Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | ABÍLIO RAMALHO | ||
Descritores: | PRÁTICA DE ACTOS PROCESSUAIS FAX/ TELECÓPIA LISTA OFICIAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS RECURSO | ||
Data do Acordão: | 06/01/2011 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | 3º JUÍZO CRIMINAL DO TRIBUNAL JUDICIAL DE COIMBRA | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | REJEIÇÃO DE RECURSO | ||
Legislação Nacional: | ARTIGOS 103.º, N.º 1, DO C. P. PENAL, E 150.º, NºS. 1 E 138.º-A, DO C. P. CIVIL, E 1.º, AL. A), E 2.º, DA PORTARIA N.º 114/2008, DE 06/02, D.L. N.º 28/92, DE 27/02 E D.L. N.º 66/2005, DE 15/3. | ||
Sumário: | 1.- A apresentação a juízo de actos processuais escritos, pelos respectivos sujeitos, no âmbito do processo penal e/ou contra-ordenacional e nos tribunais superiores, apenas poderá, licitamente, ser feita por um dos 3 (três) seguintes modos: a) Entrega na secretaria judicial, (valendo como data da prática do acto processual a da respectiva entrega); b) Remessa pelo correio, sob registo, (valendo como data da prática do acto processual a da efectivação do respectivo registo postal); c) Envio através de telecópia – nos estritos limites regulamentados e disciplinados pelo regime legal-especial aprovado pelo D.L. n.º 28/92, de 27/02 –, (valendo como data da prática do acto processual a da respectiva expedição). 2.- A prática de actos processuais por fax só é permitida aos advogados que constem da lista elaborada pela Ordem dos Advogados. 3.- Tendo o recurso sido enviado por telecópia (fax) expedido de terminal não constante da lista oficial, porque contrário a disposição legal de carácter imperativo, é nulo. | ||
Decisão Texto Integral: | DECISÃO-SUMÁRIA[1] I – INTRODUÇÃO
1 – Recorre a sociedade-arguida XXB, S.A. do despacho judicial – de 08/02/2011 – exarado na peça de fls. 174/177, que, por extemporaneidade, rejeitou a impugnação judicial da decisão administrativa[2] ora documentada a fls. 38/42 do presente processo, datada de 27/01/2010 – da própria condenatória ao pagamento de coima no valor de € 1.500,00 (mil e quinhentos euros) e custas, a título punitivo duma infracção contra-ordenacional p. e p. pelos arts. 198.º, n.º 2, al. a), e 204.º, ns. 1 e 2, da Lei n.º 23/2007, de 04/07, (utilização ao seu serviço de trabalhadora estrangeira com permanência ilegal no país) –, propugnando a respectiva revogação e a admissão de tal impugnação, pretensamente noticiada (por telecópia/fax) em 01/04/2010, em essencial razão de argumentada invalidade da notificação daquele acto condenatório (decisão administrativa), realizada por via postal registada com aviso de recepção (A.R.), assinado em 10/02/2010, e do efectivo/inicial conhecimento condenatório pelo seu legal representante apenas em 05/03/2010, (vd. peça de fls. 181/193 e 195/206 – respectivamente telecópia e próprio original – cujos dizeres se têm nesta sede por reproduzidos). 2 – O Ministério Público pronunciou-se – em primeira instância e nesta Relação – pela insubsistência argumentativa e pela consequente improcedência/rejeição recursória, (vide referentes peças processuais – de resposta e parecer – a fls. 214/216 e 223/224). II – AVALIAÇÃO
II.A – QUESTÃO PRÉVIA – Efeitos jurídicos da utilização da telecópia –
§ 1.º
No estádio actual do ordenamento jurídico nacional – a que, naturalmente, todos se haverão que escrupulosa e rigorosamente subordinar, [absolutamente a tal irrelevando a individual manifestação opinativa de referente desconhecimento e/ou discordância, (cfr. arts. 6.º e 8.º, n.º 2, do Código Civil), e/ou, doutra-sorte, a ilícita invocação, por quem-quer-que-seja, duma qualquer – eventual – indevida e censurável infiscalização do respectivo respeito/acatamento, posto que, evidentemente, nunca a ilegítima tolerância tácita dum qualquer acto desconforme à lei, ainda que reiterada, conferirá ao respectivo infractor a aquisição da concernente licitude] –, em função da dimensão normativa resultante da conjugação dos arts. 103.º, n.º 1, do C. P. Penal[3], e 150.º, ns. 1 e 2 (est’último subsidiariamente aplicável ao processo criminal, por força da estatuição do art.º 4.º do CPP), e 138.º-A, do C. P. Civil, (nas versões – últimas – decorrentes do DL n.º 303/2007, de 24/08)[4], e 1.º, al. a), e 2.º, da Portaria n.º 114/2008, de 06/02, (regulamentadora do citado art.º 138.º-A, do C. P. Civil, quer na redacção original, quer na que sucessivamente lhe foi introduzida pelas Portarias ns. 457/2008, de 20/06; 1538/2008, de 30/12; 195-A/2010, de 08/04; e 471/2010, de 08/07)[5], a apresentação a juízo de actos processuais escritos, pelos respectivos sujeitos, no âmbito do processo penal e/ou contra-ordenacional[6], e nos tribunais superiores, apenas poderá, licitamente, ser feita por um dos 3 (três) seguintes modos: 1 – Entrega na secretaria judicial, (valendo como data da prática do acto processual a da respectiva entrega); 2 – Remessa pelo correio, sob registo, (valendo como data da prática do acto processual a da efectivação do respectivo registo postal); 3 – Envio através de telecópia – nos estritos limites regulamentados e disciplinados pelo regime legal-especial aprovado pelo D.L. n.º 28/92, de 27/02 –, (valendo como data da prática do acto processual a da respectiva expedição). § 2.º
1 – Posto que, no caso sub judice, a manifestação recursiva – bem como, aliás, o pretenso exercício do contraditório referente ao parecer do M.º P.º, prevenido no n.º 2 do art.º 417.º do CPP, (vd. fls. 226/231) – foi opcionalmente efectivada por telecópia (fax) expedida de terminal não identificado entre as 23h:52m do dia 24/02/2011 e as 00h:01m do dia 25/02/2011, (vd. fls. 181/193), importará, em primeira linha, aferir da respectiva admissibilidade legal. Como antes se adiantou, a utilização de tal meio tecnológico encontra-se disciplinada/regulamentada pelo regime legal especial aprovado pelo Decreto-Lei n.º 28/92, de 27 de Fevereiro – ainda indubitavelmente vigente no ordenamento jurídico português[7], quer por nunca haver sido inequivocamente revogado por qualquer diploma legal posterior, como se exige no art.º 7.º, ns. 1 e 3, do Código Civil, [mormente pelo Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27 de Dezembro, que, entre outros, alterou o art.º 150.º do C. P. Civil, ou mesmo pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto, que operou nova alteração ao mesmo compêndio legal, incluindo o citado normativo], quer por ser a única conclusão que apodicticamente se compatibiliza e impõe, por interpretação sistemática, (em conformidade com o disposto art.º 9.º, n.º 1, do Código Civil), com o idêntico/similar espírito (e conteúdo) legislativo inerente ao ulterior D.L. n.º 66/2005, de 15 de Março, que regula a transmissão e recepção por telecópia e por via electrónica pelos serviços registrais, cartórios notariais e outros serviços, bem como a recepção pelas mesmas vias por advogados e solicitadores, de documentos com valor de certidão respeitantes aos arquivos dos serviços registrais e cartórios notariais ou destinados à instrução de actos ou processos dos registos e do notariado ou a arquivo nos respectivos serviços, (vide respectivo art.º 1.º) –, cujo artigo 2.º – aplicável aos actos praticados em processos de natureza criminal e/ou contra-ordenacional, por expressa determinação do sequente art.º 3.º, n.º 1 -, estatui pelo seguinte modo (com realces nossos): Ora, como claramente decorre do n.º 1, al. b), de tal normativo, só aos advogados constantes da lista oficial organizada pela respectiva Ordem, enunciativa dos interessados na utilização de telecópia na comunicação e recepção de mensagens com os serviços judiciais, bem como dos números dos respectivos equipamentos, é permitida a prática de tais actos por esse meio, que, por tal sorte, e logicamente, é vedada aos demais. Por conseguinte, o acto de transmissão de mensagens e/ou peças processuais, por telecópia, a partir de equipamento não incluído na referida lista oficial, porque contrário a disposição legal de carácter imperativo, é inexoravelmente nulo[8], (cfr. arts. 294.º e 295.º do Código Civil). 2 – Destarte, para além de se não identificar o n.º do terminal de telefax a partir do qual foi expedida tal telecópia comunicativa a juízo da vontade e motivação recursória, tendo presente que a Ex.ma advogada da respectiva peça signatária é a tal lista oficial estranha – como se pode observar, máxime, quer do Ofício-Circular n.º 25/2007 (GIRPD), de 20/04, disponível/consultável em http://www.dgaj.mj.pt/DGAJ/sections/files/circulares/2007, quer da página http://www.oa.pt/Servicos/PesqAdvogados/pesquisa_adv.aspx?idc=31897&nome=Ver%c3%b3nica+Mendes&ordenacao=0 –, impõe-se concluir pela invalidade/nulidade do dito acto de transmissão da enunciada manifestação de vontade recursiva e respectiva peça motivacional, pelo referido meio e, decorrentemente, pela extemporaneidade da respectiva acção, posto que a apresentação do referente original, em 09/03/2011, (vd. fls. 195/206) – primeiro/único acto para o efeito juridicamente válido –, ocorreu quando já se encontrava precludido/extinto o correspondente direito, o que inexoravelmente aconteceu em 28/02/2011, segunda-feira, 1.º dia útil subsequente ao 10.º dia – termo final, 28/02/2011, sábado – do prazo legal de recurso prevenido no n.º 1 do art.º 74.º do Regime Geral das Contra-Ordenações, (RGCO), aprovado pelo Decreto-Lei 433/82, de 27/10, (na versão decorrente do DL n.º 244/95, de 14/09), contado desde a notificação do questionado despacho, presumivelmente efectivada em 16/02/2011, quarta-feira, 3.º dia útil posterior à expedição – em 11/02/2011, sexta-feira, (vd. fls. 179) – da respectiva via postal registada, (vide arts. 41.º, n.º 1, do RGCO; 113.º, n.º 2, 103.º, n.º 1, e 104.º, n.º 1, do C. P. Penal; e 144.º, n.º 1, e 145.º, ns. 1 e 3, do C. P. Civil). § 3.º
Idêntico raciocínio e conclusão jurídica de invalidade – por nulidade – se estende, e consequentemente se aplica, a todos os demais actos de expedição de peças processuais realizados, por telecópia, pela mesma Ex.ma advogada, a partir de terminal de telefax não identificado, particularmente os atinentes à comunicação da impugnação judicial da decisão administrativa, (pretensa/parcialmente documentados a fls. 83 e 56/59), e à resposta ao parecer do M.º P.º já nesta Relação, (ínsita a fls. 226/231). II.B – Subsidiária inconsequência jurídica da impugnação judicial – Todavia, ainda que outro entendimento jurídico porventura se ousasse, sempre a convocada impugnação judicial da decisão administrativa se quedaria juridicamente inconsequente, pela seguinte ordem-de-razões: § 1.º
1 – A entidade jurídico-empresarial autuada na acção inspectiva do SEF e oportunamente condenada pelo cometimento da caracterizada infracção contra-ordenacional de utilização de trabalhadora estrangeira com permanência ilegal no país, [p. e p. pelos arts. 198.º, n.º 2, al. a), e 204.º, ns. 1 e 2, da Lei n.º 23/2007, de 04/07], foi a sociedade comercial anónima XXB..., , S.A., (vd. peças de fls. 8 e 38/42). 2 – Porém, a que se apresentou a impugnar tal acto condenatório foi a sociedade comercial por quotas ESTABELECIMENTOS XXB...–,S.A., (vd. peças de fls. 56/59, 69/82 e 95/109). 3 – Como assim, tratando-se de entidades juridicamente distintas – nada nos autos documentalmente demonstrando qualquer relação de sucessão jurídica entre si –, impor-se-á axiomaticamente concluir pelo oficioso reconhecimento da excepção dilatória de ilegitimidade jurídico-processual dest’última, não arguida, para o questionamento de tal decisão administrativo-condenatória, [cfr. arts. 59.º, n.º 2, do RGCO; 26.º, 493.º, ns. 1 e 2, 494.º, al. e), e 495.º, do C. P. Civil]. § 2.º
1 – Ademais, nada nos autos inculcando que a notificação da dita decisão condenatória à id.ª sociedade-arguida XXB...,S.A. não foi realizada com pertinente/rigorosa observância das formalidades legais estabelecidas nos arts. 46.º e 47.º, n.º 1, do RGCO, e 113.º, ns. 1, al. b), e 5, do C. P. Penal, (como esclarecido, subsidiariamente aplicável por força do n.º 1 do art.º 41.º do RGCO) – antes o contrário se observando do teor de fls. 44/46 –, haver-se-la-á por perfectibilizada na data da assinatura do aviso de recepção (A.R.) da respectiva carta registada, junto a fls. 46, ou seja em 10/02/2010, como se ajuizou no despacho recorrido. III – DISPOSITIVO
1 – Assim, impondo-se concluir, por qualquer das enunciadas perspectivas, pelo trânsito-em-julgado quer da questionada decisão administrativa quer do sindicado despacho judicial de 08/02/2011 (documentado na peça de fls. 174/177), em conformidade com a dimensão normativa resultante da integrada interpretação dos dispositivos 417.º, n.º 6, al. b), e 420.º, ns. 1, als. a) e b), e 2, do C. P. Penal, decido a rejeição do caracterizado recurso. 2 – Consequentemente condeno a id.ª sociedade-recorrente XXB..., S.A. ao pagamento da sanção pecuniária equivalente a 4 (quatro) UC, nos termos do n.º 3 do citado art.º 420.º do CPP, a que acrescerá o montante de 3 (três) UC, a título de taxa de justiça, pelo decaimento no recurso, (cfr., ainda, normativos 513.º, n.º 1, do CPP, e 8.º, n.º 5, do Regulamento das Custas Processuais). *** Despacho elaborado pelo signatário, (cfr. art. 94.º, n.º 2, do C. P. Penal). *** Coimbra, 01/06/2011.
O Juiz-desembargador-relator:
......................................................................... (Abílio Ramalho)
2 – Decorrentemente, havendo-se o prazo legal – de impugnação judicial –, de 20 (vinte) dias, prevenido nos arts. 59.º, n.º 3, e 60.º, do RGCO, que contar desde então, ter-se-á inescapavelmente de concluir que o respectivo termo final – descontados, nos termos legais, sábados e domingos – ocorreu em 10/03/2010, data, pois, do trânsito-em-julgado da questionada decisão administrativa, dado que até então nenhum concernente impulso processual a mesma sociedade-arguida (XXB..., S.A.) formalizou. |