Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | GARCIA CALEJO | ||
Descritores: | CONTRATO-PROMESSA DE COMPRA E VENDA INCUMPRIMENTO DO CONTRATO INDEMNIZAÇÃO JUROS DE MORA | ||
Data do Acordão: | 04/05/2005 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | TRIBUNAL JUDICIAL DE COIMBRA - VARA MISTA | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Legislação Nacional: | ARTº 442º, NºS 2 E 4, DO C. CIV. . | ||
Sumário: | I – Nos termos do nº 4 do artº 442º do C. Civ., na ausência de estipulação em contrário, não há lugar pelo não cumprimento do contrato, a qualquer outra indemnização, nos casos de perda do sinal ou de pagamento do dobro deste . II – Todavia, deve entender-se que, para além do sinal em dobro, é também exigível o pagamento de juros moratórios no caso de ter sido retardada a realização da prestação pecuniária, tendo existido interpelação para o seu pagamento . | ||
Decisão Texto Integral: | 13 Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I- Relatório: 1-1- A..., residente em Senhor das Almas-Oliveira do Hospital, propõe contra B... e mulher C..., a presente acção declarativa de condenação com processo comum sob a forma ordinária, pedindo a condenação destes no pagamento de 14.963,94 euros a título de restituição em dobro do sinal prestado por si ( relativamente ao contrato de promessa que indica ), acrescido de juros. Fundamenta a acção no facto de ter celebrado com os RR. um contrato promessa de compra e venda de imóvel ( que referencia ), por força do qual lhes entregou a quantia de 7.481,97 euros, a título de sinal e princípio de pagamento, sendo que o mesmo contrato se mostra definitivamente incumprido, por culpa deles, RR.. 1-2- Os RR. contestaram, referindo, também em síntese, que o incumprimento do contrato não existe, mas apenas mora do cumprimento, uma vez que não é de sua culpa a demora da viabilidade da construção exigida pelo contrato. 1-3- O A. respondeu à contestação, mantendo a posição assumida na p.i., sustentando ainda que os RR. litigam de má fé, pelo que pediu a sua condenação em multa e indemnização condigna. 1-4- O processo seguiu os seus regulares termos posteriores, tendo-se proferido despacho saneador, após o que se fixaram os factos assentes, se elaborou a base instrutória, se realizou a audiência de discussão e julgamento, se respondeu ao questionário e se proferiu a sentença. 1-5- Nesta considerou-se procedente por provada a acção e, em consequência, condenou-se os RR. no pagamento ao A. da quantia de 14.963,94 euros (catorze mil novecentos e sessenta e três euros e noventa e quatro cêntimos ), acrescida de juros, à taxa legal, desde a citação e até integral pagamento. Mais de condenaram os RR., como litigantes de má fé, no pagamento de 20 Ucs. de multa. 1-6- Não se conformando com esta sentença, dela vieram recorrer os RR., recurso que foi admitido como apelação e com efeito devolutivo. 1-7- Os recorrentes alegaram, tendo dessas alegações retirado as seguintes conclusões que se resumem: 1ª- O quesito 3º deve ter uma resposta negativa, ou quanto muito, uma redacção modificada. 2ª- O quesito 4º não deveria ter sido formulado, pois contém meras conclusões, sendo que a sê-lo, como o foi, o mesmo deveria ter tido resposta negativa. 3ª- No que diz respeito à matéria do incumprimento, a douta sentença faz errada aplicação das normas dos artigos 442º nº 2 e 808º do Código Civil, visto que, se é verdade que os RR. se encontram em mora, não se encontram demonstrados nos autos, nem sequer foi feita a necessária alegação, os restantes requisitos do artigo 808º nº 1 do Código Civil, isto é, perda do interesse do A. na prestação ou a fixação de prazo para cumprir, na modalidade de interpelação admonitória, pelo que não existe incumprimento definitivo, não sendo, por isso, aplicável o nº 2 do artigo 442º na parte em que estipula a devolução do sinal em dobro. 4ª- Igualmente, a douta sentença, não poderia ter condenado os RR. no pagamento de juros, tendo violado, assim, o disposto no nº 4 do artigo 442º do Código Civil, por força do disposto no artigo 806º do mesmo diploma legal. 5ª- Não se pode condenar os Réus como litigantes de má-fé, pois sempre disseram que querem cumprir com o contrato, o que não aconteceria se afirmassem que não o queriam cumprir e não pusessem à disposição do A. o dinheiro que receberam. Termos em que a sentença, deve ser revogada, por violação das disposições legais acima citadas, devendo ser substituída por outra que atenda a posição assumida pelos RR. nos presentes autos nos termos acima expostos. 1-8- A parte contrária não respondeu a estas alegações. Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir: II- Fundamentação: 2-1- Uma vez que o âmbito objectivos dos recursos é balizado pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes, apreciaremos apenas as questões que ali foram enunciadas ( arts. 690º nº1 e 684º nº 3 do C.P.Civil ). 2-2- Após as respostas à matéria de facto da base instrutória, ficaram assentes os seguintes factos: a) No dia 4 de Junho de 2001, o A. celebrou com os RR. um contrato promessa de compra e venda, cujo teor consta do documento nº 1. b) Os RR. prometeram vender ao A. um prédio rústico sito em Natas, freguesia de Cernache, com a área de 5.008 m2, inscrito na respectiva matriz predial rústica sob o n° 3.149, não descrito na Conservatória do Registo Predial de Coimbra, nos termos do clausulado do contrato promessa celebrado. c) Pretendia o A. adquirir tal imóvel para lá construir a sua casa de habitação, com recurso a crédito bancário, factos estes de que deu conhecimento aos RR.. d) Nos termos do referido contrato ficou expresso que os RR. assumiram o compromisso de registar o prédio objecto do contrato na respectiva Conservatória do Registo Predial. e) Assim como, assumiram o compromisso de entregar ao A. a viabilidade oficializada pela Câmara Municipal de Coimbra da área de construção no referido imóvel, no mínimo de 250 m2 de construção urbana. f) Tudo isto necessário à formalização do contrato prometido e à obtenção de crédito bancário ( cfr. parte final da cláusula 4 do contrato ). g) Ainda nos termos do contratado entre as partes, ficou estipulado que a escritura pública de compra e venda seria realizada no prazo de 120 dias a contar da celebração do contrato promessa ( cfr. alínea b) da cláusula 3° do contrato). h) Na tentativa de viabilizar o contrato promessa, no passado dia 26 de Março último, o A. notificou os RR. da marcação da escritura pública de compra e venda, bem como para proceder à entrega de todos os documentos necessários à preparação e formalização da escritura referente ao contrato prometido ( doc. 4 ). i) No dia 23/1/03 os RR. não tinham ainda procedido ao registo do imóvel na Conservatória do Registo Predial de Coimbra como se tinham vinculado por escrito. j) A Câmara Municipal de Coimbra, informou o R. José Oliveira Correia, por ofício datado de 7/3/01, que o terreno em causa se insere em Zona Agrícola, A, incluído parcialmente em zona de Reserva Ecológica Nacional, REN e incluído em Zona de Reserva Agrícola Nacional, RAN, onde não é viável a ocupação urbana. l) Os RR. não obtiveram viabilidade oficializada pela Câmara Municipal de Coimbra para a construção de, pelo menos, 250m2. m) A viabilidade de construção não depende da exclusiva vontade dos RR.. n) Tudo documentos ( o registo de inscrição predial e a viabilidade de construção da Câmara Municipal ) necessários para instruir quer a escritura notarial quer o processo de crédito bancário, os RR. não obtiveram. o) O A. tomou agora conhecimento que, aquando da celebração do contrato promessa em referência, os RR. tinham perfeito e cabal conhecimento de que no imóvel prometido vender, não era viável a ocupação urbana. p) Outorgaram, pois, os RR. o contrato em causa com a plena consciência que o mesmo jamais seria cumprido por ser inviável, pretendendo tão somente apropriar-se dolosa e ilegitimamente do quantitativo monetário pago pelo A. a título de sinal.----- 2-3- Na apelação os apelantes começam por se insurgir com a resposta dada ao quesito 3º, entendendo que o mesmo deve ter uma resposta negativa. No quesito 3º perguntava-se se “o A. tomou agora conhecimento que, aquando da celebração do contrato promessa em referência, os RR. tinham perfeito e cabal conhecimento de que no imóvel prometido vender, não era viável a ocupação urbana”. Ao quesito foi dada resposta positiva. O Mº Juiz justificou a resposta a este quesito, através dos depoimentos das testemunhas a ele indicadas e ainda com os documentos de fls. 40 a 50, 11 e 12. Segundo os apelantes, analisando o depoimento das quatro testemunhas ouvidas, a nenhuma delas foi dirigida directamente a pergunta inscrita no quesito. E mesmo as várias perguntas que foram efectuadas à volta do assunto, não obtiveram qualquer resposta que pudessem, por si ou relacionadas, conduzir à resposta positiva do quesito. Daí que, no seu entender, exista falta ou insuficiência da prova testemunhal em relação à resposta positiva do quesito. No que toca à prova documental, os documentos de fls. 11 e 12, nada dizem sobre esta questão. No documento de fls. 40 ( emitido pela Câmara Municipal de Coimbra ) certifica-se que o terreno em questão, insere-se em Zona Agrícola A, incluindo parcialmente em zona de Reserva Ecológica Nacional e incluindo em Zona de Reserva Agrícola Nacional, onde não é viável a ocupação urbana. Acrescentam que é verdade que, o ofício onde tal informação se insere tem a data de 07.03.01. Mas nada consta sobre a data em que os RR. tomaram conhecimento de tal informação, razão por que não se pode afirmar que os RR. já tinham conhecimento da inviabilidade da construção urbana, na data em que celebraram o contrato-promessa. Mas mesmo admitindo que já tinham conhecimento da informação que consta do documento de fls. 40, não se pode afirmar, como se faz na resposta ao quesito, que os RR. tinham perfeito e cabal conhecimento de que no imóvel prometido vender não era viável a ocupação urbana. E isto porque, de acordo com os documentos de fls. 40 a 50, a ocupação é viável, mediante determinadas condicionantes, condicionantes essas exigidas pela RAN e pela REN, conforme se alcança de uma leitura atenta do conteúdo de tais documentos. Se o pedido de construção tivesse sido instruído com os pareceres positivos da REN e da RAN e os mesmos pareceres, a terem sido solicitados, teriam que ser positivos, desde que observadas as condicionantes à ocupação urbana naquelas reservas e já a Câmara Municipal de Coimbra não emitiria o parecer de inviabilidade de construção. Daí que seja lícito afirmar que os RR. tinham conhecimento do documento de fls. 40, mas já não se pode afirmar que os RR. tinham cabal conhecimento, antes ou na altura da celebração do contrato-promessa, de que no imóvel prometido vender não era viável a ocupação urbana. Pese embora se reconheça algum mérito no raciocínio dos apelantes, o certo é que a sua posição não pode deixar de ser considerada insubsistente. O contrato promessa em questão e que fundamenta a presente acção, foi celebrado pelos A. e RR. em 4-6-2001. Dele consta, como se viu, que os RR. assumiram o compromisso de entregar ao A. a viabilidade oficializada pela Câmara Municipal de Coimbra da área de construção no referido imóvel, no mínimo de 250 m2 de construção urbana. Ora, nessa data, já tinha sido emitido, pela Câmara Municipal de Coimbra, o documento de fls.41, dirigido ao A. marido ( na sequência de requerimento efectuado pelo mesmo -fls 48-) informando que “o terreno indicado ( em causa nos autos ) insere-se na Zona Agrícola, A, incluído parcialmente em zona de Reserva Ecológica Nacional, REN e incluído em Zona de Reserva Agrícola Nacional, RAN, onde não é viável a ocupação urbana”. Esta comunicação foi emitida em 7-3-2001, ou seja cerca de três meses antes da realização do contrato promessa. Dizem os apelantes que nada consta sobre a data em que eles ( RR. ) tomaram conhecimento de tal informação, querendo assim desdizer o perguntado no quesito. Esta posição é, no mínimo, insólita, já que por um lado e sob o ponto de vista processual, os RR. aceitaram o conteúdo do documento ao serem dele notificado, limitando-se a dizer que continuavam convencidos que era possível no prédio a construção urbana e que o parecer da Câmara Municipal de Coimbra não é definitivo, porquanto faltam os pareceres da RAN e da REN ( fls. 51 ). Não demonstraram surpresa sobre o seu assunto, denunciando antes terem pleno conhecimento desse mesmo conteúdo. Pelo outro lado, por presunção natural, é de admitir que um ofício/informação dirigido a uma pessoa, na sequência de um requerimento feito por essa mesma pessoa, seja pela mesma recebido e conhecido. Evidentemente que uma pessoa que dirige um pedido de informação a uma entidade pública, estará atenta e demandará a resposta ao seu requerimento, no mais curto prazo possível. Isto será o natural ou normal. Qualquer saída desta normalidade, demandará, por parte do interessado, a prova do contrário. Por isso, não nos parece crível ou sustentável que o interessado, A. marido e, concominantemente a sua mulher, não pudessem ter conhecimento do teor de tal ofício na data da celebração do contrato promessa. De resto, ficou demonstrado, sem reacção por parte dos RR., na al. J) da Factos Assentes, que a Câmara Municipal de Coimbra, procedeu à informação em causa, ao R. marido, através do dito ofício ( datado de 7/3/01 ). Nesta conformidade e sem qualquer dúvida considerável, tem que se ter como indiciado que os RR. tiveram conhecimento, algum tempo antes da realização do contrato de promessa a que se referem estes autos e segundo informação da dita Câmara Municipal, da inviabilidade de construção no terreno. Sustentam depois os apelantes que, mesmo admitindo que já tinham conhecimento da informação em causa, ainda assim se não poderia afirmar, como se faz na resposta ao quesito, que os RR. tinham perfeito e cabal conhecimento de que no imóvel prometido vender não era viável a ocupação urbana. E isto porque, de acordo com os documentos de fls. 40 a 50, a ocupação é viável, mediante determinadas condicionantes, condicionantes essas exigidas pela RAN e pela REN, conforme se alcança de uma leitura atenta do conteúdo de tais documentos. A afirmação de que a ocupação urbana é ( ainda ) viável, no terreno em causa, não passa de mera afirmação dos apelantes, sem qualquer comprovação nos autos. Mais, esta posição dos RR. é até nova, como iremos ver. Somos em crer que qualquer pessoa de boa fé, tendo conhecimento da dita informação da Câmara Municipal, não deveria negociar o terreno para fins de construção. Se entendia que, pese embora a informação desta entidade, a construção no terreno era ainda possível, através de pareceres positivos da RAN e da REN, então deveria não só mencionar isso ao comprador ( razões de ordem de lealdade e probidade assim o exigiam - art. 227º do C.Civil - ), como sobretudo deveria ter alegado isso mesmo ( com vista à pertinente demonstração ) na contestação. Ora nada disto alegaram os RR. na contestação, tendo-se ficado com a alegação genérica e diferente de que “estão convencidos de que no seu prédio é possível a construção urbana, porquanto as respectivas infra-estruturas continuam a ser realizadas, nomeadamente a rede urbana de abastecimento de água” ( art. 9º da contestação ). Ou seja, nos articulados os RR. fundamentaram o seu convencimento de possibilidade de construção urbana no terreno, por causa de continuarem aí a ser realizadas infra-estruturas, concretamente a rede urbana de abastecimento de água. Agora, em sede de recurso, defendem que o seu convencimento se alicerçou no facto de, com o parecer positivo das ditas entidades, ser ainda possível a construção no terreno. Claro que não podemos aceitar esta nova posição dos recorrentes, porque foi aduzida em momento inoportuno. Fica-nos pois a posição da contestação acima dita, que é irrelevante para fundamentar qualquer convicção coerente, posto que existiu, com conhecimento dos RR., aquele oficio da Câmara Municipal de Coimbra em que claramente se referenciou não ser possível a construção no terreno em causa. Assim, somos em crer que, na realidade, os RR. aquando da realização do contrato promessa, não poderiam ignorar que no seu terreno não poderiam erigir construção, pelo que o perfeito e cabal conhecimento pelos RR. sobre o assunto dado como assente no quesito em causa, se justificou plenamente. De resto, tudo isto é irrelevante para o desfecho da acção, como iremos ver. Pese embora esta circunstância, debruçámo-nos sobre a questão porque o assunto tem a ver ( mais ) com a condenação dos RR. como litigantes de má fé. Com a resposta ao quesito ficou assente que o A. tomou conhecimento que, aquando da celebração do contrato promessa em referência, os RR. tinham perfeito e cabal conhecimento de que no imóvel prometido vender, não era viável a ocupação urbana. Este conhecimento é irrelevante para a decisão da causa, pois o mesmo não respeita, obviamente, ao cumprimento ou não cumprimento do contrato. Na douta sentença recorrida decidiu-se e bem que os RR. não cumpriram o contrato promessa, pois não celebraram o contrato definitivo. E não celebraram este porque não cumpriram cláusula 4ª daquele contrato ( segundo a qual lhes incumbia, como promitentes vendedores, obter o registo na Conservatória Predial do imóvel e obter a viabilização de construção no mesmo ). Não cumpriram nem podem cumprir tal cláusula, pois a inviabilidade de construção no terreno tem que se ter como assente. Note-se aqui que, perante o conteúdo do ofício da Câmara Municipal indicado, os RR. nada de substancial alegaram no sentido de contrariarem a apregoada impossibilidade de construção no terreno ( limitaram-se a dizer, como já se mencionou, que continuam convencidos de que no seu prédio é possível a construção urbana, em virtude das infra-estruturas realizadas, convicção que, sem a alegação de qualquer outro elemento factual conveniente, é obviamente irrelevante para contrariar a afirmada impossibilidade de construção ). Verificou-se pois a impossibilidade definitiva do cumprimento do contrato, com as consequências decididas na sentença recorrida, nos termos dos arts. 801º nº 1 e 442º nº 2 do C.Civil ). Em relação a este aspecto, os apelantes argumentam no sentido de não aplicação ao caso do disposto no art. 808º nº 1 do C.Civil. Entendemos aplicar ao caso, não o dispositivo do art. 808º nº 1, mas sim o disposto no art. 801º nº 1, já que o que existe aqui, na verdade, é um caso de incumprimento impossível da prestação, por causa imputável aos RR.. Claro que os apelantes argumentam ( se bem que não expressamente ) que o cumprimento não é impossível, visto que a construção no terreno é ainda possível ( através de pareceres positivos da RAN e da REN ). Simplesmente, como se disse acima, por falta de alegação dessa factualidade, não puderam essas circunstâncias ser provadas. Fica-nos apenas e só a dita informação da Câmara Municipal que nos leva a ter de concluir que a construção no terreno é inviável e assim retirar a conclusão de incumprimento do contrato. Evidentemente que e contra o que sustentam os apelantes, a culpa pelo não cumprimento do contrato só aos RR, é imputável. É que estes vincularam-se à dita prestação, que não cumpriram. Tendo conhecimento do teor do ofício da Câmara Municipal referenciado, nunca se deveriam ter obrigado a tal prestação. Ao fazerem-no, e não cumprindo essa obrigação, sujeitaram-se às sanções derivadas do não cumprimento do contrato. Defendem ainda os apelantes que o quesito 4º não deveria ter sido formulado, pois contém meras conclusões, sendo que a sê-lo, como o foi, o mesmo deveria ter tido resposta negativa. Este quesito é constituído, na realidade, uma vertente conclusiva contendo, também, uma afirmação de uma aspiração genérica sem concretização factual. Como na base instrutória só devem ser introduzidos factos ( art. 511º nº 1 do C.P.Civil ), deve dar-se sem efeito a matéria do quesito. Porém, como a respectiva materialidade é ( patentemente ) irrelevante para a decisão da causa, esta subtracção em nada altera o desfecho da causa. Sustentam depois os apelantes que a sentença, não poderia ter condenado os RR. no pagamento de juros, tendo violado, assim, o disposto no nº 4 do artigo 442º do Código Civil, por força do disposto no artigo 806º do mesmo diploma legal. O A. pede, pelo incumprimento do contrato, o pagamento do sinal em dobro, nos termos do art. 442º nº 2 do C.Civil e ainda o pagamento de juros moratórios desde 5-9-02 até integral pagamento. Nos termos do nº 4 deste artigo, na ausência de estipulação em contrário, não há lugar pelo não cumprimento do contrato, a qualquer outra indemnização, nos casos de perda do sinal ou de pagamento do dobro deste. Todavia, deve entender-se que, para além do sinal em dobro, é também exigível o pagamento de juros moratórios no caso de ter sido retardada a realização da prestação pecuniária, tendo existido interpelação para o seu pagamento ( neste sentido Januário Gomes, Trib. Just. 48º, 7 ). É que não se vê nenhuma razão para não sancionar o faltoso ( com os juros moratórios ) no caso de não efectuar o pagamento logo que interpelado para o fazer, sendo a obrigação exigível. A não ser assim, pela demora no pagamento iria o faltoso retirar evidentes ganhos à custa do seu credor, benefícios que seriam obviamente ilegítimos. A obrigação de juros moratórios pelo retardamento do cumprimento da prestação, não se pode confundir com a obrigação ( indemnização ) de devolução de sinal em dobro a que se refere o dito art. 442º nº 2. No caso dos autos o A. alegou que interpelou os RR., em 15-9-02, para a devolução do sinal em dobro ( art. 14º da p.i. e carta de fls. 13 ). Esta matéria factual, importante para a decisão desta problemática, não foi introduzida na factualidade assente nem na base instrutória. Sucede que essa factualidade tem que se ter como assente, visto que não foi impugnada pelos RR. ( art. 490º nºs 1 e 2 do C.P.Civil ) e deve ser atendida na sentença para a decisão da causa (art. 659º nº 3 do mesmo diploma ). Temos assim assente que o A. interpelou os RR., em 15-9-02, para a devolução do sinal em dobro, pelo que, de harmonia com referenciado e de acordo com o disposto nos arts. 805º nº 1, 806º nºs 1 e 2 do C.Civil, teria direito o A. aos juros de mora, à taxa legal, desde aquela data e até integral pagamento. Sucede que na sentença apenas se condenou os RR. no pagamento desses juros mas desde a citação ( isto é, a partir de data posterior ) e até integral pagamento. Como o A. não recorreu e como nos é impedido a reformatio in pejus. mantém-se a condenação, neste âmbito, determinada na sentença recorrida. Por fim sustentam os apelantes que eles, RR., não litigaram de má fé, pois sempre disseram que querem cumprir com o contrato, o que não aconteceria se afirmassem que não o queriam cumprir e não pusessem à disposição do A. o dinheiro que receberam. Também aqui carecem os apelantes de razão. A litigância dos RR. é nitidamente de má fé. Para além da razão invocada na douta sentença recorrida ( em que se refere que os RR. deduziram oposição conhecendo bem que a situação alegada pelo A. correspondia à verdade e a sua oposição mais não era que argumento para protelar o pagamento da indemnização pelo incumprimento em que se encontravam ), diremos que tendo ficado demonstrado que os RR. tiveram conhecimento, algum tempo antes da realização do contrato de promessa e segundo informação da dita Câmara Municipal, da inviabilidade de construção no terreno, circunstância que omitiram não só quando contrataram com o A. mas também aquando elaboraram a sua contestação, os RR. não indicaram factos relevantes para a decisão da causa, de que tinham conhecimento pessoal, tendo agido com evidente culpa, culpa derivada desse mesmo conhecimento e da ausência de alegação factual correspondente. Quer isto dizer que também aqui a pretensão dos apelantes é insubsistente. A decisão recorrida, se bem que pelas razões ditas, é de manter. III- Decisão: Por tudo o exposto, nega-se provimento ao recurso confirmando a douta decisão recorrida, pelos motivos expostos. Custas pelos apelantes. |