Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
458/23.0T8VIS-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: CARLOS MOREIRA
Descritores: DOCUMENTO PARTICULAR AUTENTICADO
ASSUNÇÃO/CONFISSÃO DE DÍVIDA
REQUISITOS DO TERMO DE AUTENTICAÇÃO NOTARIAL
Data do Acordão: 05/21/2024
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO DE EXECUÇÃO DE VISEU
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGO 458.º, DO CÓDIGO CIVIL
ARTIGO 703.º, 1, A) E B), DO CPC
ARTIGO 38.º, 3 DO DL 76-A/2006, DE 29/3
ARTIGOS 46.º; 70.º E 151.º, DO CÓDIGO DO NOTARIADO
Sumário: Se o documento particular autenticado dado à execução consistir em assunção/confissão de dívida, o termo de autenticação notarial basta-se, para além do mais exigível nos artºs 46º e 151º do CN, com a identificação do devedor, a certificação da sua vontade de assunção da dívida, a sua assinatura e o registo informático nos termos do nº 3 do artigo 38º do DL nº 76-A/2006, de 29.03, Portaria nº 657-B/2006 de 29-06, não sendo necessária a intervenção do credor; pelo que, assim, ele assume-se título executivo com exequibilidade extrínseca.
Decisão Texto Integral: Relator: Carlos Moreira
Adjuntos: Luís Cravo
Vítor Amaral

ACORDAM OS JUIZES  NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA

1.

AA, deduziu oposição  à execução que lhe foi movida por Banco 1... S.A. Sucursal em Portugal.

Peticionou a extinção da execução, desde logo, pela inexistência do título.

Alegou, em síntese:

Dispõe o artigo 46.º, do Código do Notariado sobre as formalidades comuns aos instrumentos notariais e especificando, o artigo 151.º do mesmo diploma, os requisitos comuns para a autenticação dos documentos particulares.

O termo de autenticação, além de satisfazer, na parte aplicável e com as necessárias adaptações o disposto nas alíneas a) a n) do n.º 1 do art. 46.º do CN, deve ainda conter os elementos referidos nas al. a) e b) do n.º 1 do art. 151.º do CN.

O termo de autenticação que acompanha o documento dado à execução tem em falta a menção da outorgante que figura como “Primeira Parte” no mencionado “Acordo” (cfr. art. 46.º,n.º 1, alc) do CN); a menção de haver sido feita a leitura do instrumento lavrado, ou de ter sido dispensada a sua leitura pelos intervenientes, bem como a menção da explicação do seu conteúdo (cfr. art. 46.º,n.º 1, al l) e art. 50.º, ambos do CN); a assinatura, em seguida ao contexto, da outorgante que figura como “Primeira Parte” no mencionado “Acordo” (cfr. art. 46.º, n.º 1, al n) do CN); ou, pelo menos, a indicação da parte outorgante que não assina e a declaração que esta faça de que não assina por não saber ou não poder fazê-lo (cfr. art. 46.º, n.º 1, al m) do CN).

O ato notarial em causa é nulo, por vício de forma, ao abrigo do disposto no art. 70.º, n.º 1 do CN, sendo certo que tais omissões não foram sanadas abrigo do disposto no n.º 2 do referido preceito legal.

Acresce que a validade da autenticação de documentos particular importa, além do mais, que o registo informático do competente ato obedeça ao regime estabelecido na Portaria n.º 657-B/2006, de 29 de Março.

Verifica-se que também a elaboração do respetivo registo é omissa no que respeita à identificação dos interessados, legalmente exigida nos termos do disposto na al. b) do art. 3.º da referida Portaria; a inobservância do aí estipulado põe em causa a validade da autenticação realizada, implicando que o documento não chegue sequer a adquirir a natureza de documento particular autenticado.

O embargado contestou.

Disse que o documento dado à execução cumpre todos os requisitos para consubstanciar título executivo e cumpre, ainda, os requisitos formais patentes do artigo 46.º, do C.N.; as partes estão devidamente identificadas no documento; o termo diz expressamente que o conteúdo foi lido e compreendido; tanto o termo como o acordo são assinados pelos intervenientes; todos os elementos constantes do artigo 46º do Código do Notariado estão patentes do termo e do acordo; também o registo do termo não contém qualquer irregularidade que afete a sua validade; o registo contém, sim, a identificação dos interessados que constam do Acordo.

2.

Seguidamente foi proferida a seguinte «Decisão»

«Considerando o supra exposto, o Tribunal julga procedentes por provados os embargos deduzidos e, por ausência de título executivo, declara extinta a execução movida no âmbito dos autos principais

3.

Inconformada recorreu a exequente/embargada.

Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões:

a) O título executivo dado à presente ação não padece de qualquer vício.

b) Do termo de autenticação que acompanha o acordo dado à execução como titulo executivo, consta a identificação do embargante na qualidade de garante e na qualidade de representante da empresa A..., Lda., a declaração do embargante de que já leu o acordo e que o mesmo exprime a sua vontade, a menção do dia, mês, ano e lugar onde foi lavrado o termo, a assinatura da Advogada e a assinatura do Embargante.

c) Ou seja, o termo de autenticação, além de satisfazer, na parte aplicável e com as necessárias adaptações o disposto nas alíneas a) a n) do n.º 1 do art. 46.º do CN, contem os elementos referidos nas als. a) e b) do n.º 1 do art. 151.º do CN.

d) Encontram-se igualmente reunidos os requisitos do artigo 70.º do CN, não padecendo o termo de autenticação de nulidade por vicio de forma uma vez que não faltam qualquer um dos seus requisitos.

e) O termo de autenticação tem como finalidade a confirmação da declaração de vontades constante do documento particular, conforme cumprido in casu.

f) O artigo 151.º, n.º 1, do Código do Notariado, normativo legal específico para a autenticação, é claro ao definir que o termo de autenticação terá de satisfazer o disposto nas alíneas a) a n) do n.º 1 do artigo 46.º, “na parte aplicável e com as necessárias adaptações”, impedindo-se, pois, a aplicabilidade pura e cega do definido naquelas alíneas.

g) O facto de o termo não fazer referência à Primeira Outorgante, na qualidade de Mutuária e Credora, não implica a sua nulidade.

h) Verificando-se, sim, a assinatura do Embargante, e a expressão da sua vontade, constante do acordo.

i) O termo de autenticação em crise foi lavrado cumprindo todos os requisitos legais, pelo que é válido, e o documento particular dado à execução encontra-se validamente autenticado, pelo que validamente serve de base ao processo de execução, nos termos do artigo 703.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil.

j) O documento, dado à execução como título executivo, cumpre todos os requisitos para consubstanciar título executivo e cumpre, ainda, os requisitos formais patentes do artigo 46º do Código do Notariado.

k) Não se verifica, pois, qualquer vício do documento, ainda menos a nulidade, dado que a infirmação do alegado por este pode ser facilmente feita através da consulta e leitura atenta do documento.

l) Também o registo do termo não contém qualquer irregularidade que afete a sua validade, visto que o registo contém a devida identificação dos interessados que constam do Acordo.

Contra alegou o recorrido pugnando pela manutenção do decidido com os seguintes argumentos finais:

A. As Alegações de Recurso apresentadas pela ora Recorrente não cumprem os requisitos processuais e formais aplicáveis.

B. Quer da motivação de recurso, quer do enquadramento do mesmo, quer das suas conclusões, não é possível destrinçar o concreto e específico fundamento da recorribilidade ou, tão-pouco, a base legal da mesma.

C. Além do mais, as Alegações de Recurso apresentadas pela ora Recorrente não dão cumprimento às normas legais e processuais aplicáveis em matéria de ónus de alegação e formulação de conclusões em sede recursiva.

D. Das conclusões apresentadas pela Recorrente, não consta a indicação (nem de forma expressa, concreta e individualizada, nem de forma sumária):

a) Das normas jurídicas violadas;

b) Do sentido com que, no entender da recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas;

c) da norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada;

d) Dos concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;

e) Dos concretos meios probatórios que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;

f) Da decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas;

g) Daquilo que a Recorrente efetivamente pretende obter com o presente recurso;

E. Nestes termos, sempre será de concluir pela necessária inadmissibilidade do Recurso apresentado, determinando-se, em consequência, o seu indeferimento/rejeição, desde logo e sem mais.

SEM PRESCINDIR,

F. Ao contrário do alegado pela Recorrente em sede de Recurso e tal como doutamente firmado na Decisão recorrida, o documento particular trazido à execução não constitui documento autenticado, nem pode valer como título executivo.

G. Pois que, qualquer documento particular que não esteja ou não tenha sido elaborado em estrito cumprimento e concordância com as leis notariais (nomeadamente, cfr. art. 46.º e art. 151.º do Código do Notariado), nunca poderá ser tido por autenticado. 

H. Do termo de autenticação que acompanha o documento dado à execução como título executivo, encontram-se evidentemente em falta diversos elementos legalmente exigíveis para a validade de tal autenticação.

I. A saber, do termo de autenticação que acompanha o documento dado à execução como título executivo não consta:

a) A menção da identificação completa da outorgante que figura como “Primeira Parte” no mencionado “Acordo” (cfr. exigido pelo art. 46.º,n.º 1, al c) do CN);

b) A menção de haver sido feita a leitura do instrumento lavrado, ou de ter sido dispensada a sua leitura pelos intervenientes, bem como a menção da explicação do seu conteúdo (cfr. exigido pelo art. 46.º,n.º 1, al l) e art. 50.º, ambos do CN);

c) A assinatura, em seguida ao contexto, da outorgante que figura como “Primeira Parte” no mencionado “Acordo” (cfr. exigido pelo art. 46.º, n.º 1, al n) do CN); ou, pelo menos,

d) A indicação da parte outorgante que não assina e a declaração que esta faça de que não assina por não saber ou não poder fazê-lo (cfr. exigido pelo art. 46.º, n.º 1, al m) do CN);

J. Se é certo que, tal como a Recorrente afirma, o art. 151.º, n.º 1 do Código do Notariado refere que o termo de autenticação terá de satisfazer o disposto nas alíneas a) a n) do n.º 1 do artigo 46.º do mesmo diploma legal “na parte aplicável e com as necessárias adaptações”,

K. Mais certo é que, tal referência à aplicabilidade e adaptação do referido normativo legal se reporta apenas à necessária exclusão da necessidade de dar cumprimento às alíneas que, de forma evidente, não se enquadrem no caso concreto a apreciar.

L. Em matéria de aplicabilidade, não se vislumbra qualquer necessidade ou justificação para, no caso concreto, proceder ao afastamento da exigência de verificação do cumprimento do disposto nas alíneas a), b), c), d), e), g), l), m) e n) do n.º 1 do artigo 46.º do Código do Notariado.

M. Verifica-se, apenas e tão-só, uma necessidade de afastamento da exigência de verificação do cumprimento do disposto nas alíneas f), h), i) e j) do referido normativo legal, por absolutamente inaplicáveis ou desconexas com o concreto ato a realizar.

N. Já em matéria de adaptação, apenas se vislumbra necessário adaptar os elementos e requisitos constantes das alíneas aplicáveis ao caso concreto que, evidentemente, não tenham conexão com o ato em concreto.

O. Motivo pelo qual, o sentido ou interpretação extensiva (e conveniente) que a Recorrente pretende retirar ou promover da redação do art. 151.º do Código do Notariado, nunca poderia ter qualquer procedência.

P. Além disto, em nenhum caso concreto se vislumbra possível ou admissível afastar, da elaboração do instrumento notarial, a necessidade de dar cumprimento ao disposto na alínea l) do n.º 1 do art. 46.º do Código do Notariado,

Q. Pois que, tal previsão legal, constitui a representação expressa da intenção do legislador de proteger todos aqueles que ocupam a posição de intervenientes num ato e de garantir que todo e qualquer outorgante entende e fica a conhecer, de forma clara, plena e precisa, o alcance, o significado e os efeitos do respetivo ato e das declarações prestadas no documento particular que, posteriormente, virá a adquirir uma força qualificada.

R. Atento o conteúdo do documento que o termo de autenticação em causa acompanha, é evidente que os elementos que se verificam estar em falta no caso concreto se reconduzem a elementos essenciais à sua válida autenticação.

S. O termo de autenticação em causa sempre teria de se ter por nulo, em conformidade com o disposto no art. 70.º, n.º 1 do Código do Notariado, nunca podendo, igualmente, ser considerado título executivo válido, em conformidade com o disposto no art. 703.º, n.º 1, al. b) do CPC.

T. Além de tudo, a validade da autenticação de um documento particular depende, ainda, da realização do registo informático do respetivo termo em conformidade com as exigências/requisitos de modo e tempo previstos no regime estabelecido na Portaria n.º 657-B/2006, de 29 de junho.

U. In casu, o comprovativo de registo informático que acompanha o termo de autenticação aqui em apreço é igualmente omisso relativamente a requisitos legalmente exigíveis à elaboração daquele registo – nomeadamente, à identificação dos interessados (cfr. exigido pelas disposições conjugadas do art. 1.º e art. 3.º, al. b) da Portaria n.º 657-B/2006- de 29 de Junho).

V. O registo informático efetuado por advogado em contrariedade com as disposições conjugadas dos arts. 1.º e 3.º da Portaria n.º 657-B/2006, como sucedeu in casu, põe em causa a validade da autenticação realizada, pelo que não pode ter-se como validamente autenticado, nem revestir força executiva.

W. O documento dado à execução como título executivo não cumpre diversos requisitos essenciais e legalmente impostos à autenticação de documentos particulares (art. 46.º e 151.º do Código do Notariado e art. 1.º e art. 3.º, al. b) da Portaria n.º 657-B/2006- de 29 de Junho),

X. Pelo que, evidentemente, o documento dado à execução não constitui documento autenticado, nem nunca poderia valer como título executivo. 

Y. Nestes termos, sempre será imperativo concluir que andou bem o Tribunal a quo em julgar procedentes, por provados, os embargos deduzidos e em declarar extinta a execução, por ausência de título executivo.

Z. Sempre se devendo, igualmente, concluir pela improcedência do Recurso apresentado, mantendo-se a Decisão recorrida nos seus precisos termos, por não ser esta merecedora de qualquer reparo.

4.

Sendo que, por via de regra: artºs  635º nº4 e 639º do CPC - de que o presente caso não constitui exceção -, o teor das conclusões define o objeto do recurso, a questão essencial decidenda  é a seguinte:

Inexistência de título executivo, por inobservância das formalidades do Código do Notariado.

5.

Foram dados como provados os seguintes factos, que urge considerar:

1- No dia 23 de janeiro de 2023 o exequente instaurou execução contra o executado, alegando o seguinte no respetivo requerimento executivo:

“1. Por Acordo com Termo e Autenticação celebrado em 02 de junho de 2021, os Executados declararam e assumiram, serem solidariamente devedores, perante a Exequente da quantia de EUR 210.842,60 de capital, dos juros que se vencerem na pendência do referido Acordo, assim como do Imposto de Selo - Cfr. Documento n.º 1 que se reproduz para os devidos efeitos legais.

2. Para efeitos de pagamento da referida quantia, a sociedade executada obrigou-se a proceder ao pagamento do valor em 60 (sessenta) meses, nos termos previamente definidos pelas partes e constantes da Cláusula Segunda do Acordo.

3. As partes acordaram, ainda, que o não pagamento - total ou parcial - das prestações acordadas, nos termos e prazos convencidos, importaria ao vencimento imediato e integral das seguintes prestações, independentemente de qualquer interpelação prévia ( Cfr. Cláusula Terceira do Acordo).

4. Desde abril de 2022 que a sociedade executada deixou de proceder ao pagamento pontual e integral das prestações a que se obrigou.

5. Não obstante as reuniões mantidas com os Executados e as insistentes interpelações para o pagamento do montante em dívida, os Executados não regularizaram o montante que se encontra em dívida, constituindo-se em mora, nos termos do artigo 805.º n.º 1 do Código Civil.

6. Pelo que, a Exequente tem direito a peticionar, uma indemnização correspondente aos juros de mora vencidos e vincendos, calculados sobre o montante do capital em dívida, até integral e efetivo pagamento, ao abrigo do estatuído nos artigos 804.º e 806.º todos do Código Civil.

7. A quantia exequenda é certa, líquida e exigível e o acordo autenticado constituí título executivo bastante ao abrigo do disposto no artigo 703º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Civil.”;

2- Como título executivo, o exequente apresentou um documento denominado “Acordo”, datado de maio de 2021, onde consta como primeira parte Banco 1... S.A. – Sucursal Em Portugal, como segunda parte A..., Lda. e como garante AA, que é também representante da segunda parte, com o seguinte teor: “ (…)A SEGUNDA PARTE e o GARANTE declaram e assumem, sem quaisquer reservas, serem solidariamente devedores, perante a PRIMEIRA PARTE, do montante total de EUR 210.842,60 (…) declaram e assumem, sem quaisquer reserva, serem igualmente solidariamente devedores, perante a PRIMEIRA PARTE, do valor devido a título juros remuneratórios, contabilizados à taxa contratual de 2,35% (…) que se vencerem no decurso do presente Acordo. (…) A falta de pagamento, total ou parcial, de qualquer uma das prestações acordadas e mencionadas (…) importa o vencimento imediato e integral das seguintes prestações, independentemente de qualquer interpelação, podendo a PRIMEIRA PARTE recorrer aos meios legais necessários para cobrança judicial do seu crédito (…). ”;

3- Com o documento referido em 2, foi junto outro documento denominado “Termo de Autenticação”, datado de 02.06.2021, com o seguinte teor: “No dia dois de junho de dois mil e vinte e um, perante mim, BB, Advogada, portadora da cédula profissional n.º ...09..., compareceu como Outorgante, no meu escritório sito na Rua ..., ..., ... ...: AA (…), por si e na qualidade de Sócio-gerente e em representação da sociedade comercial por quotas denominada “A..., LDA.” (…), cuja identidade, qualidade e poderes para o acto verifiquei por exibição do cartão de cidadão supra indicado e pela consulta da respectiva certidão permanente com o código de acesso ...07, subscrita em 07-05- 2021 e válida até 07-05-2022. E por ele foi dito: Que, para fins de autenticação, me apresentou o acordo, anexo, que leu e assinou, e de cujo conteúdo está perfeitamente inteirado e que o mesmo é a expressão da sua vontade.”;

4- O documento referido em 3, cujo registo online foi feito junto da Ordem dos Advogados na mesma data, com a identificação apenas de AA como interessado, só se encontra assinado pela Advogada mencionada e pelo embargante.

5.

Apreciando.

5.1.

Liminarmente.

Improcede a  argumentação do recorrido quando alega que o recurso é inadmissível porque não é possível destrinçar o concreto e específico fundamento da recorribilidade ou, tão-pouco, a base legal da mesma.

Na verdade, a recorrente especifica claramente o objeto do recurso – insurgimento contra a não consideração como título executivo dos documentos juntos– e plasma, adrede, as normas jurídicas violadas – artº 703º nº1  al. b) do CPC e artºs 46º, 70º e 151º do Código do Notariado.

A pretensão da recorrente é, até face à singeleza do thema decidendum, claramente intuível e percetível, o que é demonstrado pelas próprias contra alegações do recorrido.

Quanto ao fundo.

A julgadora decidiu aduzindo o seguinte, sinótico e essencial, discurso argumentativo:

«Segundo Antunes Varela (R.L.J., Ano 121, n.º 3770, p. 148) «(…) o título executivo é a peça que pela sua força probatória abre directamente as portas da acção executiva. É, no plano probatório, o salvo-conduto (uma espécie de abre-te Sésamo) indispensável para ingressar na área dura do processo executivo…dir-se-á que o título executivo é uma espécie de escada magirus necessária para o portador ascender imediatamente ao andar nobre da jurisdição cível – que é o da realização coactiva da prestação a que o queixoso faz jus – em vez de entrar pelo rés-do-chão do edifício judiciário, onde normalmente se discute a existência e a violação do direito que o demandante se arroga (…).

No caso dos presentes autos, o exequente deu à execução um documento particular que considera autenticado.

Prevê o artigo 46.º, do Código do Notariado, sobre as formalidades comuns aos instrumentos notariais, especificando o artigo 151.º, do mesmo diploma legal, os requisitos comuns para a autenticação dos documentos particulares nos seguintes termos:

“1 – O termo de autenticação, além de satisfazer, na parte aplicável e com as necessárias adaptações, o disposto nas alíneas a) a n) do nº1 do artigo 46, deve conter ainda os seguintes elementos:

- a declaração das partes de que já leram o documento ou estão perfeitamente inteiradas do seu conteúdo e que este exprime a sua vontade;

- a ressalva das emendas, entrelinhas, rasuras ou traços contidos no documento e que não estejam devidamente ressalvados.

2 – É aplicável à verificação da identidade das partes, bem como a intervenção de abonadores, intérpretes, peritos, litores ou testemunhas, o disposto para os instrumentos públicos.”

Já o artigo 70.º, do mesmo Código, prevê os casos de nulidade do ato notarial por vício de forma, prescrevendo o seu nº 1 o seguinte: “O ato notarial é nulo, por vício de forma, apenas quando falta algum dos seguintes requisitos:

- a menção do dia, mês e ano ou do lugar em que foi lavrado;

- a declaração do cumprimento das formalidades previstas no artigo 65 e 66;

- a observância do disposto na primeira parte do nº2 do artigo 41;

- a assinatura de qualquer intérprete, perito, leitor, abonador ou testemunha;

- a assinatura de qualquer dos outorgantes que saiba e possa assinar;

- a assinatura do notário;

- a observância do disposto na alínea g) do nº1 do artigo 46.”.

Atento o termo junto aos autos principais, verifica-se que o mesmo, apesar de fazer referência ao embargante/executado, contendo a respetiva assinatura,  não menciona a denominada primeira parte no acordo, nem possui qualquer declaração da mesma e assinatura.

A definição do que são documentos autênticos ou particulares autenticados encontrasse no artigo 363.°, do Código Civil, estipulando-se no seu n.º 3, que os documentos particulares são havidos por autenticados, se forem confirmados pelas partes perante o notário, nos termos prescritos nas leis notariais, ou por outra das entidades legitimadas a fazêlo, como é o caso dos advogados, nos termos do artigo 5.º, do Decreto-Lei n.º 237/2001, de 30 de agosto, e 38.º, n.º 1, do Decreto-Lei n. ° 76-A/2006, de 29 de março, desde que o ato seja, registado em sistema informático (n.º 3, do mesmo artigo) e desde que o teor do documento tenha sido confirmado pelas partes perante o certificante (o notário, a câmara de comércio e indústria, o conservador, o oficial de registo, o advogado ou o solicitador), nos termos prescritos nas leis notariais, o que terá de constar da respetiva autenticação, concretizando-se, ainda, a assinatura do respetivo termo pelas partes envolvidas, sendo que, sem tal elemento, não existe autenticação.

Ora, tudo ponderado, perante a factualidade apurada, resta-nos concluir que assiste razão aos embargantes/executados, quando afirmam a inexistência de título executivo.

Acresce, ainda, que o artigo 38.º, do D.L. n.º 76-A/2006, de 29 de Maio, procedeu à extensão do regime dos reconhecimentos de assinaturas e da autenticação e tradução de documentos, além de outras entidades ou profissionais, aos advogados e solicitadores que podem fazer reconhecimentos simples e com menções especiais, presenciais e por semelhança, autenticar documentos particulares, certificar, ou fazer e certificar, traduções de documentos nos termos previstos na lei notarial, possuindo os seus atos a mesma força probatória que teriam se tivessem sido levados a cabo pelo notário (n.º 1 e 2 do referido preceito legal). Porém, como refere o n.º 3, do mesmo preceito, a sua validade depende ainda de registo em sistema informático, cujo funcionamento, respetivos termos e custos associados são definidos por Portaria n.º 657-B/2006, de 29 de junho.

Nos termos do artigo 3.º, da Portaria indicada, “Relativamente a cada um dos actos referidos no artigo 1.º, devem ser registados no sistema informático os seguintes elementos:

a) Identificação da natureza e espécie dos actos;

b) Identificação dos interessados, com menção do nome completo e do número do documento de identificação;

c) Identificação da pessoa que pratica o acto;

d) Data e hora de execução do acto;

e) Número de identificação do acto.”.

Tudo ponderado, impõe-se concluir que a validade da autenticação de um documento particular depende também da observância das formalidades legais supra mencionadas, verificando-se que o n.º 3, do artigo 38.º, do D.L. n.º 76-A/2006, de 29/03, faz depender a validade do ato de autenticação do referido registo em sistema informático, nos termos da Portaria, incluindo no que respeita à identificação dos interessados, com menção do nome completo e do número do documento de identificação.

Trata-se de uma formalidade essencial, que tem na sua base razões de fé pública, segurança e certeza jurídicas relacionadas com a determinação das partes envolvidas, pelo que o desrespeito da mesma não pode deixar de retirar a validade ao ato de autenticação e, necessariamente, a possibilidade do documento valer como título executivo.

Ora, no caso dos presentes autos, atento o teor dos referidos documentos, facilmente se alcança que as formalidades acabadas de descrever não foram respeitadas, não se podendo considerar um documento por autenticado, pelo simples facto de só conter a identificação de um dos interessados, ficando de fora a primeira parte e a segunda parte indicadas no acordo.

Nestes termos, tudo ponderado, resta-nos concluir que, também por este argumento, assiste razão ao embargante/executado, quando afirma a falta de título executivo que sustente a pretensão deduzida pelo exequente.»

5.2.

A ação executiva pressupõe o incumprimento da obrigação que emirja do próprio título dado à execução, isto é, que o direito inscrito no título está definido e acertado.

Temos assim que a relevância especial dos títulos executivos que resultam da lei deriva da segurança tida por suficiente da existência do direito substantivo o que permite dispensar a prévia indagação sobre se existe ou não o direito de crédito que consubstancia e faz presumir a existência da obrigação exequenda.

O título constitui condição da ação executiva e a prova legal da existência do direito nas suas vertentes fáctico-jurídicas.

Porém, o fundamento substantivo da ação executiva é a própria obrigação exequenda, constituindo o título executivo o seu instrumento documental legal de demonstração.

Nesta conformidade o título executivo é condição necessária e suficiente da ação.

Necessária porque não há execução sem título.

Suficiente porque, repete-se, perante ele, deve ser dispensada qualquer indagação prévia sobre a real existência ou subsistência do direito a que se refere.

Efetivamente, a obrigação exequenda tem de constar no título, o qual, como documento que é, prova a existência da mesma.

O título executivo é um pressuposto da ação executiva na medida em que confere ao direito à prestação invocada um grau de certeza e exigibilidade que a lei reputa de suficientes para a admissibilidade de tal ação.

Na verdade «…a relevância especial dos títulos executivos que resulta da lei deriva da segurança, tida por suficiente, da existência do direito substantivo cuja reparação se pretende efectivar por via da acção executiva.

O fundamento substantivo da acção executiva… é a própria obrigação exequenda, sendo que o título executivo é o seu instrumento documental legal de demonstração, ou seja, constitui a condição daquela acção e a prova legal da existência do direito de crédito nas suas vertentes fáctico-jurídicas» - Ac. do STJ de 18.10.2007, p.07B3616,  dgsi.pt.

Os títulos executivos são  apenas os taxativamente previstos na lei.

Estatui o artigo 703.º, sob a epígrafe  Espécies de títulos executivos:

1 - À execução apenas podem servir de base:

a) As sentenças condenatórias;

b) Os documentos exarados ou autenticados, por notário ou por outras entidades ou profissionais com competência para tal, que importem constituição ou reconhecimento de qualquer obrigação;

In casu temos um acordo  firmado entre duas partes, a exequente e a firma A..., Lda, tendo como garante o embargante, de reconhecimento de dívida por parte  desta firma.

Este acordo foi autenticado por termo de autenticação notarial, com o teor e nos termos supra apurados.

As formalidades comuns dos instrumentos notariais estão previstas no artº 46º do CN:

  Artigo 46.º

Formalidades comuns

1 - O instrumento notarial deve conter:

a) A designação do dia, mês, ano e lugar em que for lavrado ou assinado e, quando solicitado pelas partes, a indicação da hora em que se realizou;

b) O nome completo do funcionário que nele interveio, a menção da respectiva qualidade e a designação do cartório a que pertence;

c) O nome completo, estado, naturalidade e residência habitual dos outorgantes, bem como das pessoas singulares por estes representadas, a identificação das sociedades, nos termos da lei comercial, e das demais pessoas colectivas que os outorgantes representem, com menção, quanto a estas últimas, das suas denominações, sedes e números de identificação de pessoa colectiva;

d) A referência à forma como foi verificada a identidade dos outorgantes, das testemunhas instrumentárias e dos abonadores;

e) A menção das procurações e dos documentos relativos ao instrumento que justifiquem a qualidade de procurador e de representante, mencionando-se, nos casos de representação legal e orgânica, terem sido verificados os poderes necessários para o acto;

f) A menção de todos os documentos que fiquem arquivados, mediante a referência a esta circunstância, acompanhada da indicação da natureza do documento, e, ainda, tratando-se de conhecimento do imposto municipal de sisa, a indicação do respectivo número, data e repartição emitente;

g) A menção dos documentos apenas exibidos com indicação da sua natureza, data de emissão e entidade emitente e, ainda, tratando-se de certidões de registo, a indicação do respetivo número de ordem ou, no caso de certidão permanente, do respetivo código de acesso;

h) O nome completo, estado e residência habitual das pessoas que devam intervir como abonadores, intérpretes, peritos médicos, testemunhas e leitores;

i) A referência ao juramento ou compromisso de honra dos intérpretes, peritos ou leitores, quando os houver, com a indicação dos motivos que determinaram a sua intervenção;

j) As declarações correspondentes ao cumprimento das demais formalidades exigidas pela verificação dos casos previstos nos artigos 65.º e 66.º;

l) A menção de haver sido feita a leitura do instrumento lavrado, ou de ter sido dispensada a leitura pelos intervenientes, bem como a menção da explicação do seu conteúdo;

m) A indicação dos outorgantes que não assinem e a declaração, que cada um deles faça, de que não assina por não saber ou por não poder fazê-lo;

n) As assinaturas, em seguida ao contexto, dos outorgantes que possam e saibam assinar, bem como de todos os outros intervenientes, e a assinatura do funcionário, que será a última do instrumento.

Acresce que relativamente à autenticação de documentos particulares prescreve o artº 151º do mesmo diploma:

Artigo 151.º

Requisitos comuns

1 - O termo de autenticação, além de satisfazer, na parte aplicável e com as necessárias adaptações, o disposto nas alíneas a) a n) do n.º 1 do artigo 46.º, deve conter ainda os seguintes elementos:

a) A declaração das partes de que já leram o documento ou estão perfeitamente inteiradas do seu conteúdo e que este exprime a sua vontade;

b) A ressalva das emendas, entrelinhas, rasuras ou traços contidos no documento e que neste não estejam devidamente ressalvados.

2 - É aplicável à verificação da identidade das partes, bem como à intervenção de abonadores, intérpretes, peritos, leitores ou testemunhas, o disposto para os instrumentos públicos.

No caso vertente e como dimana dos factos provados, no acordo aludido:

«…consta como primeira parte Banco 1... S.A. – Sucursal Em Portugal, como segunda parte A..., Lda. e como garante AA, que é também representante da segunda parte, com o seguinte teor: “ (…)A SEGUNDA PARTE e o GARANTE declaram e assumem, sem quaisquer reservas, serem solidariamente devedores, perante a PRIMEIRA PARTE, do montante total de EUR 210.842,60 (…) declaram e assumem, sem quaisquer reserva, serem igualmente solidariamente devedores, perante a PRIMEIRA PARTE, do valor devido a título juros remuneratórios

Já no termo de autenticação consta:

« …compareceu como Outorgante, no meu escritório sito na Rua ...: AA (…), por si e na qualidade de Sócio-gerente e em representação da sociedade comercial por quotas denominada “A..., LDA.” (…), cuja identidade, qualidade e poderes para o acto verifiquei por exibição do cartão de cidadão supra indicado e pela consulta da respectiva certidão permanente com o código de acesso ...07, subscrita em 07-05- 2021 e válida até 07-05-2022. E por ele foi dito: Que, para fins de autenticação, me apresentou o acordo, anexo, que leu e assinou, e de cujo conteúdo está perfeitamente inteirado e que o mesmo é a expressão da sua vontade.”;

(sublinhado nosso)

Vemos assim que o acordo em causa apenas atribui deveres e responsabilidades à firma segunda outorgante e ao seu garante, o embargante.

Estamos, pois, perante uma confissão ou reconhecimento unilateral de dívida.

Estabelece o artº 458º do CCivil que:

1. Se alguém, por simples declaração unilateral, prometer uma prestação ou reconhecer uma dívida, sem indicação da respectiva causa, fica o credor dispensado de provar a relação fundamental, cuja existência se presume até prova em contrário.

 2. A promessa ou reconhecimento deve, porém, constar de documento escrito, se outras formalidades não forem exigidas para a prova da relação fundamental.

Constitui jurisprudência pacífica que o artigo 458º, nº 1, do Código Civil, não cria a obrigação mas apenas faz presumir a existência da mesma, cuja fonte será outro ato ou facto; estabelece-se a inversão do ónus da prova da existência da relação fundamental,  cabendo ao devedor alegar e provar a falta de causa da obrigação assumida.

Porém, cumprido pelo exequente o aludido ónus de alegação da relação fundamental, é ao executado que cabe o ónus da prova da inexistência ou invalidade do negócio donde procede a dívida ou a que a prestação se reporta, da exceção de não cumprimento do contrato ou do exercício do direito de resolução.

E, com estes termos alegatórios, podendo o documento servir de base à execução, se autenticado - cfr. Ac. RE 13.12.2020, p. 1575/18.3T8MMN-A.E1 e Ac. RG de 09.06.2022, p. 492/22.7T8VNF.G1, in dgsi.pt, como os infra citados.

Nestes casos de reconhecimento de dívida  discute-se se o termo de autenticação tem, necessariamente, de conter referência expressa a todos os outorgantes do documento a que se reporta, rectius ao credor e ao devedor.

Uns, numa leitura e interpretação  meramente literal e (r)estrita do artºs  46º e 151º aludidos, os quais se reportam às «partes» ou outorgantes», entendem que sim – cfr. Ac. RG de 22.09.2022, p. 456/21.8T8PRG.G1.

Outros consideram que a declaração cuja autenticação se impõem é, necessariamente,  apenas a da pessoa que “se obrigou”, seja a pagar, a entregar ou a prestar o facto, ou  seja declaração a do devedor.

Assim, se o termo de autenticação/documento que contenha só a autenticação do credor (exequente), mas não do devedor, não serve de título executivo.

Mas o que contenha a intervenção do devedor, mesmo que apenas   esta, que não a do credor, já serve.

Na verdade, sendo o documento dado à execução não  mais do que uma confissão de dívida, expressa pelo executado em documento particular,  no termo de autenticação não é  necessária  a intervenção e a assinatura da  credora exequente, pois que o único obrigado no título e no processso, é, perante aquele documento, apenas o executado – cfr. Ac. RP de 08.11.2018, p. 3261/17.2T8AGD.P1.

Aderimos a este último entendimento.

Efetivamente, tratando-se de confissão unilateral de dívida, e sendo que a lei, perante tal confissão,  faz presumir a existência da mesma, impendendo sobre o devedor provar a inexistência da relação fundamental substantiva que, aparentemente/indiciariamente, se presume existir, a  autenticação da declaração de vontade do devedor, reportada e confirmante do teor do acordo confessório, é suficiente para que os documentos dados à execução como títulos executivos assumam o seu jaez e desiderato, ou seja, façam prova legal da existência do direito de crédito que referem, com o grau de exigibilidade, certeza e segurança que a lei impõe.

Nestes casos de confissão de dívida, se a autenticação abranger todos os outorgantes, ela fica ainda mais completa e irrefragável, pois que, como diz o brocardo, quoad abundant non nocet.

Mas se abranger apenas o devedor, ela é suficiente para, atento o supra aludido,  se concluir -  através de uma exegese com perspetivação dos elementos lógico, racional e teleológico da hermenêutica jurídica -  que cumpriu os requisitos do Código do Notariado.

No caso presente.

Já se viu que o acordo exequendo não atribui deveres recíprocos para ambas as partes, antes constitui uma assunção/confissão unilateral de dívida por banda da segunda outorgante.

No termo de autenticação plasmou-se adrede que  o embargante,  (…), por si e na qualidade de Sócio-gerente e em representação da sociedade comercial por quotas denominada “A..., LDA.” …E por ele foi dito: Que, para fins de autenticação, me apresentou o acordo, anexo, que leu e assinou, e de cujo conteúdo está perfeitamente inteirado e que o mesmo é a expressão da sua vontade.”.

(negrito e sublinhado nossos).

Inexiste, pois, qualquer dúvida que a autenticação colheu a vontade dos devedores/obrigados do acordo a que se reporta, inexistindo assim resquício de dúvida quanto à assunção da dívida exequenda.

Destarte, a autenticação da declaração de vontade da devedora, através do seu representante, atribui aos documentos força bastante para, reitera-se, com a certeza e segurança exigíveis, se concluir,  sem necessidade de indagação prévia sobre a real existência ou subsistência do direito a que se referem, pela  liminar responsabilidade dos mesmos.

Ademais provou-se – facto 4 – que o termo de autenticação foi registado on line,

em sistema informático, requisitos de validade do ato, tal como exigível no  nº 3 do artigo 38º do Decreto-Lei nº 76-A/2006, de 29 de Março, e  nos termos definidos na Portaria nº 657-B/2006 de 29-06.

O que, tudo, confere aos documentos dados à execução, exequibilidade extrínseca.

Efetivamente, há de distinguir a exequibilidade extrínseca, que se reporta à exequibilidade do título ou à exequibilidade da pretensão incorporada ou materializada no título, da exequibilidade intrínseca, que diz respeito à validade ou eficácia do teor  do ato ou negócio incorporado no título e que tem como requisitos a certeza, a exigibilidade e a liquidez da obrigação exequenda. – cfr. Ac. RP de 18.01.2005, p. 0424318.

Vistas e bem interpretadas as coisas, a exequibilidade intrínseca atêm-se à exigibilidade da prestação, e, assim, reporta-se à (im)procedência do pedido executivo.

Já a exequibilidade extrínseca do próprio título reporta-se à sua idoneidade para, ab initio poder sustentar e permitir a instauração do processo executivo.

In casu, reitera-se, com a autenticação do devedor e a confirmação/renovação da sua declaração de vontade, perante a notária, de reconhecimento e assunção da dívida do acordo,  foram cumpridos, com a suficiência exigível, os requisitos notariais para a autenticação, assumindo pois os documentos exequibilidade extrínseca.

Se o acordo não reflete a vontade das partes ou enferma de algum vício que pode obstar à pretensão exequenda é questão de fundo, e tal atém-se à exequibilidade intrínseca, eventualmente a discutir ulteriormente.

Procede o recurso.

(…)

7.

Deliberação.

Termos em que se acorda julgar o recurso procedente, revogar a sentença e ordenar o prosseguimento da execução.

Custas recursivas pelos executados.

Coimbra, 2024.05.21.