Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
| Processo: |
| ||
| Nº Convencional: | JTRC | ||
| Relator: | LUÍS CRAVO | ||
| Descritores: | EXTINÇÃO DE SOCIEDADE COMERCIAL AÇÕES JUDICIAIS PENDENTES SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL LIQUIDATÁRIOS | ||
| Data do Acordão: | 11/11/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Tribunal Recurso: | TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA – ALCOBAÇA – JUÍZO DE EXECUÇÃO – JUIZ 1 | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | REVOGADA | ||
| Legislação Nacional: | ARTIGOS 162° E 163° DO CÓDIGO DAS SOCIEDADES COMERCIAIS | ||
| Sumário: | I – As ações em que a sociedade seja parte continuam após a extinção desta, que se considera substituída pela generalidade dos sócios, representados pelos liquidatários, operando-se a substituição no próprio processo e sem necessidade de habilitação [art. 162º do Código das Sociedades Comerciais].
II – Os arts. 162° e 163° do Código das Sociedades Comerciais, distinguem e regulam dois modos diferentes de fazer intervir os sócios em ação instaurada por dívida da sociedade extinta, consoante a ação esteja pendente à data da extinção da sociedade ou seja instaurada após a extinção da sociedade. III – Sendo que o art. 162º do Código das Sociedades Comerciais ao estatuir que o processo prossegue contra a “generalidade dos sócios, representados pelo liquidatário”, reconhece assim a personalidade judiciária deste “coletivo dos sócios”. (Sumário elaborado pelo Relator) | ||
| Decisão Texto Integral: | *
Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra[1] * 1 – RELATÓRIO “A... STC”, com sede no Ed. D. AA, R. ... Quinta ... ... [na qualidade de cessionária de “Banco 1...” (“Banco 1...”)], intentou execução sumária para pagamento de quantia certa contra “B..., Lda.”, com morada na Praça ..., ..., ... ... ..., apresentando como título executivo uma escritura de compra e venda e mútuo com hipoteca, celebrada em 12 de Junho de 2008 entre a dita cedente “Banco 1...” e a Executada, cujo incumprimento se verificou (não tendo sido pagas as prestações que se venceram após 12/12/2010), sendo o valor da Execução de € 55 014,58, aos quais «(…) acrescerão os respetivos juros de mora vincendos até efetivo e integral pagamento, calculados sobre o capital em divida à taxa de 4%, bem como o respetivo Imposto de Selo, nos termos legais aplicáveis». * Por requerimento de 24.06.2019, a primitiva Senhora Agente de Execução informou nos autos que a executada “B..., Lda.” se encontrava extinta (conforme consulta aí anexa). * Nesse seguimento, em 26.06.2019, veio a Exequente requerer o prosseguimento dos autos contra o(s) sócio(s) da executada (atualmente extinta), o que concretizou por requerimento de 05.11.2019, a ora apelante requereu à primitiva Senhora Agente de Execução o prosseguimento da instância contra os sócios da Executada (atualmente extinta – com dissolução e encerramento da liquidação de 25 Jan. 2019), nos termos e para os efeitos do artigo 162º do Código das Sociedades Comerciais.[2] * De referir que nesse requerimento juntou código de acesso à certidão comercial da sociedade executada da qual consta decisão administrativa proferida [«Decisão: proferida em procedimento administrativo oficioso de dissolução e encerramento da liquidação a que se refere o averbamento n.º1 à inscrição n.º1, não tendo sido apurada a existência de qualquer ativo ou passivo a liquidar e também não foi comunicada a sua existência à Conservatória Data da Decisão: 20-11-2018»]. * Nessa sequência, a primitiva Senhora Agente de Execução em 21.11.2019 requereu ao Tribunal de 1ª instância que se dignasse ordenar a inserção dos sócios da executada extinta (constantes da certidão comercial que anexou), para os termos e efeitos dos art. 162º e 163º do Código das Sociedades Comerciais, sendo que os mesmos vieram efetivamente a ser inseridos. * Os sócios da sociedade Executada nunca vieram dizer nada aos presentes autos. * Nos presentes autos de Execução está penhorado imóvel Prédio misto sito em ..., descrito na CRP ... sob o nº ...17 e inscrito nas matrizes urbana sob o nº ...94 e rústica sob o nº ...05, secção 007 da União de Freguesias ... e ..., imóvel esse que é propriedade da sociedade Executada “B... Unipessoal, Lda.”. * Tendo entretanto os autos transitado e já se encontrando a pender no Juízo de Execução de alcobaça, foi aí proferido o seguinte despacho judicial: «(…) Importa apreciar a situação (que não foi ainda submetida a decisão judicial e que se entende não ser matéria da competência do AE, por respeitar à modificação da instância executiva, sendo reservada a competência jurisdicional), sendo que se entende desnecessário qualquer outro contraditório adicional, uma vez que a exequente suscitou a questão e teve a possibilidade de tomar posição e algo requerer, face à situação registral da executada. (…) nada consta quanto a eventual património, antes consta que foi proferida uma decisão de dissolução e encerramento da liquidação por inexistir informação sobre a existência de activo ou de passivo (art. 11.º, n.º 4, do aludido anexo) – o que, à partida, pressupõe que inexistia ou não foi comunicada (mal ou bem, agora não interessa) a existência de activo e passivo (tanto assim que também não consta a nomeação de liquidatário, que seria necessária em caso contrário). (…) Em resumo, entende-se que a execução não pode prosseguir contra a sociedade executada (por falta de personalidade judiciária) e, por outro lado, entende-se que a execução não é a sede própria para averiguar e decidir sobre a existência de bens e da sua distribuição aos sócios (arts. 162.º e 163.º do CSC), certo que, além disso, o ónus de alegação (e prova) da partilha de bens entre os sócios (facto constitutivo a equacionar-se o prosseguimento da execução contra estes ou a sua generalidade) pertenceria à exequente (ou, no limite, a outro credor) e não foi cumprido, e sendo que, por fim, a ser ponderada outra solução face à inexistência de liquidação, também a execução não será a sede própria para levar a cabo essa liquidação do património da sociedade extinta, pelo que deve a presente execução ser declarada extinta quanto à executada “B...”, cabendo à exequente (ou, no limite, a outro credor), se for caso disso e verificados os pressupostos legais, recorrer agora aos meios declarativos, conforme entender conveniente, nomeadamente nos termos acima expostos. Face ao exposto, declara-se extinta a execução, com o inerente levantamento da penhora após trânsito em julgado da presente decisão (e ficando, por essa via, também prejudicada a apreciação da ref. 26885588).» * Inconformada com essa decisão, apresentou a Exequente recurso de apelação contra a mesma, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: A Exma. Juíza a quo proferiu despacho a admitir o recurso interposto, providenciando pela subida dos autos devidamente instruídos. * Colhidos os vistos e nada obstando ao conhecimento do objeto do recurso, cumpre apreciar e decidir. * 2 – QUESTÕES A DECIDIR: o âmbito do recurso encontra-se delimitado pelas conclusões que nele foram apresentadas e que atrás se transcreveram – arts. 635º, nº4 e 639º do n.C.P.Civil – e, por via disso, por ordem lógica e sem prejuízo do conhecimento de questões de conhecimento oficioso, as questões a decidir são: - nulidades da decisão recorrida [art. 615º, nº1, als. c) e d) do n.C.P.Civil]?; - desacerto da decisão, porquanto em caso de dissolução de sociedade devedora na pendência da execução movida contra a mesma, deve ser admitido e mantido o prosseguimento dos autos contra os sócios da Executada, nos termos do artigo 162º do CSC? * 3 – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A matéria de facto a ter em conta para a decisão do presente recurso é essencialmente a que consta do relatório que antecede. * 4 - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO 4.1 – A primeira ordem de questões que com precedência lógica importa solucionar é a que se traduz nas alegadas nulidades da decisão recorrida. Será, então, que ocorre nulidade da sentença consistente em “contradição entre os fundamentos e a decisão” e “obscuridade” [cf. al. c) do nº1 do art. 615º do n.C.P.Civil]? A resposta a esta questão é claramente negativa – e releve-se este juízo antecipatório! – aliás, só se compreendendo a sua arguição por um qualquer equívoco ou deficiente interpretação dos conceitos legais. Senão vejamos. Consabidamente, nos termos da al. c) do art. 615º, nº1 do n.C.P.Civil, verifica-se a nulidade da sentença quando, nomeadamente (1ª parte), “Os fundamentos estejam em oposição com a decisão”. Sucede que quando se fala, a tal propósito, em “oposição entre os fundamentos e a decisão”, está-se a aludir à contradição real entre os fundamentos e a decisão; está-se a aludir à hipótese de a fundamentação apontar num sentido e a decisão seguir caminho oposto. Na verdade, o que está em causa nesse normativo é a contradição resultante de a fundamentação da sentença apontar num sentido e a decisão (dispositivo da sentença) seguir caminho oposto ou direção diferente[3], inserindo-se no quadro dos vícios formais da sentença, tal como elencados nos art.os 667º e 668º do C.P.Civil[4], e atualmente nos art.os 614º e segs. do n.C.P.Civil, sem contender, pois, com questões de substância, que, como tais, já se prendem com o mérito, e não com o âmbito formal. Ora, compulsada a decisão, o que se constata é que foi tendo em conta o quadro factual dos autos (encerramento da liquidação e o subsequente cancelamento da matrícula da sociedade executada, verificada no âmbito da liquidação administrativa) que se perfilhou um determinado enquadramento jurídico, a saber, que tal ocasionava a extinção da sociedade executada, o que determinava a falta de personalidade judiciária da mesma, e não sendo a execução a sede própria para averiguar e decidir sobre a existência de bens e da sua distribuição aos sócios, acrescendo que se entendia não ser também a execução a sede própria para levar a cabo a pretendida/requerida liquidação do património da sociedade extinta, sendo em coerência com essa fundamentação/enquadramento jurídico que veio a ser proferida a “decisão”. Sucede que se assim é, na medida em que a Recorrente invoca o desacerto deste enquadramento jurídico face às normas legais que invoca, resulta que efetivamente entende ter ocorrido uma errada interpretação e aplicação das ditas normas substantivas, isto é, questiona diretamente o mérito da decisão, que não a nulidade de julgamento, sob o ponto de vista formal, que é o que está em causa nestas nulidades do art. 615º do n.C.P.Civil. Idem se diga, mutatis mutandis, relativamente ao que é invocado em termos de “obscuridade” da decisão. Dito de outra forma: o que a Recorrente discorda é da interpretação e aplicação que das leis foi feita. Só que isso é outro patamar da questão…, sendo certo que a ter havido erro de julgamento, sob o ponto de vista substantivo, tal será aquilatado nesta instância de recurso, sendo essa a função primordial do recurso interposto e a que este Tribunal está interpelado, o que o mesmo cumprirá face à fundamentação que foi enunciada na decisão e que constitui o percurso lógico-jurídico da mesma. Apreciação essa de que se tratará na sequência imediata. Termos em que, sem necessidade maiores considerações, improcede esta arguição de nulidade. ¨¨ E que dizer da arguição de nulidade por “excesso de pronúncia” [art. 615º, nº1, al.d) do n.C.P.Civil]? Atente-se que quanto a este segunda vertente visada pelo recurso, a dimensão do excesso decorreria de se ter proferido decisão judicial tendo desde logo como justificação a “falta de personalidade judiciária” da sociedade Executada [consequente do encerramento da liquidação e o subsequente cancelamento da matrícula dessa sociedade executada, verificada no âmbito da liquidação administrativa]. Que dizer? Também a esta questão a nossa resposta é claramente negativa, aliás, só se compreendendo a sua arguição como fruto de um qualquer equívoco ou deficiente compreensão dogmática desta temática. Senão vejamos. Nos termos da dita al. d) do nº1 do art. 615º do n.C.P.Civil, verifica-se a nulidade da sentença quando “O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”. Na verdade, à luz do disposto neste normativo, a decisão padece do vício da nulidade quer no caso de o juiz conhecer de questões de que não podia tomar conhecimento, quer no caso de deixar de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar, isto tendo-se presente que o juiz não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras – art. 608º, nº2 do mesmo n.C.P.Civil. Ora, cremos que será inquestionável a afirmação de que o Exmo. Juiz de 1ª instância ao emitir pronúncia sobre a “falta de personalidade judiciária” da sociedade Executada versou sobre questão que devia apreciar, sendo como era questão de conhecimento oficioso. Donde se assim é, importa concluir que não foi cometido o aludido vício, designadamente nesta sua vertente da excesso. Assim sendo, não ocorreu qualquer “excesso de pronúncia” no quadro e para efeitos do art. 615º, nº1, al.d) do n.C.P.Civil. Termos em que igualmente improcede claramente esta via de argumentação aduzida pela Exequente/recorrente como fundamento para a procedência do recurso. * 4.2 – Questão do desacerto da decisão, porquanto em caso de dissolução de sociedade devedora na pendência da execução movida contra a mesma, deve ser admitido e mantido o prosseguimento dos autos contra os sócios da Executada, nos termos do artigo 162º do CSC. De referir que a resposta à questão decidenda implica a apreciação e decisão sobre se numa execução pendente, os ex-sócios da sociedade executada podiam ou não ser responsabilizados pelo pagamento da quantia exequenda. Salvo o devido respeito – e ressalvado o juízo antecipatório! – a resposta em termos académicos e teóricos deve ser, em regra, de sentido afirmativo, ainda que com uma especificidade que a própria solução legal contempla, donde procederem os argumentos recursivos. Senão vejamos. Começando a análise pelo regime legal invocado e aplicável [o Código das Sociedades Comerciais, doravante “C.S.C.”]: «Artigo 162º - Ações pendentes 1 - As acções em que a sociedade seja parte continuam após a extinção desta, que se considera substituída pela generalidade dos sócios, representados pelos liquidatários, nos termos dos artigos 163.º, n.ºs 2, 4 e 5, e 164.º, n.ºs 2 e 5. 2 - A instância não se suspende nem é necessária habilitação.» «Artigo 163º - Passivo superveniente 1 – Encerrada a liquidação e extinta a sociedade, os antigos sócios respondem pelo passivo social não satisfeito ou acautelado, até ao montante que receberam na partilha, sem prejuízo do disposto quanto a sócios de responsabilidade ilimitada. (…)» Por força deste regime jurídico, apesar da extinção da sociedade [que perde a sua personalidade jurídica e judiciária] as relações jurídicas de que a mesma era titular não se extinguem. Na verdade, no artigo 162º do C.S.C., estabelece-se que as ações em que a sociedade seja parte continuam após a extinção desta, que se considera substituída pela generalidade dos sócios, representados pelos liquidatários, nos termos dos artigos 163.º, nos 2, 4 e 5, e 164.º, nos 2 e 5 (nº1), sendo que a instância não se suspende nem é necessária habilitação (nº2). No caso sub judice, a extinção da sociedade verificou-se na pendência da instância executiva. Donde, será legítima a aplicação do disposto no artigo 162º, do C.S.C., isto é, a sociedade considera-se substituída pela generalidade dos sócios e o procedimento da sua substituição pelo conjunto dos sócios é feito no próprio processo, sem necessidade de recorrer ao incidente de habilitação – reside aqui a especificidade da solução legal a que supra se aludiu. Mas se por meio do requerimento apresentado pela Exequente nos autos de execução era possível regularizar a instância – passando a estar na lide, em substituição da sociedade extinta, os sócios representados pelos liquidatários! – o passo subsequente da averiguação era determinar qual a responsabilidade social e/ou pessoal dos sócios da sociedade extinta, consabido que havendo passivo social não satisfeito ou acautelado [como era o caso], é dos sócios a respetiva responsabilidade. De referir que “in casu” não está em causa essa responsabilidade circunscrever-se ou ter por limite o montante que receberam na partilha. Isso é aspeto sobre o qual estatui mais direta e aprofundadamente o dito art. 163º, nº 1, do C.S.C.[5] Ora, no caso vertente, um dos dados de facto era que o bem imóvel em causa – e que havia sido penhorado à sociedade Executada – não foi partilhado e distribuído pelos sócios… A decisão recorrida assenta, em alguma medida, na ideia de que por se tratar de caso em que os sócios nada tinham recebido, também nenhuma responsabilidade lhes podia ser exigida. Sucede que, salvo o devido respeito, o que estava em causa nos autos era tão somente poder (ou não) prosseguir a execução contra os sócios quanto ao bem imóvel da sociedade que havia sido penhorado nos autos e quanto ao qual não foi dado destino no âmbito da “liquidação administrativa”. Sendo que, quanto a nós, sobre tal estatui diretamente o citado artigo 162º do C.S.C.. Senão vejamos. Se bem atentarmos na literalidade deste normativo, nele se prevê e estabelece que as ações em que a sociedade seja parte continuam após a extinção desta, que se considera substituída pela generalidade dos sócios, representados pelos liquidatários. E é disso que basicamente se tratava e estava em causa nos autos. Desta forma já se adivinha qual a nossa posição nesta temática. Na verdade, aderimos ao entendimento de que «Os arts. 162° e 163° do Código das Sociedades Comerciais, distinguem e regulam dois modos diferentes de fazer intervir os sócios em acção instaurada por dívida da sociedade extinta, consoante a acção esteja pendente à data da extinção da sociedade ou seja instaurada após a extinção da sociedade. Tratando-se de acção pendente à data da extinção da sociedade, a substituição da sociedade pelo conjunto dos sócios, representados pelos liquidatários, é imediata e feita no próprio processo, sem necessidade de qualquer justificação e sem necessidade de recorrer ao incidente de habilitação (art. 162° do CSC).»[6] É que, como igualmente foi explicitado em outro douto aresto no mesmo sentido, «[N]a execução para pagamento de quantia certa em que, na pendência da mesma, ocorre a extinção da sociedade comercial (anónima) Executada, nos termos dos artigos 11.º, n.º 4, e 13.º do RJPADLEC, com o registo da decisão administrativa da dissolução e encerramento da liquidação, é aplicável o disposto no art. 162.º do CSC, do qual resulta que as ações em que a sociedade seja parte continuam após a extinção desta, que se considera substituída pela generalidade dos sócios, representados pelos liquidatários, nos termos dos artigos 163.º, n.ºs 2, 4 e 5, e 164.º, n.ºs 2 e 5, do CSC. Com efeito, o legislador optou por facultar ao credor que já foi a juízo (para fazer valer o seu direito) um “caminho mais fácil”, o do n.º 2 do art. 163.º, ou seja, não determinou que o processo prosseguirá contra os próprios sócios (em sentido amplo entenda-se, incluindo, pois, os acionistas), que teriam de ser “habilitados”, mas sim contra a “generalidade dos sócios, representados pelo liquidatário”, reconhecendo assim a personalidade judiciária deste “coletivo dos sócios”. Em situações como a dos autos, em que não existiu procedimento de liquidação com partilha, mas está comprovada a existência de ativo, de bens que não foram partilhados (no caso, imóveis penhorados, com registo de aquisição a favor da sociedade Executada) e de passivo (no caso, o crédito exequendo), a execução pode e deve prosseguir contra a “generalidade dos sócios”, representados pelos liquidatários, pois não se está perante uma circunstância conducente à inutilidade ou impossibilidade superveniente da lide».[7] De referir que neste último aresto estava em causa uma situação factual perfeitamente equiparada/semelhante à dos presentes autos – execução já pendente, não tendo havido partilha/distribuição pelos sócios do bem penhorado à sociedade executada no âmbito da “liquidação administrativa”. Assim, salvo o devido respeito, não estávamos reconduzidos in casu a uma “falta de personalidade judiciária” da sociedade Executada determinante da necessária e incontornável extinção da execução, pois que é o próprio art. 162º do C.S.C. a estatuir o “remédio” “solução” para a situação, a saber, que o processo prossegue contra a “generalidade dos sócios, representados pelo liquidatário”, reconhecendo assim a personalidade judiciária deste “coletivo dos sócios”. Nem, aliás, nos encontrávamos perante uma circunstância conducente à inutilidade ou impossibilidade superveniente da lide. Antes e ao invés, continuando penhorado o imóvel ajuizado, isto é, existindo esse bem que não foi partilhado, impõe-se que os autos executivos prossigam, nomeadamente para a venda do mesmo (sobre o qual até incide hipoteca para garantia do crédito exequendo), com vista ao pagamento da quantia exequenda, sendo certo que, a existir um valor remanescente do produto da venda, ser-lhe-á dado destino pelo(s) liquidatário(s). Termos em que, brevitatis causa, o recurso merece provimento, devendo a execução prosseguir, como pretende a Exequente/recorrente, contra a “generalidade dos sócios”, o que se traduz na revogação da decisão recorrida. * 5 – SÍNTESE CONCLUSIVA (…). 6 – DISPOSITIVO Pelo exposto, decide-se a final, dar procedência à apelação e, em consequência, revogar a decisão recorrida, determinando, em substituição da mesma, o prosseguimento da ação executiva, agora contra a “generalidade dos sócios” da extinta sociedade Executada, representados pelo(s) liquidatário(s). Custas do recurso pela “generalidade dos sócios”, as quais sairão precípuas do produto do bem penhorado. Coimbra, 11 de Novembro de 2025 Luís Filipe Cravo Fernando Monteiro Carlos Moreira
|