Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | ALBERTO RUÇO | ||
Descritores: | SIGILO BANCÁRIO QUEBRA | ||
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Data do Acordão: | 01/14/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA - LEIRIA - JC CÍVEL -JUIZ 4 | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | LEVANTAMENTO/QUEBRA DE SIGILO | ||
Decisão: | IMPROCEDÊNCIA/NÃO DECRETAMENTO | ||
Legislação Nacional: | ARTIGOS 417.º DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ARTIGO 135.º DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL ARTIGO 92.º DO ESTATUTO DA ORDEM DOS ADVOGADOS - LEI N.º 145/2015, DE 09 DE SETEMBRO | ||
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Sumário: | Considerando o disposto nos artigos 417.º do Código de Processo Civil e 135.º do Código de Processo Penal, o bem jurídico da confiança encabeçado em todos os cidadãos, tutelado pelo sigilo profissional previsto no artigo 92.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, no sentido de poderem confiar que os advogados não revelarão a terceiros, designadamente em tribunal, os factos de que tiveram conhecimento por causa do exercício das suas funções, prevalece, em regra, sobre o interesse de um cidadão particular em obter tutela jurídica para interesses patrimoniais da sua esfera jurídica, ainda que de valor elevado (775 607,33 euros), que resultam segundo o alegado, da violação de direitos emergentes de relações contratuais. (Sumário elaborado pelo Relator) | ||
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Decisão Texto Integral: | *
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra, * Juiz relator………….....Alberto Augusto Vicente Ruço 1.º Juiz adjunto………..Carlos António Paula Moreira 2.º Juiz adjunto………. João Manuel Moreira do Carmo * * Requerentes...………………………...A..., Lda; e ………………………………….……….AA. Requerido…………………… ……….BB.
* I. Relatório a) Os presentes autos respeitam a um procedimento de dispensa do dever de sigilo profissional previsto nas disposições conjugadas dos artigos 417.º do Código de Processo Civil e 135.º do Código de Processo Penal. 1 – Respeita ao sigilo profissional de advogado e às testemunhas Dr. CC e Dra. DD arroladas pelos réus. 2 – Na petição, o autor BB, pede o seguinte: «Nestes termos e nos melhores de direito deve a presente ação ser julgada procedente, por provada, e consequentemente: 1. Serem os Réus condenados a reconhecer a validade do acordo contratual e contrato de penhor celebrados em 28 de janeiro de 2016, bem como do acordo contratual celebrado em 16 de junho de 2016. 2. Ser conferida força executiva ao penhor celebrado em 28 de janeiro de 2016. 3. Serem os Réus condenados a pagar ao Autor, solidariamente, a quantia de € 221.760,27 (duzentos e vinte e um mil euros setecentos e sessenta euros e vinte sete cêntimos) acrescida das quantias que o Autor vier a pagar, a título de juros e de imposto de selo, na pendência desta ação, até ser proferida decisão transitada em julgado, bem como de juros de mora civis, à taxa legal de 4%, vencidos e vincendos, calculados desde 16 de janeiro de 2017 até integral e efetivo pagamento, que até à data se cifram na quantia de € 28.847,06 (vinte e oito mil oitocentos e quarenta e sete euros e seis cêntimos). 4. Serem os Réus condenados a pagar ao Autor, solidariamente, a quantia de € 25.000,00 (vinte cinco mil euros), a título de cláusula penal. Em alternativa: 5. Serem os Réus condenados a reconhecer a validade do acordo contratual e contrato de penhor celebrados em 28 de janeiro de 2016, bem como do acordo contratual celebrado em 16 de junho de 2016. 6. Serem os Réus condenados a reconhecer que o Autor adquiriu, por dação em pagamento, a propriedade das 125.000 (cento e vinte cinco mil) ações nominativas, com o valor nominal de € 1,00 (um euro), cada, e uma prestação acessória de € 156.250,00 (cento e cinquenta e seis mil duzentos e cinquenta euros), da sociedade comercial anónima “B..., S.A.”, com o número único de matricula e de identificação de pessoa coletiva ...05, com sede em Rua ..., ..., .... 7. Ser declarado que o Autor pode dispor das ações que lhe foram dadas em penhor, podendo vender as mesmas, pelo preço e condições que entender convenientes, a quem entender. 8. Serem os Réus condenados a praticar todos os atos e assinar toda a documentação necessária para a formalização da transmissão das ações.» 3 – Os réus A..., Lda., e AA deduziram reconvenção e pediram: (…) «b) - deve a reconvenção ser julgada totalmente procedente, por provada, e, em consequência, ser declarada a nulidade do pretenso endosso das ações identificadas no art. 3º da p.i. pela A... ao autor, bem como da entrega dessas ações a este, sendo o mesmo condenado a reconhecer tal nulidade; - ser o autor condenado a restituir essas ações à A..., devidamente endossadas.» 4 – No saneador datado de 17 de junho de 2021 identificaram-se os seguintes temas de prova: «a. Saber se a quantia de €250.000,00 referida sob os artigos 12º e seguintes da petição inicial se destinou, em parte, a ser usada pela 1ª ré no cumprimento das suas obrigações. b. Conhecer o concreto contexto em que o autor teve intervenção no respetivo empréstimo e o que foi acordado, a esse respeito, entre ele, EE, FF e GG, nomeadamente, o referente às 125.000 ações nominativas da sociedade B.... c. Conhecer os termos do invocado acordo de 16 de junho de 2016. d. Saber o que foi acordado, com o 2º réu, aquando das negociações tendentes à sua entrada para o capital social da 1ª ré, no respeitante ao pagamento, ao Banco 1..., da dívida advinda do empréstimo e à retirada ou substituição de aval prestado pelo autor. e. Aferindo, nomeadamente, se o 2º réu assumiu, pessoalmente, junto do autor o compromisso de substituir o seu aval e de lhe pagar a quantia titulada pela livrança se este a viesse a pagar ao Banco 1.... f. Conhecer os factos referentes ao alegado pagamento do autor ao Banco 1... (motivo pelo qual o fez e com que recursos) e quais os custos que suportou. g. Saber se, antes desse pagamento, o 2º réu tentou negociar com o Banco 1... o diferimento do pagamento da dívida e tornar-se avalista da mesma, em substituição do autor e se tal proposta foi rejeitada. h. Saber se a 1ª ré não recebeu e não beneficiou de qualquer quantia do financiamento aludido em a., nem as obrigações assumidas no acordo referido em c. tiveram para a mesma qualquer contrapartida ou benefício, e se tais factos eram do conhecimento do autor. i. Saber se o 2º réu sempre teve conhecimento de tudo o que está em causa nestes autos, nomeadamente de todos os contratos, muito antes de ter sido nomeado gerente da 1ª ré, porque, muito antes dessa sua nomeação formal como gerente da 1ª ré, já o 2º réu intervinha na gestão da sociedade, conjuntamente com EE. j. Saber se EE, mesmo durante o tempo em que não era gerente de direito da 1ª ré, foi sempre seu gerente de facto, representando-a junto dos trabalhadores, fornecedores, bancos e demais entidades, tendo sido perante ele, enquanto representante da 1ª ré, que o 2º réu negociou a sua entrada no capital social daquela. k. Saber se estava mandatado pela sua filha, FF, para outorgar o acordo contratual em questão nos autos. l. E se o autor jamais pensou que EE não pudesse representar formalmente a 1ª ré.» 5 – Os réus pretendem que estas testemunhas sejam inquiridas à matéria indicada nos artigos 14º a 22º, 32º a 34º, 36º a 43º, 65º, 67º, 74º a 81º, 87º e 88º da contestação. Ou seja: «14º Por sua vez, o réu AA tinha então grande experiência, conhecimentos e prestígio comercial e técnico e credibilidade nos ramos da importação, exportação, comercialização e aluguer de máquinas, equipamentos, assessórios e peças, bem como da prestação de assistência técnica a máquinas e equipamentos para os setores da construção civil e obras públicas, extração e processamento mineral, agricultura e floresta, ambiente e reciclagem, logística e transportes. 15º Sendo acionista, sócio, administrador e gerente de várias sociedades comerciais que se dedicavam a essas atividades, designadamente da C..., SA, doravante C... – doc. nº 3. 16º Acresce que desde 2002 o réu AA está coletado e exerce como empresário em nome individual as atividades de comércio por grosso de máquinas e ferramentas, comércio de outros veículos automóveis, aluguer de máquinas e equipamentos e arrendamento de bens imobiliários – doc. nº 4. 17º Neste quadro, conhecedor dos factos referidos nos arts. 14º a 16º desta contestação, em meados de 2016, o EE abordou o réu AA, tendo dito a este que a A... tinha boas probabilidades de vir a ser representante de máquinas e equipamentos da prestigiada marca Hyundai, mas para conseguir essa representação necessitava de apresentar um curriculum comercial mais robusto, ter sócios e gerentes com experiência, prestígio comercial e técnico e credibilidade no setor da comercialização e manutenção de máquinas e equipamentos, aumentar o seu capital social, obter crédito, designadamente junto da banca e de clientes, ter disponibilidade financeira e ampliar a respetiva faturação, não possuindo ele nem a FF condições e dinheiro para concretizar tal projeto. 18º Tendo então o EE proposto ao réu AA que este entrasse para o capital social da A..., de modo a que esta conseguisse reunir os referidos requisitos, designadamente por via da aquisição e fornecimento de mercadorias e serviços ao referido réu e às empresas a que o mesmo estivesse ligado. 19º Dado que a aludida marca Hyundai possuía elevado prestígio comercial e capacidade de penetração no mercado, o réu AA interessou-se pela proposta. 20º Após várias conversações, o réu AA, o EE e a FF acordaram no seguinte: - o capital social da A... seria aumentado através de entradas em dinheiro para €130.000,00, ascendendo portanto esse aumento a € 122.518,00; - a C... ficaria com uma nova quota, do valor nominal de € 78.000,00, correspondente a 60% desse capital, entregando tal quantia à A...; - o EE e a FF ficariam com quotas do valor nominal global de € 52.000,00, correspondentes a 40% do referido capital, entregando à A... a importância de € 44.518,00, uma vez que já detinham nesse capital quotas no montante global de € 7.482,00; - a A... passaria a ter dois gerentes, sendo um o EE e outro o réu AA. 21º Entretanto, no decurso da preparação da formalização desse acordo, o EE comunicou ao réu AA que se encontrava com problemas noutras sociedades, correndo riscos patrimoniais, sobretudo devido a elevadas dívidas fiscais das mesmas, pelo que desejava que a sua parte no capital social da A... ficasse em nome da FF e de uma sociedade do seu advogado, Dr. HH, doravante Dr. HH, denominada D..., Limitada, doravante D..., bem como preferia que o réu AA ficasse como único gerente da A..., continuando no entanto ele, EE, a colaborar no desenvolvimento da atividade desta, sem contudo constar como gerente da mesma. 22º Não tendo então visto nisso qualquer inconveniente, o réu AA acedeu a tais pedidos.» «32º Todavia, nem a FF, nem a D... pagaram à A... os valores das respetivas prestações de capital social a que ficaram obrigadas por virtude do deliberado na sobredita assembleia geral desta realizada em 27/7/2016. 33º Por isso, na assembleia geral da A... realizada no dia 7/6/2019, pelas 17 horas, foi deliberado, com os votos favoráveis da C... e os votos contra da FF e da D...: - excluir estas últimas de sócias da A..., por não cumprimento tempestivo das suas obrigações de entrada decorrentes do sobredito aumento de capital desta, perdendo a FF a totalidade da respetiva quota do valor nominal de € 15.268,00 e a D... a totalidade da respetiva quota do valor nominal de € 29.250,00; - considerar a quota de que era titular a FF, do valor nominal de € 15.268,00, e a quota de que era titular a D..., do valor nominal de € 29.250,00, perdidas a favor da A..., sendo cada uma dessas quotas vendida à C... pelo respetivo valor nominal – docs. nºs. 6, 7 e 8. 34º Acresce que, na sequência dessas deliberações, por documento escrito particular denominado “Contrato de Cessão de Quotas”, outorgado em 17/6/2019, assinado pelo representante de ambas as partes, a A... cedeu à C..., que lhe adquiriu, as referidas quotas dos valores nominais de € 15.268,00 e de € 29.250,00, por estes valores, respetivamente – doc. nº 9.» «35º Encontrando-se todos esses atos inscritos no Registo Comercial (vd. docs. nºs. 1 e 2 juntos com a p.i.). 36º Em virtude do que vem de ser dito, o réu AA e a A... desconhecem grande parte dos factos alegados na p.i. 37º Desconhecendo totalmente as eventuais relações havidas entre o autor, a E..., SA, doravante E..., SA, e a A... anteriores a 27/7/2016. 38º Todavia, seguro é que em dezembro de 2015, a A... não atravessava dificuldades económicas e financeiras, não tendo quaisquer dívidas. 39º Como se disse, a sua atividade era então escassíssima. 40º Não tinha sequer trabalhadores. 41º E, ainda assim, teve lucros. 42º Pelo que não necessitava de qualquer financiamento. 43º Não tendo efetivamente a A... recebido qualquer quantia do financiamento então alegadamente concedido à E..., SA, pelo Banco 1..., SA.» « 65º Como decorre do que se disse supra e do alegado pelo próprio autor, nem a subscrição pela A... a favor do Banco 1..., SA, da livrança de € 225.000,00 referida no pretenso “Acordo Contratual” de 16/6/2016 teve qualquer contrapartida ou benefício para essa ré.» «67º Nem as obrigações alegadamente assumidas nesse pretenso “Acordo Contratual” pela A... a favor do autor tiveram qualquer contrapartida ou outro benefício para essa ré.» «74º Por outro lado, as negociações que levaram à entrada da C... no capital da A... foram acima descritas. 75º Nunca tendo sido dito ao réu AA no decurso dessas negociações que existia qualquer obrigação ou garantia da A... a favor do autor. 76º Muito menos que este tinha em seu poder as ações referidas no art. 3º da p.i. 77º Não tendo o autor alguma vez intervindo nessas negociações. 78º Com efeito, o réu AA apenas veio a saber que o autor era avalista numa livrança subscrita pela A... a favor do Banco 1..., SA, imediatamente após a sua entrada para a gerência dessa sociedade. 79º Por conseguinte, não foi estabelecida qualquer condição para a entrada da C... no capital da A... que se relacionasse com o autor. 80º Sendo pura fantasia a alegada assunção pelo réu AA da responsabilidade de pagar pessoalmente qualquer quantia ao Banco 1..., SA, ou ao autor, ou de substituir qualquer aval prestado por este. 81º Aliás, como é óbvio, se tal tivesse sucedido, teria sido reduzido a escrito.» « 87º Por outro lado, em outubro de 2016, o réu AA, enquanto gerente da A..., iniciou negociações com o Banco 1..., SA, com vista a transformar em dívida de longo prazo o montante da aludida livrança de € 200.000,00. 88º Porém, no decurso dessas negociações, inesperadamente, o Banco 1..., SA, comunicou à A... que o valor da mencionada livrança já havia sido pago.» 6 – As testemunhas declararam o seguinte: «CC e DD, advogados com escritório na Rua ... em ..., respetivamente portadores da Cédula Profissional nº ...6L e ...6C, tendo sido notificados na qualidade de testemunhas para comparecerem na audiência de julgamento agendada para o dia 07-12-2023 pelas 9h30, vêm recusar-se a prestar o seu depoimento, no cumprimento do dever que lhes é imposto pelo artigo 92.º do EOA, porquanto são mandatários da Ré A... Lda. em outros processos, sendo que tudo o quanto têm conhecimento sobre esta sociedade lhe advém do exercício do seu mandato estando por isso abrangidos pelo sigilo profissional. Em consequência deverá ser dispensada a sua presença no dia a hora agendados para a realização do julgamento» 7 – O Conselho Regional de Coimbra da Ordem dos Advogados em parecer datado de 23 de fevereiro de 2024, pronunciou-se neste sentido: «Tudo visto e ponderado, com fundamento em todo o exposto, a nossa pronúncia é no sentido da impossibilidade do Senhor Dr. CC, e Senhora Dra. DD, deporem como testemunhas no processo – e, portanto, impossibilidade de quebra de sigilo – no Processo Comum n.º 1272/20.0T(LRA, a correr termos no Juízo Central Cível de Leiria – juiz 4, do Tribunal Judicial da Comarca e Leiria» Advogados se encontram “impossibilitados” de depor, por estarem vinculados ao dever de sigilo profissional. 8 – Os Requerentes, após indicarem a fundamentação jurídica, justificaram em concreto a dispensa do dever de sigilo nestes termos: «19. Tais testemunhas têm conhecimento direto desses factos, porquanto intervieram nos mesmos enquanto Advogados do réu AA e da sociedade C..., S.A., da qual aquele era e é administrador. 20. Desse modo, é profuso o seu conhecimento dos mencionados factos. 21. Assim, dado o referido protagonismo que assumiram nos factos sobre que deverão recair os respetivos depoimentos, deve concluir-se pela imprescindibilidade das aludidas testemunhas. 22. Ao que acresce que a importância dos interesses discutidos na presente ação, que desde logo se extrai do respetivo valor, da descoberta da verdade material e, em última instância, da realização da justiça no caso, são aqui manifestamente superiores aos resguardados pelo sigilo profissional das testemunhas em referência, maxime tendo as mesmas intervindo naqueles factos como Advogados do réu/requerente dos respetivos depoimentos e de uma sociedade de que este era e é administrador.» 9 – Por despacho de 29 de outubro de 2024 o tribunal de 1.ª instância solicitou a esta Relação a apreciação do pedido de dispensa do dever de sigilo profissional. II. Objeto do processo A questão coloca consiste em saber se as mencionadas testemunhas, face aos factos a que deverão depor, devem ser dispensadas, ou não, do dever de sigilo profissional de advogado. III. Fundamentação Matéria a considerar 1 - No despacho saneador de 17 de junho de 2021 foram alinhados os seguintes temas de prova: a. Saber se a quantia de €250.000,00 referida sob os artigos 12º e seguintes da petição inicial se destinou, em parte, a ser usada pela 1ª ré no cumprimento das suas obrigações. b. Conhecer o concreto contexto em que o autor teve intervenção no respetivo empréstimo e o que foi acordado, a esse respeito, entre ele, EE, FF e GG, nomeadamente, o referente às 125.000 ações nominativas da sociedade B.... c. Conhecer os termos do invocado acordo de 16 de junho de 2016. d. Saber o que foi acordado, com o 2º réu, aquando das negociações tendentes à sua entrada para o capital social da 1ª ré, no respeitante ao pagamento, ao Banco 1..., da dívida advinda do empréstimo e à retirada ou substituição de aval prestado pelo autor. e. Aferindo, nomeadamente, se o 2º réu assumiu, pessoalmente, junto do autor o compromisso de substituir o seu aval e de lhe pagar a quantia titulada pela livrança se este a viesse a pagar ao Banco 1.... f. Conhecer os factos referentes ao alegado pagamento do autor ao Banco 1... (motivo pelo qual o fez e com que recursos) e quais os custos que suportou. g. Saber se, antes desse pagamento, o 2º réu tentou negociar com o Banco 1... o diferimento do pagamento da dívida e tornar-se avalista da mesma, em substituição do autor e se tal proposta foi rejeitada. h. Saber se a 1ª ré não recebeu e não beneficiou de qualquer quantia do financiamento aludido em a., nem as obrigações assumidas no acordo referido em c. tiveram para a mesma qualquer contrapartida ou benefício, e se tais factos eram do conhecimento do autor. i. Saber se o 2º réu sempre teve conhecimento de tudo o que está em causa nestes autos, nomeadamente de todos os contratos, muito antes de ter sido nomeado gerente da 1ª ré, porque, muito antes dessa sua nomeação formal como gerente da 1ª ré, já o 2º réu intervinha na gestão da sociedade, conjuntamente com EE. j. Saber se EE, mesmo durante o tempo em que não era gerente de direito da 1ª ré, foi sempre seu gerente de facto, representando-a junto dos trabalhadores, fornecedores, bancos e demais entidades, tendo sido perante ele, enquanto representante da 1ª ré, que o 2º réu negociou a sua entrada no capital social daquela. k. Saber se estava mandatado pela sua filha, FF, para outorgar o acordo contratual em questão nos autos. l. E se o autor jamais pensou que EE não pudesse representar formalmente a 1ª ré.» 2 - Despacho 24 de maio de 2024 Req. ref. nº 10580494 (de 04/03/2024) – dos Réus: Em face do parecer do Conselho Regional da AO não se suscitam, agora, quaisquer dúvidas sobre a legitimidade da escusa dos Srs. Drs. CC e DD, nada mais havendo a determinar nesse tocante, devendo a parte que os arrolou indicar, em 10 dias, se mantém a sua indicação.» 3 - Requerimento de 10 de junho de 2024 «A..., Lda., NIPC ...62, e AA, contribuinte nº ...48, réus nos autos à margem identificados, que lhes move BB, tendo sido notificados do douto despacho proferido em 24/5/2024, com a referência citius 107202377, vêm dizer que mantêm a indicação das testemunhas Dr. CC e Drª DD, requerendo seja ordenada a subida dos autos ao Tribunal da Relação de Coimbra, a fim de aí se decidir sobre a justificação da quebra do dever de sigilo profissional a que tais testemunhas se encontram vinculadas, nos termos do art. 135.º, n.º 3, do CPP, ex vi do art. 417.º, n.º 4 do CPC.» 4 - Despacho de 24-9-2024 «Req. de 10/06/2024 (fls. 773 do processo físico): A fim de se suscitar o incidente de quebra de sigilo profissional, notifique os RR. para, em 10 dias, em requerimento fundamentado, justificarem a necessidade da audição das mencionadas testemunhas.» 5 - Requerimento de 5 de outubro de 2024 «A..., Lda., NIPC ...62, e AA, contribuinte nº ...48, réus nos autos à margem identificados, que lhes move BB, em face do douto despacho de 24/9/2024, ref.ª citius 108274977, que ordenou a sua notificação para justificarem, fundamentadamente, a necessidade da audição das testemunhas Dr. CC e Drª DD, a fim de ser suscitado o incidente de quebra de sigilo profissional, vêm expor e requerer a V. Ex.ª o seguinte: «(…) 18. Ora, in casu, os réus pretendem que as testemunhas Dr. CC e Drª DD sejam ouvidas sobre os factos alegados nos arts. 14º a 22º, 32º a 34º, 36º a 43º, 65º, 67º, 74º a 81º, 87º e 88º da contestação. 19. Tais testemunhas têm conhecimento direto desses factos, porquanto intervieram nos mesmos enquanto Advogados do réu AA e da sociedade C..., S.A., da qual aquele era e é administrador. 20. Desse modo, é profuso o seu conhecimento dos mencionados factos. 21. Assim, dado o referido protagonismo que assumiram nos factos sobre que deverão recair os respetivos depoimentos, deve concluir-se pela imprescindibilidade das aludidas testemunhas. 22. Ao que acresce que a importância dos interesses discutidos na presente ação, que desde logo se extrai do respetivo valor, da descoberta da verdade material e, em última instância, da realização da justiça no caso, são aqui manifestamente superiores aos resguardados pelo sigilo profissional das testemunhas em referência, maxime tendo as mesmas intervindo naqueles factos como Advogados do réu/requerente dos respetivos depoimentos e de uma sociedade de que este era e é administrador. 23. Em suma, in casu, o critério do interesse preponderante ou prevalecente importa a quebra do dever de sigilo profissional que vincula as sobreditas testemunhas. 4 Cf. ALBUQUERQUE, PAULO PINTO DE, Comentário do Código de Processo Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 2.ª edição atualizada, Universidade Católica, Lisboa, 2008, p. 375. Nestes termos, reiteram seja solicitado ao Tribunal da Relação de Coimbra que, pelos fundamentos indicados, dispense os Exmºs Srs. Dr. CC e Dra. DD do dever de sigilo profissional, determinando a prestação de depoimento testemunhal pelos mesmos à matéria indicada pelos réus. P. D. a V. Exª. O ADVOGADO, 6 - Despacho de 29 de outubro de 2024 Como se alcança dos autos, as testemunhas Dr. CC e Dr.ª II, arrolados como testemunhas na contestação/reconvenção, vieram invocar o sigilo profissional, recusando-se a depor como testemunhas (cfr. art. 92º EOA). Ouvida a Ordem dos Advogados, e sendo pacífico nos autos que o respetivo objeto contende com matéria compreendida no sigilo profissional, inexistem motivos que permitam concluir pela ilegitimidade da recusa em depor por banda das sobreditas testemunhas. Face a tal recusa, tem aplicação o disposto no art. 417º, nºs 3 e 4 do CPC, dispondo, inter alia e no que ora interessa, que “3 - A recusa é, porém, legítima se a obediência importar: (…) c) Violação do sigilo profissional ou de funcionários públicos, ou do segredo de Estado, sem prejuízo do disposto no n.º 4”, sendo que “Deduzida escusa com fundamento na alínea c) do número anterior, é aplicável, com as adaptações impostas pela natureza dos interesses em causa, o disposto no processo penal acerca da verificação da legitimidade da escusa e da dispensa do dever de sigilo invocado” (n.º 4). Esta última disposição remete para a legislação penal adjetiva, maxime para o art. 135º do Código de Processo Penal, que tem a seguinte redação (também unicamente na parte ora relevante): “1 - Os ministros de religião ou confissão religiosa e os advogados, médicos, jornalistas, membros de instituições de crédito e as demais pessoas a quem a lei permitir ou impuser que guardem segredo podem escusar-se a depor sobre os factos por ele abrangidos. 2 - Havendo dúvidas fundadas sobre a legitimidade da escusa, a autoridade judiciária perante a qual o incidente se tiver suscitado procede às averiguações necessárias. Se, após estas, concluir pela ilegitimidade da escusa, ordena, ou requer ao tribunal que ordene, a prestação do depoimento. 3 - O tribunal superior àquele onde o incidente tiver sido suscitado, ou, no caso de o incidente ter sido suscitado perante o Supremo Tribunal de Justiça, o pleno das secções criminais, pode decidir da prestação de testemunho com quebra do segredo profissional sempre que esta se mostre justificada, segundo o princípio da prevalência do interesse preponderante, nomeadamente tendo em conta a imprescindibilidade do depoimento para a descoberta da verdade, a gravidade do crime e a necessidade de proteção de bens jurídicos. A intervenção é suscitada pelo juiz, oficiosamente ou a requerimento”. No caso vertente, o normativo invocado pelas testemunhas é o art. 92º (Segredo profissional) do EOA: “1 - O advogado é obrigado a guardar segredo profissional no que respeita a todos os factos cujo conhecimento lhe advenha do exercício das suas funções ou da prestação dos seus serviços, designadamente: a) A factos referentes a assuntos profissionais conhecidos, exclusivamente, por revelação do cliente ou revelados por ordem deste; b) A factos de que tenha tido conhecimento em virtude de cargo desempenhado na Ordem dos Advogados; c) A factos referentes a assuntos profissionais comunicados por colega com o qual esteja associado ou ao qual preste colaboração; d) A factos comunicados por coautor, corréu ou cointeressado do seu constituinte ou pelo respetivo representante; e) A factos de que a parte contrária do cliente ou respetivos representantes lhe tenham dado conhecimento durante negociações para acordo que vise pôr termo ao diferendo ou litígio; f) A factos de que tenha tido conhecimento no âmbito de quaisquer negociações malogradas, orais ou escritas, em que tenha intervindo (…)”. Assim, em face da argumentação expendida pelos Réus, suscita-se perante V. Exas. a questão da justificação da escusa, isto é, se existe justificação legal para se impor tais depoimentos. Notifique, emitindo-se certidão de todo o processado, autuando essa certidão em separado e remetendo-a ao Tribunal da Relação de Coimbra, para apreciação do presente incidente, aguardando estes autos, por ora, pela decisão desse incidente, uma vez que nunca se poderia concluir (ou mesmo iniciar o julgamento) sem que fosse definitivamente apreciada essa questão.» c) Apreciação da questão colocada 1 - De modo muito resumido, porventura algo impreciso, o Autor invoca na petição relações contratuais com os Réus (acordo contratual e contrato de penhor celebrados em 28 de janeiro de 2016 e um outro acordo contratual celebrado em 16 de junho de 2016), atinentes a responsabilidades que assumiu, a pedido dos Réus, e pagamentos que fez à instituição bancária envolvida, devido a essas responsabilidades assumidas, tendo, para o efeito, como garantia a si prestada, por virtude do contrato de penhor de ações, entrado na posse de 125.000 ações nominativas da sociedade B..., detidas pela Ré, e, além disso, obtido da Ré um acordo no sentido de que esta solveria as responsabilidades para com o Autor através, designadamente, de dação em cumprimento destas ações. Por sua vez, os Réus argumentam que esse acordo contratual e contrato de penhor padecem de nulidade e por isso pedem a improcedência da ação e em reconvenção a restituição das ações. 2 – Os Réus alegam que o depoimento das duas testemunhas é necessário para a defesa da sua pretensão porque elas têm conhecimento direto desses factos, porquanto intervieram nos mesmos enquanto Advogados do réu AA e da sociedade C..., S.A., da qual aquele era e é administrador. 3 – Vejamos então. É consensual nos autos que a matéria factual em questão está coberta pelo sigilo profissional das testemunhas na sua qualidade de advogados. O dever de sigilo encontra-se previsto no artigo 92.º do Estatuto da Ordem dos Advogados – Lei n.º 145/2015, de 09 de setembro –, cujo teor é o seguinte: «1- O advogado é obrigado a guardar segredo profissional no que respeita a todos os factos cujo conhecimento lhe advenha do exercício das suas funções ou da prestação dos seus serviços, designadamente: a) A factos referentes a assuntos profissionais conhecidos, exclusivamente, por revelação do cliente ou revelados por ordem deste; b) A factos de que tenha tido conhecimento em virtude de cargo desempenhado na Ordem dos Advogados; c) A factos referentes a assuntos profissionais comunicados por colega com o qual esteja associado ou ao qual preste colaboração; d) A factos comunicados por coautor, corréu ou cointeressado do seu constituinte ou pelo respetivo representante; e) A factos de que a parte contrária do cliente ou respetivos representantes lhe tenham dado conhecimento durante negociações para acordo que vise pôr termo ao diferendo ou litígio; f) A factos de que tenha tido conhecimento no âmbito de quaisquer negociações malogradas, orais ou escritas, em que tenha intervindo. 2 - A obrigação do segredo profissional existe quer o serviço solicitado ou cometido ao advogado envolva ou não representação judicial ou extrajudicial, quer deva ou não ser remunerado, quer o advogado haja ou não chegado a aceitar e a desempenhar a representação ou serviço, o mesmo acontecendo para todos os advogados que, direta ou indiretamente, tenham qualquer intervenção no serviço. 3 - O segredo profissional abrange ainda documentos ou outras coisas que se relacionem, direta ou indiretamente, com os factos sujeitos a sigilo. 4 - O advogado pode revelar factos abrangidos pelo segredo profissional, desde que tal seja absolutamente necessário para a defesa da dignidade, direitos e interesses legítimos do próprio advogado ou do cliente ou seus representantes, mediante prévia autorização do presidente do conselho regional respetivo, com recurso para o bastonário, nos termos previstos no respetivo regulamento. 5 - Os atos praticados pelo advogado com violação de segredo profissional não podem fazer prova em juízo. 6 - Ainda que dispensado nos termos do disposto no n.º 4, o advogado pode manter o segredo profissional. 7 - O dever de guardar sigilo quanto aos factos descritos no n.º 1 é extensivo a todas as pessoas que colaborem com o advogado no exercício da sua atividade profissional, com a cominação prevista no n.º 5. 8 - O advogado deve exigir das pessoas referidas no número anterior, nos termos de declaração escrita lavrada para o efeito, o cumprimento do dever aí previsto em momento anterior ao início da colaboração, consistindo infração disciplinar a violação daquele dever.» Este dever pode ser dispensado nos termos conjugados dos artigos 417.º do Código de Processo Civil e 135.º do Código de Processo Penal. Na parte que agora interessa, para a decisão a tomar, o n.º 3 do artigo 135.º do Código de Processo Penal dispõe que o tribunal «… pode decidir da prestação de testemunho com quebra do segredo profissional sempre que esta se mostre justificada, segundo o princípio da prevalência do interesse preponderante, nomeadamente tendo em conta a imprescindibilidade do depoimento para a descoberta da verdade, a gravidade do crime e a necessidade de proteção de bens jurídicos.» Vejamos então (a) o princípio da prevalência do interesse preponderante, nomeadamente tendo em conta a imprescindibilidade do depoimento para a descoberta da verdade, (b) a gravidade da omissão de tutela face aos pedidos formulados, no pressuposto que são justificados e (c) a necessidade de proteção de bens jurídicos, neste caso, da realização da justiça no caso concreto e em geral. ● Prevalência do interesse preponderante. Neste aspeto, confronta-se o interesse geral de todos os cidadãos no sentido de que os advogados, que os auxiliam a resolver problemas jurídicos, não revelarão, mais tarde, a terceiros, designadamente em tribunal, os factos de que tiveram conhecimento por causa dessas funções. Este dever de sigilo profissional de advogado tutela um interesse coletivo, no sentido de que satisfaz uma necessidade que é de todos os cidadãos e que existe antes de se concretizar individualmente em casos concretos. Trata-se de tutelar para futuro, em termos de confiança, o segredo quanto a factos revelados entre o advogado (um profissional) e o cliente. Ou seja, é essencial para a existência da instituição social que denominamos «advocacia», que o cidadão possa confiar que o advogado, que o auxilia na resolução dos seus problemas, não revelará, mais tarde os conhecimentos que obteve por causa dessa relação. Com efeito, para o advogado poder ser uma mais valia na resolução dos problemas do cliente, é dizer, para os resolver, no todo ou em parte, na proporção do possível, tem de conhecer todos os factos que são relevantes e, em regra, só os conhece porque o cliente lhos revela. Mas se o cidadão não puder contar com o sigilo do advogado, porque este, mais tarde, pode vir a ser chamado a tribunal, para testemunhar sobre esses factos, a pedido dos seus adversários ou outras pessoas, sabendo que como testemunha está obrigado a prestar declarações correspondentes à realidade (verdadeiras), então o cidadão pode recear revelar ao advogado os factos em toda a sua extensão, e com isso prejudica a boa defesa dos interesses dos cidadãos nos tribunais e, de modo mediato, o próprio desenvolvimento habitual do comércio jurídico. Por outro lado, nestas condições, os advogados estariam diariamente a ser chamados a tribunal como testemunhas, aliás, privilegiadas, para serem interrogados sobre factos, quer favoráveis, quer desfavoráveis aos seus clientes, em que participaram profissionalmente, tornando-se a profissão inviável porque num primeiro momento o advogado era um auxiliar precioso e passado algum tempo podia converter-se num «inimigo». Daí que este dever de sigilo seja fundamental à existência da função social do advogado e só em casos raros possa ser quebrado. Sendo certo que estamos perante uma função essencial à realização da justiça, porque assegura a correta introdução dos feitos em juízo, a democraticidade entre as partes (por se encontrarem representadas em igualdade de circunstâncias perante o tribunal) e a necessária colaboração com o tribunal, com vista à descoberta da verdade e aplicação adequada da lei. No caso concreto, estamos perante relações jurídicas emergentes de contratos celebrados entre a partes que versam sobre interesses patrimoniais privados. Como se disse, o Autor alega que assumiu responsabilidades perante terceiros em proveito dos Réus; que estes se comprometeram com determinadas prestações contratuais que não cumpriram e não querem cumprir. O valor da causa é elevado – 775 607,33 euros. Trata-se de um litígio que não tem particularidades especiais que o diferenciem de tantos outros que dão corpo a milhares de processos que foram e são continuamente instaurados em tribunal. Face apenas ao exposto, é de concluir que o interesse público supera o interesse deste caso particular. ▪ Prevalência do interesse preponderante, considerando a imprescindibilidade do depoimento para a descoberta da verdade. Trata-se aqui de fazer uma previsão e uma previsão é, em regra, falível. Destro desta precaridade, afigura-se que os depoimentos não são imprescindíveis para determinar aquilo que efetivamente aconteceu, pois existem documentos onde se encontram exaradas as declarações de vontade contratual e não será inviável, mesmo prescindindo destes depoimentos, descortinar a intencionalidade que presidiu à realização dos contratos e que aglutina todos os factos que se encontram documentados, apontando para determinadas finalidades que serviram determinados interesses. ▪ Prevalência do interesse preponderante considerando a gravidade da omissão de tutela face aos pedidos formulados, no pressuposto que são justificados. Como se disse, estamos perante interesses patrimoniais privados. A eventual omissão de tutela dos direitos invocados pelo Autor resultante da impossibilidade de inquirir as testemunhas é grave, como é grave toda a falta de justiça, mas é uma gravidade que a sociedade suporta, na medida em que afeta, de imediato, apenas o interesse de uma só pessoa. (c) Prevalência do interesse preponderante, considerando a necessidade de proteção de bens jurídicos, neste caso, da realização da justiça no caso concreto e em geral. Repetindo, estamos perante interesses patrimoniais privados. A eventual omissão de tutela dos direitos invocados pelo Autor, resultante da não inquirição das testemunhas em questão, não causa erosão em interesses ligados a administração da justiça, pois é relativamente comum que um cidadão não obtenha ganho de causa em ações cíveis, sem que daí resulte perda de confiança no sistema de justiça. ▪ Tudo ponderado, afigura-se que o bem jurídico da confiança encabeçado em todos os cidadãos, tutelado pelo sigilo profissional previsto no artigo 92.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, no sentido de poderem confiar que os advogados não revelarão a terceiros, designadamente em tribunal, os factos de que tiveram conhecimento por causa do exercício das suas funções, prevalece, em regra, sobre o interesse de um cidadão particular em obter tutela jurídica para interesses patrimoniais da sua esfera jurídica, ainda que de valor elevado (775 607,33 euros), que resultam segundo o alegado, da violação de direitos emergentes de relações contratuais. inserindo-se o caso dos autos nesta situação. Improcede, pelo exposto, o pedido. IV. Decisão Considerando o exposto, julga-se improcedente o pedido de dispensa do dever de sigilo profissional relativamente às testemunhas identificadas supra no texto. Custas pelo Requerente. * Coimbra, … |