesse sentido, Vaz Serra e Anselmo de Castro). [11] Assim, vide, nomeadamente, Lebre de Freitas, A Acção Executiva, 6ª edição, Coimbra Editora, pág. 260 e notas (41) e (42) e Rui Pinto, A Acção Executiva, AAFDL Editora, Lisboa/2018, págs. 530 e seguintes, 615 e 792 e, de entre vários, os acórdãos do STJ de 22.01.2008-processo 07A4033 [tendo-se concluído: «I - Efectuado o requerimento para separação de meações (...), a instância executiva fica suspensa até à partilha. A partir deste momento prosseguirá sobre os bens penhorados se ficarem a pertencer ao executado, ou sobre outros que lhe tenham cabido, caso os penhorados não lhe couberem (mas fiquem a pertencer ao seu cônjuge). II - Neste inventário, o cônjuge do executado tem o direito de escolha dos bens que hão-de formar a sua meação. Mas nesse caso, os credores podem reclamar contra essa escolha, fundamentando a sua queixa, inferindo-se do n.º 2 do art.º 1406º que o fundamento da reclamação só pode ser a má avaliação dos bens. III - Teve aqui o legislador evidentes preocupações com os credores, pois, como é evidente, uma avaliação incorrecta, pode resultar em manifesto prejuízo deles. Note-se que o que se trata aqui é a possibilidade de o exequente vir a penhorar bens que couberam ao executado, sendo evidente o dano se existir uma avaliação por defeito dos bens escolhidos pelo cônjuge deste. (...) V - Mesmo que se entenda que o processo pode terminar com uma transacção, nela têm que intervir, para além dos interessados no inventário, os credores exequentes cuja penhora em bens comuns do casal originou a instauração do processo (para separação de meações - art.º 293º, n.º 2, do CPC). VI - Tendo os interessados, no presente inventário para separação de meações, chegado a acordo, sem que estivesse presente a credora, exequente no processo principal, vindo a ser homologada por sentença a referida transacção, fazendo-se terminar o processo, inviabilizou-se a realização da partilha e a consequente adjudicação dos bens a cada um dos cônjuges (ou seja, o preenchimento dos respectivos quinhões), não se permitindo, assim, o prosseguimento da execução com penhora de bens. VII - Deverá, pois, revogar-se a sentença homologatória da transacção, realizando-se nova conferência de interessados e subsequente partilha.»], da RG de 07.3.2019-processo 3660/14.1T8VNF-G.G1 [com o sumário: «I. Penhorado um determinado bem comum do casal, numa execução movida unicamente contra um dos cônjuges, e citado o outro cônjuge ao abrigo do disposto no art.º 740º do CPC, das duas, uma: - Ou o cônjuge do executado não requer a separação de meações nem junta certidão de acção pendente, e a execução prossegue contra o bem penhorado, para a sua venda ou adjudicação na acção executiva; - Ou o cônjuge requer a separação de meações ou junta certidão comprovativa de processo de separação de bens já instaurado, suspendendo-se a execução nos bens comuns até à partilha. II. Nesta última situação, podem ocorrer duas hipóteses: 1ª Ou o bem penhorado é adjudicado ao executado. 2ª Ou é adjudicado ao seu cônjuge. III. Naquela primeira hipótese, não surge, neste âmbito, qualquer problema, uma vez que se o bem penhorado for adjudicado ao executado, a execução pode voltar a prosseguir os seus trâmites ulteriores relativamente a tal bem. No entanto, se se verificar a segunda hipótese, e o bem penhorado for adjudicado antes ao cônjuge do executado, ficando o executado com a sua meação preenchida com o direito às tornas, deve-se entender que a garantia de pagamento do crédito do exequente resultante da primitiva penhora (que incidia sobre um bem comum do casal) transfere-se automaticamente para os bens que passaram a constituir o quinhão do executado/devedor. IV. Nessa medida, qualquer acordo de composição dos quinhões que tenha sido estabelecido pelos cônjuges naquele Inventário, por via do qual se atinja aquele resultado (o bem penhorado seja adjudicado ao cônjuge não executado, ficando o cônjuge executado com direito a tornas, logo, alegadamente, pagas em mão), deve ser considerado ineficaz em relação ao Tribunal da execução por aplicação do regime da penhora de créditos (art.ºs 740º, n.º 2; cf. art.º 777º do CPC; e art.ºs 820º e 823º do CC, este por analogia), ficando o executado (ou o cônjuge do executado) obrigado a entregar as tornas no processo executivo - mesmo que estas já tenham sido alegada e indevidamente entregues ao executado. V. Enquanto isso não suceder, a penhora que incide sobre os bens imóveis (bens comuns do casal) tem que se manter, pois que, conforme decorre do disposto no art.º 740º, n.º 2 do CPC a penhora primitiva mantém-se (“permanece”) “até à nova apreensão”. VI. Além disso, tendo em conta a afirmada ineficácia dos actos de partilha efectuados (designadamente, da entrega em mão das tornas) perante a penhora vigente dos bens comuns do casal (cf. n.º 2 do art.º 740º do CPC), não se pode julgar verificada a existência de caso julgado (seja em que modalidade for), uma vez que a decisão proferida no processo de inventário (sentença que homologou a partilha) não impõe a sua autoridade, nem obsta a que se reconheça a ineficácia (limitada) dos actos de partilha homologados, em face dos efeitos sub-rogatórios (automáticos) da penhora dos bens comuns sobre as tornas ou o direito às tornas que vieram a integrar o património do executado.»] e 22.4.2021-processo 6802/16.9T8VNF-C.G1, da RP de 12.10.1995-processo 9530556 e 03.5.2016-processo 2839/11.2TBMAI-B.P1 [assim sumariado: «I - O imóvel adjudicado a um dos cônjuges por partilha na sequência de divórcio responde pela dívida da responsabilidade do outro cônjuge, se o registo da aquisição for posterior ao registo da penhora. II - Não é relevante que a penhora tenha sido feita em execução intentada contra ambos os cônjuges por dívida da responsabilidade de ambos, e, extinta essa execução, tenha prosseguido por impulso de outro credor por dívida da exclusiva responsabilidade do cônjuge cujo quinhão foi composto por tornas. III - A partilha é inoponível ao credor que impulsionou a execução após a sua extinção, ainda que a penhora não esteja registada a seu favor. IV - A inoponibilidade significa que o acto praticado pelo executado é válido ´inter partes` e perante terceiros à excepção do exequente. V - Enquanto a penhora se mantiver, em relação ao exequente, tudo se passa como se não tivesse havido partilha. VI - O credor reclamante que impulsiona a execução extinta nos termos do artigo 920º CPC 61 não carece de registar penhora a seu favor.»] e da RE de 25.11.2004-processo 1971/04-2 [sumariando-se: «No processo para separação de bens nos termos do art.º 825, do CPC, cabendo os bens penhorados ao cônjuge do executado, as tornas de que este possa, consequentemente, ser credor, não lhe devem ser entregues em mão, não ficando o devedor desonerado de tal obrigação, se fizer a entrega em tais termos.»] e 13.12.2005-processo 630/05-3 [concluindo-se: «(...) 2 - No inventário para separação de meações com a adjudicação do bem, onerado por penhora, ao cônjuge não executado, transfere-se, também, este ónus, nos termos do art.º 823º do Cód. Civil para os bens que hão-de constituir o quinhão do seu cônjuge, devedor, o valor das tornas, sobre elas passando a incidir a garantia do pagamento do crédito. 3 - O devedor das tornas fica colocado na posição de fiel depositário, com todos os deveres daí inerentes, inclusive, com a obrigação e prestar contas (art.º 843º, n.º 1 do CPC), pelo que sobre ele incide o dever de conservar as tornas em seu poder ou de as depositar à ordem do tribunal. 4 - A não existência de conflito entre os cônjuges, e a estratégia deliberada para colocar o imóvel - o único bem capaz de garantir substancialmente a satisfação do crédito do credor Estado Português - no património da cônjuge-mulher e não executada, com vista à subtracção ao pagamento, consubstancia um comportamento malicioso tendente a fazer do processo um uso manifestamente reprovável, com o fim de atingir um objectivo ilegal, ou seja, manifesta má fé processual. 5 - No inventário para separação de meações, atento o interesse dos credores, quando aos bens é atribuído valor muito diferente dos valores de mercado deve o juiz, oficiosamente, ao abrigo do disposto no art.º 1353º, n.º 1 e 2 do Cód. Proc. Civil, determinar se proceda à avaliação.»], publicados no “site” da dgsi. [12] Valor que não tem, na maioria das vezes, qualquer correspondência com o valor real do bem - cf., a propósito, designadamente, o acórdão do STJ de 14.7.2020-processo 1219/16.8T8GRD.C.C1.S1, publicado no “site” da dgsi. [13] Não cabendo a esta Relação pronunciar-se sobre a pretensa “dívida do casal à recorrente, referente às prestações desses mesmos empréstimos por ela pagas, desde a data do divórcio até à data da partilha”, aludida em II. 1. h), parte final, supra, sempre se dirá que, por exemplo, do expendido no citado acórdão da RE de 13.12.2005-processo 630/05-3 algum contributo poderá advir para uma razoável, detida e avisada análise/ponderação... De resto, no arrazoado da alegação de recurso, afirma a recorrente «que o possui em exclusivo desde a data do divórcio e que, por essa razão, suportou os encargos do empréstimo para sua aquisição desde essa data» (sublinhado nosso). [14] Cf., por exemplo, os citados acórdãos da RP 03.5.2016-processo 2839/11.2TBMAI-B.P1 e da RG de 07.3.2019-processo 3660/14.1T8VNF-G.G1. Naturalmente, não nos parece que a situação em apreço possa igualmente suscitar ou corporizar as “profundas reservas” preconizadas por Rui Pinto quanto ao domínio de aplicação do n.º 2 do art.º 740º do CPC (v. g., na obra citada, pág. 534), desde logo, porque, ante o descrito enquadramento fáctico, processual e substantivo, não se poderá/deverá dizer que o bem imóvel em causa não irá “responder pela dívida” ... [15] O acórdão da RP de 14.3.2017-processo 429/07.3TMPRT-B.P1, publicado no “site” da dgsi, citado pela recorrente, alude, apenas, a essa possibilidade de intervenção [importava apurar se o credor exequente, cuja execução ficou suspensa até à partilha dos bens comuns do casal, deve ser considerado interessado no âmbito do inventário para separação de meações, tendo o direito de requerer a avaliação de quaisquer dos bens relacionados, e concluiu-se: «I - Em inventário para separação de meações, o credor exequente cuja execução ficou suspensa até à partilha dos bens comuns do casal deve ser considerado como interessado, ainda que indireto, na partilha. II - Tem, por isso, a possibilidade de intervir na conferência de interessados, podendo reclamar contra o valor atribuído a quaisquer bens relacionados e requerer a sua avaliação.»]. |