Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
| ||
Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | FONTE RAMOS | ||
Descritores: | MODIFICABILIDADE DA DECISÃO DE FACTO CONTRATO DE SEGURO INTERPRETAÇÃO | ||
![]() | ![]() | ||
Data do Acordão: | 10/11/2022 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | JUÍZO LOCAL CÍVEL DE POMBAL DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA | ||
Texto Integral: | S | ||
![]() | ![]() | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA POR UNANIMIDADE | ||
Legislação Nacional: | ARTIGO 662.º, N.º 1, DO CPC, ARTIGOS 236.º E SEGUINTES DO CÓDIGO CIVIL, ARTIGO 37.º, N.º 1, DA LEI DO CONTRATO DE SEGURO E ARTIGOS 7.º, 10.º E 11.º DO DECRETO-LEI N.º 446/85, DE 25 DE OUTUBRO. | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário: | I - A Relação só poderá/deverá alterar a decisão de facto se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
II - O contrato de seguro é um contrato bilateral, de execução continuada, aleatório e de adesão, pelo qual uma das partes se obriga a cobrir um risco e, no caso da sua concretização, a indemnizar o segurado (ou terceiro lesado) pelos prejuízos sofridos. III - Na delimitação do objeto do contrato de seguro há que interpretar as condições gerais, especiais e particulares que o constituem e constam da apólice do contrato e, porventura, ainda, da própria proposta do seguro. IV - Na interpretação das suas cláusulas, vale o regime geral do Código Civil, com as especificidades decorrentes dos art.ºs 7º, 10º e 11º do Decreto-lei n.º 446/85, de 25 de Outubro. | ||
![]() | ![]() | ||
Decisão Texto Integral: | Relator: Fonte Ramos Adjuntos: Alberto Ruço Vítor Amaral Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:
I. Em 18.8.2020, F..., Lda., intentou a presente ação declarativa comum contra Companhia de Seguros A..., S. A., pedindo que seja condenada a pagar-lhe: a) € 25 052,80, a título de indemnização pela perda da viatura, com juros moratórios comerciais, sobre a quantia de € 24 394,99, desde 19.8.2020 até integral pagamento; b) € 19 800, a título de indemnização por danos pela paralisação do veículo, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento; c) o valor dos danos vincendos decorrentes da paralisação da viatura, à razão de € 200/por dia útil, a contar de 19.8.2020, até que seja satisfeito o pedido indicado sob a alínea a). Alegou, em síntese: nas circunstâncias indicadas na petição inicial (p. i.), ocorreu um sinistro, envolvendo um seu veículo segurado na ré, do qual resultaram danos equivalentes à sua perda total, no valor de € 25 000; em virtude do incumprimento por parte da ré dos deveres atinentes à regularização do mencionado sinistro, sofreu danos decorrentes da paralisação do veículo, no valor de € 200/dia útil. A ré contestou, alegando, em resumo, que, no âmbito do contrato celebrado com a autora se encontra excluída a cobertura de danos próprios na vertente de choque, colisão e capotamento sempre que o condutor do veículo se apresente com taxa de álcool no sangue superior ao legalmente admissível, o que sucedeu; não foi contratada a cobertura relativa a privação do uso / veículo de substituição; em face dos contornos do sinistro, justificou-se a demora na concretização da sua averiguação, inexistindo qualquer comportamento culposo da ré que implique o pagamento de indemnização a título de privação do uso, se devida. A autora deduziu incidente de ilisão de autenticidade ou da força probatória do “documento n.º 11” apresentado pela ré com a contestação (cf. fls. 123 a 126 e 138). Foi proferido despacho saneador que identificou o objeto do litígio e enunciou os temas da prova (inclusive, do incidente). Realizada a audiência de julgamento, o Mm.º Juiz do Tribunal a quo, por sentença de 29.3.2022, julgou a ação totalmente improcedente, absolvendo a Ré do pedido. Inconformada, a A. apelou formulando as seguintes conclusões: 1ª - O teor dos documentos 8 junto com a p. i. e 11 junto com a contestação, (respetivamente, participação do acidente e posterior aditamento), conjugado com os depoimentos prestados pelas testemunhas AA e BB, analisados à luz das regras da experiência não permite dar como provado o facto assente sob o ponto 32., na medida em que ficou por demonstrar que o resultado do teste à amostra de sangue colhida ao condutor correspondesse à taxa que o mesmo apresentava no momento da condução. 2ª - O julgamento demonstrou que a colheita da amostra de sangue para análise quantitativa ocorreu pelas 20/21 horas do dia 04.3.2020, entre 08 a 09 horas após o condutor ter admitido, sem prova em contrário, ter ingerido bebidas alcoólicas e cerca de sete hora após a ocorrência do sinistro. 3ª - A forma como a colheita dessa amostra ocorreu em nada respeitou o estipulado no “Regulamento de Fiscalização” aprovado pela lei n.º 18/2007, de 17.5, pois não foi feito dentro dos 30 minutos de intervalo entre os dois testes, não foi feito dentro do mais curto espaço de tempo possível, nem sequer no estabelecimento de saúde mais próximo do local do sinistro. O resultado do teste também não foi entregue às autoridades policiais no prazo máximo de 30 dias após a receção da amostra. 4ª - Pese embora se entender que a expressão “mais curto espaço de tempo” não encerra em si um limite temporal apertado, podendo referir-se a várias horas, esse limite é necessariamente imposto pela ciência que nos dá a conhecer o comportamento do álcool no organismo, revelando que a sua presença é tanto mais detetável quanto mais próximo da sua ingestão. 5ª - A “curva da alcoolémia” ensina também que os vestígios de uma ingestão moderada de álcool deixam de ser detetáveis no sangue a partir da sexta hora posterior à ingestão, não sendo assim possível, no caso, imputar ao condutor, a condução sob o efeito de álcool às 13h45m (hora do acidente) através de um exame cuja colheita foi feita sete horas depois. 6ª - A menos que o condutor estivesse num profundo estado de embriaguez a essa hora, o que é desmentido pelo teste de despistagem realizado nesse momento do acidente, que deu um resultado negativo, ou seja, sem indícios da presença de álcool no sangue. 7ª - A apontada discrepância só se poderá explicar de uma das seguintes formas: ou erro na colheita e manuseamento da amostra submetida a exame; ou a amostra sujeita a exame não se refere àquele condutor; ou o condutor ingeriu álcool entre as horas que separaram a realização dos testes qualitativo ou quantitativo; ou, por último, terá havido erro na realização do teste qualitativo (o que a autoridade que o executou negou perentoriamente). 8ª - Não tendo o julgamento tido a virtualidade de clarificar essa disparidade o tribunal a quo não poderia dar como provado, sem mais, que o resultado do teste de álcool aditado à participação do acidente correspondesse ao que o condutor detinha no momento da condução, dando dessa forma por preenchida a cláusula de exclusão de cobertura. 9ª - Mas já poderia o Tribunal e deveria, ao abrigo do princípio do inquisitório, consagrado no art.º 411º, do Código de Processo Civil (CPC), - e uma vez que o facto controvertido é superveniente à propositura da ação -, ter encetado oficiosamente as diligências que reputasse como necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio. 10ª - A não determinação da realização de todas as diligências tidas como possíveis e necessárias a uma composição justa do litígio, encerra em si uma nulidade processual que aqui se invoca. 11ª - O facto dado como não provado sob a alínea b) entra em colisão com o que decorre provado no ponto 19., devendo assim ser suprimido. 12ª - O depoimento da testemunha CC, na descrição que fez relativamente à forma como se estabeleceu o contrato de seguro entre as partes, quanto às respetivas coberturas, valores, prémios, e às reações e comportamentos das partes no desenvolvimento da regularização do sinistro, conjugado com as mais elementares regras da experiência comum, impõe que os factos dados como não provados sob as alíneas a), c), d) e e) sejam dados como provados. 13ª - Tratando-se a cláusula (subponto 6.3 do ponto 6) referida na alínea f) dos factos não provados de uma cláusula contratual geral, não sujeita à prévia negociação entre as partes, a prova da sua comunicação e elucidação compete, não à recorrente pela negativa, mas sim à recorrida pela positiva. 14ª - Assim o facto constante desta alínea f) não deveria estar nos factos não provados, mas sim nos factos provados, pois a recorrida não logrou, nem sequer tentou provar que o teor desse subponto (ou qualquer outro ponto ou cláusula da apólice), tenha sido devidamente explicado à recorrente em termos de conteúdo e alcance. 15ª - Tanto o que decorreu provado sob os pontos 33. e 34. bem como o conteúdo do depoimento da testemunha DD permitem dar como provado pelo menos parte do teor da alínea g) dos factos não provados. Assim, não podendo o veículo continuar a atividade para a qual se provou ser utilizado, a sua paralisação gera obviamente prejuízo diário, apesar de não se ter logrado fazer prova do respetivo valor. 16ª - Ainda o depoimento desta testemunha impunha também que se levasse à matéria assente que o condutor, a ter eventualmente conduzido sob a influência do álcool no momento da colisão, fê-lo à revelia e contra as ordens expressas e contrárias que lhe foram dadas pela recorrente. 17ª - A decisão quanto à matéria de facto deverá assim ser modificada nos seguintes termos: 1. Alterando-se o facto dado como assente sob o ponto 32. para a seguinte redação: “Entre as 20 e as 21 horas do dia em que ocorreu o acidente, já no Hospital ..., em ... para onde foi encaminhado em consequência das lesões que sofreu, o condutor do veículo em causa foi submetido a colheita de sangue para deteção da presença de álcool” 2. Transportando-se para a matéria provada os factos que o não foram sob as alíneas a), c), d), e) e f). 3. Eliminando-se a totalidade do facto vertido na alínea b) dos factos não provados. 4. Eliminando-se dos factos não provados a alínea g), e dar-se como provado o seguinte facto: “A privação do uso do veículo em causa nos autos, atentas as suas utilidade, tonelagem e capacidade de gerar rendimento, acarreta um prejuízo diário, em valor não concretamente apurado.” 5. Acrescentando-se à matéria provada o seguinte facto novo, não tido em consideração na decisão, com a seguinte redação: “A circunstância de o condutor do veículo em causa conduzir com uma taxa de álcool no sangue superior à legalmente admissível, a acontecer, ocorreu à revelia da autora e contra as suas ordens expressas de não ingerirem bebidas alcoólicas quando conduzem.” 18ª - Tratando-se o aditamento à participação do acidente, de um documento autêntico, a parte do teor do mesmo, pela qual se nega a submissão do condutor ao teste de álcool por ar expirado, tendo-se apurado que essa submissão ocorreu efetivamente, é falsa, nos termos do disposto no art.º 372º, do Código Civil (CC). 19ª - Logo o incidente pelo qual se requereu a respetiva declaração de falsidade, tendo-se cingido a essa parte, não pode deixar de proceder integralmente. 20ª - A coexistência, no mesmo contrato de seguro, de uma cláusula que exclui das coberturas do seguro facultativo a condução sob o efeito do álcool, com outra que prevê expressamente a favor da seguradora o direito de regresso, após satisfeita a indemnização, contra o condutor que conduza com uma taxa de alcoolemia superior à legalmente admitida, é manifestamente contraditória, 21ª - E a resolução do conflito decorrente dessa contradição só é possível de alcançar através da interpretação a dar às cláusulas em causa e que não poderá deixar de ser de acordo com o que preceitua os art.ºs 10º e 11º, do DL 446/85, de 25/10. 22ª - E feita a interpretação nesses termos não se poderá entender por uma exclusão imediata e automática, à margem da conduta do segurado. Ou seja, a exclusão deve ter lugar quando o segurado tenha contribuído para a respetiva causa. Tendo a exclusão uma causa alheia à vontade e comportamento do segurado, a exclusão não deve operar. 23ª - O DL 291/2007, de 21/8, impõe às seguradoras verdadeiras normas de conduta na resolução de sinistros no âmbito dos contratos de seguro de responsabilidade civil obrigatório e, por força do seu art.º 92º, aos de coberturas facultativas de choque, colisão e capotamento, normas cuja violação acarreta consequências. 24ª - Dentro dessas normas de conduta, decorre o prazo máximo, inultrapassável para a resolução do sinistro por parte da seguradora e satisfação do direito de crédito do lesado, prazo esse que só é passível de suspensão quando se inicie uma averiguação por suspeita fundamentada de fraude. 25ª - Não estando em causa uma suspeita de fraude, a seguradora recorrida, tendo apenas em outubro de 2020 dado a conhecer a sua posição definitiva quanto à sua responsabilidade pelo acidente (seis meses após), esgotou por pelo menos seis vezes o prazo de 30 dias que tinha para ressarcir a segurada, através da colocação à sua disposição do montante equivalente ao valor seguro ou, pelo contrário, negar esse ressarcimento. 26ª - O que não pode e não é, de todo aceitável, é que possa manter em espera indefinidamente o segurado por meses e meses a fio, condicionando-o numa tomada de posição para o futuro, uma vez que a sua posição estaria sempre salvaguardada em função do direito de regresso que lhe assiste. 27ª - Num contrato de seguro de danos próprios, o risco de se ficar dependente das diligências de terceiros para a resolução do sinistro - como é no presente caso a submissão do condutor ao teste de álcool - não pode recair apenas sobre o segurado. Trata-se de um risco que terá se ter por transferido para a seguradora, competindo-lhe o adiantamento da indemnização do capital assegurado. 28ª - No que aos danos decorrentes da paralisação concerne, a recorrida deverá ser sempre condenada no seu ressarcimento, por violação injustificada das normas e dos prazos legais impostos pelo DL 291/2007, de 21/01: a) Considerando-se a inexistência de causa de exclusão do seguro, esses danos deverão ser computados desde o momento em que deveria colocar à disposição da recorrente o valor do capital seguro, até ao momento em que o vier a fazer; b) Considerando-se a exclusão da responsabilidade, os danos dessa paralisação deverão ser calculados até ao momento em que a seguradora informou a segurada de que não assumia a responsabilidade. 29ª - Quando ao valor indemnizatório para a paralisação, e na medida em que não se logrou apurar o quantum do prejuízo diário, há que fazer apelo às regras da equidade. 30ª - Já o capital seguro, atendendo ao que resultou provado por prova documental e testemunhal e ao que decorre do art.º 3º, do DL 2174/97, não poderá ser considerado inferior aos € 25 000 pelos quais foi calculado o prémio para a anuidade em curso aquando da ocorrência do acidente. 31ª - O Tribunal a quo violou ou pelo menos fez incorreta aplicação e interpretação, nomeadamente: a) Da generalidade do DL 291/2007, de 21.8; b) Do art.º 3º, do DL 214/97, de 16.8; c) Da generalidade do DL 446/85, de 25.10; d) Da generalidade Regulamento de Fiscalização da Condução sob o Efeito do Álcool ou de Substâncias Psicotrópicas, aprovado pela Lei n.º 18/2007, de 17.5; e) Dos art.ºs 236º e 369º a 372º do CC e 3º, n.º 4, 446º, 607º e 611º do CPC. A Ré respondeu concluindo pela improcedência do recurso. Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objecto do recurso, importa apreciar/decidir: a) impugnação da decisão sobre a matéria de facto (erro na apreciação da prova; incidente de ilisão de autenticidade ou da força probatória de documento); b) decisão de mérito (cuja modificação depende, principalmente, do sucesso daquela impugnação). * II. 1. A 1ª instância deu como provados os seguintes factos: 1) A autora é uma sociedade comercial que, entre outras, se dedica à atividade de transporte rodoviário de mercadorias, nacional e internacional. 2) Na prossecução dessa atividade e com vista a assegurar a sua frota de veículos, enquanto tomadora, contratou com a ré/seguradora, em julho de 2014, um contrato de seguro, do ramo automóvel, denominado “...”, titulado pela apólice ...75, que teve início às 10.34 horas do dia 08.7.2014, automática e anualmente renovável a partir do dia 01.7.2015. 3) Nos termos das condições particulares contratadas, “a inclusão de veículos efetuar-se-á a pedido do tomador e será garantida mediante a emissão da correspondente declaração de seguro onde se indicam as coberturas contratadas para cada veículo, de entre as abaixo listadas. A exclusão de veículo efetuar-se-á a pedido do tomador, por motivo de venda ou abate do veículo, mediante a devolução à companhia da carta verde vigente.” 4) Nesse contrato de seguro, para além das obrigatórias respeitantes à responsabilidade civil, foram igualmente contratadas sob a rúbrica de “danos próprios” as seguintes coberturas facultativas: i. Choque, colisão e capotamento; ii. Incêndio, raio e explosão; iii. Furto ou roubo; iv. Cataclismos naturais e queda de árvores; v. Greves, tumultos, comoções civis, vandalismo e atos de terrorismo. 5) Do Ponto 3 (Exclusões), subponto 1, alínea f) das condições particulares do contrato em causa nos autos consta o seguinte: “1. Além das exclusões previstas nas condições gerais uniformes do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel, e das demais no presente contrato, e salvo indicação expressa em contrário, estão sempre excluídos os danos: (…) f) Resultantes de demência do condutor do veículo seguro por este contrato ou quando este conduza sob a influência do álcool, com uma taxa superior ao legalmente permitido, estupefacientes ou outras drogas ou produtos tóxicos”. 6) Em outubro de 2014, a autora promoveu a inclusão nessa apólice do seu veículo pesado de transporte de mercadorias, até 40 toneladas de peso bruto, da marca ... e matrícula ..-HJ-.., inclusão que lhe foi garantia pela ré com efeitos a partir de 24.10.2014, em contrapartida do pagamento do prémio anual inicial de € 2 054,87. 7) Nos termos inicialmente contratados, a apólice de seguro foi-se renovando, relativamente ao referido veículo, automática e anualmente. 8) Na renovação que se deu no dia 01.7.2019, o capital seguro para as coberturas facultativas, entre as quais a de “Choque, colisão e capotamento”, para esse veículo e por acordo das partes, ficou estabelecido em € 25 000, valor a ter em consideração para efeitos de indemnização em caso de perda total, com uma franquia, a suportar pela autora, de € 500,01. 9) O correspondente prémio anual relativo ao seguro do veículo em causa, para o período de 01.7.2019 a 30.6.2020 estava fixado no montante global de € 3 139,88, a pagar pela autora em prestações trimestrais por débito direto. 10) Do valor desse prémio, € 579,98 tinham como destino garantir a cobertura de danos próprios por colisão, choque e capotamento. 11) Para o período de vigência trimestral de 01.01.2020 a 01.4.2020, e no que concerne às coberturas facultativas, o valor seguro foi de € 25 000. 12) No dia 04.3.2020, pelas 13h45m, no IC..., ao km 103,80, na Freguesia e Concelho ..., Distrito ..., o veículo ..., segurado na ré pela apólice acima referida, em conjunto com o semirreboque de matrícula C-....1, interveio em acidente de viação. 13) O veículo circulava no referido IC..., no sentido Oeste/Este, conduzido ao serviço da autora pelo seu motorista, AA, que perdeu o controle da viatura. 14) O que provocou o seu despiste para a berma do lado direito, atendo o seu sentido de marcha. 15) Indo embater violentamente no rail de proteção lateral, 16) Sobre o qual ficou imobilizado, com a parte frontal sobre a berma direita, atento o sentido em que seguia, e a parte traseira (semirreboque) ainda na faixa de rodagem. 17) O local onde se deu o choque apresenta-se em curva ligeira à esquerda, atento o sentido de marcha tomada pelo veículo e o piso encontrava-se molhado em consequência do estado de tempo chuvoso. 18) Desse embate resultaram ferimentos graves para o condutor do veículo que recebeu a primeira assistência médica no local após o que foi encaminhado ao Centro Hospitalar ... – Hospital .... 19) Realizado no local do acidente teste de álcool por ar expirado em aparelho qualitativo ao condutor do veículo em causa nos autos, foi inscrito o seguinte resultado: “Submetido ao teste de álcool pelo ar expirado em aparelho qualitativo: Sem indícios de álcool (TAS que permite conduzir).” 20) Do acidente resultaram também danos materiais para a IP Infraestruturas de Portugal, decorrentes da destruição da vedação da faixa de rodagem, que a ré indemnizou no dia 19.6.2020 ao abrigo do seguro obrigatório de responsabilidade civil titulado pela mencionada apólice. 21) Na sequência do referido acidente, foi declarada a perda total do veículo da autora. 22) No dia seguinte, em 05.3.2020, a autora, por intermédio do mediador do seguro, CC, participou à ré a ocorrência do sinistro. 23) Na mesma data a ré diligenciou pela peritagem do veículo, que fora rebocado do local do acidente para uma oficina situada na Zona Industrial ..., em ..., indicada pela autora, a qual foi marcada para o dia 06.3.2020. 24) Após a peritagem, a ré, por correio eletrónico datado de 23.3.2020, dirigido à autora, comunicou-lhe que os prejuízos sofridos pela viatura na sequência do acidente, resultaram na sua perda total, de acordo com os seguintes valores: i. Valor estimado da reparação (sem desmontagem): € 69 971,87; ii. Capital seguro: € 19 000; iii. Estimativa do valor do salvado € 105. 25) Na referida comunicação, a ré informou ainda à autora que colocaria à sua disposição a quantia de € 18 515, já deduzida a franquia contratual de € 380 e o valor atribuído ao salvado, que ficaria na sua posse. 26) Na mesma comunicação, a ré ressalvou que o processo interno se encontrava ainda em instrução, pelo que o pagamento de tal valor estava dependente da análise das conclusões da diligência que solicitou a fim de confirmar o sinistro, que não especificou em tal comunicação. 27) Relativamente ao mencionado veículo e cerca de dois meses antes do acidente, a autora havia pago o prémio de seguro trimestral no valor de € 784,98, a que corresponde o prémio anual de € 3 139,88. 28) A ré não mais contactou a autora para indemnizar os danos ou dar conta do resultado ou evolução das diligências que solicitou. 29) Na data referida em 24), não era conhecido da ré o resultado do teste quantitativo de álcool no sangue realizado ao condutor da viatura em causa nos autos, o qual apenas lhe foi informado pela GNR ... em 08.9.2020. 30) A ré não validou a proposta de regularização do sinistro porquanto aguardava o resultado do referido teste. 31) Nos termos do subponto 6.3 do ponto 6 (Procedimentos em caso de sinistro) do contrato em causa, “Quando o valor do veículo for igual ou inferior ao valor seguro, a seguradora apenas responderá até à concorrência do capital seguro ou valor venal, não podendo do sinistro resultar enriquecimento do segurado.” 32) O referido condutor do veículo não foi submetido no local do acidente a teste de álcool pelo ar expirado em aparelho quantitativo, em virtude das lesões advindas do acidente em causa[1], tendo sido submetido ao teste de álcool através de análise sanguínea, o qual teve como resultado um valor positivo de 0,46 +/- 0,06 g/l de álcool no sangue. 33) O veículo em questão era utilizado pela autora no transporte rodoviário internacional de mercadorias para Espanha, França e Itália. 34) Em cada semana o veículo ia duas a três vezes a Espanha, transportando mercadorias na ida e no regresso. 35) No dia do sinistro, a viatura efetuava um transporte de mercadorias com destino a ..., onde aguardaria carga para efetuar novo transporte de mercadorias, no regresso. 36) No Ponto 1.7 (Danos Próprios), sub ponto 3 (Exclusões), sub-subponto 1. v) do contrato em apreço nos autos consta: “1. Além das exclusões previstas nas condições gerais uniformes do seguro obrigatório de Responsabilidade Civil automóvel, e das demais no presente contrato, e salvo indicação expressa em contrário, estão sempre excluídos os danos: (…) v) Que consistam em lucros cessantes ou perda de benefícios ou resultados advindos ao Tomador de Seguro e/ou ao Segurado em virtude de privações de uso, gastos de substituição ou depreciação, desgaste ou consumo naturais.” 2. E deu como não provado: a) O valor do prémio tenha sido determinado e calculado em estreita relação com as coberturas contratadas e proporcionais ao “valor seguro”. b) Submetido no local do acidente ao teste de álcool por ar expirado em aparelho qualitativo, o condutor não tenha acusado indícios de álcool no sangue. c) Acto imediato à comunicação da ré referida em 24) dos factos provados, por intermédio do mediador CC, a autora tenha dado a conhecer à ré que não concordava com o valor proposto, atendendo a que o capital seguro por danos próprios e pelo qual pagara o prémio trimestral, em cujo período ocorrera o sinistro, era de € 25 000 (e não os € 19 000, referidos na proposta). d) O mediador atrás referido tenha dado razão à reclamação apresentada pela autora em virtude de, no dia seguinte ao do acidente, após a sua participação, a ré ter emitido declaração, na qual o valor seguro para a cobertura de choque, colisão e capotamento era de € 25 000, valor este a considerar para efeito de indemnização por perda total da viatura, com uma franquia de € 500,01. e) A autora tenha pago o prémio trimestral de seguro no valor de € 784,98, na convicção de que, em caso de perda total do veículo, seria ressarcida do valor contratualmente seguro de € 25 000, correspondente ao valor da viatura à data do acidente. f) O constante do subponto 6.3 do ponto 6 do contrato em causa não tenha sido explicado à autora aquando da contração do seguro. g) A privação do uso do veículo, atenta as suas utilidade, tonelagem e capacidade de gerar rendimento, acarretasse à autora um prejuízo diário que se estima de valor não inferior a € 200 (por dia útil). 3. Cumpre apreciar e decidir com a necessária concisão. a) A A. insurge-se contra a decisão sobre a matéria de facto, invocando parte da prova pessoal produzida em audiência de julgamento e a prova documental, concluindo, sobretudo, que o tribunal a quo deveria considerar provados os pontos de facto das alíneas a), c), d), e) e f) [ponto II. 2., supra], dar uma diferente resposta à factualidade do ponto 32), eliminar as alíneas b) e g) e acrescentar novos factos, tudo, como decorre das “conclusões 1ª a 17ª”, ponto I., supra, ciente de que tal alteração poderá levar a diferente desfecho dos autos. Assim, dada a relevância de tal factualidade, importa saber se outra poderia/deveria ser a decisão do Tribunal a quo. b) Esta Relação procedeu à audição da prova pessoal produzida em audiência de julgamento, conjugando-a com a prova documental. c) Pese embora a maior dificuldade na apreciação da prova (pessoal) em 2ª instância, designadamente, em razão da não efetivação do princípio da imediação[2], afigura-se, no entanto, que, no caso em análise, tal não obstará a que se verifique se os depoimentos foram apreciados de forma razoável e adequada. E na reapreciação do material probatório disponível por referência à factualidade em causa, releva igualmente o entendimento de que a afirmação da prova de um certo facto representa sempre o resultado da formulação de um juízo humano e, uma vez que este jamais pode basear-se numa absoluta certeza, o sistema jurídico basta-se com a verificação de uma situação que, de acordo com a natureza dos factos e/ou dos meios de prova, permita ao tribunal a formação da convicção assente em padrões de probabilidade[3], capaz de afastar a situação de dúvida razoável. d) Partindo da motivação da decisão sobre a matéria de facto e tendo em atenção o objeto do recurso, destacamos os seguintes excertos: «(…) A respeito da matéria controvertida, para lá do que se pôde extrair do clausulado do referido contrato (pontos 3, 5 e 36 dos factos provados), importa ainda atentar nos documentos juntos com a petição inicial (n.ºs 1 e 8) e com a contestação (n.º 11) e, bem assim, nos depoimentos de EE, de AA, de BB, de FF e de GG. (...) De seu lado, AA, motorista de pesados, condutor do veículo em causa na data do sinistro em apreço dos autos, admitiu ter bebido “dois copos de vinho em casa”, ao almoço, antes de conduzir (recorde-se que o acidente em causa ocorreu pelas 13h45m). Depois, explicou que na altura do acidente “fez o teste do balão” e que, tendo sido conduzido ao Hospital ..., para aí receber assistência aos ferimentos que susteve na decorrência do acidente em causa, lhe foi feita recolha de sangue para realização de teste de despistagem da presença de álcool no sangue.[4] (...) De seu lado, BB, militar da GNR responsável pela elaboração da participação de acidente (...), embora com uma memória vaga dos acontecimentos, soube explicar que, quando chegou ao local, o condutor do veículo já estava a ser encaminhado para o hospital. Com relevo para a matéria em discussão, acrescentou que, no local, fez ao condutor o teste qualitativo de TAS, o qual deu um resultado considerado negativo. Acrescentou que não fez o teste quantitativo ao condutor porquanto este não se encontrava em condições de o realizar. Mais explicou que, tendo indicações superiores para, sempre que exista acidente de viação envolvendo pesados, realizar recolha de sangue, solicitou aos colegas do Posto da GNR mais próximo do hospital para onde o arguido tinha sido encaminhado para lá se deslocar e efetuar a referida recolha, que foi enviada ao IML para exame, cujo resultado demorou entre 2 a 3 meses a chegar ao Comando. A referida testemunha explicou, ainda, com isenção e credibilidade, de forma distanciada da matéria em causa nos autos, o modo como procede em situações de acidentes de viação envolvendo veículos pesados, designadamente quanto à elaboração dos autos e quanto à realização de testes de TAS, explicando que a expressão “sem indícios de álcool / TAS que permite conduzir” ou “negativo” é inscrita nos autos sempre que o resultado do teste qualitativo (‘balão’) aparece como inferior a 0,5g/l, independentemente do veículo em causa. Mas, tratando-se de motorista profissional e ocorrendo acidente, estava obrigado a fazer ao condutor teste quantitativo, ainda que o mesmo não tivesse ficado ferido. Concluiu, afirmando que, embora não se recordasse do valor exato, o condutor tinha uma TAS de valor superior a 0,2g/l, porquanto se recordava de ter sido elaborado auto de notícia por contraordenação em virtude de tal facto. Por outro lado, a testemunha FF, perito averiguador de seguros, a respeito, esclareceu que lhe foi solicitado, no âmbito das suas funções, que pedisse à GNR cópia da participação do acidente. Na referida participação, verificando que tinha sido realizada recolha de sangue, comunicou tal facto à ré e aguardou pelo resultado, o que apenas aconteceu em setembro. Explicou que as várias solicitações que a respeito, foi fazendo à GNR, entre a data da averiguação e setembro, foram sempre comunicadas à ré, mas que nunca falou com a autora a respeito e desconhece se a ré o fez. (...) GG, profissional de seguros por conta da ré, desde 1980, informou que, em face da informação constante da participação de acidente junta aos autos, por si considerada estranha, foi pedido aditamento à mesma, que demorou “cerca de 6 meses” e veio informar da presença de álcool no sangue por parte do condutor do veículo da autora. Acrescentou que, entre uma data e outra, foram sempre trocadas informações com o mediador de seguros CC, “algumas relacionadas com a questão do álcool”, e que “pensa que este terá informado a autora”, não tendo sido trocada nenhuma outra informação direta com a autora para lá da proposta apresentada. (...) Analisados os documentos juntos (...) pelas partes em conjugação com os depoimentos acabados de sintetizar, outra coisa não pode concluir-se que não a de que, na data do acidente em causa, o condutor foi submetido a teste qualitativo de presença de álcool no sangue (ponto 19 dos factos provados), que não foi submetido a teste quantitativo pelo ar expirado em virtude das lesões que havia sofrido e que, realizado teste sanguíneo, apresentava uma TAS de 0,46 +/- 0,06g/l (ponto 32 dos factos provados), mas que tal facto apenas foi conhecido da ré em 08.9.2020 (ponto 29 dos factos provados), o que resulta, aliás, das regras da lógica, atentas as datas dos documentos atrás referidos. De outro lado, quanto ao facto de a ré não “validar” a proposta de regularização do sinistro feita à autora se fundar na espera do resultado do aludido teste sanguíneo (ponto 30 dos factos provados), resulta o mesmo da posição assumida pela ré na contestação por si apresentada, da qual decorre que isso mesmo, em conjugação com o depoimento que a respeito prestou CC, mediador de seguros que intermediou a contratação do seguro em causa nos autos e a participação do sinistro em apreço. Com efeito, a mencionada testemunha esclareceu que fez a participação à ré e abriu o processo de sinistro, mas que a “companhia não validava sem o auto de ocorrência”, que a GNR demorou a fornecer e que, mesmo depois disso, “faltava o resultado do teste de sangue”. Depois disso, explicou, foi constituído mandatário e perdeu contacto com os detalhes do processo. A mais e com relevo para a matéria em análise, a testemunha afirmou perentoriamente que explicou ele mesmo as condições particulares do contrato em causa à autora, nas quais se insere o subponto 6.3 do ponto 6 (Procedimentos em caso de sinistro), sendo as condições gerais consultáveis pelo cliente online no site da companhia (ponto 31 dos factos provados e ponto f) dos factos não provados). Por fim, explicou que teve informação que a empresa de peritagem aguardava o auto de ocorrência, no âmbito da averiguação do sinistro, e que transmitiu à autora que aguardavam o resultado do teste sanguíneo de TAS. (...) Quanto à matéria de facto dada como não provada, tal resultou da absoluta falta de prova produzida a respeito ou por se mostrar em contradição com a matéria de facto dada como provada.» e) Ouvida a prova pessoal, vejamos o que decorre, e releva, dos depoimentos (mencionados na impugnação): - CC (fls. 187; agente/mediador de seguros): “(...) nós explicamos as condições particulares e as gerais (...); os clientes têm acesso e podem consultar nas plataformas digitais, mas o intermediário com o cliente somos nós. O cliente pode falar com a seguradora se o entender (...); nós temos formação contínua (inclusive, para explicar aos clientes/segurados as “condições” - v. g., gerais e particulares - de cada contrato de seguro); (...) nós explicamos que o cliente, a cada renovação, deve indicar à seguradora o valor de mercado daquela viatura para ele, porque a seguradora por muito que a mediação insista, não define o valor, ou seja, a cada renovação … (...). Passo essa informação desse valor para o cliente. (...) E o cliente, conforme o estado do carro, os quilómetros, o uso e não sei quê, encontra o valor do carro assegurado. (...) A seguradora aceitou e cobrou o prémio. Só depois da data do acidente e no decorrer da anuidade (...), eles reduziram o valor seguro, no decorrer da anuidade, de acordo com a peritagem que foi feita pelo perito, após o acidente. (...) E esse valor foi encontrado depois pela empresa de peritagem … que eu não sei como é que eles chegaram a esse valor (...); (...) o que eu sei é que o cliente (A.) nos ia abordando muita vez, insistentemente (sobre o estado do processo de regularização do sinistro).” - AA (fls. 195): “(...) Carreguei, de ... a ... são poucos quilómetros, na altura falei com o Sr. HH (legal representante da A.). Parei em casa, isto foi à hora de almoço, demorei duas horas a carregar, mais ou menos …. Tomei banho, fiz a barba, almocei e subi para .... O acidente foi na .... De ..., depois de almoço, andei quê?..., uma hora, duas horas (...) Ao fim de uma hora, não me pergunte nem porquê, tive o acidente…bati sozinho, penso que não bati em ninguém, mas despistei-me e depois foi o caos... (...) Bebi dois copos de vinho, ao almoço, em casa da minha mãe. Bebi um café em ... e segui para cima. Na altura em que eu tive o acidente (...), a Brigada de Trânsito de ..., salvo erro, foi quem foi intervencionada no acidente, fez-me o teste ao álcool, etc., (...) Sei que não passou muito tempo, os carros vinham de ... em sentido contrário e pararam. Apareceu logo um carro da Brigada de Trânsito de .... Apareceram os bombeiros da ..., o INEM, (...) eu estava meio encarcerado... Retiraram-me e fizeram-me teste (ao álcool). (...) Posteriormente (...) fui para o Hospital ...… (...) Estava no Hospital ... e no dia do acidente, isto por volta das oito da noite – 20, 21 horas, apareceu um Sr. da Brigada de Trânsito de…, não é ... … (...) que me pediu que a pedido dos colegas de ... (foi a conversa do Sr.) me pediu…. Eu assinei um documento qualquer, pediu se (...) o enfermeiro me podia retirar sangue e explicou-me o porquê. Que era para fazer análise ou contra-análise... ; (...) eu achei estranho o facto de ter sido desencarcerado, puseram soro (…) e ter feito o teste de álcool, lá, no acidente. (...) Mas, e depois disso, no hospital, ter vindo um agente, outra vez, um agente de autoridade... Foi o que o Sr. me disse, que o colega dele de ..., (...) que lhe pediu para … fazer teste e (...) não foi a soprar, foi por análise ao sangue. (...) No acidente eu fiz um teste de sopro com a GNR que lá estava, (...) o dito balão; (...). Eu não tenho nada em meu poder… O Sr. Guarda pode dizer o que quiser, agora é assim: eu da parte da Brigada de Trânsito de ... que intervencionou o acidente não tenho documento nenhum, em meu poder, que diga que quando eu tive o acidente estava ou não estava com excesso de álcool. (...) quando me tiraram sangue nos ..., o Sr. da Brigada de Trânsito apareceu…, disse que tinha sido convocado por um colega de ..., fez a pergunta… veio um enfermeiro tirou sangue e foi-se embora, nunca mais me deram resultados, nunca me deram resultados disto ou daquilo; nem lá, na altura, nem posteriormente a isso! (...)” - BB (fls. 195): “(...) Tomei conta do acidente, procurando os dados do veículo, os documentos do veículo e como o Sr. já estava a ser encaminhado para o Hospital mais próximo que acho que era o de ..., pedi a alguém daquela zona para ir ao hospital tirar os dados do condutor e fazer os respetivos testes de álcool; (...) no local foi feito… pelo ar expirado. (...) já estava acompanhado pelos Bombeiros e deixámo-lo ir para quando ele chegasse ao hospital fazer o exame de sangue. No local foi o qualitativo.” Não submeteu o condutor ao teste quantitativo por ele “não se encontrar em condições” e, em substituição, pediu a recolha de sangue, porquanto, tratando-se de um condutor de veículo pesado de mercadorias, e atentas as instruções superiores, “depois do teste de despistagem é o exame de sangue…, quando ele vai para o hospital”, independentemente do resultado do exame qualitativo. “Por ser um veículo de transporte de mercadorias pesado, é feito obrigatoriamente exame de sangue. (...) no qualitativo isto é negativo ou positivo, e no caso dava negativo. (...) A gente pede ao Posto Policial mais próximo para se deslocar ao hospital para efetuar essa recolha; (...) após a receção do exame do Instituto de Medicina Legal (...) com o valor superior a 0,2 e sendo um condutor pesado, levantamos o auto de contraordenação. (...) tenho aqui a data da entrada do teste do IML no Destacamento (...); o acidente foi em março e o teste deu entrada em agosto … (04.8.2020)”. Confrontado com os documentos da “participação de acidente de viação” e do “aditamento” juntos aos autos, confirmou que eram os documentos oportunamente elaborados e disse que foi também elaborado “auto de contraordenação”. “(...) colheita de sangue, porque ele é condutor de um veículo especial; (...) a despistagem é feita por nós, obrigatoriamente, porque na participação do acidente temos de colocar se é negativo ou positivo. E eu, para dizer se é positivo ou negativo, tenho de fazer o teste obrigatoriamente à pessoa (a realização do teste qualitativo é mais uma “questão formal” e tem a ver com o preenchimento do “auto de notícia”, enquanto que o qualitativo é obrigatório quando se trata de um motorista profissional); (...) na participação inicial está de forma correta que (...) foi submetido ...; na participação inicial é que está correto; (...) ele (condutor) foi para o hospital para a zona de ... e já não consegui voltar a falar com ele.” Confrontado com o teor da participação de acidente de viação, referiu, designadamente, que, sua “na parte inicial”, onde se refere “isenta” “é um texto que já está (...) preenchido (previamente preenchido...) na participação e, depois, quando é feita a declaração é que se indica ou o que ele (condutor/interveniente no sinistro) diz ou se não consegue fazer essa declaração; (...) (a colheita de sangue para análise da alcoolemia) no caso de ser feita no hospital, é o mais breve possível…; eu não assisti à colheita (...); o Posto que faz a recolha, depois, envia a documentação para mim (...); o qualitativo ao pé de mim deu negativo (sendo que o condutor não prestou, então, quaisquer declarações); nem sempre... (temos os mesmos resultados nos testes de alcoolemia), a maior parte das vezes há uma discrepância entre os valores (testes qualitativos, quantitativos e de sangue)”. Na situação dos autos, feito o primeiro teste, seria de considerar que “o valor indicado é inferior a 0,50, mas como é um condutor de pesado…”; tal teste qualitativo traduz uma “TAS que permite conduzir” - “é o que diz o aparelho e é o que eu coloco na participação; (...) dá um valor…, (...) inferior a 0,50…. mas aí não vai aparecer esse valor, vai aparecer se é positivo ou negativo; (...) sendo positivo, (...) se for inferior a 0,50 é essa a informação (“sem indícios de álcool”) que coloca; se for superior a 0,50, já não é essa informação, é outra…” f) A prova documental foi adequadamente concretizada, analisada e relevada (na decisão sob censura), designadamente, a “participação de acidente de viação” (datada de 07.3.2020) e o “aditamento à participação de acidente de viação” (datado de 03.9.2020), reproduzidos a fls. 90 /128 e 123 dos autos, respetivamente, sendo que a testemunha BB explicitou, devidamente, a forma de elaboração dos ditos documentos e a razão de ser dalgumas expressões neles empregues e das (invocadas e aparentes) discrepâncias ou incongruências, mormente quanto à interpretação da menção “Sem indícios de álcool (TAS que permite conduzir)” e à incorreta inclusão da excerto “(...) a descrição do acidente é transcrita de forma isenta, tomada como fonte a versão apresentada pelo interveniente do mesmo”, e bem assim sobre a realização dos aludidos testes qualitativo e quantitativo; a mesma testemunha corroborou o que se fez constar do item “Observações” incluído na parte final do mencionado “aditamento”, principalmente, a respeito do “resultado das análises efetuadas ao sangue para despistagem e quantificação de etanol no sangue”, com “um valor positivo de 0,46 +/- 0,06g no sangue”. Neste contexto, é evidente que a A. não logrou ilidir a autenticidade ou a força probatória do documento denominado “aditamento”, improcedendo o incidente suscitado a 22.10.2020 (cf., ainda, designadamente, art.ºs 446º e 449º do CPC, 342º, n.º 2 e 371º, n.º 1 do CC e 78º, n.º 2 do DL n.º 291/2007, de 21.8[5]). 4. A descrita fundamentação da decisão sobre a matéria de facto elaborada pelo Mm.º Juiz do Tribunal a quo afigura-se, em geral, correta. Na verdade, face à mencionada prova pessoal e documental, apenas se poderá dizer que a factualidade dada como provada (e não provada) respeita a prova produzida nos autos e em audiência de julgamento, sendo que, até em razão da exigência de (especial) prudência na apreciação da prova pessoal[6], o Mm.º Juiz não terá desconsiderado regras elementares desse procedimento, inexistindo elementos seguros que apontem ou indiciem que não pudesse ou devesse ponderar a prova no sentido e com o resultado a que chegou, pela simples razão de que não se antolha inverosímil e à sua obtenção não terão sido alheias as regras da experiência e as necessidades práticas da vida…[7] Relativamente à factualidade concretamente impugnada, nada se poderá objetar ao que se deu como provado no ponto 32), porquanto ficou por demonstrar qualquer efetiva (e relevante) inobservância das normas do Regulamento de Fiscalização da Condução sob Influência do Álcool ou de Substâncias Psicotrópicas (aprovado pela Lei n.º 18/2007, de 17.5), e, sobretudo, que o resultado do teste quantitativo por análise da amostra de sangue do condutor pudesse ser diferente do que veio a ser indicado pelo INML, apontando os elementos disponíveis, de forma suficientemente segura, para a correção na colheita de sangue e subsequente análise quantitativa realizada pelo Organismo competente, não sendo, pois, razoável questionar o valor do exame realizado. No que concerne aos pontos de facto (impugnados) dados como não provados, a par da irrelevância dalgumas das mencionadas alíneas para o desfecho da lide e da não comprovação da matéria que se pretendeu ver incluída no acervo fáctico provado, será ainda de afirmar, e concretizar, que acaba demonstrado o contrário do vertido na alínea f) [cf., ainda, nomeadamente, o documento reproduzido a fls. 21/23 e o preceituado nos art.ºs 18º, 29º, 34º e 35º do Regime Jurídico do Contrato de Seguro/RJCS, aprovado pelo DL n.º 72/2008, de 16.4], não se comprovou a matéria que se pretendia ver aditada como “facto novo” (independentemente da sua relevância) e não se vislumbra qualquer contradição entre, por exemplo, o que consta do ponto 19) dos factos provados e o teor da alínea b) da matéria tida como não provada, desde logo, face à menor objetividade do consignado nesta alínea e ao que resultou do teste qualitativo realizado complementado com o explicitação dada pela testemunha BB. O Mm.º Juiz analisou criticamente as provas e especificou os fundamentos que foram decisivos para a sua convicção, respeitando as normas/critérios dos n.ºs 4 e 5 do art.º 607º do CPC, sendo que a Relação só poderá/deverá alterar a decisão de facto se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa (art.º 662º, n.º 1 do CPC). Improcede, assim, a pretensão da apelante quanto à modificação da decisão de facto. 5. O contrato de seguro é a convenção através da qual uma das partes (segurador) se obriga, mediante retribuição (prémio) paga pela outra parte (segurado) a assumir um risco e, caso a situação de risco se concretize, a satisfazer ao segurado ou a terceiro uma indemnização pelos prejuízos sofridos ou um determinado montante previamente estipulado.[8] É um contrato bilateral, de execução continuada, aleatório e de adesão.[9] 6. Dado o momento em que os factos em causa tiveram lugar, na fixação/interpretação do conteúdo do contrato de seguro em apreço atender-se-á, designadamente, ao disposto na respetiva apólice (art.º 37º do RJCS), e - na interpretação das cláusulas de limitação do risco assumido - à Lei das Cláusulas Contratuais Gerais/LCCG (DL n.º 446/85, de 25.10, aplicável aos contratos de seguro, pelo menos desde a alteração introduzida pelo DL n.º 220/95, de 31.10; cf., ainda, o art.º 3º do RJCS). Estabelece o art.º 4º do RJCS que às questões sobre contratos de seguro não reguladas no presente regime nem em diplomas especiais aplicam-se, subsidiariamente, as correspondentes disposições da lei comercial e da lei civil, sem prejuízo do disposto no regime jurídico de acesso e exercício da actividade seguradora. As condições da apólice do seguro (estipulações/cláusulas) podem e devem ser objecto de interpretação, como quaisquer outras declarações de vontade e, de resto, tratando-se (além do mais) de cláusulas contratuais gerais devem ser interpretadas e integradas de harmonia com as regras relativas à interpretação e integração dos negócios jurídicos, mas sempre dentro do contexto de cada contrato singular em que se incluam (art.º 10º do DL n.º 446/85, de 25.10). Normalmente, a apólice[10] é constituída pelas condições gerais, estipulações que, de um modo genérico, regulam determinado tipo de seguro, que previamente são oficialmente aprovadas, revestem carácter imperativo e são idênticas para todos os contratos do mesmo género; pelas condições especiais, normalmente adotadas pela seguradora relativamente a um risco ou cobertura específica, a ter em consideração apenas quando se encontrem discriminadamente referenciadas nas condições particulares; e por estas condições particulares que constituem o enunciado dos elementos individuais necessários à elaboração do contrato singular, por norma, cláusulas manuscritas ou dactilografadas que permitiam adaptar o contrato a cada espécie - cf., ainda, os art.ºs 36º e 37º do RJCS. E prevê o art.º 45º, n.º 1 do citado RJCS que as condições especiais e particulares não podem modificar a natureza dos riscos cobertos tendo em conta o tipo de contrato de seguro celebrado. 7. Em geral, para a delimitação do objecto do contrato de seguro há que interpretar as condições gerais, especiais e particulares que o constituem e constam da apólice do contrato (cf. art.º 37º, n.º 1 do RJCS) e, porventura, ainda, da própria proposta do seguro. Na interpretação das suas cláusulas, vale o regime geral do Código Civil (art.ºs 236º e seguintes, do CC), com as especificidades decorrentes dos art.ºs 7º, 10º e 11º da LCCG e do citado regime jurídico do Contrato de Seguro.[11] 8. Na situação em análise, o contrato de seguro obrigatório compreendia a cobertura facultativa relativa a choque, colisão e capotamento, ao abrigo da qual, em princípio, seriam indemnizáveis os danos sofridos pela A.. Porém, as partes contrataram igualmente cláusulas de exclusão de cobertura, entre as quais a que respeitava a danos quando o condutor do veículo seguro conduza sob a influência do álcool, com uma taxa superior ao legalmente permitido. Dispõe o art.º 81º do Código da Estrada: É proibido conduzir sob influência de álcool ou de substâncias psicotrópicas (n.º 1). Considera-se sob influência de álcool o condutor em regime probatório e o condutor de veículo de socorro ou de serviço urgente, de transporte coletivo de crianças e jovens até aos 16 anos, de táxi, de automóvel pesado de passageiros ou de mercadorias ou de transporte de mercadorias perigosas que apresente uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 0,2 g/l ou que, após exame realizado nos termos previstos no presente Código e legislação complementar, seja como tal considerado em relatório médico (n.º 3)[12]. Decorre da factualidade provada que o condutor do veículo ... (veículo pesado de mercadorias), trabalhador subordinado ao serviço da A., se encontrava à data do acidente sob influência de álcool, ultrapassando aquele limite de 0,2g/l. Aplicando-se, pois, a exclusão de cobertura facultativa contratada pelas partes sob o “Ponto 3 (Exclusões), subponto 1, alínea f)” das condições particulares do contrato de seguro sub judice, e atenta a descrita factualidade - a considerar, independentemente de se verificar a existência de nexo de causalidade[13] -, fica necessariamente excluída a responsabilidade da seguradora/Ré, improcedendo, assim, o correspondente pedido das “alíneas a) e c)”, ponto I., supra/p. i. [cf. II. 1. 4), 5) e 32), supra e art.º 342º, n.º 2 do CC]. 9. Importa precisar que enquanto a cláusula 31ª (sob a epígrafe “Direito de regresso do segurador”)[14] se encontra inserida nas Condições Gerais do contrato de seguro (“Condições Gerais Uniformes do Seguro Obrigatório de Responsabilidade Civil Automóvel”) - sendo, por isso, aplicável a eventuais indemnizações devidas a terceiros por danos por estes suportados -, o Ponto 3, subponto 1, alínea f) insere-se nas Condições Particulares do contrato de seguro e regula, tão-só, as indemnizações devidas ao segurado em razão de danos por si suportados (cobertura de danos próprios) [cf. a apólice reproduzida nos autos, máxime, a fls. 51, 53, 58 e 69]. A dita cláusula 31º prevê um direito de regresso a favor da seguradora sempre que esta proceda à liquidação de indemnizações devidas a terceiros pelos danos por estes suportados na sequência do acidente provocado pelo condutor do veículo seguro que, por sua vez, conduzia com uma taxa de alcoolémia superior ao legalmente admitido (em sintonia, de resto, com idêntica disposição do art.º 27º, n.º 1, alínea c) do DL n.º 291/2007, de 21.8[15], sob a epígrafe “Direito de regresso da empresa de seguros”). Diferentemente, o Ponto 3, subponto 1, alínea f) determina que não serão devidas indemnizações por danos sofridos pelo segurado na sequência de eventuais acidentes sempre que este (ou o condutor ao seu serviço, ou, em geral, o condutor do veículo seguro) conduza com uma taxa de alcoolémia superior ao legalmente admitido. Estamos perante disposições distintas que regulam indemnizações distintas em razão do destinatário, não se verificando qualquer contradição entre as mesmas (ou ambiguidade), pelo que não é necessário atender, v. g., ao preceituado nos art.ºs 10º e 11º do regime das Cláusulas Contratuais Gerais (aprovado pelo DL n.º 446/85, de 25.10)[16], atenta a inexistência de qualquer conflito entre as disposições em questão [cf., sobretudo, “conclusões 20ª e 21ª”, ponto I., supra].[17] 10. Naturalmente, ocorrendo situação excludente das coberturas do seguro facultativo (v. g., condução sob a influência do álcool, com uma taxa superior ao legalmente permitido), não é devida indemnização no âmbito da cobertura facultativa (“danos próprios”), pelo que não se coloca a questão do eventual exercício do direito de regresso (contra o condutor) por parte do segurador. Inexiste, pois, qualquer incongruência no estabelecido na “Parte III” da apólice de seguro, sob o enquadramento “Questões de caráter geral”, mormente no respetivo ponto 4. - assim redigido: «Outras disposições / À(s) cobertura(s) facultativa(s) subscrita(s) são aplicáveis todas as demais disposições previstas nas Condições Gerais, não alteradas pela(s) coberturas facultativas. (sublinhado nosso) -, afigurando-se incorreto dizer que o regime do direito de regresso previsto na mencionada clausula 31ª prevaleça tanto para o seguro obrigatório como para o seguro respeitante às coberturas facultativas. 11. Relativamente à requerida indemnização pelo pretenso dano decorrente da “paralisação” / “privação do uso” do veículo e da inoportuna regularização do sinistro - alegada intempestividade que se pretende imputar a atuação da Ré -,[18] antolha-se evidente que este pedido não poderá ter desfecho diferente dos demais, quer em razão da inexistência de qualquer concreta cobertura no âmbito do contrato de seguro celebrado entre as partes[19], quer por nenhuma demora (negligência ou irregularidade) poder ser imputada à Ré nos procedimentos de regularização do sinistro e de adequada e razoável tomada de posição no decurso da averiguação de todos os elementos relevantes para esse efeito [cf. “conclusões 23ª e seguintes”, ponto I., supra, e, designadamente, II. 1. 21), 24) a 26), 29), 30) e 36), supra, e art.ºs 130º, n.ºs 2 e 3 do RJCS e 36º, 38º, 41º e 43º do DL n.º 291/2007, de 21.8]. 12. Soçobram, desta forma, as demais “conclusões” da alegação de recurso, não se mostrando violadas quaisquer disposições legais. * III. Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida. Custas a cargo da A./apelante. * 11.10.2022
[1] Redação corrigida e simplificada. [2] Vide, entre outros, Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1979, págs. 284 e 386 e Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, Vol. II, 4ª edição, 2004, págs. 266 e seguinte. [8] Vide, entre outros, Pedro Romano Martinez, Contratos Comerciais, Principia, 2006, pág. 73 e José Vasques, Contrato de Seguro, Coimbra Editora, 1999, pág. 20, e os acórdãos do STJ de 02.10.1997 e 10.12.1997 in CJ-STJ, ano V, 3, págs. 45 e 158. E estabelece agora o art.º 1º do Regime Jurídico do Contrato de Seguro, aprovado pelo DL n.º 72/2008, de 16.4: “Por efeito do contrato de seguro, o segurador cobre um risco determinado do tomador do seguro ou de outrem, obrigando-se a realizar a prestação convencionada em caso de ocorrência do evento aleatório previsto no contrato, e o tomador do seguro obriga-se a pagar o prémio correspondente”. [12] Redação conferida pela Lei n.º 72/2013, de 03.9, aplicável à situação em análise. A redação atual, introduzida pelo DL n.º 102-B/2020, de 09.12 (que entrou em vigor em janeiro/2021 – cf. art.º 15º do referido diploma), é a seguinte: «Considera-se sob influência de álcool o condutor em regime probatório e o condutor de veículo de socorro ou de serviço urgente, de transporte coletivo de crianças e jovens até aos 16 anos, de táxi, de TVDE, de automóvel pesado de passageiros ou de mercadorias ou de transporte de mercadorias perigosas que apresente uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 0,2 g/l ou que, após exame realizado nos termos previstos no presente Código e legislação complementar, seja como tal considerado em relatório médico.» [13] Cf., de entre vários, o acórdão da RC de 27.5.2015-processo 36/12.9TBALD.C1, publicado no “site” da dgsi. [14] Com o seguinte teor: “satisfeita a indemnização, o segurador apenas tem direito de regresso contra o condutor, quando este tenha dado causa ao acidente e conduzir com uma taxa de alcoolemia superior à legalmente admitida, ou acusar consumo de estupefacientes ou outras drogas ou produtos tóxicos”. [17] Também se dirá que ante as especificidades do contrato de seguro dos autos, a existência de contrato de trabalho subordinado entre a A. e o condutor do veículo seguro e o demais apurado [cf. II. 1. 2), 3), 5) e 13), supra], não existe a apontada similitude com o caso do acórdão da RG de 11.10.2018-processo 114815/16.8YIPRT [assim sumariado: «1. Quando num contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel facultativo coexistem estas cláusulas: a) ficam excluídos das coberturas do seguro facultativo os sinistros em que o veículo seguro seja conduzido por pessoa que, para tanto, não esteja legalmente habilitada a conduzir; b) quando o condutor não estiver legalmente habilitado a conduzir, satisfeita a indemnização, o segurador tem direito de regresso contra o dito condutor, estamos perante uma flagrante contradição. 2. Para dirimir o litígio deve o Julgador averiguar se o condutor não legalmente habilitado a conduzir foi autorizado pelo tomador do seguro a pegar no veículo e conduzi-lo; se sim, aplica-se a cláusula de exclusão e a seguradora pode legitimamente recusar-se a satisfazer a indemnização; se não, e esse condutor actuou à revelia e sem consentimento ou conhecimento do proprietário tomador do seguro, então a seguradora é obrigada a indemnizar este, não se aplicando a cláusula de exclusão supra referida, mas, uma vez satisfeita a indemnização, fica com direito de regresso sobre o condutor não habilitado e abusivo. » ], publicado no “site” da dgsi. [18] O que constituiu a alínea A. do objeto do litígio, assim redigida: «A. O direito da autora a ser indemnizada pela ré, ao abrigo do contrato de seguro automóvel facultativo celebrado entre ambas, pelo dano de perda total do veiculo, bem como pela violação dos deveres acessórios de conduta ligados à boa fé na execução do contrato de seguro.» (cf. fls. 142). [19] Como bem se refere na decisão sob censura «(...) não foi alegada pela autora a contratação com a ré de qualquer cobertura de seguro quanto à paralisação do veículo em causa. Por seu turno, a ré alegou a não contratação de tal cobertura e da análise do contrato em apreço dos autos não se extrai a existência de tal cobertura. / Por outro lado, conforme se extrai da factualidade apurada, nos termos no Ponto 1.7 (Danos Próprios), sub-ponto 3 (Exclusões), sub-subponto 1. v) salvo indicação expressa em contrário, estão sempre excluídos os danos que consistam em lucros cessantes ou perda de benefícios e resultados advindos ao tomador de seguro e/ou segurado em virtude de privações de uso, gastos de substituição ou depreciação, desgaste ou consumo naturais.» |