Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
414/15.1T8LMG-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JORGE MANUEL LOUREIRO
Descritores: REMIÇÃO DE PENSÃO
REMIÇÃO PARCIAL E FACULTATIVA
Data do Acordão: 02/20/2019
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE VISEU – JUIZO DO TRABALHO DE LAMEGO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ART.75º/2 DA LAT/2009
Sumário: É passível de remição parcial e facultativa, em 2018, uma pensão no valor de 7.449,89 euros, correspondente a uma IPP de 35%, com IPATH, auferindo o sinistrado, à data do acidente, a retribuição anual de 12.775 euros.
Decisão Texto Integral:




Acordam na 6.ª secção social do Tribunal da Relação de Coimbra

I – Relatório

O sinistrado nestes autos, nascido em 6/10/1969, veio requer, em 5/4/2018, a remição facultativa e parcial da pensão que lhe é devida pela responsável com fundamento num acidente de trabalho que o vitimou em 17/6/2014, por força do qual padecia, à data do pedido de remição, de uma IPP de 35%, com IPATH, a que correspondia a pensão actualizada de 7.449,89€.

O tribunal recorrido indeferiu a pretensão do recorrente nos seguintes termos: “A pensão inicial é, portanto, no valor de 7.281,75€ desde 12.12.2016, actualizada para 7.318,16€ (+ 0,5%) a partir de 01.01.2017 e para 7.449,89€ (+ 1,8%) a partir de 01.01.2018.

A pensão anual sobrante não pode ser inferior ao sêxtuplo da rmmg em 2017, 557,00€ x 6 = 3.342,00€ (artº 75º, nº 2, al. a), LAT).

A pensão calculada com base numa IPP de 30%, é de 12.775,00€ x 30% x 70% = 2.682,75€, pelo que a pensão anual sobrante seria de 3.342,00€.

Assim, a pensão a remir seria, tomando como valor o da pensão em 2017, de 7.318,16€ – 3.342,00€ = 3.976,16€, valor este que não permite a remição parcial, face ao disposto no art. 75º, al. b), da LAT.

Assim, tal como promovido, indefere-se a requerida remição parcial da pensão.”.

Não se conformando com o assim decidido, apelou o sinistrado, rematando as suas alegações com as conclusões seguidamente transcritas:

...

Não foram apresentadas contra-alegações.

Nesta Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da procedência do recurso.

Colhidos os vistos legais, importa decidir.

II - Principais questões a decidir

Sendo pelas conclusões que se delimita o objecto do recurso (artigos 635º/4 e 639º/1/2 do Código de Processo Civil aprovado pela Lei 41/2013, de 26/6 – NCPC – aplicável “ex-vi” do art. 87º/1 do Código de Processo do Trabalho – CPT), integrado também pelas que são de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido decididas com trânsito em julgado, é a seguinte a questão a decidir: saber se pensão do sinistrado é passível de remição parcial e facultativa.

III – Fundamentação

A) De facto

Os factos relevantes para esta decisão são os que emergem do antecedente relatório.

B) De direito

Questão única: saber se pensão do sinistrado é passível de remição parcial e facultativa.
Nos termos do art.75º/2 da LAT/2009, “Pode ser parcialmente remida, a requerimento do sinistrado ou do beneficiário legal, a pensão anual vitalícia correspondente a incapacidade igual ou superior a 30 % ou a pensão anual vitalícia de beneficiário legal desde que, cumulativamente, respeite os seguintes limites:
a) A pensão anual sobrante não pode ser inferior a seis vezes o valor da retribuição mínima mensal garantida em vigor à data da autorização da remição;
b) O capital da remição não pode ser superior ao que resultaria de uma pensão calculada com base numa incapacidade de 30 %.”.
Uma vez que a concreta aplicação prática desta norma e dos limites nela consagrados para a remição parcial se prestam a algumas dificuldades e equívocos, nada melhor do que tentar enunciar algumas regras a observar na sua aplicação e enunciar alguns exemplos concretos de aplicação dessas regras.
Assim, partindo do pressuposto de que está preenchido a regra enunciada no corpo do artigo (IPP igual ou superior a 30% ou a pensão anual vitalícia de beneficiário legal), há que repartir a pensão em dois blocos, a saber: i) o primeiro referente ao valor mínimo não remível enunciado na alínea a) – 6 x RMMG à data da autorização da remição, doravante pensão mínima não remível - PMNR; ii) o segundo correspondente à diferença entre a pensão anual e a PMNR,  doravante parte da pensão passível da remição – PPPR), a qual nem sempre é passível de integral remição porque o art. 75º/2/b limita o capital de remição ao montante que resultaria da remição de uma pensão do sinistrado calculada com base numa incapacidade de 30% - Retribuição anual x 0,70 x 0,30, doravante pensão de incapacidade de 30% (PI30%).
Determinados os parâmetros atrás enunciados, há que comprar a PPPR com a PI30%, na certeza que só é passível de remição o menor desses valores: se a PPPR for igual ou inferior à PI30%, aquela será passível de integral remição, ficando o sinistrado a receber, como pensão sobrante, a PMNR; se a PPPR superior à PI30%, a PPPR não pode ser totalmente remida, sem que daí resulte, ao contrário do que parece sustentar-se na decisão recorrida, uma impossibilidade total de remição da pensão, pois que continua a ser remível, apenas, o valor correspondente à PI30%, ficando o sinistrado a receber, como pensão sobrante, a diferença entre a pensão anual total e a parte desta pensão que foi objecto de remição.
Vejamos agora alguns exemplos[1]:
EXEMPLO 1:
Retribuição anual:................................................. € 14 000,00
Incapacidade (IPP):................................................ 35%
Idade para efeitos do cálculo..................................... 40 anos
Taxa da tabela prática (Portaria 11/2000):..................... 15,550
Pensão anual = € 14 000,00 x 0,70 x 0,35 = € 3 430,00
PMNR no ano 2012 = € 485,00 x 6 = € 2 910,00
PPPR = € 3 430,00 – € 2 910,00 = € 520,00
PI30% = € 14 000,00 x 0,70 x 0,30 = € 2 940,00
A PPPR é inferior à PI30% e, assim, opera-se do seguinte modo:
Capital de remição (parcial) = € 520,00 x 15,550 = € 8.086,00;
Pensão sobrante € 2 910,00.
EXEMPLO 2: (difere do exemplo 1 apenas quanto à IPP, que é agora de 65%)
Retribuição anual:................................................ € 14 000,00
Incapacidade (IPP):............................................... 65%
Idade para efeitos do cálculo.................................... 40 anos
Taxa da tabela prática (Portaria 11/2000): ................... 5,550
Pensão anual = € 14 000,00 x 0,70 x 0,65 = € 6 370,00
PMNR no ano 2012 = € 485,00 x 6 = € 2 910,00
PPPR = € 6 370,00 – € 2 910,00 = € 3.460,00
PI30% = € 14 000,00 x 0,70 x 0,30 = € 2 940,00
Neste caso a PI30% é inferior à PPPR, sando passível de remição, apenas, o valor correspondente à PI30%, operando-se do seguinte modo:
Capital de remição (parcial) = € 2 940,00 x 15,550 = € 45 717,0019;
Pensão sobrante = € 6 370,00 – € 2 940,00 = € 3 430,00
EXEMPLO 3:
Retribuição anual:................................................ € 7 000,00
Incapacidade (IPP):.............................................. 35%
Idade para efeitos do cálculo.................................. 40 anos
Taxa da tabela prática (Portaria 11/2000): ................ 15,550
Pensão anual = € 7 000,00 x 0,70 x 0,35 = € 1 715,00
PMNR no ano 2012 = € 485,00 x 6 = € 2 910,00
PPPR = € 1 715,00 – € 2 910,00 = - € 1 195,00
PI30% = € 1 715,00 x 0,70 x 0,30 = € 360,15.
Esta pensão não é remível.
Não o é obrigatoriamente porque a IPP é superior a 30 % (art. 75º/1); e não o é facultativamente porque apesar da IPP ser superior a 30 %, a diferença entre a pensão anual e a PMNR é inferior ao que corresponde à pensão anual sobrante, não estando verificado, assim, o requisito do art. 75º/2/a.

Δ
Revertendo agora ao caso dos autos temos que o sinistrado nasceu a 6/10/1969, remontando a 5/4/2018 o pedido de revisão, a significar que a esta data o sinistrado tinha 47 anos de idade, a que corresponde um factor de capitalização da remição de 14,270.
O salário mínimo nacional em 2018 era de 580 euros.
O sinistrado auferia, à data do acidente, a retribuição anual de 12.775 euros, auferindo à data do pedido de remição a pensão anual de 7.449,89 euros.
Temos assim que:
PMNR - 580 euros x 6 = 3.480 euros;
PI30% - 2.682,75 euros;
PPPR - 7449,89 euros – 3480 euros = 3969,89;
Pensão remível – 2682,75 euros;
Pensão sobrante – 7449,89 euros - 2682,75 euros = 4767,14 euros;

Capital de remição: 37.727,51 euros.

IV- DECISÃO
Acordam os juízes que integram esta sexta secção social do Tribunal da Relação de Coimbra no sentido de julgar a apelação procedente, decretando-se a remição parcial e facultativa da pensão do sinistrado nos seguintes termos: pensão remível – 2682,75 euros; pensão sobrante – 4767,14 euros; capital de remição: 37.727,51 euros.
Sem custas.
Coimbra, 20/2/2019.

                                      (Jorge Manuel Loureiro)


(Paula Maria Roberto)

(Ramalho Pinto)




[1] https://e-learning.mj.pt/dgaj/dados/0F/004/0F006TEMA2.pdf