Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
3769/03
Nº Convencional: JTRC
Relator: DR. GARCIA CALEJO
Descritores: INDEMNIZAÇÃO POR DANOS PATRIMONIAIS
Data do Acordão: 01/20/2004
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: ALBERGARIA A VELHA
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO DE AGRAVO
Decisão: PROVIDO PARCIAL
Legislação Nacional: ART. 495.º N.º 3 DO CC
Sumário:

O pressuposto de legitimidade para a exigência de indemnização por parte de menores e a que se refere o art. 495.º n.º 3 do CC, encontra preenchido no caso vertente, dado que a mãe deles, vítima de acidente de viação, estava legalmente adstrita ao pagamento de prestações alimentícias aos mesmos.
Tendo-lhes faltado a mãe, o direito dos menores a alimentos em relação a ela, extinguiu-se, donde resulta que sofrem prejuízos patrimoniais. É que incumbindo à mãe, nos termos legais, a obrigação de providenciar pelos alimentos dos filhos e estando provado nos autos que ela auferia rendimentos pelo desempenho profissional, é evidente que os menores, ao ser-lhes subtraída a fonte de rendimentos derivada da mãe, sofreram danos.
È de supor, por tal ser normal que uma pessoa durante a vida activa adquira bens duradoiros tais como casa, automóvel, principalmente se tiver uma fonte de rendimentos que lhe permita aforrar algo, ou seja, que lhe dê para pôr algum dinheiro de lado para adquirir bens ou para simplesmente o amealhar. Claro que com este acumular de bens, os filhos iriam, por via de herança futura, beneficiar dessa situação. Tendo falecido a mãe, é evidente que os lesados deixam de poder contar com o benefício que a sua capacidade de ganho lhe poderia no futuro, proporcionar. Daí que também por este prisma, os lesados tenham sofrido prejuízos.
Decisão Texto Integral: ap-3769/03



Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

I- Relatório:
1-1- Carlos, em representação do seu filho menor A, residentes na Praceta ..., Maia, intenta a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, emergente de acidente de viação, contra B, residente na Rua Miguel ..., Matosinhos, C com sede na Av. da ..., 1269-122 Lisboa, pedindo se condene os RR. a pagar ao A. a quantia global de 104.655.766$00, a título de indemnização, com juros de mora à taxa legal, a contar da citação e até efectivo e integral pagamento.
Fundamenta este seu pedido, em síntese, num acidente de viação, ocorrido no dia 22 de Maio de 1999 no Itinerário Principal n.º 5, pelas 8,40 horas e em que foram intervenientes a mãe do A., E, e o R., sendo que o acidente foi causado por este R., que transitava no sentido contrário ao sentido seguido pelo veículo conduzido pela E, tendo invadido a semifaixa por onde esta circulava, colidindo com o veículo dela e sem que lhe desse qualquer hipótese de se desviar para qualquer dos lados da estrada. Do acidente resultou a morte da mãe do A. e os consequentes danos patrimoniais e não patrimoniais que indica e de que se quer ver ressarcido.
Pelo pagamento destes danos é também responsável a R. Seguradora, para quem foi transferida a responsabilidade civil derivada da circulação do veículo automóvel conduzido pelo R..
1-2- A R. Seguradora, contestou arguindo a excepção da ilegitimidade do R. B, já que a proprietária do veiculo havia transferido, para si, ilimitadamente, a responsabilidade civil derivada da circulação do veículo automóvel conduzido pelo R., motivo por que só ela própria deve responder pelas quantias peticionadas.
Admite, em síntese, que o acidente ocorreu por culpa exclusiva do condutor do veículo por si seguro, impugnando, por não serem do seu conhecimento pessoal e não ter obrigação de conhecer, os danos invocados pelo A..
1-3- O R. B contestou, sustentando, também em síntese, que, por ter sido acometido de dor abdominal, perdeu o controle do veículo que conduzia, tendo perdido os sentidos que só recuperou largos minutos após o acidente. Por isso não sabe se corresponde à verdade a descrição do acidente por banda do A.. Os danos patrimoniais e não patrimoniais encontram-se valorizados de forma exagerada.
1-4- O A. respondeu à excepção deduzida pela Seguradora, sustentando, em resumo, desconhecer as condições gerais e particulares do contrato de seguro celebrado entre a proprietária do veículo e a Seguradora.
1-5- O Centro Nacional de Pensões veio pedir o reembolso da quantia de 1.802.460$00 por subsídios que pagou em razão da morte da referida E Loio, beneficiária do Centro com o nº 116020377.
1-6- Foi aceite a intervir nos autos, na qualidade de irmã do A. e filha da vítima E, a interessada D, representada pelo seu pai, F, que fez seus os factos alegados na p.i. pelo A., seu irmão.
1-5- O processo seguiu os seus regulares termos posteriores, tendo-se proferido despacho saneador, em que se considerou parte ilegítima o R., pelo que se absolveu da instância, após o que se fixou os factos assentes e a base instrutória.
1-6- Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, após o qual foi proferida decisão final em que se considerou parcialmente procedente por provada a acção, condenado-se a R. Seguradora a pagar ao A. e à interveniente D, a cada um deles, a quantia global de 130.785,45 Euros, acrescida de juros de mora, à taxa legal, vencidos desde a citação a incidir sobre 785,45 Euros e desde a data da sentença, a incidir sobre os restantes 130.000 Euros. No mais, incluindo no que se refere ao pedido do CNP, foi a R. absolvida.
1-7- Não se conformando com esta sentença, dela veio recorrer a R. Seguradora, recurso que foi admitido como apelação e com efeito suspensivo.
1-8- A recorrente alegou, tendo dessas alegações retirado as seguintes conclusões úteis:
1ª- Os apelados não alegaram nem provaram os factos constitutivos do seu direito de alimentos nem que a vítima lhos vinha prestando antes do acidente (1ª parte do art. 495º nº 3 do C.Civil ), o que era necessário que a respectiva indemnização lhes fosse atribuída.
2ª- Não foi alegado e muito menos provado que a vítima prestava alimentos aos apelados, nos termos da 2ª parte do art. 495º nº 3, ou seja, ao abrigo de uma obrigação natural.
3ª- Os AA. na p.i. limitaram-se a pedir a condenação da R. no pagamento de uma indemnização no valor de 79.125.766$00, a título de perda do direito à vida da falecida, utilizando, para o efeito, a fórmula da cálculo própria dos danos patrimoniais, sendo que o dano de morte deve ser valorado como um dano moral, correspondente à perda do direito à vida de alguém.
4ª- Constitui pressuposto do direito de indemnização invocado pelos AA., a alegação e prova da necessidade de alimentos.
5ª- Não tem cabimento o pagamento de indemnização pela perda de direito a alimentos quando não se formula tal pedido na petição, nem se articula a esse propósito, qualquer factualidade e quando não são previsíveis com segurança bastante nos pretensos danos futuros, que com tal indemnização se visa compensar, por não poder prever-se se os lesados herdeiros da vítima poderão vir a carecer de alimentos.
6ª- Cada um dos apelados, menores, tem o seu pai, com quem vive e que, legalmente, deve prover ao seu sustento e exercer o poder paternal quanto a eles ( arts. 1878º e 1901º do C.Civil ).
7ª- Nenhum desses pais veio alegar qualquer facto relevante demonstrativo da prestação de alimentos aos filhos, por parte da falecida, nem quanto à efectiva necessidade dos mesmos por parte destes em ordem a compensá-los dessa efectiva perda.
8ª- Do mesmo modo nada disseram quanto ao impacto que a morte da falecida tem na sua própria vida económica enquanto pais, uma vez que, em rigor, são eles que exercem o poder paternal dos filhos que sustentam.
9ª- Na sentença conheceu-se de uma questão - direito de alimentos - de que se não podia ter conhecido, por falta de alegação de factos pelos apelados, sendo assim a sentença nula, nos termos do art. 668º nº 1 al. d) do C.P.Civil.
10ª- Para quando assim se não entenda, a sentença violou o disposto nos arts. 264º e 664º do C.P.Civil. 342º, 495º nº 3, 562º, 564º, 566º, 1880º e 1575º do C.Civil e violou ainda a jurisprudência pacífica em matéria de fixação de direito a alimentos e alegação dos respectivos factos constitutivos.
Termos em que deve a sentença recorrida ser parcialmente revogada e substituída por outra que absolva o apelante do pagamento de indemnização por danos patrimoniais futuros.
1-9- Os apelados responderam a estas alegações, sustentando não provimento do recurso e a confirmação da sentença recorrida.
Corridos os vistos legais, há que apreciar e decidir.
II- Fundamentação:
2-1- Dado que a matéria de facto dada como assente na 1ª instância não foi objecto de impugnação, nem vemos que haja qualquer motivo para a alterar, de harmonia com o disposto no art. 713º nº 6 do C.P.Civil, remete-se para os termos da decisão proferida na 1ª instância sobre essa matéria.
2-2- Como se vê pelo teor das alegações de recurso, a apelante apenas coloca em dúvida os montantes, de 100.000 Euros em que a sentença a condenou por danos patrimoniais a cada um dos lesados, e de 20.000 Euros a título de danos morais próprios da vítima, correspondentes ao dano morte propriamente dito e ao sofrimento da própria vítima, entre o momento da morte e aquela em que veio da falecer.
Como ponto prévio, diremos que em relação a este aspecto nas doutas alegações e sobretudo nas conclusões nada se contrapõe, no sentido da impugnação do sustentado e decidido na douta sentença recorrida. Apenas no preâmbulo das alegações se refere genericamente e quanto ao objecto do recurso que “a apelante ... põe em crise a douta sentença em que a condenou a pagar aos apelados uma indemnização ... de E 20.000 a título de título de danos morais próprios da vítima, correspondentes ao dano morte propriamente dito e ao sofrimento da própria vítima, entre o momento da morte e aquela em que veio da falecer”, nada se desenvolvendo depois sobre tal problemática. Daí e sabendo-se que o âmbito objectivos dos recursos é balizado pelas conclusões apresentadas pelo recorrente, não tendo este apresentado qualquer conclusão sobre o assunto, estamos impedidos de conhecer da questão ( arts. 690º nº1 e 684º nº 3 do C.P.Civil ).
Fica-nos portanto a apreciação e decisão sobre a indemnização fixada pelo tribunal a quo a cada um dos lesados, em relação ao montante de 100.000 Euros por danos patrimoniais.
Compulsando a douta sentença recorrida verifica-se que aí se refere sobre a questão que “a morte da mãe dos AA. determinou um dano patrimonial traduzido na privação dos proventos que esta auferia da sua actividade profissional e com os quais poderia contribuir para o sustento, educação e formação dos filhos. Conhecido o rendimento mensal da vítima e a sua idade, deverão esses prejuízos ser avaliados tendo em atenção «a multiplicidade e especificidade das circunstâncias que concorrem no caso e o tornarão único e diferente ... Uma vez que o julgador não está vinculado a seguir qualquer método especial para a determinação do montante da indemnização devida pelos prejuízos sofridos em virtude do rendimento perdido, «o que parece razoável é que se atribua ao lesado uma quantia que elimine aquela perda; é que fazendo-se isso, restituir-se-á o lesado à sua situação anterior - art. 562º, C.C. Pode alcançar-se esse objectivo se se atribuir ao lesado uma quantia em dinheiro que produza rendimento (fixo) mensal perdido mas que, ao mesmo tempo, lhe não propicie um enriquecimento injustificado à custa do lesante, isto é: é necessário que, na data final do período considerado, se ache esgotada a quantia atribuída. Conseguir-se-á isso se as prestações mensais - que serão sempre iguais - forem constituídas quer por rendimentos produzidos pela quantia atribuída ( juros ), quer pela sucessiva e progressiva amortização desta»...”. Assim entendeu-se adequado fixar a indemnização em 200.000 Euros, atribuída, a cada um dos filhos, na proporção de metade.
Quer isto dizer que a douta sentença recorrida atribuiu esta indemnização a cada um dos filhos da falecida, em virtude da privação dos proventos que ela auferia da sua actividade profissional e com os quais poderia contribuir para o sustento, educação e formação dos filhos, tendo-se considerado, como utensílio capaz à fixação da indemnização nesse âmbito, o critério matemático/científico a que tem recorrido a jurisprudência ( com o carácter meramente indicativo - entre outros Ac. do STJ. de 6-7-00, Col. Jur. 2000, II, 144 - ).
A este entendimento contrapõe a apelante que os apelados não alegaram nem provaram os factos constitutivos do seu direito de alimentos nem que a vítima lhos vinha prestando antes do acidente ( 1ª parte do art. 495º nº 3 do C.Civil ), o que era necessário para que a respectiva indemnização lhes fosse atribuída. Não foi alegado e muito menos provado que a vítima prestava alimentos aos apelados, nos termos da 2ª parte do art. 495º nº 3, ou seja, ao abrigo de uma obrigação natural. Constitui pressuposto do direito de indemnização invocado pelos AA., a alegação e prova da necessidade de alimentos. Não tem cabimento o pagamento de indemnização pela perda de direito a alimentos quando não se formula tal pedido na petição, nem se articula a esse propósito, qualquer factualidade e quando não são previsíveis com segurança bastante nos pretensos danos futuros, que com tal indemnização se visa compensar, por não poder prever-se se os lesados herdeiros da vítima poderão vir a carecer de alimentos. Cada um dos apelados, menores, tem o seu pai, com quem vive e que, legalmente, deve prover ao seu sustento e exercer o poder paternal quanto a eles ( arts. 1878º e 1901º do C.Civil. Nenhum desses pais veio alegar qualquer facto relevante demonstrativo da prestação de alimentos aos filhos, por parte da falecida, nem quanto à efectiva necessidade dos mesmos por parte destes em ordem a compensá-los dessa efectiva perda. Do mesmo modo nada disseram quanto ao impacto que a morte da falecida tem na sua própria vida económica enquanto pais, uma vez que, em rigor, são eles que exercem o poder paternal dos filhos que sustentam.
Significa isto que a apelante sustenta por um lado, que os apelados não alegaram nem provaram os factos constitutivos do seu direito de alimentos e pelo outro que não provaram a sua necessidade de alimentos, sendo certo que cada um deles, menores, tem o seu pai, com quem vive e que, legalmente, deve prover ao seu sustento e exercer o poder paternal. Daí que não seja devida a atribuição de indemnização neste âmbito.
Vejamos:
Está em causa a fixação de uma indemnização no tocante a danos futuros /lucros cessantes por banda dos lesados, em virtude de terem ficado, em razão do acidente de viação dos autos, privados da sua mãe.
Como princípio geral estabelece o art. 563º do C.Civil ( diploma de que serão as disposições a referir sem menção de origem ) que “a obrigação de indemnizar só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”.
Por sua vez refere o art. 564º 1 “o dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão”. Acrescenta o nº 2 da disposição que “na fixação da indemnização pode o tribunal atender aos danos futuros, desde que previsíveis; se não forem determináveis, a fixação da indemnização correspondente será remetida para decisão ulterior”.
Portanto no que toca aos danos futuros, o tribunal deve fixar uma indemnização desde que os mesmos sejam previsíveis.
Essa fixação deve ser feita, de harmonia com o disposto no art. 566º nº 3 que estabelece que “se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados”.
Claro que em relação ao valor dos danos futuros, o valor exacto dos prejuízos será impossível de determinar, dado que é impossível adivinhar o amanhã. Por isso, nos termos desta disposição, a fixação da respectiva indemnização deve fazer-se através da equidade. Significa isto que a indemnização deve fixar-se atendendo ao bom senso, à justa medida das coisas, enfim ao que se afigurar razoável face às circunstâncias concretas apuradas. Como se refere no Ac. do STJ de 10-2-98 ( Col. Jur. STJ, 1998, I, 65) “a equidade é a justiça do caso concreto, flexível, humana, independente de critérios normativos fixados na lei, devendo o julgador ter em conta as regras de boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida”.
Existirão, no caso vertente, danos patrimoniais futuros ? E em caso afirmativo qual o montante em que devem ser fixados ?
Eis as questões que nos são colocadas para apreciação e decisão.
O acidente dos autos ocorreu em 22-5-99, sendo que na altura o A. A tinha 14 anos de idade ( nasceu a 30-9-84 - doc. de fls 28 -) e a interveniente D 7 anos de idade ( nasceu a 23-8-91 - doc. de fls.316 - ).
Quer isto dizer que ambos eram de menoridade. Evidentemente que, dada a sua idade, teriam que lhes ser prestados alimentos, consistindo estes em “tudo o que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário”, neles se compreendendo também, dada a sua qualidade de menores “ a instrução e educação do alimentado” ( art. 2003º nº 1 ). E quem estão vinculados à obrigação de prestarem alimentos, não existindo, obviamente, cônjuges e descendentes, são os ascendentes, nos termos do art. 2009º al.c).
Significa isto que a mãe dos apelados, estava legalmente adstrita ao pagamento de prestações alimentícias a seus filhos. Estas prestações perdurariam durante a sua menoridade e poderiam manter-se durante a maioridade, até os filhos haverem completado a sua formação profissional ( art. 1880º ).
Dado que os menores podiam exigir alimentos de sua mãe, a infeliz vítima do acidente, é evidente que o pressuposto de legitimidade para a exigência de indemnização por parte dos menores e a que se refere o art. 495º nº 3 se encontra preenchido.
Claro que faltando a mãe, o direito dos menores a alimentos em relação a ela, extinguiu-se, donde resulta que sofreram prejuízos patrimoniais.
É certo que nas suas petições os ora apelados não arquitectaram o pedido de indemnização por danos patrimoniais, através deste ponto de vista. Porém porque se trata de uma evidente aplicação de regras de direito, aliada a factos notórios ( como pessoas de 7 e 14 anos necessitarem de alimentos ), o tribunal para fixar uma indemnização nestes contornos, não necessita de alegação de factos nesse sentido ( arts. 664º e 514º nº 1 do C.P.Civil ). Por esta mesma razão, contra o que sustenta o apelante, a sentença recorrida não é nula por excesso de pronúncia.
Quanto à alegada, pela apelante, falta de prova da necessidade de alimentos por banda dos menores lesados, diremos que, resulta dos documentos de fls. 28 e de 316 ( fotocópias dos assentos de nascimento dos mesmos ), documentos que não foram impugnados e que, de harmonia com os arts. 646º nº 4 e 659º nº 3 do dito C.P.Civil, o tribunal deve ter em conta, os menores, em virtude de regulação do poder paternal, foram judicialmente entregues à mãe, donde resulta que seria esta quem deveria providenciar pelos seus alimentos, de acordo com as disposições combinadas dos arts. 1909º e 1905º.
Portanto, a nosso ver, incumbindo à mãe, nos termos legais, a obrigação de providenciar pelos alimentos dos filhos e estando provado nos autos que ela auferia rendimentos pelo seu desempenho profissional, é evidente que os menores, ao ser-lhes subtraída a fonte de rendimento derivada da mãe, sofreram patentes danos.
Mas mesmo que assim não fosse e os menores estivessem judicialmente a cargo dos seus pais e não da mãe, ainda assim, auferindo esta rendimentos, sofreriam igualmente prejuízos, pois a partir da morte dela, passaram a ficar dependentes de apenas uma só fonte de rendimento, quando antes tinham duas, da mãe e do pai.
Claro que isto é absolutamente teórico, porque, na prática, a vida dos menores, sob o ponto de vista de alimentos, pode não ter sofrido qualquer alteração qualitativa em virtude do decesso da mãe. Tudo está das possibilidades económicas dos pais. Mas é claro que, por falta de elementos, não poderemos partir desse pressuposto. E uma coisa é certa. Enquanto a mãe foi viva, os apelados tinham, como já se assinalou, duas fontes de rendimento em relação aos seus alimentos. A da mãe e do pai. Extinguindo-se aquela fonte, em virtude do evento dos autos, somos em crer que não poderemos fugir à conclusão que, em virtude da morte da mãe, os apelados padeceram prejuízos patrimoniais.
Questão diversa será a de se saber em que quantia se concretizarão estes danos.
Não é uma resposta fácil de dar, pois, como se disse acima, o valor exacto dos prejuízos será impraticável de determinar, dado que é impossível adivinhar o amanhã.
Entendemos porém dever aqui distinguir os apelados, dada a idade diferente de cada um deles. É que perdurando, como se viu acima, os alimentos até se completar a formação profissional, é claro que a medida deles será maior em relação ao filho mais novo, isto é, em relação à interveniente D e menor em relação ao filho mais velho, o A. A.
Consideramos, neste âmbito, ficcionar a idade do terminus da formação profissional, por nos parecer razoável, em 23 anos.
Quer isto dizer que em relação ao A e à D a mãe ainda deveria contribuir com alimentos, respectivamente, durante cerca de 9 e 16 anos.
Atendendo aos proventos que a vitima auferia à data do acidente (vencimento não inferior a 200.000$00 ) e atendendo que ambos os menores tinham também pais vivos ( que igualmente tinham obrigação de contribuir com alimentos para eles ), somos em crer que, para efeitos de cálculos de alimentos, uma quantia à volta de 30.0000$00 mensais ( 150 Euros ), se revela adequada, o que dará para o A e para a D até atingirem os mencionados 23 anos, os montantes globais de 16.200 e de 28.800 Euros, respectivamente, quantias que reputamos ajustadas.
Portanto quanto a uma indemnização por danos patrimoniais em virtude da morte da mãe e por, em consequência, terem deixado de poder receber dela alimentos, os lesados terão direito a receber da R. Seguradora, o A. A, a quantia de 16.200 Euros e a interveniente D, o montante de 28.800 Euros.
Mas, a nosso ver, os menores lesados tiveram ainda mais prejuízos patrimoniais.
Com efeito, a sua mãe, quando foi subtraída à vida, auferia um vencimento que consideramos razoável, face à mediania da vida social e económica portuguesa. Tinha apenas 37 anos de idade, pelo que tinha à sua frente um período de vida activa de cerca de 23 anos ( até aos 70 anos de idade ). Ou seja, a vítima tinha uma capacidade de ganho que se prolongaria por período de dilatado tempo que, com o acidente dos autos e consequente morte, terminou. É de supor, por tal ser normal, que uma pessoa durante a vida activa adquira bens duradoiros, tais como casa, automóvel, principalmente se tiver uma fonte de rendimento que lhe permita aforrar algo, ou seja, que lhe dê para pôr algum dinheiro de lado para adquirir bens ou para simplesmente o amealhar. Claro que com este acumular de bens, os filhos iriam, por via de herança futura, beneficiar dessa situação. Tendo falecido a mãe, é evidente que os lesados deixaram de poder contar com o benefício que sua capacidade de ganho lhes poderia, no futuro, proporcionar. Daí que também por este prisma, a nosso ver, tenham sofrido prejuízos patrimoniais.
Estes, partindo do pressuposto de um aforro na ordem dos 350 Euros por mês ( o que até poderá pecar por defeito em virtude de uma existir um óbvio incremento nos rendimentos, à medida que uma pessoa se vai «instalando» na vida profissional ) e atendendo, ao período de vida activa mencionado e numa possível existência de cerca de 80 anos ( o que é absolutamente razoável, visto que a esperança de vida das mulheres já hoje se aproxima dessa bitola, aceitando-se, porém, que após a vida activa haja uma diminuição no aforro ) estimamos o respectivo pecúlio em cerca de 110.000 Euros.
Nesta conformidade afigura-se-nos razoável que cada um dos filhos da vítima venha a receber 55.000 Euros de indemnização neste âmbito.
Significa isto que o A. A deverá receber, como danos patrimoniais, a quantia global de 71.200 Euros ( 16.200 + 55.000 ) e a interveniente D o montante global de 83.800 Euros ( 28.800 Euros + 55.000 ).
Claro que a estas quantias acrescerão as outras indicadas na douta sentença recorrida não colocadas em causa no presente recurso e fixadas a título de danos patrimoniais ( relativos ao funeral ) e de danos não patrimoniais, a que acrescerão os juros moratórios nos termos aí decididos ( desde a citação em relação a 785, 45 Euros e desde a data da sentença em relação ao restante da indemnização ).
Para terminar uma simples nota em relação ao cálculo que se fez na sentença recorrida em relação aos danos patrimoniais e que, a nosso ver, não é, no caso, aceitável. Com efeito, considerou-se para fixação da indemnização nesse âmbito, o critério matemático/científico a que tem recorrido a jurisprudência. Mas este critério diz respeito ao danos futuros do próprio lesado/vítima, derivados da diminuição da sua capacidade de ganho, situação que se não verifica aqui, visto que não é a diminuição dessa capacidade de ganho da vítima que está aqui em causa, mas sim o prejuízos que os apelados, filhos da vítima, sofreram em virtude de uma fonte de rendimento a que tinham legalmente direito ( derivada da capacidade de ganho da mãe ) se ter extinguido.
III- Decisão:
Por tudo o exposto dá-se parcial provimento ao recurso, pelo que se revoga parcialmente a douta sentença recorrida, fixando-se os danos patrimoniais mencionados em 71.200 Euros para o A. A e em 83.800 Euros para a interveniente D.
No resto, designadamente em relação às outras indemnizações fixadas, mantém-se o aresto recorrido.
Custas pela apelante e apelados, na acção, na proporção do respectivo vencimento e, na apelação, na proporção de metade para cada uma.