Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | ||||||||||||||||||||||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | |||||||||||||||||||||
Relator: | LUÍS CRAVO | |||||||||||||||||||||
Descritores: | DECISÃO IMPLÍCITA INEQUÍVOCA QUANTO À LEGITIMIDADE DOS RR QUER NA DECISÃO SOBRE A ADMISSÃO DO INCIDENTE DE INTERVENÇÃO DE TERCEIROS QUER NA DECISÃO SOBRE A LEGITIMIDADE PASSIVA NO DESIGNADO POR “DESPACHO SANEADOR” ESGOTAMENTO DO PODER JURISDICIONAL DO JUIZ CASO JULGADO FORMAL | |||||||||||||||||||||
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Data do Acordão: | 12/11/2024 | |||||||||||||||||||||
Votação: | UNANIMIDADE | |||||||||||||||||||||
Tribunal Recurso: | JUÍZO LOCAL CÍVEL DAS CALDAS DA RAINHA | |||||||||||||||||||||
Texto Integral: | S | |||||||||||||||||||||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | |||||||||||||||||||||
Decisão: | REVOGADA | |||||||||||||||||||||
Legislação Nacional: | ARTIGOS 613.º, 1 E 3; 620.º, 1; 625.º, 2; 636.º, 1 E 644.º 1 A 3, DO CPC | |||||||||||||||||||||
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Sumário: | I – Tendo havido decisão implícita inequívoca quanto à legitimidade dos RR., quer na decisão sobre a admissão do incidente de intervenção de terceiros, quer na decisão sobre a legitimidade passiva no designado por “Despacho Saneador”, o esgotamento do poder jurisdicional do juiz, ex vi do art. 613º nos 1 e 3 do n.C.P.Civil, obstava a que o juiz se pronunciasse sobre a mesma em decisão “avulsa” posterior sobre a legitimidade.
II – Mesmo a assim se não entender, uma vez que os RR./recorridos, nas suas contra-alegações, não vieram alargar o âmbito do recurso, pedindo a reapreciação das referidas decisões, têm-se as mesmas como transitadas em julgado, donde, tendo-se constituído caso julgado formal quanto à afirmação da legitimidade dos RR., a esta Relação apenas cabe respeitar essas decisões – que, independentemente do respetivo acerto, se tornaram obrigatórias neste processo, ex vi do art. 620º, nº 1, do n.C.P.Civil, neles se apresentando como indiscutíveis. | |||||||||||||||||||||
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Decisão Texto Integral: | Apelação em processo comum e especial (2013)
* Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra[1] * 1 - RELATÓRIO AA e OUTROS propuseram ação de impugnação de Deliberação da Assembleia de Condóminos, em 4.02.2011, com processo comum, contra BB e mulher CC e OUTROS[2], dizendo ser contra os condóminos que, à data, votaram a favor da deliberação de 04.12.2010, “Todos a citar na pessoa dos administradores da propriedade horizontal” em exercício de funções à data da propositura da ação, e peticionando, no essencial, que seja declarada nula a deliberação da assembleia de condóminos do dia 4 de Dezembro de 2010 [do Condomínio do prédio urbano sito na Rua ..., também designado por “Edifício ...”, ..., em propriedade horizontal], na qual foi deliberada e aprovada a “Transferência dos serviços de Centro de Dia e Apoio Domiciliário”, prestados diretamente pelo Condomínio, para a “Associação de Proprietários a criar”, bem como o “Protocolo”, a outorgar entre o Condomínio e a Associação a criar, que regulamenta, além do mais, o uso das áreas comuns e respetiva cedência a título de comodato à referida Associação, e os benefícios a atribuir aos sócios da Associação a criar. Concluíram, em conformidade com o sustentado, que a deliberação em causa violava o disposto nos arts. 1422.º, n.º3, 1421.º, n.º 3, 1406.º ex vi o art. 1422.º, n.º1, 1424.º, 1425.º, 1426.º, todos do Código Civil e o princípio da “Liberdade de Associação” previsto no art. 46.º da CRP, e mais requereram, a final, a citação dos administradores da propriedade horizontal enquanto representantes de todos os réus condóminos, para contestarem. * Citados os administradores, os mesmos apresentaram contestação conjunta no dia 04.11.2011, arguindo, além do mais, a nulidade da citação, porquanto entendem que deverão ser citados os condóminos per si, não sendo bastante para o efeito a citação dos administrações em representação daqueles; e a ilegitimidade dos condóminos DD, EE, FF, A..., Lda. e GG, porquanto não estiveram presentes na assembleia de condóminos em referência e, bem assim, invocando a omissão de outros condóminos que votaram favoravelmente a dita deliberação. Os autores replicaram, respondendo à invocada nulidade de citação e sustentando, em jurisprudência do STJ, a representação judiciária dos condóminos pelos respetivos administradores. * Por requerimento de 29.05.2012, mais requereram os AA. a intervenção principal provada dos condóminos cuja omissão foi suscitada pelos réus. Foi deferida a intervenção principal provocada, por despacho datado de 14.01.2015, nos termos requeridos, mais concretamente nos seguintes concretos termos: «Iniciaram-se os presentes autos em Fevereiro de 2011 pretendendo os Autores seja declarada nula a deliberação da assembleia de condóminos do Edifício ... sito nas .... Propuseram a acção contra os condóminos que votaram favoravelmente a deliberação que pretendem anular requerendo que estes fossem citados nas pessoas dos administradores do condomínio. Contestando estes últimos vieram arguir a nulidade da citação dizendo que a validade dela dependeria da citação de todos os Réus. Durante a pendência da acção vieram a falecer alguns intervenientes processuais tendo havido lugar às consequentes habilitações de herdeiros que se encontram agora apensas aos presentes autos. Os Autores vieram agora requerer seja admitida intervenção principal provocada de: 1) HH, casado com II no regime de comunhão de adquiridos, residente na Praça .... , .... 2) JJ, casado com KK no regime de comunhão de adquiridos, residente na Rua ... F, ...; 3) LL, casado com MM no regime de comunhão de adquiridos, residente na Rua ..., .... Balizaram a sua pretensão no facto de os chamados serem os plenos proprietários da fracção designada pela letra “J“, correspondente ao 1. º Esq. “AF” do condomínio do prédio em causa nestes autos e daí terem interesse directo na causa pois é necessária a intervenção de todos os interessados para que a decisão final possa produzir o seu efeito útil normal regulando de forma definitiva a situação das partes relativamente ao pedido formulado pelos ora Autores. Os Réus foram devidamente notificada nos termos do disposto no artigo 318º nº 2 do Código de Processo Civil (anterior artigo 326º) e não deduziram oposição à pretensão dos Autores. Nos termos do disposto no artigo 316º do Código de Processo Civil “qualquer das partes pode chamar a juízo o interessado com direito a intervir na causa, seja como seu associado, seja como associado da parte contrária.” In casu os Requerentes sustentaram a sua pretensão na existência de litisconsórcio necessário passivo sendo a falta dos chamados motivo de ilegitimidade. Analisados os factos verifica-se estarem reunidos os requisitos e os pressupostos de que dependa a admissibilidade da intervenção pelo que a admito. Cumpra-se o disposto no artigo 319º nº 1 do Código de Processo Civil Custas do incidente conforme o disposto no artigo 538º do Código de Processo Civil. Notifique.» De referir que foram citados os condóminos ali identificados, os quais vieram, por requerimento de 15.04.2025, a aderir à contestação anteriormente apresentada nos autos. * Na sequência processual, foi designada data para realizar a tentativa de conciliação (“Artigo 594º do Código de Processo Civil”) e a audiência prévia (“Artigos 591º nº 1 alínea a) , c) d) e g) e 595º do Código de Processo Civil”), sendo que na data da diligência, 25.01.2016, foi, além do mais, proferido um designado “DESPACHO SANEADOR”, com o seguinte concreto teor: «Dispõe o art.306º, nº1 do Código de Processo Civil, compete ao juiz fixar o valor da causa, sem prejuízo do dever de indicação que impende sobre as partes. Assim, estando as partes de acordo em relação ao valor indicado na petição inicial e nos termos do art.297º e 299º do Código de Processo Civil, fixa-se o valor da presente acção em €30.000,01. * Suscitou-se nestes autos a questão da legitimidade passiva. Atentos os fins indicados no despacho que designou esta audiência prévia, pela Mm.ª Juiz foi dada a palavra aos Ilustres Mandatários para se pronunciarem o que os mesmos fizeram. * Ouvidos os Ilustres Mandatários, conclui-se que não existe entendimento divergente quanto à legitimidade passiva para a presente acção. Com efeitos ambos estão de acordo quanto a esta estar atribuída, nos termos da lei, aos condóminos que votaram favoravelmente à deliberação que se pretende impugnar, que são: CC (fracção H) NN (fracção AI) OO (fracção BQ) PP (fracção BH, BI e BJ) QQ (fracção AU) RR (fracção BE) SS (fracção L e AF) TT (fracção P) UU (fracção AC, AV e AM) VV (fracção BF) WW (fracção BO) XX ( fracção V) YY (fracção BD) HH (fracção J) ZZ (fracção T) WW (fracção BM) AAA (fracção R e AS) BBB (fracção AO) CCC (fracção BP) DDD (fracção BG) EEE (fracção G) FFF (fracção Q) GGG (fracção AL) HHH (fracção M) III (fracção AJ) JJJ (fracção AX) KKK (fracção N) LLL (fracção AD e S) MMM (fracção AE) * Seguidamente, pela Mm.ª Juiz foi proferido o seguinte DESPACHO Em face do entendimento aceite por autores e réus, conclui-se que, NNN, DD, GG e A..., Lda. são partes ilegítimas da acção, pelo que vão absolvidos da instância com custas a contar a final a cargo dos autores. * Durante a presente audiência, foi dito pelo Ilustre Mandatário dos réus contestantes que no decurso da acção morreram: RR, GGG, CCC e EEE. De seguida, pela Mm.ª Juíz foi proferido o seguinte, DESPACHO Com vista à conformação da marcha processual e no âmbito do disposto nos artigos 6º e 7º do Código do Processo Civil, foi ordenando que se fizesse pesquisa na base de dados, tendo-se concluído que estão falecidos as pessoas referidas supra e que constam dos documentos obtidos nessa pesquisa. Em face dos documentos que provam que estes réus faleceram, e o disposto no artigo 273º nº 1 alínea a) do Código de Processo Civil declaro suspensa a presente instância. Notifique.» * Ulteriormente, por despacho proferido no dia 14.02.2022, entendendo o tribunal perfilhar o entendimento jurisprudencial no sentido de ser ao Condomínio, representado pelo seu administrador, que cabe a legitimidade passiva neste tipo de ações, o qual sai reforçado com a nova redação do art. 1437.º do Código Civil, aprovada pela Lei 8/2022, e cuja entrada em vigor é imediata como resulta do art. 8.º do referido diploma legal, foram as partes convidadas a, querendo, pronunciarem-se nos termos do art. 3.º n.º3 do novo CPC. Pronunciaram-se os autores, através de requerimento apresentado em juízo no dia 24.02.2022, concluindo como na petição inicial, pelo prosseguimento da ação contra os administradores já citados, em representação dos condóminos que votaram favoravelmente a deliberação impugnada. Os réus nada disseram ou requereram. No dia 07.06.2022 foi, então, proferido despacho com o seguinte teor: «(…) Entendendo-se ser ao Condomínio, representado pelo seu administrador, que cabe a legitimidade passiva neste tipo de acções, e não aos diferentes condóminos, foram as partes notificadas para se pronunciarem. Vieram os Autores pronunciar-se no sentido de concordarem com o despacho proferido, tanto mais que haviam proposto a acção contra os condóminos que votaram desfavoravelmente a decisão cuja impugnação pretendem, a citar na pessoa dos administradores. Ora, compulsada a petição inicial apresentada constata-se que a presente acção foi proposta contra condóminos individualmente considerados, ainda que “a citar” na pessoa dos administradores do condomínio. Afigura-se, pois, claro que não se pode concluir que a presente acção se encontra devidamente proposta contra o Condomínio, representado pelos seus Administradores. Deste modo, não pode a presente acção prosseguir nos termos constantes da petição inicial. Por outro lado, e estando em causa uma situação de ilegitimidade passiva, não se pode ignorar que, não decorrendo esta da preterição de litisconsórcio necessário ou de outras situações em que seja exigida a presença adjectiva de diversas pessoas, e que no caso não estejam no processo, mas sim da demanda de entidade diversa daquela que deveria estar na acção, afigura-se que não se poderá recorrer aos mecanismos de regularização da instância, previstos nos arts.311º e seguintes do Código de Processo Civil. Configurando-se uma situação de ilegitimidade das partes, que nos termos do art.577º, al.e) do Código Processo Civil, tal constitui uma excepção dilatória, que tem como consequência a absolvição dos Réus da instância. Assim, e nos termos do art.3º, nº3 do Código de Processo Civil, notifique as partes para se pronunciarem.» Vieram responder os réus OOO [cf. requerimento de 14.06.2022], PPP [cf. requerimento de 15.06.2022], acompanhando o douto despacho e concluindo pela absolvição da instância. Responderam os autores através do requerimento entrado em juízo no dia 24.06.2022, sustentando que quando os autores manifestaram a sua concordância à aplicação da nova redação do art. 1437.º do Código Civil não foi no sentido de aceitar a verificação da exceção dilatória da ilegitimidade, inutilizando todos os atos já praticados nos autos, mas, pelo contrário, ao aceitarem o teor do dito despacho foi para que – tal como consta do despacho – agilizar a presente ação e permitir que a mesma prosseguisse contra os réus que constam dos autos, representados pelos administradores do condomínio, sendo certo que na audiência prévia dos presentes autos, as partes já tinham acordado que a legitimidade passiva assistia aos condóminos que votaram favoravelmente as deliberações impugnadas. Concluem, pela necessidade de adequação formal dos autos ao abrigo dos arts. 547.º e 591.º n.º1, alínea e, do CPC, no sentido do aproveitamento dos atos já praticados, devendo a ação prosseguir contra as partes e intervenientes já demandados ou, caso assim não se entenda, contra o condomínio representado pelos seus administradores já citados e que já apresentaram contestação. * Após vicissitudes processuais que para o caso não relevam, vieram os AA., através de requerimento apresentado no dia 19.10.2023, requerer a alteração da causa de pedir e do pedido, peticionando a declaração de nulidade da deliberação da assembleia de condóminos do dia 25 de Fevereiro de 2017 [Acta n.º20], que substituiu a anterior [do dia 04.12.2010] que havia motivado a propositura da ação. * De seguida, com data de 18.05.2024, foi proferido despacho judicial de apreciação e decisão sobre a questão oficiosamente suscitada pelo despacho de 14.02.2022, “DA ILEGITMIDADE PASSIVA”, através do qual, começando por se reconhecer que a questão da legitimidade da passiva neste tipo de ações tem sido objeto de divergência doutrinária e jurisprudencial, se perfilhou o entendimento considerado “maioritário” nessa temática, à luz do qual se considerava existir a arguida ilegitimidade passiva dos réus na presente ação, já que foi contra eles e não contra o “CONDOMÍNIO”, representado pelo respetivo administrador, que foi instaurada a ação, donde se concluiu nos seguintes termos: «(…) Assim, por tudo quanto precede, julgo procedente a excepção de ilegitimidade passiva arguida pelos réus, constituindo esta uma excepção dilatória que obsta a que o Tribunal conheça do mérito da causa e dá lugar à absolvição da instância - cf. os arts. 576.º n.º2.º, 577.º al. e) e 578.º, todos do novo CPC. * DECISÃO: Pelo exposto, julgo os Réus e os Chamados [e seus Habilitados] parte ilegítima na presente acção, e, em consequência, absolvo-os da instância, julgando-a extinta. Fixo o valor da causa em 30.000,01€, conforme indicado pelos autores sem oposição dos réus - cf. o art. 301.º do novo CPC. Custas da acção a cargo dos autores – cf. o art. 527.º do novo CPC. Registe e notifique.» * Inconformados, dele interpuseram recurso os AA., com as seguintes conclusões: «1.º Vem o presente recurso da douta sentença que decidiu pela extinção da instância por ilegitimidade passiva e, em consequência, absolveu os réus da instância. 2.º Como é sabido (a própria sentença recorrida o admite) a questão de saber quem deve ser demandado nas acções de impugnação das deliberações tomadas pela assembleia de condóminos nunca obteve uma resposta consensual tanto no âmbito da Doutrina como sobretudo na Jurisprudência. 3.º As duas soluções fundamentais em confronto são: - para uns, devem ser demandados cada um dos condóminos que votaram a favor da deliberação inválida, embora representados pelo administrador – tese que nega a personalidade judiciária do condomínio; - para outros, a acção deve ser instaurada contra o condomínio propriamente dito, representado pelo administrador - tese que reconhece a personalidade judiciária do condomínio. 4.º A primeira posição – assumida pelos apelantes nos autos - alicerça-se nas seguintes ideias: • Da conjugação dos artigos 12º, alínea e) do CPC e os dos 1436.° e 1437.°, n.°s 1 a 3, ambos do Código Civil resulta que a personalidade judiciária do condomínio é meramente funcional; • O condomínio não tem personalidade jurídica e, por isso, o legislador entendeu atribuir-lhe personalidade judiciária apenas e tão só na medida da competência funcional que a lei atribui, ou a assembleia venha a atribuir, ao administrador, enquanto seu órgão executivo; • Fora dos casos relativos aos poderes do administrador, as demais acções obrigam à intervenção dos condóminos singularmente considerados, uma vez que se trata de atribuir uma extensão da personalidade apenas em casos determinados e para efeitos processuais; • As deliberações tomadas pela assembleia de condóminos não se enquadram nos poderes do administrador, tal como resulta do transcrito artigo 1436º do C.C; • É perante cada um dos condóminos que formaram e aprovaram a deliberação inválida que os apelantes pretendem que se produzam efeitos da impugnação, ainda que possam ser citados na pessoa do administrador. 5.º Independentemente da posição que se possa tomar quanto à discussão doutrinal e jurisprudencial, o não se pode ignorar que o processo civil tem uma feição meramente instrumental, e por isso, deve aferir se nas circunstâncias concretas dos autos, o processo reúne as necessárias condições para poder prosseguir sem atropelos dos direitos processuais das partes. 6.º Nem os pressupostos processuais nem as discussões a eles referentes podem ultrapassar a decisão de mérito do processo, sob pena de vir a prevalecer a forma sobre a substância - o que constituirá sempre uma violação dos direitos das partes. Ora, vejamos os autos: 7.º A presente acção de impugnação de deliberações da assembleia de condóminos deu entrada no dia 4 de Fevereiro de 2011 e foi proposta contra os condóminos que aprovaram favoravelmente a deliberação, tendo sido requerida a citação dos mesmos na pessoa dos seus administradores. 8.º Mais alegaram os autores que os administradores da propriedade horizontal são os representantes judiciários dos réus, conforme resulta do disposto no artigo 1433º, nº 6 do Código Civil. 9.º Os administradores de condomínio foram citados e os réus contestaram aceitando que a legitimidade passiva pertence aos condóminos, mas que cada um dos condóminos deveria ser citado individualmente. 10.º No dia 25 de Janeiro de 2016 realizou-se nos autos a audiência prévia, onde foi proferido o seguinte despacho: Suscitou-se nestes autos a questão da legitimidade passiva. Atentos os fins indicados no despacho que designou esta audiência prévia, pela Mm.ª Juiz foi dada a palavra aos Ilustres Mandatários para se pronunciarem o que os mesmos fizeram. * Ouvidos os Ilustres Mandatários, conclui-se que não existe entendimento divergente quanto à legitimidade passiva para a presente acção. Com efeitos ambos estão de acordo quanto a esta estar atribuída, nos termos da lei, aos condóminos que votaram favoravelmente à deliberação que se pretende impugnar, que são: • CC (fracção H) • NN (fracção AI) • OO (fracção BQ) • PP (fracção BH, BI e BJ) • QQ (fracção AU) • RR (fracção BE) • SS (fracção L e AF) • TT (fracção P) • UU (fracção AC, AV e AM) • VV (fracção BF) • WW (fracção BO) • XX ( fracção V) • YY (fracção BD) • HH (fracção J) • ZZ (fracção T) • WW (fracção BM) • AAA (fracção R e AS) • BBB (fracção AO) • CCC (fracção BP) • DDD (fracção BG) • EEE (fracção G) • FFF (fracção Q) • GGG (fracção AL) • HHH (fracção M) • III (fracção AJ) • JJJ (fracção AX) • KKK (fracção N) • LLL (fracção AD e S) • MMM (fracção AE) * Seguidamente, pela Mm.ª Juiz foi proferido o seguinte DESPACHO Em face do entendimento aceite por autores e réus, conclui-se que, NNN, DD, GG e A..., Lda. são partes ilegítimas da acção, pelo que vão absolvidos da instância com custas a contar a final a cargo dos autores. * Durante a presente audiência, foi dito pelo Ilustre Mandatário dos réus contestantes que no decurso da acção morreram: RR, GGG, CCC e EEE. De seguida, pela Mm.ª Juíz foi proferido o seguinte, DESPACHO Com vista à conformação da marcha processual e no âmbito do disposto nos artigos 6º e 7º do Código do Processo Civil, foi ordenando que se fizesse pesquisa na base de dados, tendo-se concluído que estão falecidos as pessoas referidas supra e que constam dos documentos obtidos nessa pesquisa. Em face dos documentos que provam que estes réus faleceram, e o disposto no artigo 273º nº 1 alínea a) do Código de Processo Civil declaro suspensa a presente instância. Notifique. 11.º Assim, toda a tramitação dos autos e os sucessivos incidentes de intervenção principal e incidentes de habilitação foram deduzidos tendo em conta que a legitimidade passiva pertenceria aos condóminos acima identificados. 12.º E, na sequência de tal facto, os autores deduziram e pagaram taxas relativas aos seguintes incidentes:
13.º Assim, desde o ano de 2012 que os autores vêm deduzindo incidentes de forma a assegurar que os condóminos que não foram citados e os herdeiros dos que, entretanto, foram falecendo sejam chamados para os autos. 14.º Chamamentos esses que foram sendo admitidos e feitos prosseguir, conforme despacho do dia 5 de Setembro de 2018 que aqui se transcreve a título exemplificativo: Consigna-se que pelas Ilustres Mandatárias foi dito que na diligência que teve lugar no passado dia 25/01/2016 as partes e a Mmª Juiz que presidiu à mesma procederam apenas a um pré-saneamento, não tendo sido alcançado qualquer acordo ou proferida qualquer decisão definitiva quanto à nulidade de citação e demais excepções dilatórias suscitadas na contestação, tendo em consideração nomeadamente que foi comunicado o óbito de alguns intervenientes processuais e que nessa medida se determinou a suspensão da instância. * Após, procedeu-se conjuntamente à análise dos articulados e dos documentos constantes dos autos, maxime, das certidões prediais, com vista a averiguar da identificação e respectivo estado das partes já admitidas nos autos e bem assim dos requeridos no incidente de intervenção principal de terceiros apresentado pelos autores no dia 29/05/2012. Nessa sequência, pela Ilustre Mandatária dos réus foi comunicado o óbito das rés FFF e DDD. Mais se suscitaram dúvidas quanto à actual titularidade das fracções G, AJ, AL, AM, AS, AV e BG. * Consigna-se que a Ilustre Mandatária dos Autores comunicou que quanto à falecida FFF desconhece a identificação dos herdeiros e demais sucessores. Quanto à falecida DDD consta do registo predial que a fracção em referência (fracção BG) foi adquirida por legado, por terceiro. De seguida, confrontada a Ilustre Mandatária dos Autores sobre a possibilidade de se proceder, por escrito, ao saneamento dos autos, nomeadamente quanto à questão da ilegitimidade passiva suscitada antes da apreciação do incidente de intervenção de terceiros requerido a 29/05/2012 com vista, eventualmente, à sua reformulação, pela mesma foi dito que nada tem a opor. De seguida, pela Mmª Juiz foi proferido o seguinte: DESPACHO “Na sequência da análise das certidões prediais constantes dos autos e das informações trazidas aos autos pelas Ils. Mandatárias na presente diligência, antes de mais, convido os autores a juntarem aos autos: a) Os assentos de óbito das Rés FFF e DDD; b) Certidão predial actualizada referente às fracções G, AJ, AL, AM, AS, AV e BG. Prazo: 10 dias. Para tanto, averigúe previamente a secção nas bases disponíveis sobre o óbito das rés acima identificadas, comunicando a informação obtida à Ilustre Mandatária dos Autores. Mais solicite desde já informação aos serviços tributários sobre a identificação dos herdeiros da ré FFF. Notifique.” * Consigna-se que na presente diligência foi entregue em mão à Ilustre Mandatária dos autores os resultados obtidos nas pesquisas efectuadas nas bases de dados. 15.º A sentença recorrida não é mais do que uma decisão que viola o princípio da prevalência da substância sobre a forma. 16.º Por outro lado, a douta sentença recorrida admite que – afinal – até havia uma forma de ultrapassar o facto do condomínio não ter sido demandado: No caso, dada a grande divisão jurisprudencial e doutrinal existente, afigura-se que só com o recurso ao mecanismo do artigo 39º do Código de Processo Civil[22],» os autores apenas poderiam ter garantido a legitimidade passiva na presente acção. 17.º Ora, se o Tribunal a quo entendia que a forma de garantir a legitimidade passiva era chamar o condomínio, era isso que deveria ter ordenado! 18.º Mesmo que assim não fosse, sempre o Tribunal a quo deveria ter ordenado o cumprimento do referido artigo 39º do CPC, tal como resulta do artigo 8º da Lei n.º 8/2022, de 10 de Janeiro. 19.º É manifesto que a intenção do legislador da Lei n.º 8/2022, de 10 de Janeiro foi a de aproveitar todos os actos praticados nos processos e permitir o prosseguimento dos mesmos. 20.º Ordenar que sejam encetados os procedimentos necessários para assegurar a representação do condomínio, deve ser interpretado no sentido do Julgador dever ordenar os procedimentos que entenda necessários. 21.º O artigo 8º da nova lei traduz-se, tão só, na aplicação dos princípios criados e reforçados com a reforma do processo civil de 2013, e que a douta sentença recorrida também ignorou. 22.º Nos termos do disposto no artigo 547º, artigo 591º, nº 1, alínea e) do CPC do Código de Processo Civil, impende sobre o juiz deveres de adequação formal, simplificação ou a agilização processual, nos termos previstos no n.º 1 do artigo 6.º e no artigo 547.º. 23.º E, nada impede que os actos já praticados (durante 13 anos) sejam aproveitados e seja ordenada a adequação formal com vista à agilização processual. 24.º Durante cerca de 13 anos que os autores têm praticado todos os actos necessários para alcançar um processo equitativo e que venha a ser julgado, sob pena de lhes ser negada justiça. 25.º O poder dever que o Tribunal tem de assegurar a gestão processual, foi mais uma vez ignorado, apesar da decisão singular do Tribunal da Relação de Coimbra que revogou a decisão de inutilidade superveniente da lide já disso ter dado nota. 26.º Por último, cabe referir que não é indiscutível que a nova lei venha a pôr termo à discussão a que se alude no presente recurso, porque a nova redacção em nada clarifica a questão da legitimidade passiva nas ações de impugnação de deliberações sociais porque esta questão se situa a montante da problemática da (in)capacidade judiciária/representação. A dúvida na problemática em apreço situa-se ao nível da apreciação da legitimidade, ou seja, em saber a quem pertence o interesse em contradizer. 27.º A douta sentença interpretou erradamente ou violou o disposto no artigo 12º, alínea e) do CPC e 1436.° e 1437.°, n.°s 1 a 3, não aplicou o disposto nos artigos 39º do CPC e 8º da Lei nº 8/2022, de 10 de Janeiro. 28.º A douta sentença recorrida não exerceu os poderes deveres resultantes dos artigos 547º e 6º do CPC com vista a um processo equitativo, pondo fim a uma acção com 13 anos de tramitação decorrente dos esforços desenvolvidos pelos autores e custos que agora são totalmente inúteis. 29.º Deve a sentença recorrida ser revogada e substituída por despacho que ordene o prosseguimento dos autos ou, eventualmente, a prática dos actos necessários para assegurar a legimitidade passiva. Assim decidindo, Venerandos Desembargadores, uma vez mais se fará a costumada e esperada JUSTIÇA!» * Não foram apresentadas quaisquer contra-alegações. * Nada obstando ao conhecimento do objeto do recurso, cumpre apreciar e decidir. * 2 – QUESTÕES A DECIDIR, tendo em conta o objeto do recurso delimitado pelos Recorrentes nas conclusões das suas alegações (arts. 635º, nº4 e 639º, ambos do n.C.P.Civil), por ordem lógica e sem prejuízo do conhecimento de questões de conhecimento oficioso (cf. art. 608º, nº2, “in fine” do mesmo n.C.P.Civil), face ao que é possível detetar o seguinte: - desacerto da decisão recorrida [datada de 18.05.2014] que julgou procedente a exceção de ilegitimidade passiva. * 3 – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A matéria de facto a ter em conta para a decisão do presente recurso é, no essencial, a que consta do Relatório que antecede. * 4 - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO Que dizer quanto ao arguido desacerto da decisão recorrida [datada de 18.05.2014] que julgou procedente a exceção de ilegitimidade passiva? Alegam os AA./recorrentes, de forma particularmente enfática, que «(…) toda a tramitação dos autos e os sucessivos incidentes de intervenção principal e incidentes de habilitação foram deduzidos tendo em conta que a legitimidade passiva pertenceria aos condóminos acima identificados.» E quanto a nós com toda a pertinência, pois que tal teve consequências jurídico-processuais que não podem ser completamente desconsideradas em fase ulterior, como o fez a decisão recorrida. Senão vejamos. A presente ação de impugnação da deliberação tomada pela assembleia de condóminos foi proposta em 4.02.2011 contra um conjunto de RR., no pressuposto e consideração por parte dos AA. de que a legitimidade passiva para uma ação judicial com esta causa de pedir e pedido pertencia aos condóminos que votaram a favor da deliberação inválida. Os RR. contestaram arguindo, além do mais, a exceção de ilegitimidade passiva, fundada em que a ação havia sido proposta contra pessoas que não participaram na assembleia de condóminos ajuizada e bem assim em não ter sido proposta contra todos os condóminos que votaram favoravelmente a deliberação (assim ocorrendo a preterição de litisconsórcio necessário). Sucedeu que em vista do suprimento dessa exceção da ilegitimidade passiva, por preterição de litisconsórcio necessário, por despacho datado de 14.01.2015, foi deferido o incidente requerido pelos AA. da intervenção principal provocada dos condóminos cuja omissão havia sido suscitada pelos RR.. Neste despacho vindo de citar, grafou-se expressa e literalmente que «In casu os Requerentes sustentaram a sua pretensão na existência de litisconsórcio necessário passivo sendo a falta dos chamados motivo de ilegitimidade. Analisados os factos verifica-se estarem reunidos os requisitos e os pressupostos de que dependa a admissibilidade da intervenção pelo que a admito.» Na sequência processual oportuna, foi proferido em 25.01.2016, um designado “DESPACHO SANEADOR”, através do qual, para o que ora diretamente releva, se decidiu o seguinte: «Suscitou-se nestes autos a questão da legitimidade passiva. Atentos os fins indicados no despacho que designou esta audiência prévia, pela Mm.ª Juiz foi dada a palavra aos Ilustres Mandatários para se pronunciarem o que os mesmos fizeram. * Ouvidos os Ilustres Mandatários, conclui-se que não existe entendimento divergente quanto à legitimidade passiva para a presente acção. Com efeitos ambos estão de acordo quanto a esta estar atribuída, nos termos da lei, aos condóminos que votaram favoravelmente à deliberação que se pretende impugnar, que são: CC (fracção H) NN (fracção AI) OO (fracção BQ) PP (fracção BH, BI e BJ) QQ (fracção AU) RR (fracção BE) SS (fracção L e AF) TT (fracção P) UU (fracção AC, AV e AM) VV (fracção BF) WW (fracção BO) XX ( fracção V) YY (fracção BD) HH (fracção J) ZZ (fracção T) WW (fracção BM) AAA (fracção R e AS) BBB (fracção AO) CCC (fracção BP) DDD (fracção BG) EEE (fracção G) FFF (fracção Q) GGG (fracção AL) HHH (fracção M) III (fracção AJ) JJJ (fracção AX) KKK (fracção N) LLL (fracção AD e S) MMM (fracção AE) * Seguidamente, pela Mm.ª Juiz foi proferido o seguinte DESPACHO Em face do entendimento aceite por autores e réus, conclui-se que, NNN, DD, GG e A..., Lda. são partes ilegítimas da acção, pelo que vão absolvidos da instância com custas a contar a final a cargo dos autores.» Acresce que este mesmo designado “DESPACHO SANEADOR” teve um segmento relativo à prossecução processual relevante para a habilitação de herdeiros de alguns intervenientes processuais de cujo falecimento foi adquirido notícia nesse ato, sendo certo que face ao falecimento de alguns outros anteriormente ocorrido, tinha havido lugar às consequentes habilitações de herdeiros por atinentes despachos. Ora se assim é, mormente com esses dois referenciados despachos de 14.01.2015 e de 25.01.2016 [de decisão do incidente de intervenção provocada e no designado por “Despacho Saneador” sobre a legitimidade, respetivamente], salvo o devido respeito, visou-se e ficou decidida a exceção da ilegitimidade passiva. Atente-se que os dois fundamentos que haviam sido erigidos para a dedução desta exceção da ilegitimidade passiva [a ação haver sido proposta contra pessoas que não participaram na assembleia de condóminos ajuizada e não ter sido a ação proposta contra todos os condóminos que votaram favoravelmente a deliberação] obtiveram resposta e solução, assumindo-se claramente o entendimento, a contrariu sensu, de que os condóminos que foram especificada e discriminadamente referidos como sendo os “condóminos que votaram favoravelmente à deliberação” eram os que tinham “legitimidade passiva para a presente acção”. De referir que «IV - O incidente de intervenção não é um meio de substituição processual de demandados, nomeadamente quando se demandou certa pessoa ou entidade, e se deveria ter demandado outra. A finalidade do incidente de intervenção provocada é ultrapassar o vício de preterição de litisconsórcio necessário ou assegurar a intervenção dos litisconsortes voluntários. V – Por conseguinte, só a ilegitimidade plural é suprível por via do incidente de intervenção. Já a ilegitimidade singular é insanável e constitui exceção dilatória que dá lugar à absolvição do réu da instância (arts. 577.º, al. e), 576.º, n.º 2, e 278.º, n.º 1, al. d), do CPC).»[3] Dito de outra forma: o deferimento do incidente de intervenção de terceiros representou a adesão ao entendimento de que deviam ser demandados todos e cada um dos condóminos que votaram a favor da deliberação inválida, o que tendo ocorrido nos autos, significava e tinha o sentido de se julgar que os RR. demandados eram partes legítimas na ação, improcedendo a exceção da sua ilegitimidade que havia sido deduzida. Na verdade, parece-nos insofismável que pressuposto necessário da admissão da dita intervenção de terceiros é a consideração da legitimidade destes na acção![4] Assim, pelo menos de forma implícita, foi operado através dos referenciados despachos de 14.01.2015 e de 25.01.2016 julgamento sobre a legitimidade dos RR. demandados… Temos presente ser coisa já afirmada por várias vezes, quer na doutrina[5], quer na jurisprudência dos Tribunais Superiores, a possibilidade do julgamento implícito de determinados pressupostos processuais[6], admitindo-se, inclusivamente, a formação de caso julgado quanto ao assim decidido quando as questões em causa, «(...) dados os termos da causa, constituem pressuposto ou consequência necessária do julgamento expressamente proferido.»[7] E nem se argumente, nomeadamente por referência ao designado “DESPACHO SANEADOR”, que este foi um “despacho pré-saneador” ou que se tratou apenas de uma decisão genérica ou tabelar, pois que, ao invés, houve objetivamente uma definição acerca da legitimidade passiva, isto é, uma concreta apreciação sobre a legitimidade, razão pela qual se tomou posição e se expressou decisão sobre a legitimidade passiva, o que devia obstar a que a questão fosse (re)apreciada nos autos. Isto é o que decorre do art. 613º, nos 1 e 3, do n.C.P.Civil[8], o que, salvo o devido respeito, obstava a que o Tribunal “a quo”, na decisão “avulsa” sobre a legitimidade ora recorrida, se pronunciasse sobre a legitimidade passiva na ação, mais a mais, em sentido oposto àquele que havia determinado a admissão da intervenção de terceiros para pleitearem ao lado dos RR. primitivos, a se também já considerados parte legítimas. Sem embargo do vindo de dizer, acresce o seguinte. Pode-se sustentar que não se havia formado, à data da prolação do despacho recorrido, caso julgado formal sobre a legitimidade passiva por via dos referenciados despachos de 14.01.2015 e de 25.01.2016. Isto para quem entenda que relativamente a eles, por não caberem em qualquer das situações previstas nos nos 1 e 2 do art. 644º do n.C.P.Civil, não era admissível recurso imediato autónomo.[9] Nessa linha de entendimento, estava liminarmente arredada a possibilidade de se resolver por não ter sido atacada, uma eventual contraditoriedade de julgados, nos termos do art. 625º, nº2, do n.C.P.Civil, a saber, «cumprindo-se a decisão que transitou em julgado em primeiro lugar»... Sucede que mesmo a assim se entender, também temos in casu que as decisões interlocutórias que não sejam passíveis de recurso autónomo imediato não deixam de transitar em julgado quando, sendo desfavoráveis a quem interponha recurso das decisões contempladas no nº 1 do art. 644º do n.C.P.Civil, o recorrente não inclua aquelas no âmbito desse recurso [cf. nº 3 do mesmo art. 644º] ou se, sendo desfavoráveis ao recorrido – que é o caso dos RR. no que respeita, como se viu, às decisões de 14.01.2015 e de 25.01.2016, quanto à legitimidade dos próprios –, quando estes não suscitarem a respetiva apreciação no âmbito das contra-alegações, assim ampliando o âmbito do recurso [solução imposta por aplicação analógica do nº 1 do art. 636º do n.C.P.Civil]. Na verdade, importa não olvidar que os RR. haviam arguido a ilegitimidade passiva na contestação deduzida nos autos, pelo que se tinham de considerar partes vencidas pelas decisões em referência, posto que, importa atender à decisão para se concluir se a parte é ou não vencida e não aos respetivos fundamentos, sendo irrelevante a razão da derrota ou da vitória[10], s../../../Documents and Settings/mcordas/Ambiente de trabalho/ATT11850.doc - _ftn5endo certo que «Tem legitimidade para recorrer a parte para a qual a decisão é desfavorável, qualquer que tenha sido o seu comportamento na instância recorrida e independentemente dos pedidos por ela formulados no tribunal a quo.»[11] De referir que, a propósito do disposto no dito art. 636º do n.C.P.Civil, já foi doutamente sublinhado que «Aos casos em que o recorrido pode requerer a ampliação do âmbito do recurso deve juntar-se ainda um outro que decorre da opção, ínsita no art. 644º, n° 3, de não se admitir recurso imediato da generalidade das decisões intercalares. Nestas circunstâncias, uma vez que a parte vencida em relação a tais decisões não as pôde impugnar imediatamente, se o recurso da decisão final for interposto pela outra parte, tem de se reconhecer àquela a possibilidade de nas contra-alegações requerer a sua reapreciação, desde que a resposta possa servir para impedir que o recurso interposto proceda. Repare-se que, em tais situações, nem sequer se pode invocar a possibilidade prevista no nº 4 do art. 644º, a qual pressupõe precisamente que não tenha havido recurso da decisão final.»[12] O que tudo serve para dizer que tendo havido decisão implícita inequívoca quanto à legitimidade dos RR., o esgotamento do poder jurisdicional do juiz, ex vi do art. 613º, nos 1 e 3 do n.C.P.Civil, obstava a que o juiz se pronunciasse sobre a mesma em decisão “avulsa” posterior sobre a legitimidade; mesmo a assim se não entender, uma vez que os RR./recorridos, nas suas contra-alegações, não vieram alargar o âmbito do recurso, pedindo a reapreciação das referidas decisão sobre a admissão do incidente de intervenção de terceiros e decisão sobre a legitimidade passiva no designado por “Despacho Saneador”, têm-se as mesmas como transitadas em julgado, donde, tendo-se constituído caso julgado formal quanto à afirmação da legitimidade dos RR., a esta Relação apenas cabe respeitar essas decisões – que, independentemente do respetivo acerto[13], se tornaram obrigatórias neste processo, ex vi do art. 620º, nº 1, do n.C.P.Civil, neles se apresentando como indiscutíveis. Assim, em conformidade com tudo o exposto, decide-se pela revogação da impugnada decisão “avulsa” sobre a legitimidade – quanto à decisão de dar como verificada a exceção dilatória da ilegitimidade dos RR. e dos Chamados [e seus Habilitados] e quanto à absolvição da instância dos mesmos. Nestes termos procedendo as alegações recursivas e o recurso. * (…) * 6 - DISPOSITIVO Pelo exposto, julga-se procedente o recurso e, em consequência, revoga-se a decisão “avulsa” sobre a legitimidade [datada de 18.05.2014, a qual deu como verificada a exceção dilatória da ilegitimidade dos RR. e dos Chamados (e seus Habilitados) e em consequência os absolveu da instância], determinando a baixa dos autos à 1ª Instância para que a ação aí prossiga os seus termos normais. Custas pelos RR./recorridos. Coimbra, 11 de Dezembro de 2024 Luís Filipe Cravo Fernando Monteiro João Moreira do Carmo
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