Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1757/23.6T8LRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: CARLOS MOREIRA
Descritores: REJEIÇÃO DE MEIO DE PROVA
RECURSO
MOMENTO DE SUBIDA
OFICINA REPARAÇÃO DE AUTOMÓVEIS
ATIVIDADE RUIDOSA
DIREITO AO REPOUSO
SANÇÃO PECUNIÁRIA COMPULSÓRIA
Data do Acordão: 03/25/2025
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA – LEIRIA – JUÍZO CENTRAL CÍVEL – JUIZ 1
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 25º Nº 1 E 64º Nº 1 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA.
ARTIGOS 70.º, 335.º, N.º 2, 829.º-A DO CÓDIGO CIVIL.
ARTIGOS 299 º, N.º 3, 615.º, 640.º, 644.º, N.º 1, AL. G), E 638.º, N.º1, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.
ARTIGO 3.º, AL. A), DO REGULAMENTO GERAL DO RUÍDO – DL 9/2007DE 17 DE JANEIRO.
ARTIGO 5º Nº 1, E 11.º DA LEI DE BASES DA POLÍTICA DE AMBIENTE - LEI 19/2014 DE 14 DE ABRIL.
Sumário: I - Não tendo sido admitida a reconvenção, e porque o valor deste pedido só releva para os «atos e termos posteriores» - artº 299º nº3 do CPC – , vg. para fixação do valor da causa no despacho saneador, não pode ele somar-se ao valor do pedido inicial do autor para se fixar o valor da causa.

II – O recurso do despacho de rejeição de algum meio de prova tem de ser impugnado imediatamente, no prazo de 15 dias após a sua notificação – artº 644º nº1 al. g) e 638º nº1 do CPC -, mostrando-se assim extemporâneo o recurso dele interposto apenas na decisão final.

III - Há que não confundir as nulidades do artº 615º do CPC, meros vícios formais da sentença enquanto instrumento jurídico comunicante primordial do processo, que, assim, se pretende fundamentada, lógica e percetível, com a menos adequada subsunção dos factos e a exegese jurídica das normas invocadas operadas pelo julgador, o que acarreta o vício substantivo da sua ilegalidade.

IV -No âmbito da al. c) do artº 615. a sentença só é nula:

i) Por oposição entre os fundamento e a decisão, se aqueles, em termos de pura lógica formal – que não por errada interpretação jurídica – de todo em todo não puderem alicerçar/justificar esta;

ii) Por ambiguidade ou obscuridade, naquele caso se, logicamente, comportar não um ou vários sentidos unívocos, mas antes dois ou mais sentidos díspares nenhum deles prevalente; e, neste, se o significado e sentido da decisão não puderem ser apreendidos por um declaratário normal.

V - A censura sobre a convicção do julgador em sede de apreciação da prova, apenas pode ser concedida – máxime perante prova pessoal e considerando os benefícios da imediação e da oralidade – se tal convicção se revelar manifestamente desconforme à prova invocada, e, assim, os meios probatórios aduzidos pelo recorrente e a exegese deles operada não apenas sugiram, mas antes imponham tal censura – artº 640ºdo CPC

VI - Em caso de colisão de direitos, os direitos de personalidade assumem, em tese e em princípio, maior dignidade e relevância do que os direitos patrimoniais, pelo que aqueles prevalecem sobre estes– artº 335º nº2 do CCivil - .; porém tal liminar prevalência não é absoluta, podendo, pela força das circunstancias de cada caso concreto, ser infirmada/derrogada.

VII – A atividade de uma oficina de reparação de automóveis - máxime com amplas valências: bate chapa, pintura lavagem - pode ser considerada, pela sua própria natureza, que cabe, ou pode caber, na definição do artº 3º al. a) do DL 9/2007de 17.01: atividade ruidosa permanente, como normalmente produtora, para quem a rodeia, de ruído excessivo que é incomodativo, máxime se por vezes decorre no exterior das suas instalações.

VIII – Provando-se factos que permitem a conclusão sobre a produção de tal ruído, o qual prejudica o sossego e incomoda os autores que fruem casa de habitação, com quinta, confinante, mas resultando que os réus de tal oficina retiram o essencial dos rendimentos para o seu sustento, a solução mais razoável, sensata e justa, não é ordenar o encerramento da oficina, por prevalência do direito de personalidade sobre o direito patrimonial, mas antes fazer ceder e tutelar, na medida do possível, os dois direitos, o que passa pela determinação da eliminação/correção dos aludidos factos principais causantes.


(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Integral: Relator: Carlos Moreira
Adjuntos: Alberto Ruço
Fonte ramos

*

ACORDAM OS JUIZES NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA


1.
 AA e BB, instauraram contra A... Ldª , CC e DD a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum.

Pediram a condenação dos réus:
-A reconhecerem o direito de propriedade dos autores sobre o prédio que identificam em 1º da p.i;
-A reconhecerem que os ruídos, vibrações, trepidações, fumos, gases, fuligens, cheiros produzidos pela actividade comercial e industrial, por si, explorada no prédio a sul, emitidos para os prédios dos autores, são lesivos para a sua saúde, descanso, repouso e, qualidade de vida;
-A cessar imediata e definitivamente todos essas emissões para os prédios dos autores, tanto no interior como no exterior, bem como à remoção de todos os resíduos ali, existentes;
-A pagarem aos autores uma indemnização por danos morais, a liquidar em execução de sentença, acrescida de juros moratórios;
-No pagamento de € 200,00 a título de sanção compulsória, por cada acto violador dos direitos dos autores.
 
Para tanto alegaram, em síntese:
São proprietários dos prédios descritos a seu favor na Conservatória do Registo Predial ... sob os nºs ...68 e ...69, afetos essencialmente a habitação, sendo que os réus, no prédio contíguo a sul do prédio descrito sob o nº ...68, edificaram construções e instalaram equipamentos, máquinas e ferramentas, explorando continuadamente, a atividade comercial e industrial, de oficina de reparação e, lavagem de viaturas automóveis e máquinas, mormente, para reparação mecânica, bate chapas, mudanças de óleos, filtros e, lavagens e/ou limpeza de várias proveniências.
Do exercício da atividade desenvolvida pelos réus são produzidos, de forma intensa e continuada, ruídos, gases, fumos fuligens, vibrações e trepidações, pelo que os autores não podem ter janelas abertas, nem estender roupa, nem descansar, pois os ruídos chegam a atingir 30/40 decibéis.
 Em consequência destes factos, andam incomodados, angustiados, ansiosos, nervosos, abatidos, sem conseguir descansar ou adormecer normalmente, com a tensão arterial elevada e deprimidos.

Os réus contestaram e deduziram pedido reconvencional.
Alegaram:
Desde 2007, exercem no prédio de que são proprietários, a sua atividade, sendo que as obras feitas pelos autores no prédio contíguo são posteriores a essa data.
Raramente procedem à reparação e lavagem de viaturas pesadas no prédio em questão, sendo a sua atividade dirigida essencialmente para a reparação de veículos ligeiros de passageiros e de mercadorias.
Os ruídos produzidos decorrem do normal exercício de tal atividade e durante o horário laboral, entre as 8.30 e as 18.00 horas (com intervalo de almoço das 12.30 às 14.00) nos dias da semana e das 8.30 e as 13.00 horas aos Sábados A ré sociedade está devidamente licenciada para essa atividade e cumpre todas as obrigações legais em matéria de sucata e resíduos, sendo portadora de certificado de responsabilidade ambiental.
Uma vedação metálica dos autores caiu sobre o seu – da ré – prédio, provovando danos, vg. num automóvel de cliente.
O autor marido tem praticado atos, que discriminam, que perturbam e afugentam trabalhadores, clientes e fornecedores
Pedem:
A improcedência da ação.
Em reconvenção peticionam :
a condenação dos autores no pagamento dos prejuízos resultantes da queda de uma vedação, bem como uma indemnização a título de danos não patrimoniais.

Replicaram os autores.
Impugnando os factos descritos na reconvenção, que entendem não ser admissível, mais pedindo a condenação dos réus como litigantes de má fé.
 
Dispensada a realização de audiência prévia, foi proferido despacho saneador onde se decidiu não se admitir a reconvenção deduzida.

2.
Prosseguiu o processo os seus termos, tendo, a final, sido proferida sentença na qual foi decidido:
«…julgo a acção parcialmente procedente reconhecendo o direito de propriedade dos autores sobre os prédios identificados em 1, no mais absolvendo os réus do pedido. *
 Custas pelos autores e pelos réus, na proporção de 4/5 para os primeiros e 1/5 para os últimos (artº 527º nº 1 do CPC). »

 3.
Inconformados recorreram os autores.
Rematando as suas alegações com as seguintes - prolixas e complexas, mesmo depois de expurgadas dos depoimentos que, inadmissivelmente, nelas constavam -  conclusões:

1ª) Atento ao valor atribuído à causa pelos AA de € 81.972,27, que representa a utilidade económica e, não tendo sido admitida a reconvenção deduzida pelos RR; a qual, atribuíram o valor de € 4.111,92; o valor a fixar à causa, deveria ser o indicado pelos AA de € 81.972,27 e, não de € 86.084,19 (arts. 296º e 306º do CPC).
2ª) Na enunciação dos temas da prova, pretende-se a delimitação da causa de pedir, de molde a assegurar a livre investigação e consideração de toda a matéria atinente para a decisão da causa e, não de tal modo vaga e abstrata - atentas as necessidades da instrução - a proporcionar a justa composição do litígio; pelo que, a reclamação apresentada pelos AA, devia ser atendida e deferida e, em consequência, os temas da prova ampliados, de molde a inserir o tema da prova, sobre a indemnização por danos sofridos articulados, designadamente, nos pontos 26º, 38º e 44º da p.p.
3ª) O ónus da prova, quanto à alegação e demonstração dos factos constitutivos do direito invocado, impende sobre os AA; pelo que, tem o direito à produção dos meios de prova, legalmente admissíveis, concretamente, por meio de produção documental de prova pericial e, oportunamente, requeridos para esclarecimentos de factos articulados, a exigir conhecimentos técnicos e científicos, mormente, quanto à medição do nível da intensidade e duração dos ruídos, gases, fumos, cheiros, fuligens, vibrações, duração e quantidade de partículas, produzidos pela utilização de equipamentos, utensílios, ferramentas, no exercício da actividade da Ré e da lavagem e limpeza de viaturas automóveis, emitidos para os prédios dos AA, pela ação do vento, com serviços de bate-chapa, pinturas, mecânica, mudança de óleos, baterias, escapes e de sucata, pelo que; ao ser-lhe indeferida tais meios de prova, ficaram cerceados de o poder provar.
4ª) Tendo em conta a necessidade de os AA poderem carrear, para os autos, documentação útil, necessária e pertinente para a produção de prova, sobre a factualidade alegada nos pontos 13; 14; 17; 18 da p.i. e, 39º da resposta, concretamente, o projecto de obras, a certificação do teste de ruído, o projecto de saneamento básico, de alteração de obras e; de recolha, remoção e transporte de resíduos sólidos e líquidos, resultantes da actividade da Ré, devia ser admitida e deferida o por si requerido e determinado à Ré, a sua junção, para esclarecimento dos factos e, para a boa decisão da causa (art. 429º do CPC). Com efeito,
5ª) Aquando da realização da inspecção judicial, a actividade da Ré, encontrava-se completamente encerrada e inativa, quando a mesma devia estar em plena laboração, em ambas as oficinas e parque utilizado. Por outro lado,
6ª) O auto de inspecção devia descrever os factos percecionados, relevantes para a decisão e, o relatório fotográfico, incluir todos os fotogramas, abrangendo os prédios dos AA, a(s) oficina(s), o parque, a estação de lavagem e limpeza, como a oficina de pintura referida no ponto 10.) dos factos provados e; tal, assim não se lavrou, nem registou.
7ª) O julgamento deverá ser anulado e, admitidos e produzidos os meios de prova referidos, procedendo-se a nova apreciação e decisão, tanto sobre a questão da matéria de facto, como da de mérito.
Quando assim, se não entenda!
8ª) A sentença proferida enferma de vício de nulidade, em virtude da fundamentação da decisão da matéria de facto e, de direito, conter ambiguidade e, mesmo contradições a torná-la, parcialmente ininteligível.
Sem prejuízo,
9ª) Da impugnação da decisão, quanto à matéria de facto, dos concretos pontos de facto enunciados sob os nºs: 3, 4, 6, 7, 10, 11, 12, 13 e 14 dos factos considerados “provados” e, sob as alíneas: a); b); c); d); e); f); g); h); i); j); l); m); n); o); p) e q) dos factos tidos como “não provados” que, os AA consideram incorrectamente julgados.
10ª) Os concretos meios probatórios constantes do processo e do registo por meio de gravação áudio digital, nele realizada, para documentação da audiência de discussão e julgamento que, no entender dos AA, impunham decisão diversa, sobre tais pontos da matéria de facto impugnados, diversa da recorrida:
 ð Ponto 3:
Da motivação à decisão, consta ter resultado do indicado no alvará de licença de utilização, dando por provado também o facto 3 do respectivo documento junto com a contestação sob o nº 2. Porém, além do doc. nº2, datado de 23/05/2007 ter-se-á de conjugar com os demais elementos probatórios, documentais, mormente com seção de bate-chapa e pintura (Cf. Pontos 13 a 28 da PI), complementado com despacho de 11/06/2024.
Vejamos, os documentos juntos com a p.i.
Doc. 36:
Refere-se as desconformidades existentes, com o projetado, daí a comunicação dirigida pela Câmara Municipal ... ao IGAMAOT com data de 08/08/2018. O edificado fora o coberto do alvará de obra de construção nº. 484/06, titulado pela autorização de utilização para a actividade exercida nº. 2/07 para oficina de reparação de automóveis e estação de lavagem de automóveis. - Nesta sequência foram encontradas irregularidades nomeadamente de edificação em causa encontrar-se em desconformidade com o projecto de arquitectura aprovado e uma vez que se constatou existirem obras de alteração e ampliação nos alçados lateral direito e posterior (sublinhado nosso).
Doc. 32:
Junto com a PI, fotograma da oficina de pintura dos RR e, facto 10º dos factos provados.
Docs. 5 e 31:
Registos de fotogramas, onde se localizam as edificações e, onde, a Ré explora a actividade industrial, não é só um único espaço e sitio.
Atente-se no teor do doc. 5 junto com a contestação (horário de trabalho), ramo de actividade: bate-chapas e pintura, atribuída pela ANE em 01/02/2007, tendo como local de trabalho: Rua ..., ...; que, não se reporta à oficina existente na Rua ..., ... – ... (cf. fotos juntas com a p.i.). Equivale por dizer, o alvará de licença emitido em 23/05/2007 não traduz o existente, à data da propositura da acção – 26/04/2023 – consubstancia outro prédio para onde fora emitido o alvará de obra de construção e, de utilização. Nem se diga ter havido novo alvará de utilização ou, de aprovação de obras perante o pedido dos RR como parece resultar do doc. nº 1 junto pelos mesmos, sob refª. 46739270, de 09/10/2023, porquanto; esse ter caducado (visto nenhum outro ter sido apresentado). Não se podendo, ainda perder de vista por relevante, a secção de bate-chapa e de pintura, ali explorada em dois sítios, no barracão nº 13 e no edifício nº 14, ambos na Rua .... Em suma, o alvará emitido em 23/05/2007, não comprova a conformidade da oficina em questão, pelo que; há erro na análise e apreciação de tal meio de prova.
Resposta a dar:
O prédio referido na al. a) do facto 1 confronta pelo lado sul com um prédio onde a sociedade da Ré tem instalada e exercem uma actividade de oficina de automóveis com secção de bate-chapa, pintura, mecânica, mudança de óleos, filtros e lavagem de viaturas automóveis ligeiros e pesados e máquinas, tractores e outros, tanto no interior como no exterior e, há outra secção de pintura localizada em prédio mais afastado.
ð Ponto 4:
A actividade referida em 3 é exercida pelos réus e por, pelo menos, dois trabalhadores, com um horário laboral das 8.30 horas às 18 horas, com intervalo de período de almoço das 12.30 às 14 horas, de Segunda a Sexta-feira e das 8.30 horas às 13.00 horas aos Sábados.
A decisão para o Tribunal a quo resultará do horário laboral, sob doc. 2, do letreiro, junto com o doc. 5 junto com a contestação sendo a localização da oficina referida em 9 e a secção de pintura referida em 10 da matéria aceite pelas partes.
Vejamos!
Quanto aos docs. 4 e 5, foram impugnados pelos AA na réplica (Cf. Ponto 55; 60 e 61).
O doc. 4 nada tem a ver com horário e reportar-se-á a 2016, enquanto, o doc. 5 é o horário supostamente autorizado em 01/02/2007 pela Anecra – Associação Nacional das Empresas de Comércio e da Reparação de Automóveis e, não aquela oficina, efectivamente alegada pelos AA.
O suposto horário ser para o ramo de actividade de bate-chapa e pintura com o local de trabalho, como se afirmou, na Rua ..., ... - ... e; por outro lado, estação de lavagem e limpeza de automóveis de viaturas, ser ao longo de 24h self service.
De facto, o horário de 24 horas encontra-se ostensivamente escrito: self-service 24 horas (cf. doc. nº 19 junto com a PI).
Não se podendo ignorar também, os depoimentos prestados pelas testemunhas arroladas pelos AA, concretamente EE, FF, dado sobre as mesmas e quanto às declarações dos AA o Tribunal a quo parece não ter dado a devida observância.
Tanto mais, como deflui da motivação a primeira – EE – residente com carácter de permanente com os pais até 2002 e, onde, se desloca aos fins-de-semana e; a FF, também, residente com os pais até ao no de 2002 e, onde, continua  a estar com frequência, uma vez que pode exercer a sua profissão (programadora), em teletrabalho, neste conspecto afirmaram nas passagens: EE
ð Ponto 6
 A actividade referida em 3 produz barulhos de motores, do funcionamento do compressor de ar comprimido, do martelar das ferramentas e do falar das pessoas.
Crítica:
Pelos AA foi alegado, serem produzidos ruídos, gases, fumos, fuligens, vibrações e trepidações de forma intensa e continuada (Cf. ponto 15) e que o aparente encerramento das portas, inclusivé, no exterior, práticas de trabalhos de reparação e de lavagem (self-serviço), para além de ficarem por ali viaturas estacionadas durante dias, meses, senão mesmo, anos sucessivos (Cf. ponto 17), trabalham, continuadamente, com todos os portões abertos instalado no exterior além de veículos que ali permanecem com os motores em funcionamento dos quais verifica-se a emissão de gases, fumos, fuligem e, trepidações, cheiros tóxicos e desagradáveis e nocivos, por vezes irrespiráveis, com impacto na saúde e qualidade de vida e ambiental dos AA.
Só por erro notório de leitura, análise, interpretação, apreciação e decisão se poderá explicar e/ou compreender.
É do conhecimento comum que, os veículos vão à oficina, por estarem avariados, afim de serem reparados; os trabalhos de reparação de motores (mecânico), com o funcionamento dos mesmos, soltam combustíveis, fumos, gases, cheiros, partículas pelos escapes e, trepidações.
É uma evidência inquestionável!!
Resposta a dar:
O ponto 6 deve ser ampliado de molde a passar a integrar os factos aduzidos e demonstrados por prova documental, testemunhal e presunção judicial que produz ruídos, gases, fumos, fuligem, vibrações, trepidações e cheiros desagradáveis que se propagam pelo ar e pelas estruturas para o prédio dos AA.
Aliás, dos próprios documentos juntos se atestam, também, o demonstrado, concretamente sob os docs.: 19; 22; 27 e 32; em particular do documento 36 enviado pela C.M. ... ao IGAMAOT.
Nesta sequência, por encontrar-se irregularidade, nomeadamente, a edificação e insalubridade.
Como do documento 2, junto com a PI é visível letreiro afixado na portaria, nomeadamente, óleos, mecânica, travões, baterias, escapes, ar condicionado, chapa e pintura.
Como dos depoimentos prestados pelas testemunhas às passagens: EE Início 14:41:01 horas; Fim 15:31:05 horas

ð Ponto 11:
A actividade de lavagem de veículos é esporadicamente utilizada pela Ré.
O Tribunal a quo deixou consignado:
- É inequívoca existência de um equipamento de lavagem automática, localizado no exterior da oficina, nos termos que constam das fotografias juntas ao auto de inspecção
Dos depoimentos das testemunhas GG, HH e II, é frequente estarem estacionados nesse local veículos necessitados de qualquer intervenção, o que também sucedia na data em que efetuámos a visita ao local (Cf. fotografias 7 a 10 do auto), do que resulta a ocupação de tal espaço para um fim diferente (?)
Em nosso entender, os mesmos depoimentos e os registos fotográficos apontam para um uso muito pouco frequente.
Que dizer?
A prova do julgador é livre mas, não tem de ser adversa, à realidade objectiva e constatável. Numa análise crítica e reflexiva, a ser assim, questiona-se essa valência, para um uso pouco frequente.
É juízo subjetivo!
Ora, contrasta com a sua própria possibilidade de utilização Self-serviço 24 horas.
Ouçam-se, os depoimentos das testemunhas nas passagens, quando afirmam, perentoriamente: EE Início 14:41:01 horas; Fim 15:31:05 horas
….
Resposta a dar:
A actividade de lavagem e limpeza de veículo, é utilizada 24 horas, por modo self service, encontra-se no exterior da oficina, acessível a qualquer cliente.
ð Ponto 12:
No ano de 2018, o autor reclamou junto do Município ... e da Inspecção Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (IGAMAOT), da actividade desenvolvida pela sociedade ré, na sequência das quais o município verificou que o ruído se inseria na actividade normal do estabelecimento particularmente quando a mesma era desenvolvida no exterior ou quando a oficina tinha as portas abertas. Está em contradição com o documentado, nos documentos 34 e 35 juntos com a PI dirigida aos AA datado de 08/08/2018, pela CM....
A dado passo: “…sendo notificada a Ré, informar a A. marido e tendo em consideração as reclamações apresentadas, o Município ..., entre outras, notificou a Oficina A... para: “a adopção imediata de todas as medidas de minimização de ruído provocado por este estabelecimento, para melhoramento do ruído e ambiente geral e para cumprimento rigoroso do horário atribuído”.
Como, o exarado no doc. 36, ter tão só notificado a oficina, tendo ainda a fiscalização municipal averiguado que a mesma oficina se encontra a laborar e do último parágrafo:
- Atendendo o acima descrito e caso após as diligências efetuadas as questões de ruído persistirem, o Município ... despoletará novos procedimentos, que se considerarem convenientes, para a reposição da legalidade e do direito ao descanso do munícipe reclamante.
O Tribunal a quo parece não ter apreciado, nem valorado devidamente, tais segmentos dos elementos probatórios. Salvo o devido respeito e melhor opinião, trata-se de elemento probatório idóneo, relevante, útil e pertinente para a boa decisão e causa, tendo em conta, a repartição do ónus de prova imposta às partes, por força do disposto no artº. 342º do CC.
Quando, nenhumas medidas foram tomadas pela Ré, para minimizar os ruídos provocados pelo seu estabelecimento, para melhoramento do ruído e da salubridade. Há erro, rectius, insuficiência de apreciação e julgamento cabal de tais elementos, atenta à pretensão deduzida em juízo e da causa de pedir!
ð Ponto 13:
A sociedade ré é regularmente acompanhada e fiscalizada pelas entidades competentes, públicas e privadas, cumprindo com as suas obrigações referentes a sucata e resíduos, nomeadamente quanto à sua separação, acondicionamento e entrega nos locais apropriados, sendo detentora do “Certificado de Responsabilidade Ambiental 2023”, emitido pela “B..., Lda”, que lhe presta serviços na área ambiental.
Neste ponto engloba-se, regularmente acompanhado e fiscalizado por entidades públicas e privadas cumprido com as suas obrigações referente a sucata e resíduos, sendo conceitos ou expressões opinativas e não factos objectivos e especificados, pelo que não se poderá ter por escrito nem requerido?
O Tribunal a quo considerou ter tido como alicerce nas fichas de produção de resíduos juntas pelos réus com o requerimento de 09/11/2023.
Atentemos!
Da sua leitura, análise e interpretação temos:
Doc. 1: Oficio enviado a Ré onde a C.M. ... notifica a Ré, com data de 23/06/2021, que lhe fora deferido o pedido de licença devendo requerer na mesma edilidade no prazo de um ano o direito de alvará sob pena de caducidade do mesmo.
Mas, não se vislumbra a emissão do alvará de licença de obras!
Doc. 2: Ficha sobre produção de resíduos, reporta-se a oficina de pintura na Rua ..., ..., ... quando o edifício principal fica no nº 14, como vimos anteriormente e, encontra-se documentado. Trata-se, de resíduos de tintas e vernizes contendo solventes orgânicos e outras substâncias perigosas! Doc. 3: Outros óleos de motores, transmissões e lubrificações, embalagens de cartão, embalagens de metal, absorventes, pastilhas de travões, metais ferrosos, plástico, vidro.
Pela sua leitura reportam-se a Janeiro de 2023 e, de nenhum outro ano existe!
Além de, como se poderá ouvir pelos depoimentos das testemunhas JJ e, KK, apenas, ocorrerá uma vez.
ð Ponto 14:
Em consequência do facto referido em 6, os autores andam incomodados com a actividade desenvolvida na oficina referida em 3.
Considerado provado, com alicerce nos depoimentos das testemunhas EE e FF, bem como declarações de parte dos autores que foram no mesmo sentido dado por provado.
Mais, se adiantando:
“Tais meios de prova foram conjugados com as regras da experiência comum já referidas e relacionadas com a actividade normal que é desenvolvida por uma oficina de reparação de automóveis, uma vez que o simples exercício de tal actividade produz, por si só, ruído suscetível de incomodar quem reside permanentemente nas imediações da mesma. Porém, o que, de forma alguma resulta da prova produzida é que a actividade desenvolvida pelos réus seja suscetível de causar os danos enunciados na alínea q), que assim se deram por não provados”. Sic.
Crítica:
Ouçam-se os depoimentos das testemunhas EE e FF e as declarações de parte dos Autores, de forma crítica, analítica e reflexiva; afim de, a 2ª Instância poder fazer o seu juízo, sobre tais temas de prova e, concluir-se-á não andarem apenas incomodados. Destacam-se as seguintes passagens: EE Início 14:41:01 horas; Fim 15:31:05 horas
….
Os AA, como legítimos danos tem o direito de usar, fruir e dispor, livre e plenamente do que lhes pertence, dentro dos limites da lei e, com observância das restrições (art. 1.305º do CC), por ela impostas.
É pois expectável e da experiência comum que usem continuadamente do seu prédio, para confecionar, tomar refeições, dormir, passar momentos de lazer, receber familiares e amigos, movimentando-se pelos logradouros, a respirar aquele ar.
Al. b) Os réus constituíram a sociedade ré, da qual são únicos sócios e gerentes
São os próprios réus a admiti-lo, no documento procuração junto com a contestação, consta o NIPC ...06 consultável em base de dados e, a Ré DD como sócia-gerente, bem como, do doc. 37 tendo o CC como CC como dono da oficina de bate-chapas do próprio.
Al. c) A estação de lavagem de veículos referida em 3 é utilizada diariamente durante 24 horas do dia ao longo da semana, do mês e do ano
Já, atrás se deu conta e, está comprovado pelos documentos de alvará e, dos registos fotográficos e, do auto de inspecção judicial.
Al. d) São levados diariamente para as instalações da oficina referida em 3 veículos pesados tractores e máquinas Alegado no ponto 14 e, para onde os clientes conduzem automóveis ligeiros e pesados, como tractores e/ou outras máquinas, tanto para o interior, como para o exterior das instalações (Cf. foto junta sob o doc. 1) da réplica; docs. 1; 7; 8; 21 e 24 juntos com a PI).
Visualiza-se, desde logo, a título de exemplo; veículo automóvel pesado, como ligeiros e de mercadorias, caravana, caixas térmicas, etc ….
Leia-se o alegado na PI, designadamente, nos pontos: 26; 28; 32; 33; 34; 36 e 44 da PI e pontos: 36; 37; 38; 39 e 40, dados por reproduzidos. Na verdade,
A actividade desenvolvida na oficina mencionada em 3 produz de forma intensa e continuada ruído, gases, fumos, fuligens, vibrações e trepidações que se propagam no ar e, pelas estruturas, sendo emitido para os prédios dos autores.
É uma realidade inserida, no interior de uma aldeia: ... – ....
Após, os AA já terem, até a sua casa de habitação, onde residem, como residiram anteriormente os seus ascendentes, pais do A. marido.
É insofismável, a actividade desenvolvida na oficina mencionada em 3 produz de forma intensa e continuada ruídos, gases, fumos, fuligem, vibrações e trepidações que se propagam no ar e pelas estruturas, sendo emitido para os prédios dos autores, devido à realização dos trabalhos realizados, tanto no interior, como no exterior da oficina.
Não se poderá perder de vista, trata-se de uma oficina de reparação de viaturas automóveis, com seção de bate-chapas, pintura, serviços rápidos, com mudança de óleos, mecânica, travões, baterias, escapes, ar condicionado, seção de lavagem e de limpeza, com parque em seu redor com viaturas, máquinas como evidenciado documentalmente, com historial de queixas/reclamações efectuadas pelos AA na Câmara Municipal ..., são concludentes dos documentos: 33; 35 e 36, em particular no parágrafo: Tendo em conta o conteúdo e as reclamações aprovadas no Município ... e no IGAMAOT, bem como do procedimento criminal sob o inquérito nº. 182/18.... do DIAP ....
Por outro lado, é facto notório e público, o acionamento dos motores, a combustão, isto é, pela queima de combustíveis fosseis, produzem ruídos, gases, fuligens, cheiros, vibrações e trepidações que se propagam pelo ar e são arrastadas pelo vento, consoante a sua orientação, bem assim, da lavagem das partes inferiores e superiores das viaturas como agora projetado sob pressão pneumática, com solventes residuais, óleos, massas e outros, com partículas pelo ar que, igualmente, são levados e amontoados pelo ar, mormente, para os prédios dos AA, dada a sua contiguidade e proximidade.
Como os vapores, cheiros, pela seção de pinturas, onde são utilizadas e, vernizes expelidos pelo ar, para o exterior.
Al. f) Após, o período laboral referido em 4, continua a ser desenvolvida actividade na oficina mencionada em 3
Os AA, tentaram ainda, com uma vedação, construção de muro encimado por estrutura em ferro e chapa de zinco (Cf. docs. 18 e 19 da PI), tentar minimizá-lo, mas não o conseguiram.
Aliás, notada pela própria Câmara Municipal quando explicita e concretamente no ofício da C.M. ..., datado de 08/01/2018 (doc. 34, parte final), para cumprimento rigoroso do horário atribuído, o mesmo constando do ofício dirigido ao A. (Cf. docs. 33, 34 e 35).
Como dos depoimentos das testemunhas: EE Início 14:41:01 horas; Fim 15:31:05 horas


Al. g) Em consequência da actividade referida em 3 ficam amontoadas as peças extraídas e/ou substituídas amontoadas, por vários sítios, além de, resíduos derramados no solo
É uma constatação, parcialmente, registado nos fotogramas juntos com a PI, sob os docs. 24; 25; 26; 29 e 30.
Aliás, o relatório fotográfico da inspecção judicial obtido aquando da inspecção judicial ao local não se restringiu aos selecionados e juntos sob a fotografia nº. 1 a fotografia nº. 16, pois, foi muito mais alargado, desconhecendo-se o critério utilizado pelo Tribunal a quo para não terem sido integradas as demais fotografias e do respectivo auto, dado ter-se optado tão só por relatório fotográfico selecionado e não por uma descrição redigida pela observação efetuada quanto à matéria factual controvertida atinente com o pedido e a causa de pedir, ficando assim tal meio de prova inquina por manifesta insuficiência.
Atente-se, que no momento, a oficina curiosa e estrategicamente, não estava a laborar, com os portões de entrada fechados.
Enfim!
Seria antes, suposto a observação do estatuído no nº. 1 do artº. 490º do CPC ao facultar ao juiz mandar proceder a reconstituição dos factos!
In casu, parece-nos seria de elementar necessidade, estar a oficina em laboração que, se poderia aquilatar, sobre os ruídos produzidos, com as respectivas acções para assim se poder realmente e, não mera formalidade o Tribunal poder percepcionar os factos que importava conhecer.
Tratou-se, com o devido respeito de um “nim”.
A secção de pintura não foi, tão pouco inspecionada, embora, se tenha dado com, o provada no facto 10:
- A sociedade ré desenvolve também actividade numa secção de pintura, localizada em prédio mais afastado.
Quanto ao previsto no artº. 411º do CPC, dispõe:
- Incumbe ao juiz realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos de que lhe é lícito conhecer.
E, no artº. 493 do CPC:
 - Da diligência é lavrado auto em que se registem todos os elementos úteis para o exame e decisão da causa, podendo o juiz determinar que se tirem fotografias para serem juntas ao processo
Equivale por dizer, uma parte, não exclui outra ou as fotografias subsituem o auto onde se regista todos os elementos úteis, através da sua descrição, com a redacção e narração do verificado e percecionado.
Como consta da nota 20 de tal comando do CPC anotado, Vol. I, pelos Drs. Abrantes Geraldes; Paulo Pimenta e Pires de Sousa:
- Pode acontecer que o auto não documente os factos observados pelo Juiz que procedeu à inspecção ou os resultados que a inspecção o conduziu e apesar disto, a inspecção seja erigida a prova decisiva em sede de fundamentação da decisão de facto, uma vez que “a fonte da convicção da Relação é, neste caso, o auto de inspecção, a falta de documentação dos factos observados ou dos resultados a que a inspecção conduzir o juiz que a realizou, impede, naturalmente a Relação de controlar o eventual erro daquele magistrado na apreciação ou valoração daquela prova”.
- Na circunstancialismo apontado “dada a inadmissibilidade da renovação dessa prova, uma proposta de solução possível e a Relação a ordenar se proceda a verificação não judicial qualificada (artº. 494º, nº. 1 e 662º, nº. 2, al. b)), Outra anular a decisão da matéria de facto por nesse caso não dispor de todos os elementos que lhe permitem alterar a decisão da matéria de facto, objecto da impugnação (artº. 662º, nº. 2, al. c)” (Cf. Henrique Antunes “recurso de apelação e controle das questões de facto em https: //docentes.fdunl.pt).
Al. h) O compressor referido em 6 funciona continuadamente, com todos os portões abertos, instalado, no exterior, da oficina
O compressor encontra-se instalado no exterior da oficina mesmo junto ao prédio dos AA, onde funciona continuadamente enquanto, obviamente, ativado e, por períodos para arrancar, insistentemente.
Como é do normal do acontecer e, do bom senso, o compressor é um dos equipamentos considerado essencial a toda a actividade da oficina de reparação de veículos automóveis, com as secções mencionadas.
Ela faz movimentar todos os aparelhos/instrumentos que, têm a ver com a compressão de ar.
Só quem não conhecer minimamente esse equipamento, poderá desconhecer tal facto!
E, como se verifica, pelos registos fotográficos, sob doc. 1 com a réplica, é visível um veículo pesado de mercadorias e, o portão da oficina aberto.
O mesmo se passa, na outra seção dita de pintura.
Al. i) Na oficina referida em 3 e no exterior da mesma são colocados veículos que ali permanecem, por períodos mais ou menos prolongados, com os motores em funcionamento com altas rotações, para testagem, chegando a atingir elevada intensidade de decibéis
Obviamente, decorrente da própria actividade exercida pelos RR e, não tendo sido admitido a prova pericial, nem se encontrando em laboração - aquando da inspecção judicial - não será dessa forma possível produzir prova como suposta e directamente os AA viram, por isso, ser-lhe recusado tal direito de produzir prova.
Al. j) Na execução de tarefas na oficina referida em 3, tanto no interior como no exterior, são desferidas marteladas sucessivas contra peças metálicas das estruturas, na própria chapa e carroçarias
Trata-se de uma oficina de reparação de automóveis, estação de lavagens a laborar, diariamente no interior e no exterior das instalações, onde se dão provados os barulhos dos motores, do funcionamento do compressor de ar comprimido, do martelar das ferramentas e do falar das pessoas, pelo que não se compreende bem como o facto da alínea j) não se deu como provado?
A nosso ver, de facto, a resposta negativa sobre tal questão, é um erro de julgamento.
Al. l) O ruído referido em 6 é incrementado pelos sistemas de ventilação/exaustão ou, de ar condicionado utilizado com máquinas de pressão, de elevadores, além das originadas pelo compressor, pelo que, o ruído persiste com períodos intercalados, durante todo o dia
Dos factos apurados extrai-se, inquestionavelmente, tal ilação.
O sistema de ventilação/exaustão e ar condicionado com os do compressor, emitem barulhos/ruídos previsto em períodos intercalados, durante todo o dia/período de laboração, sob os pontos: 3; 4; 5; 6; 7; 8 e 9 dos factos provados conjugados com os ora impugnados.
Al. m) São audíveis com frequência provindos tanto das instalações como zonas adjacentes da oficina referida em 3, conversas em alta voz de empregados e clientes, com palavreado, por vezes, obsceno expressões como “cabrões”, “filho da puta”, “caralho”, e “vão se foder”, “se não estás bem muda-te”
Ouçam-se as declarações de parte, da própria assentada constante da ata exarada na sessão de audiência de julgamento realizada no dia 21/05/2024: ASSENTADA •
Art.º 22 da p.i., admite apenas que o compressor faz ruído.
Art.º 25 da p.i., admite apenas que o Autor está reformado.
AUTO DE INSPECÇÃO AO LOCAL
Consigna-se que as fotografias 1, 2 e 3 correspondem ao interior da oficina da ré, sendo visíveis na 1 e 2 os dois portões de entrada, localizados na parte da frente da oficina, correspondendo a parede visível na fotografia 3 à parede oposta aos referidos portões e que corresponde à que se observa também na fotografia 14, que confronta com o prédio dos autores. A fotografia 15 corresponde ao local onde localiza o depósito de inertes da ré e o compressor mencionado nos autos, que se situa atrás da parede identificada nas fotografias 3 e 15 e que confina com o prédio dos autores. Asfotografias 4, 5 e 6 correspondem ao posto de lavagem visto do exterior e as 8, 9 e 10 ao seu interior, podendo observar-se da fotografia 7 um aspirador. As fotografias 11 a 14 foram tiradas no interior do prédio dos autores. A fotografia 13 foi tirada da porta que dá acesso ao espaço amplo que se visualiza na fotografia 14, desenvolvendo-se uma moradia para a direita dessa porta e que se visualiza parcialmente na fotografia 12. Do telheiro visualizado na fotografia 13 até ao muro visualizado na fotografia 14 que confronta com o prédio da ré foi medida a distância de 15 metros. Da porta que dá acesso ao espaço até á porta da moradia visualizada na fotografia foi medida a distância de 11 metros e 30 cm.
Alínea n): A actividade referida em 10º é poluente
A secção de pintura, aonde são produzidos gases e emitidas partículas, para o ar, através de chaminé, pelos registos fotográficos, juntos sob docs. 32 com a p.i.; trata-se de instalações precárias, tipo barracão clandestino, sem licenciamento de obra ou de alvará, dado o existente em 2007, teve a ver com a oficina retratada nas fotos docs. 6; 7; 23 a 25, com a p.i.
São exercidos trabalhos de bate-chapas e, procede-se à pintura de viaturas automóveis, de forma comprovada, não existindo qualquer compromisso de certificado de entidade competente e idónea, quanto à testagem do ruído, aos efluentes gasosos ou resíduos sólidos e líquidos.
Alínea o): Em consequência do facto referido em 6 e do facto referido em e), os autores têm que manter portas, janelas fechadas, para que os gases, os fumos e fuligens emitidos não se introduzam no interior das habitações, exercendo mau cheiro impregnando-se nas roupas da cama, do vestuário e, fuligem pelos móveis, pelo chão, telhados, varanda e, terraço
É, mesmo, assim!!
Ouçam-se, as declarações dos AA e, aos depoimentos das filhas EE e FF, onde de forma séria, credível e sem exageros, afirmam:
EE Início 14:41:01 horas; Fim 15:31:05 horas
…..
Alínea p): Em consequência da actividade desenvolvida na oficina mencionada em 3, os autores não podem manter, as portas e/ou janelas abertas, como estender roupa a secar, pois, ficam impregnadas de mau cheiro, de fuligem, como andar normalmente nos logradouros das suas habitações, nem dormir ou descansar, sem ruídos bruscos, inesperados, de fumos, gases, fuligens de atividade industrial poluente, dia e noite
Os prédios em causa, casa de habitação e logradouros dos mesmos prédios, não há outro qualquer obstáculo.
Alínea q): Os autores andam deprimidos, sem conseguir descansar ou adormecer normalmente, com a tensão arterial elevada, em consequência da actividade desenvolvida na oficina referida em 3
É a consequência lógica, de quem tem a sua casa de habitação e única residência; aliás, edificada e instalada em data muito anterior à construção e instalação de uma oficina de reparação de veículos automóveis, com secção de bate chapas, pintura, mecânica, mudanças de óleo, escapes, instalação de lavagem e limpeza, tudo exercido tanto no exterior, como no interior; a paredes meias – digamos – com o seu dia-a-dia, com trabalhadores, clientes; cuja actividade produz ruídos, provenientes do funcionamento dos compressores e aspersores de ar comprimido, do martelar das ferramentas, do falar das pessoas.
Não é, cumprido seguramente o horário atinente, com a estação de serviço self-service, durante 24 horas; bem como, emissão de cheiros, fumos, gases, de fuligem, como resulta das leis da física, pelo movimento do ar, são arrastadas para os seus prédios, fazendo-os sofrerem e perderem qualidade de vida.
O A. marido é reformado e, a A. mulher doméstica, passou largos períodos de tempo, nos seus prédios, incluindo as filhas que os visitam, regularmente.
As fuligens e os cheiros, ficam impregnados na roupa posta a secar ou a arejar, no estendal, no interior das suas casas, nos tecidos e por cima dos objectos e, até, nos alimentos é perfeitamente compreensível, que o desgaste emocional e psicológico dos AA e seu agregado familiar, que os tem levado a apresentar reclamações sucessivas, tanto na Câmara Municipal ..., como no IGAMAOT e; interpelarem os RR; onde pelo menos desde 2018, conforme documentalmente comprovado, pelos docs. juntos com a p.i. sob docs. 33; 34; 35; 36 e 37,
Assim, como poderá o tribunal a quo ser insensível a este quadro e, não dê credibilidade a toda essa factualidade? Quando é séria, não empolada, nem momentânea ou, de se simples má vizinhança.
Ouçam-se os depoimentos, nas passagens: EE Início 14:41:01 horas; Fim 15:31:05 horas
(…)
11ª) A decisão que, no entender dos AA, deverá ser proferida, sobre as questões de facto impugnadas:
Ponto 3 - O prédio referido na alínea a) do facto 1 confronta pelo lado sul com um prédio onde a sociedade ré tem instalada e explora comercialmente, uma oficina de reparação de automóveis, com secção de bate-chapas, pintura, mecânica, mudança de óleo, travões, baterias, escapes, ar condicionado e estação de lavagem de automóveis ligeiros de passageiros e, de pesados e/ou mercadorias, tractores e ou máquinas, com alvará de licença de utilização emitido em 23.05.2007.
Ponto 4 - A actividade referida em 3 é exercida pelos réus e por, pelo menos, dois trabalhadores, sendo o horário laboral atribuído pela ANECRA, das 8.30 horas às 18 horas, com intervalo de período de almoço das 12.30 às 14 horas, de Segunda a Sexta-feira e das 8.30 horas às 13.00 horas aos Sábados, sendo a estação de lavagem e limpeza self-service 24 horas.
Ponto 5 - A actividade referida em 3 é, exercida no interior e exterior das instalações, onde ficam aparcados veículos sinistrados e outros, por períodos longos.
Ponto 6 - A actividade referida em 3 produz a emissão de ruídos e barulhos de motores, de fumos, gases, fuligens poluentes e trepidações; bem assim, pelo funcionamento do compressor de ar comprimido, do martelar das ferramentas e do falar das pessoas; do barulho de chapas e, cheiros da secção de pintura, produção de resíduos sólidos e líquidos.
 Ponto 7 - O compressor de ar comprimido e o aspirador para limpeza dos veículos, não têm protecção ou insonorização acústica, encontrando-se localizado numa divisão coberta junto à confinância dos prédios mencionada em 3.
Ponto 10 - A sociedade ré desenvolve também actividade numa secção de pintura, localizada em prédio mais afastado, da qual há emissão de fuligem, cheiros e gases.
Ponto 11- A actividade de estação de lavagem de veículos, pode ser utilizada pelos clientes do self service, ao longo das 24 horas, durante todos os dias.
Ponto 12 - No ano de 2018, o autor reclamou junto do Município ... e da Inspecção Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (IGAMAOT) e, junto do próprio gerente CC, da actividade desenvolvida pela sociedade ré, na sequência das quais o município verificou que, haviam irregularidades e desconformidades com o projecto aprovado, tendo notificado a Ré para adotar de imediato, todas as medidas de insonorização do ruído provocado, para minimizar o mesmo e, para melhoramento do ruído e, para o cumprimento rigoroso do horário atribuído.
Ponto 13 - A sociedade ré, teve alvará concedido em 23/05/2007, para o uso a que se destinam as edificações, oficinas de reparação de automóveis e estação de lavagem de automóveis; as quais, foram detectadas em ações da fiscalização da C.M. ..., onde verificou irregularidades, nomeadamente ruídos, insalubridade e em desconformidade com o projecto aprovado.
Ponto 14 - Em consequência do facto referido em 6, os autores andam deprimidos, sem conseguir descansar ou adormecer normalmente, com a tensão arterial elevada.

Dos factos, tidos como “não provados”, que devem passar para os factos provados:
Al. a) - Os autores e as suas filhas utilizem diariamente o prédio identificado na alínea a) do facto 1;
Al. b) Os réus constituíram a sociedade ré, da qual são únicos sócios e gerentes; Al. c) A estação de lavagem de veículos referida em 3 é utilizada diariamente durante 24 horas do dia ao longo da semana, do mês e do ano;
Al. d) São levados diariamente para as instalações da oficina referida em 3 veículos pesados tractores e máquinas;
Al. e) A actividade desenvolvida na oficina mencionada em 3 produz de forma intensa e continuada ruídos, gases, fumos, fuligens, vibrações e trepidações que se propagam no ar e pelas estruturas, sendo emitidos para os prédios dos autores;
Al. f) Após o período laboral referido em 4, continua a ser desenvolvida actividade na oficina mencionada em 3 e 10;
Al. g) Em consequência da actividade referida em 3 e 10, ficam amontoadas as peças extraídas e/ou substituídas amontoadas, por vários sítios, além de, resíduos derramados no solo;
Al. h) O compressor referido em 6 funciona continuadamente, com todos os portões abertos, instalado, no exterior, da oficina;
Al. i) Na oficina referida em 3 e no exterior da mesma são colocados veículos que ali permanecem, por períodos mais ou menos prolongados, com os motores em funcionamento com altas rotações, para testagem, chegando a atingir elevada intensidade de decibéis;
Al. j) Na execução de tarefas na oficina referida em 3 e 10, tanto no interior como no exterior, são desferidas marteladas sucessivas contra peças metálicas das estruturas, na própria chapa e carroçarias;
Al. l) O ruído referido em 6 é incrementado pelos sistemas de ventilação/exaustão ou, de ar condicionado utilizado com máquinas de pressão, de elevadores, além das originadas pelo compressor, pelo que, o ruído persiste com períodos intercalados, durante todo o dia; 120
Al. m) São audíveis com frequência provindos tanto das instalações como zonas adjacentes da oficina referida em 3, conversas em alta voz de empregados e clientes, com palavreado, por vezes, obsceno expressões como “cabrões”, “filho da puta”, “caralho”, e “vão se foder”, “se não estás bem muda-te”;
Al. n) A actividade referida em 3 e 10 é poluente;
 Al. o) Em consequência dos factos referidos, os autores têm que manter portas, janelas fechadas, para que os gases, os fumos e fuligens emitidos não se introduzam no interior das habitações, exercendo mau cheiro impregnandose nas roupas da cama, do vestuário e, fuligem pelos móveis, pelo chão, telhados, varanda e, terraço;
Al. p) Em consequência da actividade desenvolvida na oficina mencionada em 3 e 10, os autores não podem manter, as portas e/ou janelas abertas, como estender roupa a secar, pois, ficam impregnadas de mau cheiro, de fuligem, como andar normalmente nos logradouros das suas habitações, nem dormir ou descansar, sem ruídos bruscos, inesperados, de fumos, gases, fuligens de atividade industrial poluente, dia e noite;
Al. q) Os autores andam deprimidos, sem conseguir descansar ou adormecer normalmente, com a tensão arterial elevada, em consequência da actividade desenvolvida na oficina referida em 3 e 10.
12ª) Além da procedência do direito de propriedade dos AA, sobre os prédios identificados em 1 a) e b) dos factos tidos por provados, onde têm a sua residência permanente no prédio identificado na alínea a), contíguo ao prédio identificado em b) e, este, contíguo ao prédio onde se encontra instalada e em exploração, uma das oficinas de reparação de veículos automóveis e estação de lavagem e limpeza da Ré, e que foi reabilitada em 2013, com o propósito de ser utilizada pelas filhas, quando se deslocam a casa dos pais e, como espaço de lazer para os próprios AA, filhas e neta.
13ª) O A. é reformado, a A. doméstica, pelo que; passam largos períodos de tempo nos prédios mencionados em 1., no seu dia-a-dia, durante as 24h do dia. 14ª) No prédio a confinar com o prédio identificado em 1 a), a Ré tem instalada e, em exploração uma oficina de reparação de automóveis, onde executa, nomeadamente trabalhos de: bate chapa, pintura, mecânica, mudança de óleos, de travões, de baterias, escapes e estação de lavagem, limpeza interior de veículos automóveis, ligeiro de passageiros, de mercadorias, pesados, tractores e outras máquinas; além de, parque com viaturas sinistradas e outras por períodos prolongados, cuja actividade é exercida, tanto no interior, como no exterior das instalações propriamente ditas, com suposto horário atribuído para a oficina, na Rua ..., a estação de lavagem, limpeza self-service 24 horas.
15ª) Tem uma outra oficina ou secção de pintura, localizada em prédio, cerca de 20 metros daquela.
6ª) As casas de habitação e as residências dos AA e filhas, são anteriores à construção, instalação e funcionamento das oficinas e exploradas pela Ré, de reparação de automóveis, com todas as descritas secções e, estação de lavagem.
17ª) Dessa actividade e exploração comercial, são produzidos e emitidos barulhos, ruídos, gases, fumos, cheiros, fuligem, contendo produtos químicos tóxicos e perigosos para a saúde; além de, vibrações, designadamente, pelo funcionamento dos motores, das ferramentas utilizadas, do falar das pessoas, que se propagam no ar, pelo solo e estruturas, poluindo o ambiente geral, arrastadas pelo ar, em movimento propagam-se nos prédios dos AA. De facto,
18ª) A actividade e exploração em causa, é poluente em efluentes, nocivos à saúde, à tranquilidade e sossego das pessoas, em suma, à qualidade de vida dos AA e dos membros da sua família; por nenhuns filtros ou equipamentos adequados, existirem a minimizá-los.
19ª) Face à multiplicidade e continuidade da exposição a tais fatores, com o movimento de partículas finas e, à intensidade dos ruídos, os AA não conseguem descansar, nem dormir normalmente ou manter as portas e janelas abertas das suas casas para arejar e, nem terem, o estendal de roupa a secar, como as culturas, a água, os bens alimentares, as roupas e vestuário e, demais haveres existentes nas suas casas e logradouros, ficam com fuligem, com cheiros desagradáveis e a conspurcá-los.
Efectivamente,
20ª) Tais emissões contêm produtos tóxicos que afetam as vias respiratórias, a corrente sanguínea, a função cardíaca e o aparelho digestivo, constituindo um perigo e risco continuado face à sua proximidade, com a ação e exploração continuada no tempo e no espaço físico e social, por parte da Ré. Também,
21ª) A emanação de barulhos, ruídos, fumos, gases, fuligem, cheiros nauseabundos derivada da queima de combustíveis fósseis, infiltram-se no solo, na água, nas culturas, nas paredes dos prédios dos AA.
22ª) Numa situação de colisão de direitos, entre direitos de personalidade e direitos económicos empresariais ou comerciais - atentas as circunstâncias do caso em apreço - tem de prevalecer como direitos de personalidade dos AA, sacrificando-se estes, na medida do necessário e imprescindível.
23ª) Os direitos dos AA, encontram-se consagrados nos arts. 24º; 25º; 64º e 66º da CRP; arts. 70º, 1350º, nº 1; 1356º do CC, por aplicação do art. 335º do CC.
24ª) Complementarmente, invoca-se – atenta a factualidade apurada e pugnada – o instituto de abuso de direito, por parte dos RR que, tendo uma zona industrial a meia dúzia de quilómetros, com todas as condições para o efeito, persistem em ampliar e aumentar o aviamento da actividade, como resulta da fiscalização dos serviços da Câmara Municipal ... e do IGAMAOT.
25º) Os AA, por não poderem, jamais suportar a lesão, às suas pessoas e bens, apresentaram sucessivas queixas e reclamações junto da Câmara Municipal ... e, do R. marido, tendo inclusive o A., sido constituído arguido e, submetido a injunções que cumpriu; contudo, tudo contínua em crescendo. De facto,
26ª) Não obstante, as notificações da CM..., para a adoção imediata de todas as medidas de minimização do ruído provocado, pelo estabelecimento, para melhoramento de ruídos, de forma geral, para a salubridade, em desconformidade do projecto aprovado e para o cumprimento rigoroso do horário atribuído, os RR não cumpriram como ficou demonstrado.
27ª) Os AA encontram-se lesados patrimonial e moralmente, na sua qualidade de vida e nos seus bens e, nada fizeram para tal.
28ª) A acção deve ser julgada totalmente procedente, com custas a cargo dos RR.
29ª) Por erro de leitura, análise, interpretação, valoração critica e reflexiva da prova, globalmente conjugada e, a subsunção do direito, na sentença proferida, não é a mais assertiva, nem consentânea, com a mens legis, nem com os princípios gerais do direito constitucional, direito, cível, ambiental e processual cível.
30ª) Mostram-se violados os institutos jurídicos e os comandos atinentes aplicáveis, mormente o disposto nos arts. 20º; 24º; 25º; 64º; 65º, nº 1; 66º, nº 1 e 2; 202º da CRP; arts. 70º; 334º; 335º; 342º; 349º; 351º; 362º; 368º; 388º; 483º; 1.305º; 1.346º do CC; arts. 152º; 154º; 296º; 429º; 467º; 493º; 527º; 596º; 615º todos do CPC.
O recurso deve merecer provimento, revogando-se a decisão posta em crise, tanto quanto à matéria de facto impugnada, como da de mérito; sendo proferido acórdão a julgar a acção procedente, em conformidade com a pretensão regularmente deduzida em Juízo, com custas a cargo dos RR.

Contra alegaram os réus pugnando pela manutenção da decisão, com os seguintes argumentos finais:

1. Contrariamente ao que dizem os Apelantes, a M.ma Juiz a quo fez uma correcta, criteriosa e exaustiva apreciação dos factos e aplicação do direito, não merecendo, por isso, qualquer censura ou reparo.
2. Abstraindo da suscitada questão relativa ao valor atribuído à causa, visam os Autores com o presente recurso:
 — Que o julgamento seja anulado e “admitidos e produzidos os meios de prova referidos, procedendo-se a nova apreciação e decisão, tanto sobre a questão da matéria de facto, como da de mérito”;
— Ou caso assim não se entenda, “a sentença proferida enferma de vício de nulidade, em virtude da fundamentação da decisão da matéria de facto e de direito conter ambiguidade e mesmo contradições, a torná-la parcialmente ininteligível”;
— Sem prejuízo da sua impugnação, “quanto à matéria de facto, dos concretos pontos de facto enunciados sob os n.os 3, 4, 6, 7, 10, 11, 12, 13 e 14 dos factos considerados “provados” e sob as alíneas a), b), c), d), e), f), g), h), i), j), l), m), n), o), p) e q) dos factos tidos como “não provados”, que os AA consideram incorrectamente julgados”.
3. Pretensões que não deverão merecer acolhimento, porquanto a suscitada anulação do julgamento tem somente por base o requerimento dos Autores de 09/10/2023, que foi devida e criteriosamente apreciado pelo Tribunal e sobre a qual recaiu o douto despacho de 09/11/2023, que se mostra devidamente fundamentado.
4. Ademais, atentos os pedidos formulados na petição inicial, não se percebe porque falam agora os mesmos em “ambas as oficinas” e “oficina de pintura”, a qual fica localizada em prédio mais afastado, quando aquele articulado visa expressamente o prédio existente a sul da sua propriedade.
5. O auto de inspecção ao local afigura-se coerente com aquilo que foi percepcionado na diligência, não falando na secção de pintura, nem o tinha que fazer, uma vez que a mesma não está em causa nos presentes autos.
6. Em parte alguma das respectivas alegações, os Autores concretizam onde é que a fundamentação da decisão da matéria de facto e de direito contém ambiguidade ou contradições que a tornam parcialmente ininteligível, de molde a poder levar à pretendida nulidade da sentença.
7. Por outro lado, as conclusões de recurso destinam-se a sintetizar as razões de discórdia relativamente à decisão impugnada, servindo, além do mais, para delimitar as questões a decidir pelo Tribunal ad quem, tal como resulta do disposto no artigo 637.º, n.º 2, do CPC, devendo, por isso, conter proposições sintéticas dos fundamentos de facto e de direito, não servindo para nelas se transcrever quase metade do julgamento, como se constata da inusitada redacção da 10.ª conclusão que, só por si, ocupa mais de 40 páginas!...
8. As proposições longas e confusas não constituem conclusões válidas, não merecendo, por isso, qualquer tipo de acolhimento.
9. O Tribunal deu como provada a factualidade vertida nos pontos 3, 4, 6, 7, 10, 11, 12, 13 e 14 da douta sentença tendo por base uma apreciação crítica e conjugada do depoimento de parte do réu CC, das declarações de parte dos Autores, da inspecção ao local, da documentação junta aos autos e do depoimento de todas as dez testemunhas inquiridas, e não apenas de duas delas.
10. Os Autores pretendem impugnar a matéria que foi dada como provada tão-somente com base naquilo que foi dito por eles e pelas próprias filhas, as quais, não residindo com os pais desde 2002, denotaram ao longo dos respectivos depoimentos um indisfarçável interesse directo no desfecho da lide, dado pretenderem utilizar o prédio em questão quando aí se deslocassem, como espaço de lazer.
11. O depoimento das mesmas, que foi devidamente ponderado pela Julgadora, desacompanhado de outra prova, é manifestamente insuficiente para fundamentar qualquer resposta positiva aos factos que foram dados como não provados.
12. Só uma visão optimista dos Recorrentes, diríamos mesmo quase irrealista, mas sem fundamento, poderia levar a tal convicção, de tão parcos que são esses elementos probatórios que singelamente apresentaram.
13. Sendo que, no seu depoimento, a filha EE (14:41- 15:31), residente em ..., também admitiu que teve acesso aos presentes autos, lendo a respectiva documentação; costuma visitar os pais um fim-de-semana por mês e, fora disso, sempre que consegue passar uma semana com eles, normalmente nas férias escolares; por duas vezes, chegou a acordar de madrugada com o barulho das pessoas na zona das lavagens; não sabe se o equipamento da lavandaria está em condições de ser utilizado; não sabe se a lavandaria é muito ou pouco utilizada; quando viu os salpicos de água a passar para a propriedade do pai, o muro ainda não tinha a chapa afixada em cima;
14. E a filha FF (15:32-16:07), para além da parte agora transcrita pelos Autores, referiu ainda que, apesar de viver em ..., frequenta com bastante regularidade a casa dos pais, vai lá muitas vezes porque trabalha em regime de teletrabalho, passando lá semanas, dependendo do período do ano e da disponibilidade que possa ter; a secção que está mais próxima da casa dos avós é onde se fazem os trabalhos de mecânica auto e bate-chapas; não tem percepcionado a oficina a trabalhar à noite; viu a lavagem a ser utilizada no fim-desemana a seguir ao primeiro de Maio, às sete e tal da noite; imagina que é possível utilizar a lavagem durante a noite e a madrugada, mas nunca assistiu; não tem conhecimento se a lavagem funciona ao sábado de manhã; quando estão a fazer testagens, o cheiro dos escapes não chega à casa dos pais, mas só à área aberta do logradouro; o barulho do compressor não é estridente, não é contínuo todo o dia, o compressor liga e desliga e não trabalha à noite; os pais já não têm o estendal no muro; a história da mortandade dos peixes só aconteceu uma vez; não sabe se o ferro-velho está muito tempo encostado ao muro; sabe que constantemente têm ali coisas, mas não sabe se são sempre as mesmas; não tem reparado no aspirador a trabalhar; não sabe se os vizinhos também se queixam da tinta da secção de pintura.
15. Daí (mas não só) a acertada conclusão da M.ma Juiz a quo:
“A matéria relacionada com as consequências inerentes ao exercício da actividade dos réus, descrita no facto 6, e correspondente factualidade não provada enunciada nas alíneas e), j), l) e n) resulta, por um lado dos depoimentos de todas as testemunhas que se conjugaram com as regras da experiência comum atinentes ao ruído usual que uma actividade de reparação e manutenção de automóveis produz. O que não resultou, de forma alguma do depoimento das testemunhas e da demais prova, designadamente da missiva da 08.08.20218 dirigida pelo Município ... ao autor, é que essa actividade produza um ruído fora dos parâmetros normais ou ainda que se caracterize pela emissão de produtos poluentes nos termos alegados.
Sublinhe-se que as testemunhas indicadas pelos autores, suas filhas, apenas aludiram a situações pontuais que não permitem pôr em causa as conclusões daquela missiva, não havendo qualquer prova consistente e segura de que a qualidade ambiental, nas suas diversas vertentes, é posta em causa pela actividade desenvolvida na oficina, ou que da mesma resulte qualquer poluição sonora ou atmosférica susceptível de causar excepcional transtorno na vida dos autores” — sublinhado nosso.
16. Não resultou demonstrado — e incumbia aos Autores fazer prova dos factos de que emerge o seu direito — que a actividade desenvolvida pelos Réus produza, de forma intensa e continuada, ruídos, gases, fumos, fuligens, vibrações e trepidações que se propagam no ar e pelas estruturas, sendo emitidos para os prédios dos autores; que tal actividade seja desenvolvida fora do horário de trabalho; que, em consequência da mesma, as peças extraídas e/ou substituídas fiquem amontoadas por vários sítios ou resíduos derramados no solo.
17. Também não se provou que o compressor funcione continuadamente ou que, quando os veículos são reparados no exterior da oficina, aí permaneçam com os motores em funcionamento com altas rotações, para testagem, chegando a atingir elevada intensidade de decibéis; que sejam desferidas marteladas sucessivas contra peças metálicas das estruturas, na própria chapa e carroçarias.
18. No que à fundamentação de facto diz respeito, reitera-se o seguinte: o Tribunal debruçou-se atentamente sobre a matéria dos autos; foi minucioso, exaustivo e insistente na recolha de prova, chegando, inclusive, a deslocar-se ao local, sendo, por isso, de desconsiderar totalmente, por infundado, o, aliás, douto recurso agora apresentado pelos Autores.
19. A sentença recorrida não enferma de qualquer vício.
20. Decidindo da forma como o fez, bem andou pois a Julgadora.
21. Tudo o demais que se poderia dizer consta já, com brilho e clareza, da douta decisão recorrida, a qual deve manter-se e que só honra quem a subscreve.

4.
Sendo que, por via de regra: artºs  635º nº4 e 639º do CPC - de que o presente caso não constitui exceção - o teor das conclusões define o objeto do recurso, as questões essenciais decidendas  são as seguintes:

1ª -  Valor da  causa e responsabilidade por custas.
2ª-  Anulação da sentença por indeferimento de produção de meios de prova.
3ª - Nulidade da sentença – artº 615º nº1 al. c)  do CPC.
4ª - Alteração da decisão sobre a matéria de facto.
5ª - Procedência da ação.

5.
Apreciando.
5.1.
Primeira questão.
Dizem os autores  que «não tendo sido admitida a reconvenção deduzida pelos RR; a qual, atribuíram o valor de € 4.111,92; o valor a fixar à causa, deveria ser o indicado pelos AA de € 81.972,27 e, não de € 86.084,19 (arts. 296º e 306º do CPC).
Vejamos.
Nos termos do artº 297º nº2 do CPC:
«2 - Cumulando-se na mesma ação vários pedidos, o valor é a quantia correspondente à soma dos valores de todos eles
E nos termos do artº 299.º:
«Momento a que se atende para a determinação do valor
1 - Na determinação do valor da causa, deve atender-se ao momento em que a ação é proposta, exceto quando haja reconvenção ou intervenção principal.
2 - O valor do pedido formulado pelo réu ou pelo interveniente só é somado ao valor do pedido formulado pelo autor quando os pedidos sejam distintos, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 530.º.
3 - O aumento referido no número anterior só produz efeitos quanto aos atos e termos posteriores à reconvenção ou intervenção.
No caso vertente o pedido reconvencional formulado pelos réus era diferente dos pedidos pelos autores.
Pelo que, se a reconvenção fosse admitida, o valor dela teria de ser somado ao  valor que os autores atribuíram à ação – artº 297º nº2 do CPC.
Só que foi proferida decisão de não admissão da reconvenção.
Esta não admissão acarretava duas consequências.
Primeira: os réus deveriam ter sido condenados nas custas pelo valor do pedido reconvencional.
Segunda: este valor já não se poderia somar  ao dos pedidos dos autores.
Pois que, como dimana do nº3 do artº 299º, o valor da reconvenção apenas releva e produz efeitos para os atos posteriores à mesma, vg. para fixar o valor da ação no despacho saneador.
Ora se o pedido reconvencional, por não ter sido admitido, deixou de  existir e relevar no processo, sobre o mesmo já não podendo ser emitida qualquer decisão,   o seu valor, lógica e intuitivamente, não poderia ter sido considerado no despacho saneador para aumentar o valor da ação.
Tendo-o sido, menos bem andou a Decisora.
Esta decisão, não sendo  imediata e autonomamente recorrível, poderia sê-lo, como o foi, com o recurso interposto da decisão final – artº 644º nº3 do CPC.
Destarte, e na procedência desta questão, fixa-se à causa o valor do pedido inicial do autor, ou seja  € 81.972,27

5.2.
Segunda questão.
Os recorrentes pretendem a anulação da sentença por indeferimento de produção de meios de prova.
Alegam que impetraram a produção de prova pericial e documental e que tal lhes foi  negado por decisão de 2023.
Que tal decisão é ilegal, pois que os meios probatórios pretendidos eram necessários para convencer dos factos por si alegados fundamentadores dos pedidos formulados.
Mas esta pretensão não pode ser admitida/concedida, desde logo por motivos processuais formais.
A decisão foi proferida em 09.11.2023 e subsequentemente notificada aos autores.
Ora, este é um dos casos de recurso imediato e autónomo previstos no nº 2 do artº 644º do CPC.
O qual estatui:
«2 - Cabe ainda recurso de apelação das seguintes decisões do tribunal de 1.ª instância:
d) Do despacho de admissão ou rejeição de algum articulado ou meio de prova
Assim, mostrando-se eles com tal decisão inconformados, dela deveriam logo ter recorrido, no prazo de quinze dias, a partir da data da sua notificação – artº 638º nº1 do CPC.
Não tendo os aurores recorrido no aludido prazo, a decisão transitou em julgado firmando-se, tornando-se assente, definitiva e imodificável por via de recurso ordinário.
 E, assim, mostrando-se o recurso da mesma ora interposto patentemente extemporâneo e inatendível.
E o mesmo se diga relativamente ao que deveria constar no auto de inspeção ao  local.
Efetivamente, prescreve o artº Artigo 491.º do CPC:
«Intervenção das partes
As partes são notificadas do dia e hora da inspeção e podem, por si ou por seus advogados, prestar ao tribunal os esclarecimentos de que ele carecer, assim como chamar a sua atenção para os factos que reputem de interesse para a resolução da causa.»
Assim sendo, deveriam os autores, logo aquando da elaboração do auto, ou depois da sua notificação, alertar para os factos ou elementos  que, em sua opinião, dele deveriam, ou não, constar, em função do jaez da inspeção e das circunstâncias que a rodearam.
Princípios de autorresponsabilidade das partes e de concentração dos atos processuais,  com vista a uma tramitação mais célere, escorreita, linear e leal possível, estão na génese desta exigência e entendimento.
Pelo que, também aqui, a sua alusão à menos boa ou fidedigna elaboração do auto de inspeção se revela serôdia.

5.3
Terceira questão.
5.3.1.
Clamam os recorrentes que: «A sentença proferida enferma de vício de nulidade, em virtude da fundamentação da decisão da matéria de facto e, de direito, conter ambiguidade e, mesmo contradições a torná-la, parcialmente ininteligível. »
Liminarmente urge ter presente que há que não  confundir as nulidades do artº 615º do CPC,  meros vícios formais da sentença enquanto instrumento jurídico comunicante primordial do processo, que, assim, se pretende fundamentada, lógica e percetível, com a menos adequada subsunção do factos e  exegese jurídica das normas invocadas operadas pelo julgador.
Neste caso, estamos não perante aquele vício formal, mas antes com um erro de direito, vício substantivo, que não acarreta a sua nulidade, mas antes a sua ilegalidade.
Estatui o artº 615º nº1 al. c) do CPC:
«É nula a sentença quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível»
A última reforma processual alargou os pressupostos que possibilitam a  emergência deste vício, no âmbito desta alínea, já que o anterior artº 668º nº1 al. c) era mais restritiva, e apenas admitia a nulidade quando os fundamentos estivessem em oposição com a decisão.
Em certa medida e mutatis mutandis, parece que se equiparou este fundamento da nulidade da sentença com a nulidade de todo o processo decorrente da ineptidão da petição inicial  pelos motivos previstos no artº 186º nº2 als. a) e b) do CPC.
Assim, a oposição dos fundamentos com a decisão equipara-se à contradição entre o pedido e a causa de pedir – al. b) do nº2 do artº 186º.
E a ambiguidade ou obscuridade que acarreta a ininteligibilidade pode conexionar-se com a falta ou ininteligibilidade do pedido ou da causa de pedir – al. a) do artº 186º.
Pelo que, e com as devidas adaptações e cautelas, os argumentos que a doutrina e jurisprudência têm por  válidos para a pi, podem também ser aportados para a sentença.
Efetivamente e como já ensinava  Alberto dos Reis, Comentário, 3º, 381.:
«a causa de pedir deve estar para com o pedido na mesma relação lógica, em que, na sentença, os fundamentos hão-de estar para com a decisão. O pedido tem, como a decisão, o significado de uma conclusão…a causa de pedir é a base, o ponto de apoio, uma das premissas em que assenta a conclusão…entre a causa de pedir e o pedido deve existir o mesmo nexo lógico que entre as premissas de um silogismo e a sua conclusão».
5.3.2.
Nesta conformidade e no atinente à oposição, tout court, é pacífico que a oposição dos fundamentos, fáticos ou jurídicos, com a decisão, reconduz-se a um vício traduzido numa incompatibilidade lógica no raciocínio do julgador, em que as premissas de facto e de direito apontam num sentido e a decisão segue caminho oposto, ou, pelo menos, direção diferente.
A lei exige uma efetiva e real contradição e não apenas uma simples desarmonia.
Na verdade uma coisa é a oposição frontal entre duas ideias, a incompatibilidade lógica absoluta entre a premissa e determinada conclusão; outra, a mera não coincidência entre dois juízos, o simples desencontro entre a premissa de que se parte e a solução a que se chega.
Numa outra perspetiva ou simples nuance pode dizer-se que a contradição relevante entre os fundamentos e a decisão (tal como entre o pedido e a causa de pedir) é apenas a que se revelar intrínseca, substancial e de todo insanável, que acarrete a impossibilidade de uma decisão unitária e coerentecfr. Acs. do STJ de 06.04.1983, BMJ, 326º, 400 e de 14.03.1990. AJ, 2º,/90,p.15.
Distinguindo-se esta situação das situações em que tal disparidade advém de mero erro material.
 Pois, neste caso, a oposição não é substancial mas apenas aparente, dando apenas direito à retificação.
 Enquanto que no caso invocado e que ora nos ocupa a contradição, para existir, tem de ser autentica e real - pois que o juiz escreveu o que queria escrever -, acarretando um vício de conteúdo da sentença que implica a sua nulidade  – cfr. Alberto dos Reis, Anotado, 1981, 5º, 141, Castro Mendes, Direito Processual Civil, ed. AAFDL, 1978, 3º, 302 e Abílio Neto, Breves Notas ao CPC, 2005, 195.
Na verdade:
«A oposição entre os fundamentos e a decisão corresponde a um vício lógico do acórdão — se, na fundamentação da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão, e em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente...
 Enquanto vício lógico, a oposição entre os fundamentos e a decisão distingue-se da errada interpretação de uma determinada disposição legal, síndicável em sede de recurso.» -  Ac. STJ de 20.05.2021, p. 69/11.2TBPPS.C1.S1.
Ou:
« A nulidade da sentença prevista no art. 615.º, n.º 1, al. c), do CPC, ocorre quando os fundamentos invocados pelo juiz deveriam logicamente conduzir ao resultado oposto ao que vier a ser expresso.» - Ac. STJ de 07.05.2024, p. 311/18.9T8PVZ.P1.S1.
5.3.3.
No atinente à ora consagrada ambiguidade ou obscuridade importa ter presente que estas deficiências apenas relevam para determinar a nulidade da sentença, se acarretarem a sua ininteligibilidade, hoc sensu, ie. a total impossibilidade de, através de uma normal leitura e análise, se poder captar e inteligir o seu conteúdo substancial, sentido e alcance.
Efetivamente:
 «A ambiguidade ou a obscuridade prevista na alínea c) do n.º 1 do art. 615.º só releva quando torne a parte decisória ininteligível e só torna a parte decisória ininteligível “quando um declaratário normal, nos termos dos arts. 236.º, n.º 1, e 238.º, n.º 1, do Código Civil, não possa retirar da decisão um sentido unívoco, mesmo depois de recorrer à fundamentação para a interpretar”.» - Ac. STJ de 20.05.2021, p. 69/11.2TBPPS.C1.S1.
Ou:
« Para efeitos da nulidade por ininteligibilidade da decisão, prevista no art. 615.º, n.º 1, al. e), 2.ª parte do CPC, ambígua será decisão à qual seja razoavelmente possível atribuírem-se, pelo menos, dois sentidos díspares sem que seja possível identificar o prevalente e, obscura será a decisão cujo sentido seja impossível de ser apreendido por um destinatário medianamente esclarecido.» -  Ac. STJ de 07.05.2024, p. 311/18.9T8PVZ.P1.S1.
Pelo que:
«A insatisfação do vencido não dá lugar, enquanto fundamento legal, à nulidade do acórdão oportunamente proferido, sendo certo que as diversas alíneas do nº 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil apenas integram vícios de natureza estritamente formal da decisão, não tendo a ver com o mérito do decidido...
…não se verifica a previsão das alíneas b) e c) do nº 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil quando as disposições legais avocadas para a decisão deste caso concreto foram interpretadas em sentido oposto ao visado pelo recorrido, o que não quer dizer que qualquer das teses em confronto não sejam em si mesmo compreensíveis, tudo dependendo das diferentes leituras das normas em causa e dos princípios gerais que enformam o sistema jurídico aplicável (CIRE).
Aceitar inteligentemente a discussão jurídica que se suscitou nos autos implica compreender, com abertura e tolerância, os argumentos em sentido contrário, sem que faça o menor sentido a rotulação como “ininteligíveis” dos fundamentos da posição adversa apenas porque esta não é afinal coincidente com os argumentos e interesses pessoais de quem está convencido de defender e adoptar, com toda a superioridade intelectual de que se julga portador, a (única) leitura inteligente das normas legais em apreço.» - Ac. do STJ de 17.09.2024, p. 6215/22.3T8VNF-G.G1.S1.
5.3.4.
No caso vertente assim é.
A julgadora, depois de citar legislação e jurisprudência atinentes à  defesa dos direitos fundamentais do cidadão, como sejam, p. ex. o direito  à saúde e ao bem estar, entendeu que:
«…não resultou demonstrado …que a actividade desenvolvida pelos réus produza, de forma intensa e continuada, ruídos, gases, fumos, fuligens, vibrações e trepidações que se propagam no ar e pelas estruturas, sendo emitidos para os prédios dos autores, que tal actividade seja desenvolvida, fora do horário laboral, que em consequência da mesma fiquem amontoadas as peças extraídas e/ou substituídas amontoadas, por vários sítios, além de, resíduos derramados no solo.
…que o compressor funcione continuadamente ou que, quando os veículos são reparados no exterior, aí permaneçam com os motores em funcionamento com altas rotações, para testagem, chegando a atingir elevada intensidade de decibéis, ou que sejam desferidas marteladas sucessivas contra peças metálicas das estruturas, na própria chapa e carroçarias.
…que o ruído da oficina seja incrementado pelos sistemas de ventilação/exaustão ou, de ar condicionado utilizado com máquinas de pressão, de elevadores, além das originadas pelo compressor, pelo que, o ruído persiste com períodos intercalados, durante todo o dia.
…que, em consequência da actividade desenvolvida na oficina tenham que manter portas, janelas fechadas, para que os gases, os fumos e fuligens emitidos não se introduzam no interior das habitações, exercendo mau cheiro impregnando-se nas roupas da cama, do vestuário e, fuligem pelos móveis, pelo chão, telhados, varanda e, terraço, que não possam estender roupa a secar, ou andar normalmente nos logradouros das suas habitações, nem dormir ou descansar, sem ruídos bruscos, inesperados, de fumos, gases, fuligens de actividade industrial poluente, dia e noite.
Desta forma, apesar de ter ficado provado que os autores andam incomodados com a actividade desenvolvida na oficina, esse incómodo não deve ceder perante o legítimo exercício da actividade da ré, pois que do mesmo não resultou provada uma violação  da saúde e qualidade de vida dos autores, tanto mais que o prédio onde habitam permanentemente não é o prédio contíguo à oficina, tendo o prédio contíguo sido remodelado por aqueles em 2013 (portanto, em data posterior ao  início da actividade pelos réus), para utilização das filhas dos autores quando se deslocam a casa dos pais e como espaço de lazer.
Significa pois, que ponderando os incómodos decorrentes para os autores da actividade desenvolvida pelos réus com o direito à iniciativa empresarial destes, mormente para proverem ao seu sustento, deve prevalecer in casu este último, com o que improcedem os pedidos atinentes a tal matéria. ».
Ou seja, perante os factos apurados e a interpretação que deles opera, a Julgadora entendeu que eles não são os bastantes para fundamentar os pedidos dos autores.
Vê-se assim que este discurso argumentativo e a respetiva decisão, se encontram numa clara relação lógica, de congruência e adequada causa/efeito (ou, melhor, de não causa e não efeito).
Tal discurso e decisão apresentam-se claramente expostos e são perfeitamente compreensíveis e intuíveis por um normal declaratário.
Tanto assim que os recorrentes apreenderam o seu significado e contra eles se insurgem.
Resulta, pois, que a irresignação dos recorrentes  se prende com o entendimento de  que os factos apurados  impunham decisão diversa.
Note-se que eles não apenas se referem aos já  apurados como aos que pretendem ver dados como provados no recurso.
Pois que na  sentença não se deram como provados  «atividade intensa e continuada na oficina» e a «emissão de ruídos, gases, fumos fuligens e trepidações que se propaguem no ar» e eles, no recurso –fls. 10 e 11 -  entendem que sim.
Ou seja, apelidam a sentença de ilógica e ininteligível com base em factos que não foram dados como provados, e cuja prova pretendem, sem saber se a conseguirão.
Esta sim, é atuação ilógica e quase ininteligível.
Enfim, em consonância com o supra exposto em tese, este é mais um caso em que a questão não é de nulidade, mas de ilegalidade.
Pelo que aquele alegado vício formal inequivocamente inexiste.

5.4.
Quarta questão.
5.4.1.
No nosso ordenamento vigora o princípio da liberdade de julgamento ou da livre convicção segundo o qual o tribunal aprecia livremente as provas, sem qualquer grau de hierarquização, e fixa a matéria de facto em sintonia com a sua prudente convicção firmada acerca de cada facto controvertido -artº607 nº5  do CPC.
Perante o estatuído neste artigo, exige-se ao juiz que julgue conforme a convicção que a prova determinou e cujo carácter racional se deve exprimir na correspondente motivação – cfr. J. Rodrigues Bastos, Notas ao CPC, 3º, 3ªed. 2001, p.175.
O princípio da prova livre significa a prova apreciada em inteira liberdade pelo julgador, sem obediência a uma tabela ditada externamente;  mas apreciada em conformidade racional com tal prova e com as regras da lógica e as máximas da experiência – cfr. Alberto dos Reis, Anotado, 3ª ed.  III, p.245.
Acresce que há que ter em conta que as decisões judiciais não pretendem constituir verdades ou certezas absolutas.
Pois que às mesmas não subjazem dogmas e, por via de regra, provas de todo irrefutáveis, não se regendo a produção e análise da prova por critérios e meras operações lógico-matemáticas.
Assim: «a verdade judicial é uma verdade relativa, não só porque resultante de um juízo em si mesmo passível de erro, mas também porque assenta em prova, como a testemunhal, cuja falibilidade constitui um conhecido dado psico-sociológico» - Cfr. Ac. do STJ de 11.12.2003, p.03B3893 dgsi.pt.
Acresce que a convicção do juiz é uma convicção pessoal, sendo construída, dialeticamente, para além dos dados objetivos fornecidos pelos documentos e outras provas constituídas, nela desempenhando uma função de relevo não só a atividade puramente cognitiva mas também elementos racionalmente não explicáveis e mesmo puramente emocionais – AC. do STJ de 20.09.2004 dgsi.pt.
Nesta conformidade - e como em qualquer atividade humana - existirá sempre na atuação jurisdicional uma margem de incerteza, aleatoriedade e erro.
Mas tal é inelutável. O que importa é que se minimize o mais possível tal margem de erro.
O que passa, como se viu, pela integração da decisão de facto dentro de parâmetros admissíveis em face da prova produzida, objetiva e sindicável, e pela interpretação e apreciação desta prova de acordo com as regras da lógica e da experiência comum.
E tendo-se presente que a imediação e a oralidade dão um crédito de fiabilidade acrescido, já que por virtude delas entram, na formação da convicção do julgador, necessariamente, elementos que em caso algum podem ser importados para a gravação da prova, e fatores que não são racionalmente demonstráveis.
Sendo que estes princípios permitem ainda uma apreciação ética dos depoimentos - saber se quem depõe tem a consciência de que está a dizer a verdade– a qual não está ao alcance do tribunal ad quem - Acs. do STJ de 19.05.2005  e de 23-04-2009  dgsi.pt., p.09P0114.
Nesta conformidade  constitui jurisprudência sedimentada, que:
«Quando o pedido de reapreciação da prova se baseie em elementos de características subjectivas, a respectiva sindicação tem de ser exercida com o máximo cuidado e só deve o tribunal de 2.ª instância alterar os factos incorporados em registos fonográficos quando efectivamente se convença, com base em elementos lógicos ou objectivos e com uma margem de segurança muito elevada, que houve errada decisão na 1.ª instância, por ser ilógica a resposta dada em face dos depoimentos prestados ou por ser formal ou materialmente impossível, por não ter qualquer suporte para ela. – Ac. do STJ de.20.05.2010,, p. 73/2002.S1.  in dgsi.pt pt; e, ainda, Ac. STJ de 02-02-2022 - Revista n.º 1786/17.9T8PVZ.P1.S1.
5.4.2.
Por outro lado, e como constituem doutrina e jurisprudência pacíficas, o recorrente não pode limitar-se a invocar mais ou menos abstrata e genericamente, a prova que aduz em abono da alteração dos factos.
 A lei exige que os meios probatórios invocados imponham decisão (não basta que sugiram) diversa da recorrida.
Ora tal imposição não pode advir, em termos mais ou menos apriorísticos, da sua, subjetiva, convicção sobre a prova.
Porque, afinal, quem  tem o poder/dever de apreciar/julgar é o juiz.
Por conseguinte, para obter ganho de causa neste particular, deve o recorrente efetivar uma análise concreta, discriminada – por reporte de cada elemento probatório a cada facto probando - objetiva, crítica, logica e racional, do acervo probatório produzido, de sorte a convencer o tribunal ad quem da bondade da sua pretensão.
 A qual, como é outrossim comummente aceite, apenas pode proceder se se concluir que o julgador apreciou o acervo probatório  com extrapolação manifesta dos cânones e das regras hermenêuticas, e para além da margem de álea em direito probatório permitida e que lhe é concedida.
E só quando se concluir que  a  natureza e a força da  prova produzida é de tal ordem e magnitude que inequivocamente contraria ou infirma tal convicção,  se podem censurar as respostas dadas.– cfr. neste sentido, os Acs. da RC de 29-02-2012, p. nº1324/09.7TBMGR.C1, de 10-02-2015, p. 2466/11.4TBFIG.C1, de 03-03-2015, p. 1381/12.9TBGRD.C1 e de 17.05.2016, p. 339/13.1TBSRT.C1; e do STJ de 15.09.2011, p. 1079/07.0TVPRT.P1.S1., todos  in dgsi.pt;
5.4.3.
Finalmente urge ter presente que, como dimana do preâmbulo do Decreto-Lei nº 39/95 de 15.02 (…), «a garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto, nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida em audiência – visando apenas a detecção e correcção de pontuais, concretos e seguramente excepcionais erros de julgamento, incidindo sobre pontos determinados da matéria de facto, que o recorrente sempre terá o ónus de apontar claramente e fundamentar na sua minuta de recurso.
Não poderá, deste modo, em nenhuma circunstância, admitir-se como sendo lícito ao recorrente que este se limitasse a atacar, de forma genérica e global, a decisão de facto, pedindo, pura e simplesmente, a reapreciação de toda a prova produzida em 1ª instância, manifestando genérica discordância com o decidido.».
Dimana daqui que a Relação tem autonomia decisória, competindo-lhe formar e formular a sua própria convicção.
Mas tal não implica um novo e global  julgamento, quer quanto à matéria factual decidida, quer quanto aos meios probatórios produzidos.
Efetivamente:
«…importa ter presente que, no domínio do nosso regime recursório cível, o meio impugnatório para um tribunal superior não visa propriamente um novo julgamento global ou latitudinário da causa, mas apenas uma reapreciação do julgamento proferido pelo tribunal a quo com vista a corrigir eventuais erros da decisão recorrida. Significa isto que a finalidade do recurso não é proferir um novo julgamento da ação, mas julgar a própria decisão recorrida.» - Acs. do STJ de  09.07.2015, p. 405/09.1TMCBR.C1.S1.Ac.; de  01.10.2015, p. 6626/09.0TVLSB.L1.S1.;  e de 17.03.2016, p. 124/12.1TBMTJ.L1.S1.
Isto porque:
«…a lei, cooptando o recorrente para a colaboração com o tribunal e para a autorresponsabilização, visa agilizar a intervenção da Relação na reapreciação (que é pontual, no sentido de circunscrita a certos factos e a certas provas) da matéria de facto…» - Ac. do STJ de 18.06.2019, p. 152/18.3T8GRD.C1.S1.
Pois que:
«o direito de acesso aos tribunais não impõe ao legislador ordinário que garanta aos interessados o acesso ao recurso de forma ilimitada, sendo por isso, conforme à Constituição da República Portuguesa a imposição de ónus para quem impugna a matéria de facto dada como provada pela 1ª instância”» - Ac. do STJ de  19.12.2018, p. 2364/11.1TBVCD.P2.S2.
(sublinhado nosso)
Na verdade, a aceitação de um, novo e global,  julgamento constituiria até um desmerecimento e o lançamento de um labéu/suspeição sobre a competência e/ou idoneidade do juiz da 1ª instância, pois que assim ele se consideraria inepto para bem apreciar toda a prova produzida, e, consequentemente, para bem fixar todos os factos relevantes.
5.4.4.
O caso decidendo.
5.4.4.1.
Pretendem os recorrentes a alteração dos seguintes factos:
«os nºs: 3, 4, 6, 7, 10, 11, 12, 13 e 14 dos factos considerados “provados” e, sob as alíneas: a); b); c); d); e); f); g); h); i); j); l); m); n); o); p) e q) dos factos tidos como “não provados” que, os AA consideram incorrectamente julgados. »
Verifica-se assim que os aurores pretendem, relativamente à factualidade relevante, uma alteração quase total da mesma, o que, tendencialmente e como se viu, lhe estaria vedado, pois que, bem vistas as coisas, imputam à julgadora um juízo de censura quasi global, e assim, inadmissivelmente desconsiderante da sua atuação.
Porém, e até porque relativamente a alguns pontos de facto – os 7 e 10 dos provados -, os recorrentes a eles não  se reportam desenvolvidamente nem no corpo alegatório, nem nas conclusões, o caso queda ainda no limite do admissível, pelo que se apreciará.
Têm tais factos o seguinte teor:
3- O prédio referido na alínea a) do facto 1 confronta pelo lado sul com um prédio onde a sociedade ré tem instalada uma oficina de reparação de automóveis e estação de lavagem de automóveis, com alvará de licença de utilização emitido em 23.05.2007.
Resposta pretendida:
O prédio referido na alínea a) do facto 1 confronta pelo lado sul com um prédio onde a sociedade ré tem instalada e explora comercialmente, uma oficina de reparação de automóveis, com secção de bate-chapas, pintura, mecânica, mudança de óleo, travões, baterias, escapes, ar condicionado e estação de lavagem de automóveis ligeiros de passageiros e, de pesados e/ou mercadorias, tractores e ou máquinas, com alvará de licença de utilização emitido em 23.05.2007.

4- A actividade referida em 3 é exercida pelos réus e por, pelo menos, dois trabalhadores, com um horário laboral das 8.30 horas às 18 horas, com intervalo de período de almoço das 12.30 às 14 horas, de Segunda a Sexta Feira e das 8.30 horas às 13.00 horas aos Sábados.
 Resposta pretendida:
A actividade referida em 3 é exercida pelos réus e por, pelo menos, dois trabalhadores, sendo o horário laboral atribuído pela ANECRA, das 8.30 horas às 18 horas, com intervalo de período de almoço das 12.30 às 14 horas, de Segunda a Sexta-feira e das 8.30 horas às 13.00 horas aos Sábados, sendo a estação de lavagem e limpeza self-service 24 horas.

6- A actividade referida em 3 produz barulhos de motores, do funcionamento do compressor de ar comprimido, do martelar das ferramentas e do falar das pessoas.
Resposta pretendida:
A actividade referida em 3 produz a emissão de ruídos e barulhos de motores, de fumos, gases, fuligens poluentes e trepidações; bem assim, pelo funcionamento do compressor de ar comprimido, do martelar das ferramentas e do falar das pessoas; do barulho de chapas e, cheiros da secção de pintura, produção de resíduos sólidos e líquidos.

11- A actividade de lavagem de veículos é esporadicamente utilizada pela ré.
Resposta pretendida:
A actividade de estação de lavagem de veículos, pode ser utilizada pelos clientes do self service, ao longo das 24 horas, durante todos os dias.

12- No ano de 2018, o autor reclamou junto do Município ... e da Inspecção Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (IGAMAOT), da actividade desenvolvida pela sociedade ré, na sequência das quais o município verificou que o ruído se inseria na actividade normal do estabelecimento particularmente quando a mesma era desenvolvida no exterior ou quando a oficina tinha as portas abertas.
Resposta pretendida:
No ano de 2018, o autor reclamou junto do Município ... e da Inspecção Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (IGAMAOT) e, junto do próprio gerente CC, da actividade desenvolvida pela sociedade ré, na sequência das quais o município verificou que, haviam irregularidades e desconformidades com o projecto aprovado, tendo notificado a Ré para adotar de imediato, todas as medidas de insonorização do ruído provocado, para minimizar o mesmo e, para melhoramento do ruído e, para o cumprimento rigoroso do horário atribuído.

13- A sociedade ré é regularmente acompanhada e fiscalizada pelas entidades competentes, públicas e privadas, cumprindo com as suas obrigações referentes a sucata e resíduos, nomeadamente quanto à sua separação, acondicionamento e entrega nos locais apropriados, sendo detentora do “Certificado de Responsabilidade Ambiental 2023”, emitido pela “B..., Lda”, que lhe presta serviços na área ambiental.
Resposta pretendida:
A sociedade ré, teve alvará concedido em 23/05/2007, para o uso a que se destinam as edificações, oficinas de reparação de automóveis e estação de lavagem de automóveis; as quais, foram detectadas em ações da fiscalização da C.M. ..., onde verificou irregularidades, nomeadamente ruídos, insalubridade e em desconformidade com o projecto aprovado.

14- Em consequência do facto referido em 6, os autores andam incomodados com a actividade desenvolvida na oficina referida em 3.
Resposta pretendida:
Em consequência do facto referido em 6, os autores andam deprimidos, sem conseguir descansar ou adormecer normalmente, com a tensão arterial elevada.

a) Os autores e as suas filhas utilizem diariamente o prédio identificado na alínea a) do facto 1;
b) Os réus constituíram a sociedade ré, da qual são únicos sócios e gerentes;
c) A estação de lavagem de veículos referida em 3 é utilizada diariamente durante 24 horas do dia ao longo da semana, do mês e do ano;
d) São levados diariamente para as instalações da oficina referida em 3 veículos pesados tractores e máquinas;
e) A actividade desenvolvida na oficina mencionada em 3 produz de forma intensa e continuada ruídos, gases, fumos, fuligens, vibrações e trepidações que se propagam no ar e pelas estruturas, sendo emitidos para os prédios dos autores;
f) Após o período laboral referido em 4, continua a ser desenvolvida actividade na oficina mencionada em 3;
g) Em consequência da actividade referida em 3 ficam amontoadas as peças extraídas e/ou substituídas amontoadas, por vários sítios, além de, resíduos derramados no solo;
h) O compressor referido em 6 funciona continuadamente, com todos os portões abertos, instalado, no exterior, da oficina;
i) Na oficina referida em 3 e no exterior da mesma são colocados veículos que ali permanecem, por períodos mais ou menos prolongados, com os motores em funcionamento com altas rotações, para testagem, chegando a atingir elevada intensidade de decibéis;
j) Na execução de tarefas na oficina referida em 3, tanto no interior como no exterior, são desferidas marteladas sucessivas contra peças metálicas das estruturas, na própria chapa e carroçarias;
l) O ruído referido em 6 é incrementado pelos sistemas de ventilação/exaustão ou, de ar condicionado utilizado com máquinas de pressão, de elevadores, além das originadas pelo compressor, pelo que, o ruído persiste com períodos intercalados, durante todo o dia;
m) São audíveis com frequência provindos tanto das instalações como zonas adjacentes da oficina referida em 3, conversas em alta voz de empregados e clientes, com palavreado, por vezes, obsceno expressões como “cabrões”, “filho da puta”, “caralho”, e “vão se foder”, “se não estás bem muda-te”;
n) A actividade referida em  (3) e 10 é poluente;
o) Em consequência do facto referido em 6 e do facto referido em e), os autores têm que manter portas, janelas fechadas, para que os gases, os fumos e fuligens emitidos não se introduzam no interior das habitações, exercendo mau cheiro impregnando-se nas roupas da cama, do vestuário e, fuligem pelos móveis, pelo chão, telhados, varanda e, terraço;
p) Em consequência da actividade desenvolvida na oficina mencionada em 3, os autores não podem manter, as portas e/ou janelas abertas, como estender roupa a secar, pois, ficam impregnadas de mau cheiro, de fuligem, como andar normalmente nos logradouros das suas habitações, nem dormir ou descansar, sem ruídos bruscos, inesperados, de fumos, gases, fuligens de atividade industrial poluente, dia e noite;
q) Os autores andam deprimidos, sem conseguir descansar ou adormecer normalmente, com a tensão arterial elevada, em consequência da actividade desenvolvida na oficina referida em 3.

A julgadora fundamentou as respostas nos seguintes, essenciais, termos:
«A factualidade supra enunciada fundamenta-se numa apreciação crítica e conjugada dos seguintes meios de prova:
Depoimento de parte do réu CC, em conformidade com a assentada constante da acta da audiência de julgamento…;
Declarações de parte dos autores na medida em que as mesmas se puderam conjugar com outros meios de prova;
Inspecção ao local em conformidade com o auto constante da acta de audiência de julgamento …
Depoimentos das testemunhas:
EE, filha dos autores, …aí se desloca(casa dos pais) aos fins de semana;
FF filha dos autores, …onde continua a estar (na casa dos pais) com frequência, uma vez que pode exercer a sua profissão também em teletrabalho;
JJ, 37 anos, residente desde sempre a cerca de 1 Km …cliente da oficina…;
HH, cliente da oficina…, local onde se desloca cinco a seis vezes por ano;
GG, residente há 3 anos a cerca de 500 metros dos prédios, cliente da oficina …
II, residente há cerca de 30 anos a 500 metros dos prédios e cliente da oficina;
LL, bate-chapas, funcionário da ré desde 2018;
MM, perito automóvel e que …se deslocou à oficina da sociedade ré cerca de 8 ou 9 vezes;
NN, funcionário da ré há cerca de 22 anos;
KK, responsável pela direcção técnica e gestão de resíduos na sociedade B... Ldª, à qual é paga avença mensal pela sociedade ré para recolha de resíduos e orientação para conformidade legal das suas práticas em termos ambientais.
Teor dos seguintes documentos:
Descrições e inscrições prediais que constituem os documentos 1 a 4 da p.i;
Prints da aplicação “google earth” que constituem os documentos 5 a 11 da p.i;
Fotografias que constituem os documentos 13 a 32 da p.i e 1 da contestação;
Missivas dirigidas pelo Município ... ao autor e à sociedade ré que constituem os documentos 33 a 36 da p.i;
Alvará de licença de utilização que constitui o documento 2 da contestação; 
- Certificado de responsabilidade ambiental que constitui o documento 4 da contestação;
Letreiro referente ao horário de trabalho da sociedade ré que constitui o documento 5 da contestação;
Fichas sobre produção de resíduos que constituem o documento 2 junto pelos réus com o requerimento de 09.10.2023
 Passando à análise crítica dos meios de prova …
 A matéria relacionada com a utilização dada pelos autores aos prédios em questão e destino que pretendiam dar ao prédio referido na alínea a) do facto 1, bem como data em que foram realizadas as obras de remodelação do mesmo, fundamenta-se nos depoimentos das filhas dos autores, as testemunhas EE e FF, que depuseram pela forma dada por provada no facto 2 e que foram também corroborados, em sede de declarações de parte pelos autores.
 Correspondentemente se deu por não provada a matéria constante da alínea a) dos factos não provados, uma vez que não resultou destes meios de prova, ou de quaisquer outros, sendo patente nas fotografias constantes do auto de inspecção, designadamente as numeradas de 11 a 15, bem como da visualização que fizemos aquando da mesma, a existência de um espaço devidamente preparado para acolher uma residência e jardim, mas que não se encontra a ser utilizado com carácter de permanência. Da inspecção realizada, em confronto com as fotografias juntas sob os documentos 6 e 7 da p.i resulta também a localização do prédio referido em b) (identificado no documento 6 sob a alínea a).
…resultando… a data do alvará de licença de utilização, dado por provado no facto 3, do respetivo documento junto com a contestação sob o nº 2, bem como o horário laboral que consta do facto 4, do letreiro junto com o documento 5 do mesmo articulado...
 O mesmo facto 4 e correspondentemente a factualidade dada por não provada na alínea f), sustenta-se nos depoimentos dos trabalhadores da sociedade ré, as testemunhas NN e LL, segundo os quais o período de laboração respeita aquele horário, no que foram corroborados pelas testemunhas JJ e GG, os quais por serem vizinhos estão em condições de ter conhecimento directo de tal facto, e corroboram o mesmo.
 Da mesma forma, os depoimentos destas testemunhas e ainda de HH e II, por serem todos clientes da oficina depuseram no sentido de que a actividade da ré é dirigida para veículos ligeiros, sendo, por vezes, desenvolvida no local em que se situa a estação de lavagem que, como se constata das fotografias 4 a 10 do auto de inspecção ao local, se situa fora da oficina, o que fundamenta quer o facto 5, quer a correspondente factualidade não provada descrita nas alíneas d) e i).
A matéria relacionada com as consequências inerentes ao exercício da actividade dos réus, descrita no facto 6, e correspondente factualidade não provada enunciada nas alíneas e), j), l) e n), resulta, por um lado dos depoimentos de todas as testemunhas que se conjugaram com as regras da experiência comum atinentes ao ruído usual que uma actividade de reparação e manutenção de automóveis produz. O que não resultou, de forma alguma do depoimento das testemunhas e da demais prova, designadamente da missiva datada de 08.08.2018 dirigida pelo Município ... ao autor, é que essa actividade produza um ruído fora dos parâmetros normais ou ainda que se caracterize pela emissão de produtos poluentes nos termos alegados.
 Sublinhe-se que as testemunhas indicadas pelos autores, suas filhas, apenas aludiram a situações pontuais que não permitem pôr em causa as conclusões daquela missiva, não havendo qualquer prova consistente e segura de que a qualidade ambiental, nas suas diversas vertentes, é posta em causa pela actividade desenvolvida na oficina, ou que da mesma resulte qualquer poluição sonora ou atmosférica susceptível de causar excepcional transtorno na vida os autores.
   Pela mesma ordem de razões, e ainda que, com fundamento na inspecção  realizada ao local, tenhamos dado por provado o facto 7, deste meio de prova não resultou a factualidade dada por não prova na alínea h), uma vez que posto em funcionamento o referido equipamento, como consta do complemento do auto de inspecção ao local que consta da acta de11.06.2024, não se constatou que o mesmo produzisse um ruído especialmente atentatório da audição. Acresce que, o funcionamento do mesmo equipamento, como resultou dos depoimentos das testemunhas LL e NN é pontual, não existindo qualquer outro meio de prova (com excepção das declarações de parte dos autores que, nesta parte não se atenderam porque não corroboradas com qualquer outro meio de prova) que permanentemente estivesse no local e apontasse para um funcionamento contínuo e frequente susceptível de causar transtorno a terceiros.
 Quanto ao facto descrito em 11, é inequívoca existência de um equipamento de lavagem automática, localizado no exterior da oficina, é…o modo e, sobretudo, a frequência da sua utilização. Como resultou dos depoimentos das testemunhas GG, HH e II, … aquele equipamento de lavagem é muito pouco utilizado, o que é igualmente visível nas fotografias em questão, que apontam para um uso muito pouco frequente. Cabe dizer, por último, que os referidos depoimentos não foram contrariados pelas testemunhas EE e FF, as quais aludiram apenas a situações pontualíssimas da sua utilização, o que justifica também a factualidade não provada descrita na alínea c).
O facto 12 fundamenta-se no teor da missiva que já referimos supra, datada de 08.08.2018, dirigida pelo Município ... ao autor, junta sob o documento 36 da p.i.
Quanto ao facto 13, o mesmo tem alicerce nas fichas de produção de resíduos juntas pelos réus com o requerimento de 09.11.2023, corroboradas e explicadas pelas testemunhas JJ e, sobretudo KK, que de forma clara e isenta relataram a forma como os resíduos vão sendo acondicionados pelos réus até à sua recolha pela empresa na qual trabalha esta última testemunha.
Por último, o facto 14 e correspondente factualidade não provada descrita em g), tem alicerce nos depoimentos das testemunhas EE e FF, bem como declarações de parte dos autores que foram no mesmo sentido dado por provado. Tais meios de prova foram conjugados com as regras da experiência comum já referidas e relacionadas com a actividade normal que é desenvolvida por uma oficina de reparação de automóveis, uma vez que o simples exercício de tal actividade produz, por si só, ruído susceptível de incomodar quem reside permanentemente nas imediações da mesma.
Porém, o que, de forma alguma resulta da prova produzida é que a actividade desenvolvida pelos réus seja susceptível de causar os danos enunciados na alínea q), que assim se deram por não provados.
Finalmente, quanto à factualidade não provada, ainda não mencionada, os factos descritos nas alíneas o) e p) encontram-se prejudicados pela ausência de prova do facto não provado descrito na alínea e).
Por último, sobre os factos descritos nas alíneas b) e m) não foi produzida qualquer prova que directamente ou conjugada com outra nos permitisse a formulação de um juízo sobre a mesma. »
Já os recorrentes pugnam pela alteração dos pontos de facto com base nas razões plasmadas nas conclusões recursivas.
5.4.4.2.
Foi apreciada a prova.
Dilucidemos.
Ponto 3.
A alteração pretendida para o ponto 3  é de conceder parcialmente, quanto à secção de bate-chapa e  pintura, mecânica, mudança de óleos, filtros pois  que o teor adicional impetrado foi alegado no artº13 da pi,  concretiza a atividade  da ré sociedade e dimana do documento junto pelos réus a fls.49, da prova pessoal,  nomeadamente dos autores e filhas, que aqui depuseram com conhecimento de causa e  de uma maneira objetiva, bem como das regras da experiência comum, pois que uma oficina de reparação de automóveis normalmente tem tais concretos serviços.
Assim tal ponto terá a seguinte redação:
3- O prédio referido na alínea a) do facto 1 confronta pelo lado sul com um prédio onde a sociedade ré tem instalada uma oficina de reparação de automóveis, com  secção de bate-chapa, mecânica,  pintura, mudança de óleos, filtros e estação de lavagem de automóveis, com alvará de licença de utilização emitido em 23.05.2007.
Ponto 4.
Os recorrentes alegaram que a  estação de lavagem, em regime de self service, está aberta 24 horas – artºs 15 e 17.
E resulta da prova documental – doc fls. 22 -  e dos depoimentos das filhas dos autores que os veículos podem ser lavados em tal  alargado horário.
Assim, o ponto 4 terá a seguinte redação:
4- A actividade referida em 3 é exercida pelos réus e por, pelo menos, dois trabalhadores, com um horário laboral das 8.30 horas às 18 horas, com intervalo de período de almoço das 12.30 às 14 horas, de Segunda a Sexta Feira e das 8.30 horas às 13.00 horas aos Sábados, exceto quanto à estação de lavagem a qual pode ser usada, em regime de self service, 24 horas.
Ponto 6.
6- A actividade referida em 3 produz barulhos de motores, do funcionamento do compressor de ar comprimido, do martelar das ferramentas e do falar das pessoas.
Este ponto está estreitamente conexionado com o teor da al. e) dado como não provado, a saber:
e) A actividade desenvolvida na oficina mencionada em 3 produz de forma intensa e continuada ruídos, gases, fumos, fuligens, vibrações e trepidações que se propagam no ar e pelas estruturas, sendo emitidos para os prédios dos autores;
Os autores  invocam os  seus depoimentos/declarações  e os depoimentos das suas  filhas, e aludem aos docs 34 a 36.
Aqueles, sendo todos, mais ou menos, interessados no desfecho favorável da  causa aos demandantes, o  por eles verbalizado, e que vai no sentido alegado, deve ser valorado prudente e comedidamente - cum granno sallis –, pelo que apenas poderá relevar decisivamente se for corroborado por outros meios probatórios.
Porém, certo é que a atividade desenvolvida pelos réus,  é qualificada pela CM..., ao abrigo do DL n.º 9/2007, de 17 de Janeiro, que aprovou o REGULAMENTO GERAL DO RUÍDO,  com o jaez de  «atividade ruidosa permanente» - cfr. Doc. 36 de fls. 29 vº.
Estatui o artº 3º al. a) de tal diploma:
«Para efeitos do presente Regulamento, entende-se por:
a)  Actividade ruidosa permanente» a actividade desenvolvida com carácter permanente, ainda que sazonal, que produza ruído nocivo ou incomodativo para quem habite ou permaneça em locais onde se fazem sentir os efeitos dessa fonte de ruído, designadamente laboração de estabelecimentos industriais, comerciais e de serviços;»
Assim sendo, é óbvio e natural que a  atividade desenvolvida pelos réus emite, no seu horário de funcionamento, ruído.
A questão, como bem se refere na fundamentação, é  apurar se tal ruído assume o jaez normalmente próprio da atividade ruidosa e  permanente,  ou seja, se é nocivo e incomodativo, ou, nos dizeres dos autores, intenso e continuado.
Ora como se refere na fundamentação, para além dos autores e das filhas, a restante prova pessoal não verbalizou, ao menos consistente e convincentemente, que estejam a ser provocados ruídos, gases ou fumos de um modo intenso e continuado, como alegado.
Porém, versus o entendido na sentença, do aludido  doc. de fls. 29 indicia-se que existem alguns problemas/anomalias na oficina, como seja  a ampliação ilegal das instalações, que potenciarão o aumento do ruído.
Pois que só assim se compreende que a CM de ... tenha notificado os réus para a:
«adoção  imediata de todas as medidas de minimização do ruído provocado por este estabelecimento», nomeadamente  «a reposição da legalidade urbanística».
E tanto assim que expendeu:
«caso após as diligências efetuadas, as questões do ruído persistirem, o Município despoletará novos procedimentos… para a reposição da legalidade e do direito ao descanso do munícipe reclamante».
Daqui,  no mínimo, indicia-se que, ao menos pontualmente, existirão  picos de ruído incomodativos
Não obstante,  vista e valorada toda a prova, não se pode concluir que o ruído, bem como outras consequências nocivas, como sejam gases, fumos e fuligens -  as quais, aliás, é suposto existirem na oficina de reparação de veículos motorizadosatinjam a intensidade e  continuidade alegadas.
Até porque o cariz de intenso é conclusivo e tem algum laivo subjetivo, dependendo da capacidade de resiliência de cada pessoa.
E o conceito de continuidade é algo indeterminado e relativo, pois que não  especificam os autores se são minutos e/ou horas e/ou dias seguido(a)s e ininterruptos de ruído, gases e fumos.
Por conseguinte, e na sequência da alteração do ponto 3, este ponto terá o seguinte teor:
6- A actividade referida em 3 produz barulhos de motores, do funcionamento do compressor de ar comprimido, do martelar das ferramentas e do falar das pessoas, bem como produz gases e fumos, que se propagam pelo ar.
E, por conseguinte, não se podendo dar como provado o teor da al. e) para além do neste ponto provado.
Ponto 11.
Os documentos juntos aos autos –cfr. fls. 22 -  e os depoimentos da família do autor demonstram que a atividade de lavagem se situa no exterior e é potencialmente utilizável em regime de self service, durante 24 horas.
As filhas dos autores não moram permanentemente na habitação, e, assim, não poderiam asseverar que são lavados carros todos os dias.
Decorrentemente, não se pode entender que tal atividade apenas é utilizada «esporadicamente:», ou seja, raramente, pontualmente.
Destarte, este ponto passa a ter o seguinte teor:
A atividade de lavagem é utilizável  24 horas, por modo self service, encontra-se no exterior da oficina, acessível a qualquer cliente.
Ponto 12.
Os recorrentes dizem que o teor deste ponto está em contradição com o restante teor dos documentos  34, 35 e 36 juntos com a pi.
Não é contradição.
É insuficiência, por reporte ao  consignado em tal documento.
É que se a julgadora entendeu dar-lhe  relevância nos dizeres que dele retirou, a saber, que «o ruído se inseria na actividade normal do estabelecimento», então também tem de relevar-se o mais em tal documento constante que possa contextualizar tal expressão, desde logo no que à qualificação de tal atividade concerne.
Sendo que este «mais» se reporta ao que a CM... expendeu no doc. 36 a fls. 29vº, ou seja, que « a atividade  desenvolvida na oficina é considerada   pelo DL n.º 9/2007, de 17 de Janeiro que aprovou o REGULAMENTO GERAL DO RUÍDO -   como « uma atividade ruidosa permanente»
Ademais deve atender-se, por poder relevar, ao que nesse documento consta e que foi alegado pelos recorrentes  no artº 30 da pi, a saber:
  Que a C.M. ... «notificou a oficina… para a adoção  imediata de todas as medidas de minimização do ruído provocado por este estabelecimento, para melhoramento do ruído ambiente geral e para cumprimento rigoroso   do horário atribuído.».
Assim sendo, tal ponto terá a seguinte redação:
12- No ano de 2018, o autor reclamou junto do Município ... e da Inspecção Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (IGAMAOT), da actividade desenvolvida pela sociedade ré, na sequência das quais o município verificou que o ruído se inseria na actividade normal do estabelecimento particularmente quando a mesma era desenvolvida no exterior ou quando a oficina tinha as portas abertas .
A C.M. ... detetou irregularidades na edificação da oficina, com ampliação em desconformidade com o projeto, tendo notificado a sociedade ré para a reposição da legalidade urbanística.
Mais  a notificou para a adoção  imediata de todas as medidas de minimização do ruído provocado por este estabelecimento, para melhoramento do ruído ambiente geral e para cumprimento rigoroso   do horário atribuído.
Com a cominação de que «caso após as diligências efetuadas, as questões do ruído persistirem, o Município despoletará novos procedimentos… para a reposição da legalidade e do direito ao descanso do munícipe reclamante».
Ponto 13.
Esta pretensão não pode ser concedida.
Contrariamente ao que eles parecem pretender, ele não encerra matéria conceitual  ou opinativa, mas antes  engloba  factos objetivos.
Depois, a (in)existência de alvará de licença de obras, é inócuo para a sua prova ou não prova, pois que o seu teor não depende desta licença.
Ele foi provado com base no teor dos documentos de fls. 73 e sgs e dos depoimentos de  JJ e, sobretudo KK.
Os quais  os recorrentes não infirmam, até porque relativamente a eles não cumprem o requisito  legal formal de indicação das concretas passagens dos depoimentos que pudessem relevar em seu abono – cfr. artº 640º nº2 a. a) do CPC -, o que implica a sua liminar rejeição.
Logo, o teor deste ponto é de manter.
Por outro lado, o teor pretendido provar é totalmente divergente e nem sequer colhe respaldo nos argumentos probatórios esgrimidos.
Ponto 14.
Os recorrentes alicerçam a sua pretensão modificativa apenas nos seus próprios dizeres e das suas filhas.
Vale aqui o supra aludido quanto ao cuidado a ter na valoração da verbalização da parte ou interveniente interessados.
Pelo que, sem mais, vg, prova documental de cariz médico, a convicção da julgadora não pode ser censurada.
Alínea a).
Este ponto foi dado como  não provado, essencialmente por virtude da inspeção ao local, diligência que permitiu analisar  diretamente e in loco, o aspeto da edificação dos autores.
Se, perante tal visualização, a julgadora se convenceu de que tal edifício não aparentava ser utilizado diariamente, a  sua convicção não pode ser censurada.
Os depoimentos dos autores e filhas são interessados e, consequentemente, terão tendência a hipertrofiar tal uso.
No entanto as respostas aos pontos de facto podem ser restritivas e/ou explicativas.
Assim, apesar de se não provar o uso diário, provou-se, mediante tais declarações e depoimentos, o uso frequente.
Tal uso frequente dimana de os autores  terem necessidade de se deslocarem à casa e quintal para amanharem o terreno anexo e criarem galinhas.
Assim, é razoável concretizar tal frequência em  cerca de três dias por semana, o que se mostra adequado, vg., para amanhar a terra.
Destarte, este ponto terá a seguinte redação:
Os autores utilizam com alguma frequência o prédio identificado na al. a) do facto 1, em média  cerca de 3 dias por semana.
Alínea b).
O meio adequado de provar este facto é o titulo constitutivo e o registo da sociedade.
Porém, numa concessão probatória  menos rigorosa, ainda aceitável, há que perspetivar, como alegam os recorrentes, que na procuração junta a fls. 55vº a ré qualifica-se de sócia gerente da sociedade ré.
Já quanto ao réu marido inexiste nos autos qualquer prova de tal qualidade, vg. no doc. 37 invocado pelos recorrentes.
Assim, tal alínea passa a ter o seguinte teor provado:
Os réus,  pessoas singulares, constituíram a sociedade ré,  a qual tem como gerente, pelo menos, a ré DD.
Alínea c).
Nada mais provado do que o constante no ponto 11 e pelas razões ali aduzidas.
Alínea d).
Apurou-se que atividade da sociedade ré  normalmente incide mais sobre veículos ligeiros.
Mas tal, naturalmente, não invalida e impede que ela não possa ser exercida – até por motivos de crescida rentabilidade económica – sobre outro tipo de veículos.
E das fotografias dos autos dimana que nas instalações da ré sociedade também estão  estacionados veículos comerciais e veículos pesados – cfr. fls. 16. 21 a 24º e 62.
Assim, este ponto terá o seguinte teor:
Por vezes são levados para as instalações da oficina da ré referida em 3 veículos comerciais e veículos pesados.
Al. e).
Nada mais apurado do que o constante no ponto 6.
Alínea f).
Inexiste prova bastante para se dar como provado o seu teor, para além do aditamento feito no facto 4.
Algumas das testemunhas, como as citadas na decisão, NN , LL,  JJ e GG, depuseram no sentido do cumprimento do horário.
O teor dos depoimentos das filhas dos autores e as declarações destes, valem o que valem, nos termos sobreditos, e não são suficientes, por si, para infirmar os daquelas testemunhas.
E dos documentos 33 e 34 invocados pelos recorrentes, não se pode extrair o contrário.
Na verdade, a alusão, pela C.M. ..., à necessidade de cumprimento do horário atribuído, demonstra apenas que tal entidade quer que tal cumprimento se verifique, e não que, o horário é incumprido, muito menos com o cariz de continuidade ou regularidade, que é o sentido atribuível ao teor pretendido provar.
Para que a prova de atuação para além do horário fosse feita urgiria que tal entidade expressamente referisse  que a violação do horário já se tinha verificado, o que não aconteceu.
Alínea g).
Esta alínea não vem referida na fundamentação.
Mas o seu teor não se prova.
Os docs.  invocados 24, 25, 26, 29 e 30, demonstram, essencialmente, a presença na oficina de veículos sinistrados e de peças dos mesmos.
Nada demostram quanto  a resíduos.
O doc. 29 mostra peças no chão. Mas tal também é normal e habitual numa oficina de reparação automóvel.
O sentido e a relevância do ponto seria  apurar se tal é prática corrente e continuada, e se de tal decorre qualquer prejuízo para os autores.
O que, de todo em todo, não resulta da prova invocada.
E sendo que as deficiências que os recorrentes imputam ao auto de inspeção, a existirem, são irrelevantes, por extemporâneas, pois que elas deveriam ter sido invocadas no momento ou quando dele tomaram conhecimento.
Alínea h).
A fundamentação aduzida na sentença, a saber:
«…o funcionamento do mesmo equipamento, como resultou dos depoimentos das testemunhas LL e NN é pontual, não existindo qualquer outro meio de prova (com excepção das declarações de parte dos autores …que permanentemente estivesse no local e apontasse para um funcionamento contínuo e frequente susceptível de causar transtorno a terceiros. », é irrefutável.
E assim é quanto à prova produzida quanto ao funcionamento contínuo do compressor, ou seja, apenas os autores tal afirmaram.
Assim, e pelo que supra se viu quanto à valoração destas declarações desacompanhadas de outros meios probatórios, seria intoleravelmente arriscado dar como provada a mencionada continuidade de funcionamento.
Quanto ao mais, nada se provou para além do já constante no ponto 7 dos factos provados.
Alínea i)
Já supra se referiu que o fundamento aqui aduzido – não terem os réus podido produzir prova pericial, aliás para este teor desnecessária e inadmissível -, apenas a eles pode ser imputável, pois não recorreram atempadamente do respetivo despacho de não admissão.
No remanescente: oficina fechada aquando da inspeção,  idem ibidem.
Alínea j).
O «martelar de ferramentas» já está inserto no ponto 6 dos factos provados.
Mas pelas regras da experiência comum resulta provado que esse martelar incide, normalmente,  numa oficina de veículos automóveis, contra peças metálicas das estruturas, na própria chapa e carroçarias.
Assim, este ponto terá a seguinte redação:
O martelar de ferramentas referido no ponto 6 incide, normalmente, contra peças metálicas das estruturas, na própria chapa e carroçarias dos veículos intervencionados.
Alínea l).
O sentido do teor deste ponto – desejado ou não desejado – quer significar que o ruido referido no ponto 6, o dos motores, do compressor e das marteladas, é incrementado/ampliado pelos sistemas de ventilação/exaustão ou, de ar condicionado.
Ora esse efeito, pelas regras da experiência comum e até  atentas as regras técnico-científicas atinentes, não é muito lógico e não é certo que se verifique.
Aqui é que se justificava uma experimentação aquando da inspeção, ou um exame pericial.
Mas tal convincente prova não foi efetivada, pelo que a invocação dos recorrentes não é a bastante para a fundamentação e a convicção da julgadora poderem ser censuradas.
Alínea m).
 A julgadora diz que não foi produzida qualquer prova que diretamente ou conjugada com outra nos permitisse a formulação de um juízo sobre a mesma.
E há que convir que os argumentos aduzidos pelos recorrentes, a saber: o teor da assentada sobre as declarações de parte em julgamento, e o auto  de inspeção ao local  não têm qualquer relevância para permitir a prova do teor deste ponto, parecendo até que existiu lapso nesta argumentação.
Al. n).
Atividade poluente é uma expressão conclusiva.
Pelo que, esta expressão, não pode ser objeto de prova e ser dada como provada, pois que ela, só por si, pode decidir, total, ou parcialmente, a causa.
Assim, tal conclusão tem de ser retirada, ou não, em sede de exegese dos concretos factos apurados.
Alíneas o), p) e q).
Mais uma vez os recorrentes alicerçam-se nas suas  próprias declarações e nos depoimentos das filhas.
Vale pois aqui, mutatis mutandis, o já supra aludido quando à valoração das mesmas, vg. no ponto 14.
Aliás, as declarações suas nem são coincidentes com   os depoimentos das filhas, nem todos eles verbalizam, todos os concretos pormenores deste ponto:  vg.« cheiro impregnando-se nas roupas da cama, do vestuário e, fuligem pelos móveis, pelo chão, telhados, varanda e, terraço;
Quanto à al. q) vale aqui o aduzido relativamente ao ponto 14, vg. quanto à necessidade de prova médica das maleitas invocadas.
5.4.5.
Por conseguinte, e no parcial provimento desta questão, os factos a considerar são os seguintes, indo a negrito os aditados/alterados.
1- Encontram-se descritos a favor dos autores pela ap....66 de 30.01.2014:
a) O prédio descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...68, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo nº ...50..., sito em ..., Travessa ..., composto por casa de habitação de rés do chão e logradouro;
b) O prédio descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...69, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo nº ...32, sito em ..., Travessa ..., composto por casa de habitação de cave, rés do chão e logradouro.
2- Os autores têm a sua residência permanente no prédio identificado na alínea b), localizado nas imediações do prédio referido na alínea a), que foi reabilitado por aqueles, cerca do ano de 2013, e que constituía a habitação permanente dos ascendentes do autor marido, com o propósito de ser utilizado pelas filhas dos autores quando aí se deslocassem, e como espaço de lazer.
3- O prédio referido na alínea a) do facto 1 confronta pelo lado sul com um prédio onde a sociedade ré tem instalada uma oficina de reparação de automóveis, com  secção de bate-chapa, mecânica,  pintura, mudança de óleos, filtros e estação de lavagem de automóveis, com alvará de licença de utilização emitido em 23.05.2007.
4- A actividade referida em 3 é exercida pelos réus e por, pelo menos, dois trabalhadores, com um horário laboral das 8.30 horas às 18 horas, com intervalo de período de almoço das 12.30 às 14 horas, de Segunda a Sexta Feira e das 8.30 horas às 13.00 horas aos Sábados, exceto quanto à estação de lavagem a qual pode ser usada, em regime de self service, 24 horas.
5- A actividade referida em 3 é, por vezes, exercida no exterior das instalações, onde ficam aparcados veículos por períodos longos.
6- A actividade referida em 3 produz barulhos de motores, do funcionamento do compressor de ar comprimido, do martelar das ferramentas e do falar das pessoas, bem como produz gases e fumos, que se propagam pelo ar.
7- O compressor de ar comprimido referido em 6 não tem proteção ou insonorização acústica, encontrando-se localizado numa divisão coberta junto à confinância dos prédios mencionada em 3.
8- O autor é reformado e a autora é doméstica, passando largos períodos de tempo nos prédios mencionados em 1.
9- O prédio onde se encontra instalada a oficina encontra-se localizado junto a casas de habitação.
10- A sociedade ré desenvolve também actividade numa secção de pintura, localizada em prédio mais afastado.
A atividade de lavagem é utilizável  24 horas, por modo self service, encontra-se no exterior da oficina, acessível a qualquer cliente.
12- No ano de 2018, o autor reclamou junto do Município ... e da Inspecção Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (IGAMAOT), da actividade desenvolvida pela sociedade ré, na sequência das quais o município verificou que o ruído se inseria na actividade normal do estabelecimento particularmente quando a mesma era desenvolvida no exterior ou quando a oficina tinha as portas abertas.
A C.M. ... detetou irregularidades na edificação da oficina, com ampliação em desconformidade com o projeto, tendo notificado a sociedade ré para a reposição da legalidade urbanística.
Mais  a notificou para a adoção  imediata de todas as medidas de minimização do ruído provocado por este estabelecimento, para melhoramento do ruído ambiente geral e para cumprimento rigoroso   do horário atribuído.
Com a cominação de que «caso após as diligências efetuadas, as questões do ruído persistirem, o Município despoletará novos procedimentos… para a reposição da legalidade e do direito ao descanso do munícipe reclamante».
13- A sociedade ré é regularmente acompanhada e fiscalizada pelas entidades competentes, públicas e privadas, cumprindo com as suas obrigações referentes a sucata e resíduos, nomeadamente quanto à sua separação, acondicionamento e entrega nos locais apropriados, sendo detentora do “Certificado de Responsabilidade Ambiental 2023”, emitido pela “B..., Lda”, que lhe presta serviços na área ambiental.
14- Em consequência do facto referido em 6, os autores andam incomodados com a actividade desenvolvida na oficina referida em 3.
15. Os autores utilizam com alguma frequência o prédio identificado na al. a) do facto 1, em média  cerca de 3 dias por semana.
16. Os réus,  pessoas singulares, constituíram a sociedade ré,  a qual tem como gerente, pelo menos, a ré DD.
17. Por vezes são levados para as instalações da oficina da ré referida em 3 veículos comerciais e veículos pesados.
18. O martelar de ferramentas referido no ponto 6 incide, normalmente, contra peças metálicas das estruturas, na própria chapa e carroçarias dos veículos intervencionados.

5.5.
Quinta questão.
5.5.1.
A Srª Juíza decidiu a causa, de jure, nos seguintes, sinóticos e essenciais, termos:
«Nos termos do artº 16º nº 2 da Constituição da República Portuguesa (CRP), os preceitos constitucionais e legais relativos aos direitos fundamentais devem ser interpretados e integrados de harmonia com a Declaração Universal do Direitos do Homem.
Prescreve esta Declaração no seu artº 3º que todo o indivíduo tem direito à vida e no seu artº 25º nº 1, que toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar e à sua família a saúde e o bem estar, preceitos dos quais comunga a Convenção Europeia dos Direitos do Homem[1] quando estabelece que o direito de qualquer pessoa à vida é protegido pela lei (artº 2º nº 1).
Acresce que a própria CRP preceitua no seu artº 25º nº 1 que a integridade moral e física das pessoas é inviolável, no artº 64º nº 1 que todos têm direito à protecção da saúde e no artº 66º nº 1 que todos têm direito a um ambiente de vida humana, sadio e ecologicamente equilibrado.
Estamos, assim, perante direitos fundamentais, porque figuram entre os direitos liberdades e garantias (Capítulo I, título II da Parte I) ou porque são direitos fundamentais de natureza análoga (Cf. artº 17º) e de natureza social (Capítulo II do Título III).
De igual forma, a Lei 19/2014 de 14 de Abril, que define as bases da política de ambiente, preceitua no seu artº 5º nº 1 que todos têm direito ao ambiente e à qualidade de vida, nos termos constitucional e internacionalmente estabelecidos…
Concretamente, no artº 11º do mesmo diploma legal, é expressamente referido que são objectivos da política do ambiente a gestão de resíduos que é orientada para a prevenção da respetiva produção, através da redução da sua quantidade e perigosidade…e para a mitigação dos impactes adversos para o ambiente e a saúde humana decorrentes da sua produção através da criação de condições adequadas à sua gestão, …e que a redução da exposição da população ao ruído é assegurada através da definição e aplicação de instrumentos que assegurem a sua prevenção e controlo, salvaguardando a qualidade de vida das populações e a saúde humana (al.c).
Por último, o artº 70º do Código Civil consagra um direito geral de personalidade, preceituando que a lei protege os indivíduos contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade física ou moral, conferindo-lhes o direito de requerer as providências adequadas às circunstâncias do caso, com o fim de evitar a consumação da ameaça ou atenuar os efeitos da ofensa já cometida.
Como referido no AC. STJ 29.11.20165 os direitos fundamentais, enquanto princípios que são, não se revestem de carácter absoluto, antes são limitados internamente, para assegurar os mesmos direitos a todas as outras pessoas, e também externamente, para assegurar outros direitos fundamentais ou interesses legalmente protegidos que com eles colidam, mediante a harmonização entre uns e outros, a qual sempre implicará o sacrifício, total ou parcial, de um ou mais valores.
Os conflitos entre o direito fundamental de um sujeito e o mesmo ou outro direito fundamental ou interesse legalmente protegido de outro sujeito hão de ser solucionados mediante a respectiva ponderação e harmonização, em concreto, à luz do princípio da proporcionalidade, evitando o sacrifício total de um em relação ao outro e realizando, se necessário, uma redução proporcional do âmbito de alcance de cada qual.
A essência e a finalidade deste princípio da proporcionalidade é a preservação, tanto quanto possível, dos diversos direitos fundamentais com amparo na Constituição e, em concreto, colidentes, através da sua harmonização e da optimização do meio escolhido com a observação das seguintes regras ou subprincípios: (i) a sua adequação ao fim em vista; (ii) a  sua indispensabilidade em relação a esse fim (devendo ser, ainda, a que menos prejudica os cidadãos envolvidos ou a colectividade; (iii) a sua racionalidade, medida em função do balanço entre as respectivas vantagens e desvantagens”.
Nos presentes autos, temos por um lado, o direito dos autores ao repouso e tranquilidade, bem como ao direito a usufruírem de um ambiente saudável e ecologicamente equilibrado, requisitos indispensáveis à concretização do seu direito à saúde e qualidade de vida e como contraponto o direito dos réus ao desenvolvimento de uma actividade económica empresarial, ao abrigo da iniciativa privada, também ela constitucionalmente protegida, entre outros, nos artºs 61º nº 1, 80º al. d) e 86º da CRP.
Tal actividade, como decorre da factualidade provada encontra-se devidamente licenciada, possuindo alvará de licença de utilização desde 23.05.2007, é exercida dentro de um horário laboral das 8.30 horas às 18 horas, com intervalo de período de almoço das 12.30 às 14 horas, de Segunda a Sexta Feira e das 8.30 horas às 13.00 horas aos Sábados, produzindo um ruído dentro dos parâmetros normais de tal actividade, designadamente quando é desenvolvida no exterior e quando a oficina tem as suas portas abertas (cf. factos 3, 4 e 12.) Acresce que tal actividade, é desenvolvida sob acompanhamento das entidades competentes em matéria de resíduos, cumprindo a ré, designadamente com as suas obrigações inerentes à separação, acondicionamento e entrega de tais matérias.
De todo o modo, ainda que assim suceda, tais circunstâncias, só por si, não obstariam, à prevalência dos direitos fundamentais dos autores à tranquilidade, repouso e vivência diária em ambiente ecologicamente são, já que como decidido uniformemente pela jurisprudência sempre haveria que distinguir claramente os planos de uma possível ilegalidade administrativa no exercício das actividades que geram a poluição ambiental, decorrente do desrespeito das normas regulamentares ou atinentes ao licenciamento e à polícia administrativa, e da ilicitude, consubstanciada na lesão inadmissível do direito fundamental de personalidade. Tal diferenciação de planos tem justificadamente conduzido à conclusão de que os tribunais constituem a última linha de defesa daquele direito fundamental de personalidade, sempre que o mesmo não tenha sido devidamente acautelado pela actividade regulamentar ou de polícia da Administração, em nada obstando à tutela prioritária do direito fundamental lesado a mera circunstância de ter ocorrido licenciamento administrativo da actividade lesiva ou os níveis de ruído pericialmente verificados não ultrapassarem os padrões técnicos regulamentarmente definidos.[2]
De qualquer modo, perante dois direitos fundamentais em confronto, o dos autores à tranquilidade e vivência em ambiente saudável e o dos réus ao desenvolvimento de uma actividade económica, sempre haveria que apelar para o disposto no artº 335º, o qual determina que havendo colisão de direitos iguais ou da mesma espécie, devem os titulares ceder na medida do necessário para quer todos produzam igualmente o seu efeito, sem maior detrimento para qualquer das partes, avançando o nº 2 que se os direitos forem desiguais ou de espécie diferente, prevalece o que deva considerar-se superior.
Com efeito, como referido no AC.STJ. 07.11.20197 ainda que a avaliação dos direitos em abstracto, feita através da comparação entre os bens jurídicos tutelados pelas situações em apreço, possa constituir um indício da possível superioridade de um dos direitos ou da igualdade entre ambos, a verdade é que, ela não se apresenta como um critério definitivo, impondo-se verificar no caso concreto se, em rigor e segundo as circunstâncias do caso, um dos direitos se apresenta superior ao outro, pois não se pode afirmar que o interesse pessoal seja, em todas as circunstâncias, superior ao patrimonial.
…não dispensa uma concreta e casuística ponderação judicial, a realizar em função do princípio da proporcionalidade acerca da intensidade e relevância da invocada lesão da personalidade. 
Da conjugação da factualidade provada nos factos 1 a 3, resulta que a oficina de reparação de veículos automóveis e estação de lavagem dos mesmos, encontra-se localizada  em prédio contíguo a um dos prédios do qual os autores são proprietários e que, em tempos constituiu a habitação dos ascendentes do autor marido. Tal prédio foi reabilitado com o propósito de ser utilizado pelas filhas dos autores, quando aí se deslocassem, bem como espaço de lazer, sendo que os autores residem noutro prédio, sito nas imediações do mesmo.
Mais resultou provado que a actividade de lavagem de veículos é esporadicamente utilizada pela ré e a actividade de reparação de veículos, por vezes, é realizada no exterior da oficina, onde ficam aparcados veículos por longos períodos. Numa divisão coberta, localizada na confinância dos prédios, encontra-se localizado um compressor de ar comprimido que não tem protecção acústica (cf factos 11, 5 e 6). Tal actividade, como já supra referido, é desenvolvida das 8.30 horas às 18 horas, com intervalo de período de almoço das 12.30 às 14 horas, de Segunda a Sexta Feira, e das 8.30 horas às 13.00 horas aos Sábados, sendo que a mesma produz barulhos de motores, do funcionamento do compressor, do martelar de ferramentas e do falar de pessoas.
Porém, o que não resultou demonstrado …é que a actividade desenvolvida pelos réus produza, de forma intensa e continuada, ruídos, gases, fumos, fuligens, vibrações e trepidações que se propagam no ar e pelas estruturas, sendo emitidos para os prédios dos autores, que tal actividade seja desenvolvida, fora do horário laboral, que em consequência da mesma fiquem amontoadas as peças extraídas e/ou substituídas amontoadas, por vários sítios, além de, resíduos derramados no solo.
Da mesma forma não se provou que o compressor funcione continuadamente ou que, quando os veículos são reparados no exterior, aí permaneçam com os motores em funcionamento com altas rotações, para testagem, chegando a atingir elevada intensidade de decibéis, ou que sejam desferidas marteladas sucessivas contra peças metálicas das estruturas, na própria chapa e carroçarias.
Não ficou ainda demonstrado que o ruído da oficina seja incrementado pelos sistemas de ventilação/exaustão ou, de ar condicionado utilizado com máquinas de pressão, de elevadores, além das originadas pelo compressor, pelo que, o ruído persiste com períodos intercalados, durante todo o dia.
Por último, não lograram ainda os autores demonstrar que, em consequência da actividade desenvolvida na oficina tenham que manter portas, janelas fechadas, para que os gases, os fumos e fuligens emitidos não se introduzam no interior das habitações, exercendo mau cheiro impregnando-se nas roupas da cama, do vestuário e, fuligem pelos móveis, pelo chão, telhados, varanda e, terraço, que não possam estender roupa a secar, ou andar normalmente nos logradouros das suas habitações, nem dormir ou descansar, sem ruídos bruscos, inesperados, de fumos, gases, fuligens de actividade industrial poluente, dia e noite.
Desta forma, apesar de ter ficado provado que os autores andam incomodados com a actividade desenvolvida na oficina, esse incómodo não deve ceder perante o legítimo exercício da actividade da ré, pois que do mesmo não resultou provada uma violação  da saúde e qualidade de vida dos autores, tanto mais que o prédio onde habitam permanentemente não é o prédio contíguo à oficina, tendo o prédio contíguo sido remodelado por aqueles em 2013 (portanto, em data posterior ao  início da actividade pelos réus), para utilização das filhas dos autores quando se deslocam a casa dos pais e como espaço de lazer.
Significa pois, que ponderando os incómodos decorrentes para os autores da actividade desenvolvida pelos réus com o direito à iniciativa empresarial destes, mormente para proverem ao seu sustento, deve prevalecer in casu este último, com o que improcedem os pedidos atinentes a tal matéria.».
 

5.5.2.
Perscrutemos.
Este discurso argumentativo apresenta-se, em tese geral, curial.
Assim, dele emerge uma primeira constatação/conclusão: em princípio/em abstrato, os direitos de personalidade, como o direito à saúde, de que a tranquilidade de espírito e o descanso são condições fulcrais –  são, por  natureza, porque atinentes ao que de mais relevante encerra a pessoa humana, superiores  aos direitos de cariz meramente patrimonial.
Efetivamente:
«…um direito de personalidade que, pela sua natureza e relevância, não pode deixar de se ter, em princípio, por prevalecente sobre os interesses empresariais…» - Ac. STJ de 29.06.2017, p. 117/13.1TBMLG.G1.S1
Pelo que, desde logo naquele plano,  e liminarmente, aqueles direitos assumem-se preponderantes e prevalecem sobre  estes, em caso de colisão entre eles – artº 335º nº2 do CCivil.
Não obstante, e como bem se expende na sentença, esta prevalência não é absoluta, havendo que admitir a hipótese de ela poder ser excecionada em função das concretas circunstâncias do caso decidendo.
Pois que a realização da justiça material tem - sob pena de prolação de uma decisão tabelar, cega e, quiçá, acobertando um exercício abusivo do direito -,  sempre de perspetivar os específicos contornos fáctico-circunstanciais do caso.
Na verdade:
«Sendo embora de respeitar a real prevalência dos direitos de personalidade relativamente ao direito de propriedade, fruto da hierarquia decorrente, designadamente, das normas constitucionais, essa hierarquia não é absoluta, havendo que sopesar a realidade factual em concreto, tendo em consideração que o direito hierarquicamente inferior – neste caso, o direito de propriedade - deve ser respeitado até onde for possível e apenas deve ser limitado na exacta proporção em que isso é exigido pela tutela razoável do conjunto principal de interesses.» - Ac. TRL de 01.10.2009, p. 1229/05.0TVLSB.L1-2, in dgsi.pt. como os infra cits.
No específico conspeto de violação do direitos de personalidade  - rectius do direito ao repouso, tranquilidade de espírito e qualidade de vida -, por uma atuação de terceiro urge ter presente, há que ter presentes dois aspetos fulcrais, a saber:
Por um lado não é necessário que que tal atuação/atividade seja administrativamente ilícita ou irregular – vg. não esteja  licenciada – ou ultrapasse os limites – de tempo, lugar, modo, gravidade ou intensidade – legal ou administrativamente fixados.
Efetivamente:
«Perante a lei civil, o direito de oposição face à emissão de ruídos subsiste, mesmo que o seu nível sonoro seja inferior ao legal e a respectiva actividade tenha sido autorizada pela autoridade administrativa competente, sempre que implique ofensas de direitos de personalidade.» - Ac. STJ de  07.11.2019, p. 1386/15.8T8PVZ.P1.S1.
Ou:
«Ainda que a produção do ruído seja inferior ao, legalmente, permitido, e a atividade donde o mesmo provém tenha sido autorizada pela autoridade competente, provando-se a incomodidade do ruido para o descanso e sono dos autores, impõe-se atribuir aos lesados no direito ao repouso e a um ambiente sadio, uma indemnização, por danos não patrimoniais, com vista à tutela dos seus interesses.» - Ac. STJ de 15.12.2015, p. n.º 311/04.6TBENT.E1.S1.
Por ouro lado, para aferir se o direito de personalidade é violado por uma certa atuação ou atividade, não releva por, si só e determinantemente, um certo e determinado aspeto mais impressivo desta atividade, mas antes sendo exigível operar um juízo global e concatenado sobre todos os factos e  circunstâncias apurados, e que se tenham por  mais ou menos relevantes.
Assim:
«Ao ajuizar sobre o modo de compatibilização dos direitos em confronto, tutelando de forma efectiva o direito de personalidade dos residentes nas imediações de estabelecimento de diversão nocturna, gerador de ruido para o exterior, - fixando nomeadamente o período possível de funcionamento - pode e deve o tribunal ter em consideração o impacto ambiental negativo global que está necessariamente associado ao tipo de actividades nele exercidas…» - Ac. STJ de 29.06.2017, p. 117/13.1TBMLG.G1.S1.
Enfim,  importa  ainda  ter presente, que mesmo no caso de  colisão/confronto entre um direito superior – de personalidade – e um direito inferior – patrimonial – urge, na medida do possível, operar  a maior conciliação entre eles, de sorte a que a  defesa e satisfação do direito prevalente acarrete a menor afetação e prejuízo para o direito menor.
Na verdade:
 «O direito ao repouso, descanso e saúde …(enquanto direito de personalidade), têm um valor superior ao direito de propriedade …e ao direito (económico) de exercer e explorar uma actividade e dever, por isso, prevalecer sobres estes últimos. Tal não significa que não se deva procurar uma solução de compromisso e consequentemente, sempre que possível, se deva tentar conciliar esses direitos.»  Ac. STJ de 01.03.2016, p. n.º 1219/11.4TVLSB.L1.S1.
5.5.3.
O caso vertente.
Contrariamente ao entendido na sentença, entendemos que os factos provados na 1ª instância,  acrescidos com os supra aditados, se apresentam, numa adequada e sagaz  exegese global, suficientes para se poder concluir que a atividade dos réus afeta intoleravelmente o  direito dos autores ao sossego, ao descanso,  à paz de espírito, e, logo, à qualidade de vida.
Devendo, assim, serem tomadas medidas para infirmar ou minimizar tal afetação e prejuízo.
Desde logo o argumento essencial  vertido na  sentença, qual seja, que  não se provou que a atividade dos réus  produza de forme intensa e continuada, ruídos, gases, fumos, fuligens, vibrações e trepidações,  porque a C.M. ... referiu que o ruído alvo de reclamação insere-se na atividade normal do estabelecimento, não pode ter a relevância que parece ter-lhe sido atribuída, no sentido de desvalorizar tal ruído, antes devendo ser interpretada em sentido inverso.
Como já referido em sede de apreciação da questão anterior – ponto 12 da matéria de facto -  há que considerar que, pela própria definição legal – artº 3º al. a) do citado DL n.º 9/2007de 17 de Janeiro -, a atividade de reparação de veículos automóveis pode ser considerada - como a CM... considerou -,  «uma atividade ruidosa permanente»
Mister é que ela se assuma como produtora de «ruído nocivo ou incomodativo para quem habite ou permaneça em locais onde se fazem sentir os efeitos dessa fonte de ruído, designadamente laboração de estabelecimentos industriais, comerciais e de serviços;»
Por conseguinte, este preceito é relevante  para nortear a dilucidação do caso.
E a ser assim, a conclusão a retirar é que, pela sua própria natureza, na atividade de reparação de automóveis desenvolvida pelos réus, ademais com as valências abrangentes e certos factos  apurados - vg. martelar de ferramentas, contra peças metálicas: ponto 18 dos provados -  o seu ruído normal se assume, ao menos tendencialmente, como muito próximo do ruído nocivo ou incomodativo para quem reside na confinância ou na cercania do local onde se desenvolve, in casu, para os autores.
Esta conclusão colhe ainda respaldo no facto de se ter provado que os autores se sentem incomodados pelo ruído, - ponto 14 -, incómodo este ao qual deve ser atribuído o jaez objetivo infra a referir. 
Prosseguindo.
Um aspeto fidedigno  que convence  que o barulho provocado na oficina – seja ou não intenso e continuado, ultrapasse ou não os decibéis legalmente previstos -   deve ser tido por exagerado e intolerável, resulta do facto de  a C.M. ... ter intimado os réus para a adoção  imediata de todas as medidas de minimização do  mesmo.
Naturalmente que esta injunção da CM... teve na sua génese certos indícios ou factos causadores que tal entidade percecionou e verificou, os quais  apontavam no sentido de um excesso indevido de produção ruidosa.
E  pelo menos alguns desses indícios  ou factos causantes apuraram-se nos autos.
Desde logo a ampliação ilegal das instalações da ré sociedade, pois que este acréscimo naturalmente aumenta a área de trabalho, com o consequente acréscimo de ruído.
Depois, a estação de lavagem em regime de self service, 24 horas, sita no exterior da oficina, acessível a qualquer cliente, o que permite o seu uso de madrugada, sendo assim suscetível de provocar barulhos ou outros atos neste período sensível que prejudiquem a tranquilidade e o descanso dos autores ou da família quando se encontrarem na casa dos autos.
Depois, o compressor de ar comprimido sem proteção ou insonorização acústica, encontrando-se localizado numa divisão coberta junto à confinância dos prédios, facto este que aumenta a perceção do ruído por ele provocado por parte dos autores ou suas filhas.
Depois, a atividade  dos réus referida 3 -  a qual inclui, como se provou em 18, o martelar de ferramentas, contra peças metálicas das estruturas, na própria chapa e carroçarias dos veículos intervencionados, o que, consabidamente implica produção de ruído/sons fortes -, por vezes a ser exercida no exterior das instalações da oficina.
Finalmente havendo que valorar em sentido diverso do valorado na decisão um aspeto importante.
A oficina foi instalada já com as edificações dos autores construídas, vg. a casa do ponto 1.a).
Esta era a habitação permanente dos ascendentes do autor marido.
E foi reabilitado cerca do ano de 2013.
Com o propósito de ser utilizado pelas filhas dos autores quando aí se deslocassem, e como espaço de lazer – ponto 2.
Vemos assim que quando a oficina foi instalada pelos réus já existiam casas de habitação na confinância do seu espaço e próximas dele, como seja a dos autores.
E não o contrário, como parece intuir-se da decisão, pois que a reabilitação de 2013  limitou-se a melhorar as condições de habitabilidade da casa do ponto 1 a),  e não  a introduziu-lhe  ex novo cariz funcional habitacional, o qual já antes existia.
Destarte, deveriam os réus  ter dotado a oficina de meios técnicos adequados a minimizar os ruídos de sorte a, pelo menos, mantê-los dentro de parâmetros sonoros  não nocivos, pois que os próprios valores de ruído mais ou menos normais da atividade desenvolvida,  e resulta da experiência comum, já de si são elevados e, assim,  incomodativos.
Mas tal cuidado não tiveram, antes pelo contrário adotando atos que, como se viu, aumentaram a produção de ruído
Os aludidos incómodos  provaram-se in casu – ponto 14.
Pelo que supra se referiu quanto aos aspetos menos adequados e causas de ruído acrescido do esperado nesta atividade,  estes incómodos não devem  ser entendidos no sentido subjetivo por advenientes de uma especial suscetibilidade dos autores e suas filhas, mas antes no sentido objetivo de reais, efetivos.
Até porque os autores deslocam-se bastas vezes à sua casa e quintal, bem como as suas filhas, das quais, pelo menos uma, e  segundo  o que verbalizou, até pode trabalhar na casa em causa, atenta a sua atividade profissional desenvolvida à distância.
Do que decorre a perturbação de tal trabalho pelos ruídos provocados.
Urge, pois, tutelar e proteger o direitos dos autores  e da sua família ao sossego, descanso e paz de espírito,  o que passa ao menos, pela   redução/minimização do ruído.
Pois que quanto aos fumos e gases não se apuraram factos bastantes, vg.  quanto ao seu nível de emissão e à afetação dos autores, que clamem a conclusão da necessidade de uma restrição da atividade dos réus neste particular.
As medidas para tal redução não podem passar pela  extrema e radical solução do encerramento da atividade dos réus.
Pois que, como se refere na sentença, tal poderia impedir ou afetar intoleravelmente a satisfação das necessidades básicas dos réus, no entendimento, admissível, que desta atividade empresarial eles retiram os rendimentos,  ao menos  essenciais, para aquele efeito.
Importa, assim, impor uma afetação/compressão recíproca dos direitos em confronto, de sorte a que eles sejam tutelados o mais amplamente possível e na sua essencialidade relevante, mas de um modo sensato, razoável e comedido.
Ou seja, os réus poderem continuar a exercer a atividade onde ganham o seu pão, mas com  medidas e cautelas acrescidas para evitar a propagação de ruido incomodativo;  e os autores poderem fruir da sua casa e quintal com a maior  tranquilidade e sossego possíveis.
Fito  este que entendemos poder ser, ao menos tendencialmente, atingido, através da ultrapassagem das  anomalias/desadequações factuais supra referidas.
Decorrentemente, impõe-se determinar e, consequente,  condenar os réus - com a moratória temporal  de dois meses que se tem por razoável em função  de cada ato/tarefa a realizar/executar -, a:
i)  Exerceram as atividades normais da oficina, maxime as que impliquem o martelar de ferramentas, contra peças metálicas das estruturas, na própria chapa e carroçarias dos veículos intervencionados exclusivamente no interior das instalações, e apenas na área das mesmas conforme ao seu projeto de construção ou que tenha sido posteriormente devidamente licenciada, em conformidade com a intimação da CM....
ii) Limitarem a atividade  do uso da estação de lavagem entre as 07 e as 22 horas.
iii) Dotarem o compressor de ar comprimido de insonorização acústica adequada ou, em alternativa,  retirá-lo da confinância onde se encontra e colocarem-no em local que minimize a propagação do ruído para a propriedade dos autores.
Esta determinação/condenação, é admissível, pois que concretiza o pedido formulado pelos autores nos  parágrafos   2º e 3º, constituindo um minus relativamente ao  mesmo,   estando assim ainda  dentro do módulo jurídico delineado pelas partes e do objeto do processo.

Quanto ao pedido de danos «morais», melhor teria  sido dito, não patrimoniais, o mesmo improcede.
Primus porque não se apuraram factos com força e dignidade bastantes para os sustentar.
Na verdade, e como constituem doutrina e jurisprudência pacíficas, os simples incómodos apurados, porque inerentes à própria condição de se viver em sociedade em cuja relação dialética interpessoal eles normalmente existem,  são insuficientes para o efeito.
Secundus  porque os autores não liquidaram o valor da compensação, antes pedindo o seu apuramento em incidente de liquidação.
Mas, em função do alegado na pi., já poderiam ter operado tal liquidação pelo menos relativamente aos danos provocados pela atuação dos réus até à instauração da ação.
Ora a condenação no que vier a ser liquidado em tal incidente destina-se apenas para os casos  em que, à data em que a formulação do pedido é possível, «não houver elementos para fixar o objeto ou a quantidade» - artº 609º nº2 do CPC.
O que não é o que se verifica no presente caso.

Finalmente, os autores impetraram a fixação de sanção pecuniária compulsória no montante de 200 euros diários, por cada ato violador dos  seus direitos.
Estatui o artigo 829.º-A do CCivil:
1 - Nas obrigações de prestação de facto infungível, positivo ou negativo, salvo nas que exigem especiais qualidades científicas ou artísticas do obrigado, o tribunal deve, a requerimento do credor, condenar o devedor ao pagamento de uma quantia pecuniária por cada dia de atraso no cumprimento ou por cada infracção, conforme for mais conveniente às circunstâncias do caso.
2 - A sanção pecuniária compulsória prevista no número anterior será fixada segundo critérios de razoabilidade, sem prejuízo da indemnização a que houver lugar.
3 - O montante da sanção pecuniária compulsória destina-se, em partes iguais, ao credor e ao Estado.
Vemos assim que as caraterísticas desta sanção são as seguintes:
i- Reporta-se apenas a prestação de facto infungível;
ii- É fixada, equitativamente, pelo tribunal,  a pedido do credor;
iii – O seu montante é dividido em partes iguais pelo credor e pelo Estado.

Ora:
«I – A sanção pecuniária compulsória visa reforçar a soberania dos tribunais o respeito pelas decisões e o prestígio da justiça e, também, favorecer a execução específica das obrigações de prestação de facto ou de abstenção fungíveis.
…o seu fim não é o de indemnizar o credor pelos danos sofridos com a mora, mas o de forçar o devedor a cumprir, reforçando-se, assim, o prestígio da justiça..» -  Ac. RC de  08.11.2016, p. 38/06.4GDCBR-C.C1; cfr, ainda, AC. RP de 14.07.2021, p. 623/09.2TTSTS-D.P1.
Assim:
« Por constituir um meio de coerção ao cumprimento e ao respeito da condenação judicial, a sanção pecuniária compulsória não pode ter efeitos retroativos, isto é, não pode ser fixada para uma data anterior à própria decisão que a ordena.» - Ac. RE de 07.03.2024, p. 2022/21.9T8STB-A.E1.
(sublinhado nosso)
In casu estão reunidos os seus  requisitos, pelo menos – e no que tange à infungibilidade - em relação à exigência da  prestação do exercício da atividade  apenas no interior  das instalações, a qual, na economia do decidido, se  tem como fulcral.
Assim, em função do provado e da decisão supra, entende-se por adequado, para se consecutirem os aludidos desideratos,  fixar-se tal sanção.
Tudo visto e ponderado - vg. no que tange à situação económico-financeira das partes, máxime dos réus, a qual, à míngua de prova em contrário deve ter-se por mediana -, e norteados pelo juízo équo legalmente permitido, fixa-se o valor diário   por cada infração do decidido em i)  e por cada dia de atraso no cumprimento do decidido em ii) e iii) em cem euros.

Procede, em parte, o recurso.

 6.
Deliberação.
Termos em que se acorda conceder parcial provimento ao recurso e, agora, condenar os réus:
1º)  A reconhecerem que os ruídos produzidos pela atividade comercial e industrial por eles desenvolvida nas instalações em causa  são  audíveis no prédio dos autores mencionado no ponto 1. a) dos factos provados,  com uma intensidade incomodativa para estes, e, assim, prejudiciais  para o seu descanso, repouso e qualidade de vida.
2º) A, no prazo de dois meses:
i) Passarem a exercer as atividades normais da oficina, maxime  aquelas que impliquem o martelar de ferramentas contra peças metálicas das estruturas, na própria chapa e carroçarias dos veículos intervencionados exclusivamente no interior das instalações, e apenas na área das mesmas conforme ao seu projeto de construção ou que tenha sido posteriormente  devidamente licenciada, em conformidade, vg., com a intimação da C.M. ....
ii) A limitarem a atividade  do uso da estação de lavagem entre as 07 e as 22 horas.
iii) Dotarem o compressor de ar comprimido de insonorização acústica adequada ou, em alternativa,  retirá-lo da confinância onde se encontra e colocarem-no em local que minimize a propagação do ruído para a propriedade dos autores.
3º - Ao pagamento, a título de sanção pecuniária compulsória,  da quantia de cem euros diários, pela infração do decidido em  2º -i)  e por cada dia de atraso no cumprimento do decidido em 2º - ii) e iii).

No mais se absolvendo.

Custas por autores e réus em partes iguais.

Coimbra, 2025.03.25.