Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
59/21.7T9CLD.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: VASQUES OSÓRIO
Descritores: REQUERIMENTO DE ABERTURA DE INSTRUÇÃO
CRIME DE MAUS TRATOS
CRIME DE FALSIFICAÇÃO OU CONTRAFACÇÃO DE DOCUMENTO
CRIME DE VIOLAÇÃO DE SEGREDO POR FUNCIONÁRIO
CRIME DE ACESSO ILEGÍTIMO
ELEMENTOS SUBJECTIVOS DOS CRIMES IMPUTADOS
Data do Acordão: 02/22/2023
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA – JUÍZO DE INSTRUÇÃO CRIMINAL DE LEIRIA – JUIZ 1
Texto Integral: N
Meio Processual: RECURSO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO
Legislação Nacional: ARTIGO 287.º, N.º 2, 308.º, N.º 1, 309.º, N.º 1, E 339.º, N.º 4, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
ARTIGO 152.º-A, N.º 1, AL. A), E 256.º, N.º 1, AL. E), DO CÓDIGO PENAL
ARTIGO 6.º, N.º 1, DA LEI N.º 109/2009, DE 15 DE SETEMBRO
Sumário: I – O facto de o requerimento de abertura de instrução não estar sujeito a formalidades especiais não significa que seja informal, já que deve conter, em súmula, as razões de facto e de direito da discordância com o decidido pelo Ministério Público, deve indicar os actos de instrução pretendidos, deve enumerar os meios de prova produzidos que não foram valorados e deve indicar os factos que, com tais actos e meios de prova, se pretende provar, como resulta do art. 287º, nº 2, do C.P.P.

II – Quando a instrução visa a comprovação judicial do despacho de arquivamento do Ministério Público há que analisar uma questão que é prévia à suficiência ou insuficiência dos indícios, que é a de saber que elementos devem, obrigatoriamente, constar do requerimento para abertura da instrução e quais as consequências da sua omissão.

III – Neste caso o requerimento de abertura de instrução do assistente tem que se estruturar, substancialmente, como uma verdadeira acusação, alternativa à que foi omitida pelo Ministério Público, porque é ele que vai definir o objecto da instrução, balizando quer o âmbito da investigação a levar a efeito pelo juiz de instrução, quer o âmbito da própria decisão instrutória, porquanto a decisão instrutória que pronuncie o arguido por factos que constituam uma alteração substancial dos descritos naquele requerimento é nula, nos termos do nº 1 do art. 309º do C.P.P. 

IV – O crime de maus tratos da alínea a), do n.º 1 do art. 152.º-A do Código Penal tem como tipo objectivo a inflicção, pelo agente, a pessoa menor ou particularmente indefesa, em razão de idade, deficiência, doença ou gravidez, que tenha ao seu cuidado, à sua guarda, sob a responsabilidade da sua direcção ou educação ou a trabalhar ao seu serviço, de modo reiterado ou não, de maus tratos físicos ou psíquicos, incluindo castigos corporais, privações da liberdade e ofensas sexuais, ou a tratar cruelmente, e como tipo subjectivo o dolo genérico, o conhecimento e vontade de praticar o facto, com consciência da sua censurabilidade, em qualquer das modalidades previstas no art. 14º do C. Penal.

V – O crime de falsificação ou contrafacção de documento da alínea e), do n.º 1 do art. 256.º do Código Penal tem como tipo objectivo que o agente use documento falso, documento contrafeito por abuso da assinatura de outra pessoa, ou documento do qual conste, falsamente, facto jurídico relevante, e como tipo subjectivo o dolo genérico, o conhecimento e vontade de praticar o facto, com consciência da sua censurabilidade; o dolo específico, a intenção de causar prejuízo a outra pessoa ou ao Estado, de obter, para si ou para terceiro, benefício ilegítimo, ou de preparar, facilitar, executar ou encobrir outro crime.

VI – O crime de violação de segredo por funcionário do n.º 1 do art. 256.º do Código Penal, tem como tipo objectivo que o agente, na qualidade de funcionário, sem a autorização devida, revele segredo de que tenha tomado conhecimento ou lhe tenha sido confiado no exercício das suas funções, ou cujo conhecimento lhe tenha sido facilitado pelo cargo que exerce, e como tipo subjectivo o dolo genérico, o conhecimento e vontade de praticar o facto, com consciência da sua censurabilidade; o dolo específico, a intenção de obter para si ou para terceiro, benefício, ou com a consciência de causar prejuízo ao interesse público ou a terceiro.

VII – O crime de acesso ilegítimo do n.º 1 do art. 6.º da Lei n.º 109/2009, de 15 de Setembro, tem como tipo objectivo que o agente, sem permissão legal ou sem autorização do proprietário, ou de outro titular do direito do sistema, de qualquer modo aceda a um sistema informático, e como tipo subjectivo o dolo genérico, o conhecimento e vontade de praticar o facto, com consciência da sua censurabilidade.

VIII – Ao omitir o dolo relativamente a crimes dolosos a acusação alternativa que o RAI configura imputa factos que não constituem crime.

IX – Esta deficiência não é susceptível de sanação, mediante convite formulado à assistente para o seu aperfeiçoamento, e também não é lícito ao senhor juiz de instrução suprir a omissão na decisão instrutória.

Decisão Texto Integral:

I. RELATÓRIO

No processo nº 59/21.... que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca ... – Juízo de Instrução Criminal ... – Juiz ..., em que é assistente, AA, a Digna Magistrada do Ministério Público proferiu, em 28 de Março de 2022, despacho de arquivamento relativamente aos factos objecto da queixa apresentada pela assistente contra as denunciadas BB, CC, DD e EE.

A assistente requereu a abertura da instrução, visando que, a final, fosse proferido despacho de pronúncia das denunciadas, pela prática de um crime de maus tratos, p. e p. pelo art. 152º-A, nº 1, a), de um crime de falsificação ou contrafacção de documento, p. e p. pelo art. 256º, nºs 1, e) e 4, de um crime de violação de segredo por funcionário, p. e p. pelo art. 383º, nº 1, todos do C. Penal e de um crime de acesso ilegítimo … p. e p. pelo 6º, nº 1 da Lei nº 109/2009, de 15 de Setembro.

Por despacho de 18 de Outubro de 2022, o Mmo. Juiz de instrução proferiu despacho de rejeição do requerimento para abertura da instrução, com fundamento inadmissibilidade legal desta, por omissão … da narração de factos preenchedores do tipo subjectivo dos crimes imputados.

*

Inconformada com a decisão, recorreu a assistente, formulando no termo da motivação as seguintes conclusões:

c) Em 26 de Junho de 2020, a Recorrente deu entrada no Centro Hospital do ..., em ..., já se encontrando em trabalho de parto, tendo a filha da Recorrente nascido naquele mesmo dia.

d) Desde o momento que a Recorrente deu entrada naquele centro hospitalar que as coisas correram mal. Tendo havido desde a data do internamento até à data da alta diversas situações que consubstanciam crime, conforme a seguir melhor se descreve.

e) Começa com a entrada da Recorrente no Centro Hospitalar, no dia 26 de Junho de 2020, onde foi deixada sozinha, em trabalho de parto, na sala de espera pelo segurança, enquanto a sua mãe estacionava o carro e, só quando esta entrou na sala e gritou é que a Recorrente foi assistida.

f) Assim que a filha da Recorrente nasceu começou o “calvário” desta, começando logo por lhe ter sido feito uma episiotomia, sem qualquer anestesia, o que lhe provocou muitas dores … a partir do dia 28 de Junho de 2020, começou a enfermeira chefe dirigiu-se à Recorrente com modos discriminatórios, mais concretamente dizendo para esta e a sua mãe não fizessem barulho para que não se soubesse que era uma mulher que visitava a Recorrente, como se isso fosse um problema.

g) … a médica responsável … no dia 29/06/2020, deu alta à Recorrente, mas não deu alta à menor dizendo que este tinha uma infecção no umbigo, sabendo-se agora que não correspondia totalmente à verdade, mais colocou sistema do SNS (ficha clínica) que a Recorrente era portadora de Autismo e sinalizou-a ainda por maus tratos à filha.

h) … a Recorrente não sofre de autismo … a Arguida, Drª BB, como médica obstetra que é, não tem competência para diagnosticar o autismo e, também não existiam provas de quaisquer maus tratos à menor por parte da Recorrente … O que se pode confirmar nos documentos juntos aos autos.

i) Ao colocar essas informações na ficha da Recorrente, a Arguida criou uma situação que esta sabia que iria provocar prejuízos incalculáveis na Recorrente …

j) Com base na informação colocada pela Arguida Drª BB, foi a Recorrente sinalizada pelas Assistentes Sociais e consequentemente a CPCJ, tendo a Assistente Social, Drª EE, Arguida nos presentes autos, resolvido enviar um email, também junto aos autos, a diversas pessoas, que nada tinha a ver com a situação.

k) No dia 29/06/2020, foi a Recorrente inquirida pela Assistente Social, aqui Arguida Drª DD, quando ainda estava em convalescença, tendo-a inundado de perguntas … e dito ainda à Recorrente que poderia deixar o hospital e voltar quando quisesse para ver a filha, o que a Recorrente recusou fazer.

l) Também no referido dia 28/06/2020 a mãe da Recorrente solicitou à Arguida CC, enfermeira chefe informações sobre o que se passava com a neta, tendo sido informada que teria de falar com a médica Drª BB, Arguida neste processo. O que esta tentou fazer no dia 30/06/2020, e quando se dirigiu ao hospital para falar com a Arguida Drª BB, foi recebida por uma das Assistentes Sociais do hospital, a aqui Arguida Drª DD, que tentou por diversas maneiras que a mãe da Recorrente dissesse que esta era incapaz e que tinha autismo.

m) … tanto a Recorrente como a mãe desta insistiram para que lhes fosse dito o que se passava com a bebé e o porque da referência ao suposto autismo na ficha clínica da Recorrente, tendo sido informadas pela Arguida CC, enfermeira chefe do hospital, que era um equivoco e que seria rasurada aquela informação. O que não aconteceu, como foi do conhecimento da Recorrente meses mais tarde.

n) Tendo também a Arguida CC incorporado na ficha clínica da Recorrente a informação de que esta padecia de mutismo selectivo …

o) … durante todo o tempo que a Recorrente esteve no hospital (de 26/06/2020 a 06/07/2020) esta foi perturbada pela Arguida DD, Assistente Social do ... …

p) A partir do momento da sinalização da Recorrente e sua filha, por situações inexistentes, esta foi vitima de diversas atitudes por parte de diversas enfermeiras, nomeadamente da enfermeira chefe CC … tal como proibição de ver televisão no quarto, ouvir musica no seu telemóvel com os seus phones, tentativa de proibição de falar com a família através do seu telemóvel, proibição de sair do quarto, tendo sido isolada de toda a gente … foi ainda negado tratamento para o seu peito que se encontrava gretado, recusa em verificar o que se passava com os seus pés e pernas, bem como uma coisa tão simples como abrir uma embalagem de corta unhas. O que não era feito com as outras parturientes.

q) Tal como é completamente desumano o comportamento da Arguida CC … o facto de às 6 da manhã irem acordar a Recorrente para ir tomar banho, dizendo que se não tomasse banho àquela hora não tomava, ser acordada durante a noite, para que fosse à casa de banho, sendo que a Recorrente não tinha necessidade de ajuda para se deslocar à casa de banho.

r) Outra situação, que deixou a Recorrente muito perturbada, foi o facto de lhe terem dito que a sua filha, devido à infecção que esta tinha no umbigo, iria ser efectuado um tratamento com sal de cozinha, acontece que, assim que colocavam o sal na bebé, ela ficava completamente agitada e que só acalmava se lhe dessem banho …

s) Primeiro foi transmitido pelas enfermeiras, nomeadamente a enfermeira chefe CC à Recorrente que a bebé não tinha alta devido à alegada infecção, depois porque não tinha o peso certo, seguidamente foi-lhe dito que não tinha alta porque não tinha marido, o que na altura a Recorrente não entendeu, mas agora percebe que seriam apenas desculpas para terem tempo para criar uma história que levasse à retirada da criança à mãe …

t) Também disserem directamente à Recorrente que esta era má mãe, mas deixavam a bebé com esta várias horas durante o dia, a tomar conta da sua filha sozinha e, as conversas das Arguidas e de outras pessoas do hospital, sobre a Recorrente continuaram, umas vezes chamavam-lhe de tolinha …

u) … as Arguidas começaram a tecer comentários … que o seu pai adoptivo era pedófilo, referindo-se ainda à morte do seu pai biológico dizendo que aquele se tinha suicidado … Efectuando perguntas sobre o seu apelido antigo e no novo … que foram feitas com o intuito de magoar a Recorrente e assim deixa-la mais fragilizada.

v) … numa ocasião a Arguida Drª DD, Assistente Social no ..., se dirigiu ao quarto onde se encontrava a Recorrente para uma conversa com esta, o que sucedeu à porta fechada, na qual a Arguida tentou colocar a Ofendida contra a mãe, dizendo que tinha sido esta que tinha feito a sinalização, o que não corresponde à verdade, tendo-lhe dado um documento para a Ofendida assinar dizendo que o pai da bebé era o seu pai adoptivo, o qual a Ofendida não assinou.

w) … no dia 6/7/2020, a Recorrente foi obrigada a deixar o ... na companhia de duas Assistentes Sociais … sem que a deixassem esperar pela roupa que tinha solicitado à sua mãe, obrigando-a a sair do hospital com um pijama de homem, que lhe era enorme e que tinha de ir a segurar para não lhe cair, sem roupa interior …

x) … foi colocado … pelo pessoal clínico, nomeadamente a aqui Arguida Drª BB, que a Recorrente é portadora de autismo, o que não foi diagnosticado por um especialista nessa área, logo, foi colocado ilegitimamente essa informação no processo clínico da Recorrente, tendo depois sido divulgado por diversas pessoas, conforme consta de alguns dos documentos juntos. Além de que, as Arguidas DD e EE para efectuarem a sinalização da menor FF junto da CPCJ e do Juízo de Família, foram consultar o processo antigo da Recorrente (do ano 2009).

y) … as Arguidas foram consultar informações, que repete-se são falsas, e posteriormente divulgá-las, e que deveriam estar destruídas, sem sequer solicitar à Recorrente a sua autorização para consultar os seus processos, tanto clínico como social. Violando assim o estipulado no regulamento da Protecção de Dados e da própria LPCJC, que estipula que para se ter acesso a dados sensíveis de qualquer pessoa, tem de se ter autorização desta.

z) Verifica-se que as Arguidas não só incluíram informação uma completamente falsa, outra que não corresponde integralmente à verdade e … resolveram divulgar a referida informação por diversas pessoas que nada tinham a ver com o processo e, em desrespeito à vida privada da Recorrente, direito consagrado na Constituição da República Portuguesa.

aa) Todos os factos descritos integram a prática dos crimes de maus tratos e de violação do segredo por funcionário, violação de segredo e de falsificação de documentos, previstos e punidos nos artigos 152-A, nº 1 al a), 383 nº 1 e 256º al. e) e nº 4 todos do Código Penal e do crime de acesso ilegítimo, previsto e punido pelo artigo 6º nº1 da Lei nº 109/2002 de 15 de Setembro e, os quais são imputáveis às Arguidas.

bb) Apesar de todos os factos e provas juntas aos autos, a Digníssima Procuradora resolveu arquivar o processo …

cc) … a douta decisão da Meritíssima Magistrada do Juízo de Instrução Criminal ... em que indefere liminarmente o requerimento de instrução deduzido pela Recorrente com o fundamento de este não cumprir os requisitos legais. …

ii) … o requerimento de abertura de instrução deduzido pela Recorrente cumpre todos os requisitos exigidos por lei …

*

O recurso foi admitido.

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Respondeu ao recurso a Digna Magistrada do Ministério Público, formulando no termo da contramotivação as seguintes conclusões:

2º - No requerimento de abertura de instrução deduzido nos autos deparamos com a omissão relativa à narração dos elementos objetivos e subjetivos respeitantes aos crimes concretos.

3º - … enferma aquele de nulidade, a qual não é uma nulidade meramente formal, mas afeta a própria instrução, e, portanto, seria sempre inexequível e legalmente inadmissível.

4º - Tal requerimento não é suscetível de aperfeiçoamento …

5º - Pelo exposto, não se verificando a violação de qualquer preceito legal, nomeadamente os mencionados, entendemos que deverá o presente recurso ser julgado improcedente.

*

Na vista a que se refere o art. 416º, nº 1 do C. Processo Penal, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer, afirmando que … não tendo a recorrente alegado factos susceptíveis de, per se, se traduzirem numa acusação, o recurso não merece provimento.

II. FUNDAMENTAÇÃO

a questão a decidir, sem prejuízo das de conhecimento oficioso, é a de saber se o requerimento para abertura da instrução, por si apresentado, observou o disposto no nº 2 do art. 287º do C. Processo Penal, designadamente, se contém a narração fáctica preenchedora do tipo subjectivo dos crimes nele imputados às denunciadas e, em caso de resposta afirmativa ou em caso de resposta negativa, a respectiva consequência.

*

Para a resolução da questão enunciada, importa ter presente o teor da decisão instrutória recorrida, que é o seguinte:

“…

3. Rejeita-se o requerimento de abertura de instrução por inadmissibilidade legal (art. 283 n.º 3 do C.P.P.).

3.1. O requerimento de abertura de instrução alega a presença dos tipos de crime de maus tratos, violação de segredo, falsificação de documentos (apontando as normas dos artigos 152-A n.º 1 a), 383 n.º 1 e “256 al. e) e n.º 4” do C.P.), e “acesso indevido previsto e punido pelo artigo 6 n.º 1 da Lei 109/2009”.

3.2. Tal requerimento tem de corresponder à dedução de uma acusação, como prescrevem os artigos 287º n.º 2 e 283 n.º 3 do Código de Processo Penal pois delimita o espaço de conhecimento judicial …

No requerimento em causa falta a enunciação fáctica da vontade e conhecimento, dos respectivos ilícitos-típicos, e a que se refere o art. 14 do C.P. (cfr. AUJ 1/2015, cfr. https://data.dre.pt/eli/acstj/1/2015/01/27/p/dre/pt/html).

Em nenhum momento do arrazoado vemos tal alegação. A consequência do incumprimento é a inadmissibilidade legal …”.

*

Da observância ou não, pela recorrente, do disposto no nº 2 do art. 287º do C. Processo Penal, designadamente, no que respeita à narração de factos preenchedores do tipo subjectivo dos crimes imputados no requerimento para abertura da instrução

1. A instrução … visa, unicamente, a comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito em ordem a submeter ou não a causa a julgamento (art. 286º, nº 1, do C. Processo Penal).

Esta comprovação mais não é do que a conjugação e ponderação dos meios de prova produzidos – no inquérito e na própria instrução – de modo a concluir, ou não, pela existência de indícios suficientes de estarem verificado os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, juízo este a ser formalmente explicitado na decisão instrutória, de pronúncia ou de não pronúncia.

Por isso se dispõe no art. 308º, nº 1 do C. Processo Penal que, se, até ao encerramento da instrução, tiverem sido recolhidos indícios suficientes de se terem verificado os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, o juiz, por despacho, pronuncia o arguido pelos factos respectivos; caso contrário, profere despacho de não pronúncia.

In casu, a instrução requerida pela assistente visou a comprovação judicial do despacho de arquivamento do Ministério Público relativamente aos factos objecto da queixa por si apresentada a fls. 5 a 21, visando as quatro identificadas denunciadas [e ainda, o Centro Hospitalar ... e pessoas não identificadas, mas integrantes das equipas de pediatria e enfermagem envolvidas].

O presente recurso não tem por objecto a verificação da suficiência ou insuficiência dos indícios, mas uma questão que lhe é prévia, a de saber, quais os elementos que devem, obrigatoriamente, constar do requerimento para abertura da instrução e quais as consequências da sua omissão.

… a decisão recorrida fundamenta a decidida rejeição na omissão de descrição de factos relativos ao tipo subjectivo de cada um dos crimes imputados, razão pela qual, a este aspecto nos cingiremos.

2. Dispõe o art. 287º, com a epígrafe «Requerimento para abertura da instrução», na parte em que agora releva:

2 – …

Como se vê, o requerimento não está sujeito a formalidades especiais, o que não significa que seja informal.

Com efeito, e em primeiro lugar, dele deve fazer parte uma síntese, das razões de facto e das razões de direito de discordância relativamente à acusação ou à não acusação.

Depois, devem ser indicados os actos de instrução pretendidos, enumerados os meios de prova produzidos no inquérito e que não foram valorados, e indicados os factos que, com tais actos e meios de prova, se pretende provar.

Finalmente e, para o caso dos autos, o que é mais importante, quando o requerimento for deduzido por assistente … é-lhe aplicável o disposto nas alíneas b) e c) do n.º 3 do artigo 283º do C. Processo Penal.

Resulta desta remissão, que no caso de instrução requerida pelo assistente … o respectivo requerimento deve conter, sob pena de nulidade e, portanto, obrigatoriamente, a narração, ainda que sintética, dos factos …

Vale isto dizer que, no segmento da narração dos factos [bem como, note-se, nos segmentos previstos nas demais alíneas do mesmo número], o requerimento de abertura de instrução do assistente deve estruturar-se, substancialmente, como uma verdadeira acusação, como uma acusação alternativa à que, na perspectiva do requerente da instrução, foi, mas não devia ter sido, omitida pelo Ministério Público.

O fundamento desta exigência é evidente. A estrutura acusatória do processo penal e a salvaguarda das garantias de defesa do arguido impõem a definição do thema decidendum e a sua tendencial imutabilidade.

O objecto do processo, brevitatis causa, é definido pela acusação que nele tenha sido deduzida e, portanto, pelos factos imputados ao arguido (cfr. art. 339º, nº 4 do C. Processo Penal). Tendo-se o Ministério Público abstido de acusar por crime público ou semipúblico e pretendendo o assistente, pela via da requerida instrução, que o arguido seja levado a julgamento pela prática de tal crime, é o requerimento por si deduzido que define o objecto da instrução e portanto, baliza, não só o âmbito da investigação a levar a efeito pelo juiz de instrução, como também o âmbito da própria decisão instrutória. E se dúvidas houvesse quanto à sujeição do juiz de instrução à vinculação temática definida pelo requerimento de abertura de instrução, são as mesmas dissipadas pelo disposto no art. 309º, nº 1 do C. Processo Penal, ao cominar com nulidade, a decisão instrutória que pronuncie o arguido por factos que constituam uma alteração substancial dos descritos naquele requerimento.

É, pois, inquestionável que o requerimento para abertura da instrução do assistente se deve estruturar como uma acusação …

3. A assistente pretende, pela via da requerida instrução, que as denunciadas venham a ser pronunciadas pela prática de crime de maus tratos, p. e p. pelo art. 152º-A, nº 1, a), de crime de falsificação ou contrafacção de documento, p. e p. pelo art. 256º, nºs 1, e) e 4, de crime de violação de segredo por funcionário, p. e p. pelo art. 383º, nº 1, todos do C. Penal, e de crime de acesso ilegítimo, p. e p. pelo art. 6º, nº 1, da Lei nº 109/2009, de 15 de Setembro.

O crime de maus tratos, tutelando os bens jurídicos dignidade pessoal e saúde

(diferentemente, Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código Penal, 3ª edição actualizada, 2015, Universidade Católica Editora, pág. Pág. 597, para quem os bens tutelados são, a integridade física e psíquica, a liberdade, a liberdade e autodeterminação sexual e a honra), tem como elementos constitutivos do respectivo tipo, na parte em que agora releva (alínea a), do nº 1 do art. 152º-A do C. Penal):

[Tipo objectivo]

- A inflicção pelo agente, a pessoa menor ou particularmente indefesa, em razão de idade, deficiência, doença ou gravidez, que tenha ao seu cuidado, à sua guarda, sob a responsabilidade da sua direcção ou educação ou a trabalhar ao seu serviço, de modo reiterado ou não, de maus tratos físicos ou psíquicos, incluindo castigos corporais, privações da liberdade e ofensas sexuais, ou a tratar cruelmente;

[Tipo subjectivo]

- O dolo genérico, o conhecimento e vontade de praticar o facto, com consciência da sua censurabilidade, em qualquer das modalidades previstas no art. 14º do C. Penal.

O crime de falsificação ou contrafacção de documento, tutelando o bem jurídico

segurança e credibilidade na força probatória de documento destinado ao tráfico jurídico, tem como elementos constitutivos do respectivo tipo, na parte em que agora releva (alínea e), do nº 1 do art. 256º do C. Penal):

[Tipo objectivo]

- Que o agente use documento falso, documento contrafeito por abuso da assinatura de outra pessoa, ou documento do qual conste, falsamente, facto jurídico relevante;

[Tipo subjectivo]

- O dolo genérico, o conhecimento e vontade de praticar o facto, com consciência da sua censurabilidade;

- O dolo específico, a intenção de causar prejuízo a outra pessoa ou ao Estado, de obter, para si ou para terceiro, benefício ilegítimo, ou de preparar, facilitar, executar ou encobrir outro crime.

O crime de violação de segredo por funcionário, tutelando os bens jurídicos dever de sigilo, a privacidade de outra pessoa, a vida, a integridade física e o património, tem como elementos constitutivos do respectivo tipo, na parte em que agora releva (nº 1 do art. 256º do C. Penal):

[Tipo objectivo]

- Que o agente, na qualidade de funcionário, sem a autorização devida, revele segredo de que tenha tomado conhecimento ou lhe tenha sido confiado no exercício das suas funções, ou cujo conhecimento lhe tenha sido facilitado pelo cargo que exerce;

[Tipo subjectivo]

- O dolo genérico, o conhecimento e vontade de praticar o facto, com consciência da sua censurabilidade;

- O dolo específico, a intenção de obter para si ou para terceiro, benefício, ou com a consciência de causar prejuízo ao interesse público ou a terceiro.

Finalmente, o crime de acesso ilegítimo, tutelando o bem jurídico segurança dos sistemas informáticos, tem como elementos constitutivos do respectivo tipo, na parte em que agora releva (nº 1 do art. 6º da Lei nº 109/2009, de 15 de Setembro):

[Tipo objectivo]

- Que o agente, sem permissão legal ou sem autorização do proprietário, ou de outro titular do direito do sistema, de qualquer modo aceda a um sistema informático;

[Tipo subjectivo]

- O dolo genérico, o conhecimento e vontade de praticar o facto, com consciência da sua censurabilidade.

Deste modo, na decorrência do que supra se deixou dito, impunha-se que a assistente, no requerimento apresentado, tivesse narrado factos susceptíveis de preencherem os tipos, objectivos e subjectivos, que acabamos de definir.

Aqui chegados.

4. Lido o requerimento para abertura da instrução da assistente … procede à descrição dos factos imputados às denunciadas de forma pouco clara e com ausência de um fio condutor …

Não obstante, resulta desta mesma leitura que a assistente localiza os factos descritos e imputados às denunciadas – e só destes nos iremos ocupar – como praticados nas instalações do Centro Hospitalar ..., situado nas ... e ocorridos no período compreendido entre 28 de Junho e 6 de Julho de 2020 (cfr. arts. 11º e 52º do requerimento).

Depois, resulta que as concretas condutas imputadas às denunciadas estão assim descritas:

- No dia 28 de Junho de 2020 a enfermeira-chefe CC disse à assistente e à sua mãe para que não fizessem barulho, para que as outras pessoas não soubessem que quem a visitava era uma mulher (art. 11º do requerimento);

- No dia seguinte a assistente teve alta, comunicada verbalmente pela médica obstetra BB, que também a informou de que a sua filha, FF, não tinha alta por ter o umbigo infectado (art. 12º do requerimento);

- A médica obstetra BB diagnosticou a assistente como padecendo de autismo, o que fez constar da nota de alta, e sem que tenha sido feito qualquer exame para o efeito, e de dar maus tratos à filha recém-nascida, o que nunca aconteceu (arts. 13º a 17 do requerimento);

- No dia 29 de Junho de 2020 … foi a assistente interpelada pela assistente social DD sobre a identidade do seu pai e a identidade do pai da recém-nascida, sobre a sua condição económica e social e sobre a identidade da pessoa – se seria a sua mãe – que a acompanhava no internamento, perguntas a que não respondeu, tendo-lhe ainda aquela dito que podia sair do hospital e visitar a filha, que aí permaneceria (arts. 22º a 24º do requerimento);

- A assistente insistiu para que lhe fosse dito o que se passava com a FF e a razão da referência ao seu autismo, tendo a enfermeira-chefe CC dito que iria rasurar essa informação no seu processo clínico, o que não fez, pois ela, embora falsa, consta do seu processo, registado no sistema do SNS (arts. 26º e 27º do requerimento);

- A enfermeira-chefe CC incorporou Mutismo Selectivo no documento de fls. 286 [trata-se de lapso manifesto, pois fls. 286 configura uma remessa à Magistrada titular do inquérito] (art. 28º do requerimento);

- Durante o tempo de internamento da assistente, a assistente social DD disse-lhe que não podia ser filha da sua mãe, nem irmã do seu irmão (art. 29º do requerimento);

- A dada altura, a enfermeira-chefe CC proibiu a assistente de ver televisão no quarto, de ouvir música no telemóvel com os phones e de sair do quarto, bem como tentou proibi-la de falar com a família através de telefone, o que não acontecia com as demais parturientes, que podiam conviver e passear pelos corredores (arts. 30º e 31º do requerimento);

- A enfermeira-chefe CC recusou abrir à assistente, com uma tesoura, uma embalagem de corta-unhas (art. 33º do requerimento);

- A enfermeira-chefe CC acordava a assistente às 6h para ir tomar banho, sob pena, de não o fazendo, perder essa possibilidade, e acordava-a durante a noite, para ir à casa de banho, quando era autónoma para essa função (arts. 35º e 36º do requerimento);

- As denunciadas disseram à assistente que a sua filha, devido à infecção umbilical, iria ser tratada com sal de cozinha, comunicação em que acreditou e a perturbou, e cujo tratamento punha a recém-nascida muito agitada (arts. 37º a 39º do requerimento);

- As denunciadas começaram por dizer à assistente que a filha não tinha alta por causa da infecção umbilical, depois, por causa de não ter o peso devido, depois, porque a assistente não tinha marido, tudo para criar uma ‘história’ que levasse à retirada da criança à mãe (arts. 40º e 41º do requerimento);

- As denunciadas disseram à assistente que era uma má mãe, mas deixavam-na com a filha várias horas por dia, a cuidar dela (art. 43º do requerimento);

As denunciadas diziam que a assistente era tolinha por ter dito que residia numa casa grande e com todas as condições, e diziam-lhe, bem como a terceiros, que o seu pai adoptivo era pedófilo, que o seu pai biológico se tinha suicidado, quando este faleceu em acidente, tendo sido atropelado (sic) por um comboio, e questionavam-na sobre a mudança de apelido, assim a magoando e fragilizando (arts. 45º a 47º do requerimento);

- A assistente social DD, numa conversa com a assistente, no quarto e à porta fechada, disse-lhe que tinha sido a mãe da assistente a fazer a sua sinalização, e deu-lhe um documento para assinar, do qual constava ser pai da sua filha, o seu pai adoptivo, o que não fez, pretendendo a denunciada coloca-la contra a família (arts. 49º e 50º do requerimento);

- A assistente social DD e a assistente social EE sinalizaram a menor FF, consultando o antigo processo da assistente, datado de 2009, dele constando informações falsas, nomeadamente, ter a assistente sido vítima de abuso sexual aos sete anos de idade, pelo padrasto, e sendo que a assistente atingiu já a maioridade, sem que lhe tenha sido pedida autorização para essa consulta e posterior divulgação (arts. 71º a 76º e 78º do requerimento).

Por outro lado, quer no corpo da motivação do recurso, quer nas conclusões pp) a rr), aí formuladas, a assistente imputa às denunciadas o que segue:

- (…) é claro que à Arguida BB, médica obstetra do ..., … os crimes de violação do segredo por funcionário, violação de segredo e de falsificação de documentos;

- À Arguida CC é atribuído diversos factos … maus tratos psicológicos na pessoa da Recorrente …

- Já às Assistentes Sociais do ... são atribuídos os factos de violação do segredo por funcionário, violação de segredo e de falsificação de documentos e do crime de acesso ilegítimo … e, por último é atribuído às Arguidas DD e EE … acesso ilegítimo a processo antigo da Recorrente,  … sem a autorização ou consentimento da Recorrente desrespeitando, para além de outras normas legais, o Regulamento da Protecção de Dados. Quanto à motivação, a real apenas as Arguidas poderão dizer, mas verifica-se que tudo o que foi feito pelas Arguidas, foi-o feito com a intenção de levar a que a menor fosse retirada à mãe, o que por um período de tempo efectivamente conseguiram.

Como se vê – e isto, independentemente da repercussão que possa, ou não, ter no objecto do recurso interposto –, a assistente, no requerimento para abertura da instrução imputou às denunciadas, sem distinção e sem referência a qualquer situação de co-autoria, a prática dos crimes de maus tratos, falsificação ou contrafacção de documento, violação de segredo por funcionário e acesso ilegítimo.

Porém, na motivação do recurso, ‘esclarecendo’, de alguma forma, as imputações feitas, vem restringi-las, imputando à denunciada BB a prática de um crime de falsificação ou contrafacção de documento e de um crime de violação de segredo por funcionário, à denunciada CC a prática de um crime de maus tratos, à denunciada DD a prática de um crime de falsificação ou contrafacção de documento, de um crime de violação de segredo por funcionário e de um crime de acesso ilegítimo e à denunciada EE a prática de um crime de falsificação ou contrafacção de documento, de um crime de violação de segredo por funcionário e de um crime de acesso ilegítimo.

Pois bem.

5. Confrontando a definição dos tipos legais imputados às denunciadas … temos por certo que não alegou factos susceptíveis de preencherem todos os elementos dos respectivos tipos subjectivos, relativamente a todos os tipos imputados.

Com efeito, em lado algum do requerimento se mostra alegado, com a fórmula que segue, ou com qualquer outra equivalente, ter cada uma das denunciadas agido sempre de forma livre, voluntária e consciente, sabendo que ao assim actuar, maltratava psiquicamente e de forma cruel a assistente, o que quis, sabendo usava documentos dos quais constavam factos que não tinham correspondência com a realidade, o que quis, com intenção de causar um dano à assistente, sabendo que, sem a necessária autorização, revelou factos sujeitos a sigilo, de que teve conhecimento no exercício das suas funções de funcionária, o que quis, e sabendo que acedeu a sistema informático, sem permissão legal ou autorização de quem de direito, bem sabendo também, que todas as condutas eram proibidas e punidas por lei.

Os crimes imputados pela assistente às denunciadas no requerimento para abertura da instrução são, todos, crimes dolosos.

Ao omitir no referido requerimento, o dolo de cada uma das denunciadas, relativamente aos crimes que aí lhes imputa e por cuja prática, pretende vê-las pronunciadas, a assistente, pura e simplesmente, deduziu uma acusação alternativa por factos que não constituem crime.

Esta deficiência do requerimento não é susceptível de sanação, mediante convite formulado à assistente para o seu aperfeiçoamento, por a tanto se opor a jurisprudência fixada pelo Acórdão Uniformizador de Jurisprudência nº 7/2005, de 12 de Maio de 2005 (DR, I-A, de 4 de Novembro de 2005).

Por outro lado, considerando os fundamentos do Acórdão nº 1/2015 do Supremo Tribunal de Justiça, de 20 de Novembro de 2014 (DR, I-A, 27 Janeiro 2015), também não seria lícito ao Mmo. Juiz de instrução suprir a omissão, na decisão instrutória.

Deste modo, a instrução requerida pela assistente carece de objecto, o que determina a sua inadmissibilidade legal, e constitui causa de rejeição do requerimento (art. 287º, nº 3 do C. processo Penal).

Não merece, pois, censura, o despacho recorrido que, deve ser mantido.

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III. DECISÃO

Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes do Tribunal da Relação, em negar provimento ao recurso e, em consequência, confirmam o despacho recorrido.

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Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 4 UC (art. 515º, nº 1, b) do C. Processo Penal e 8º, nº 9, do R. Custas Processuais e Tabela III, anexa).

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Coimbra, 22 de Fevereiro de 2023

Acórdão integralmente revisto por Vasques Osório – relator

Maria José Guerra – 1ª adjunta

Helena Bolieiro – 2ª adjunta