Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | ALBERTO RUÇO | ||
Descritores: | VALOR DA CAUSA LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ | ||
Data do Acordão: | 06/20/2012 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | TORRES NOVAS 2º J | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Legislação Nacional: | ARTS.305, 306, 456 CPC | ||
Sumário: | O valor da indemnização pedida com base em litigância de má fé não entra no cômputo do valor da causa, determinando-se este valor apenas de acordo com a utilidade imediata do pedido, nos termos do artigo 305.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, conceito que não compreende, na sua extensão, a mencionada indemnização. | ||
Decisão Texto Integral: | I. Relatório.
a) O presente recurso vem interposto do despacho saneador que julgou improcedente a oposição à execução que a recorrida E (…), Lda., move aos recorrentes P (…) e V (…) Entre as várias questões suscitadas cumpre começar pela que respeita ao valor da acção, pois a admissibilidade dos recursos, salvo algumas excepções, nas quais não se inclui o presente caso, está, em regra, dependente do valor do processo. Com efeito, a regra prescrita no n.º 1, do artigo 678.º, do Código de Processo Civil, determina que «O recurso ordinário só é admissível quando a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre e a decisão impugnada seja desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal, atendendo-se, em caso de fundada dúvida acerca do valor da sucumbência, somente ao valor da causa». Face a esta norma, ressalvando as excepções previstas na lei, só pode haver recurso da decisão se o valor do processo for superior à alçada do tribunal de que se recorre. No caso presente, a alçada do tribunal de que se recorre, que é o da 1.ª instância, é de €5000,00 euros (Ver n.º 1, do artigo 24.º, da Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro – Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais –, alterado pelo artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto). O valor do presente processo foi fixado na 1.ª instância em €4318,20 euros, portanto abaixo da alçada deste tribunal. Os recorrentes entendem que o valor do processo é de €5818,20 euros, porque ao valor inicial de €4318,20 euros somam o valor de €1500,00 euros a título de indemnização que cada um dos oponentes, agora recorrentes, pede com fundamento em litigância de má fé da exequente. A recorrida nas contra-alegações argumenta que «Na litigância de má-fé o que está primordialmente em causa é a ofensa ao valor público da boa administração da justiça e só reflexamente o interesse da parte lesada. Daí que a formulação/contestação desse pedido não seja tratado como um incidente sujeito a preparo, nem tenha de ser deduzido através de reconvenção e/ou ampliação do pedido (quando a sua iniciativa caiba ao autor), razões pelas quais não contendo com qualquer "utilidade económica" a que faz referência o n.º 1 do artigo 305.º do C.P.C., e tão pouco esteja contemplada em qualquer dos critérios especiais dos artigos 306.º a 318.º daquele diploma legal. Daí que os valores peticionados em sede de litigância de má-fé não sejam considerados para efeitos de valor da acção, como os próprios recorrentes o fizeram quando indicaram o valor da causa». Por conseguinte, o valor da indemnização pedida com base em litigância de má fé não entra no cômputo do valor da causa, determinando-se este valor apenas de acordo com a utilidade imediata do pedido, nos termos do artigo 305.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, conceito que não compreende, na sua extensão, a mencionada indemnização. b) Caso improceda o recurso no que respeita à matéria relativa ao valor do processo, isso implica a inadmissibilidade do recurso no que respeita às restantes questões, por estarem compreendidas na alçada o tribunal de 1.ª instância, como resulta do já exposto, salvo quanto à questão da litigância de má fé, porquanto este é um dos casos excepcionais em que há sempre recurso independentemente do valor da causa (artigo 456.º, n.º 3, do Código de Processo Civil). Por conseguinte, se porventura se vier a decidir de seguida que o valor do processo é o fixado em 1.ª instância, apenas se tratará, depois, do recurso na parte relativa à má fé. II. Objecto do recurso quanto ao valor. O objecto do recurso quanto ao valor da causa respeita à questão de saber se o valor do pedido de indemnização por litigância de má fé, feito pelos executados na petição da oposição à execução, entra no cálculo do valor do processo. III. Fundamentação. a) A decisão sob recurso tem o seguinte teor: «De acordo com o artigo 315.º, n.º 1 do C.P.C., na redacção que lhe foi introduzida pelo D.L. 303/07, de 24-08, incumbe ao juiz fixar o valor da causa. Conforme resulta da regra geral do artigo 306.º, n.º 1 do Código do Processo Civil., “Se pela acção se pretende obter quantia certa em dinheiro, é esse o valor da causa, não sendo atendível impugnação nem acordo em contrário; se pela acção se pretende obter um benefício diverso, o valor da causa é a quantia em dinheiro equivalente a esse benefício.” De facto, com a Oposição, o Oponente pretende ver soçobrar a acção executiva, e assim não ter que pagar a quantia exequenda, que representa, assim, o benefício pecuniário que o Oponente pretende obter. Atento o exposto, decide-se fixar o valor da acção em € 4.318,20». Não há razão para alterar esta decisão. Com efeito, a questão deve ser vista tal como vem analisada na decisão sob recurso e tal como a enquadra a exequente, ou seja, segundo a regra estabelecida no n.º 1 do artigo 305.º do Código de Processo Civil, onde se dispõe que «A toda a causa deve ser atribuído um valor certo, expresso em moeda legal, o qual representa a utilidade económica imediata do pedido», sendo este o valor, acrescenta o n.º 2 deste artigo, que determina «…a competência do tribunal, a forma do processo comum e a relação da causa com a alçada do tribunal». Face a estas regras, verifica-se, sem esforço, que o pedido de indemnização com base na litigância de má fé não tem qualquer conexão com «a utilidade económica imediata do pedido» e é apenas esta utilidade, como se viu, que conta para efeitos de determinar o valor do processo. O Supremo Tribunal de Justiça já se pronunciou sobre esta questão no seu acórdão de 22 de Novembro de 2006 (http://www.gdsi.pt, processo n.º 06S1542), tendo decidido que «O pedido de condenação da parte contrária, como litigante de má fé, em multa e em indemnização, não releva para a determinação do valor da causa, nem pode ser tido em conta para achar o valor do decaimento do pedido com vista a apurar se a decisão é recorrível ou não». Cumpre, por conseguinte, julgar o recurso improcedente relativamente à alteração do valor da causa, confirmando-se a decisão da 1.ª instância. b) A questão que cumpria agora apreciação respeitava à condenação dos executados, agora recorrentes, como litigantes de má fé. Porém, apenas há que fazer referência a esta questão para dizer que a mesma não deve ser analisada porque não faz parte do objecto do recurso. Embora os recorrentes se refiram a esta matéria na parte relativa à fundamentação do recurso, o certo é que nas conclusões do recurso nada concluíram ou pedem relativamente à revogação da decisão que os condenou na multa de duas UCs como litigantes de má fé, o que implica que esta questão não faça parte do objecto do recurso. Com efeito, face ao disposto no n.º 3 do artigo 684.º e 685.º-A, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil, o objecto do recurso é definido nas conclusões, pelo que, se nada é mencionado nas conclusões sobre uma determinada matéria, tal matéria não faz parte do pedido formulado ao tribunal superior. A este respeito o Prof. Alberto do Reis esclarecia que «O tribunal superior tem de guiar-se pelas conclusões da alegação para determinar, com precisão, o objecto do recurso; só deve conhecer, pois, das questões ou pontos compreendidos nas conclusões, pouco importando a extensão objectiva que haja sido dada ao recurso, quer no requerimento de interposição de recurso; quer no corpo da alegação. Daí vem que, interposto recurso amplo, se nas conclusões da alegação não se pede que a decisão recorrida seja modificada ou revogada quanto a certa parte, o objecto inicial do recurso fica implicitamente limitado aos pontos versados nas conclusões» (Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, pág. 309, - Reimpressão -, Coimbra/1984). Conclui-se, pois, esta parte, referindo que a questão relativa à condenação dos executados como litigantes de má fé não faz parte do objecto do recurso e por isso não é analisada. IV. Decisão. Considerando o exposto, julga-se improcedente o recurso na parte relativa ao valor do processo e confirma-se o decidido a este respeito em 1.ª instância. Julga-se inadmissível o recurso quanto às demais questões colocadas nas conclusões do recurso por estarem compreendidas na alçada do tribunal de que se recorre. Custas pelos recorrentes. *
Alberto Ruço ( Relator ) Judite Pires Carlos Gil |