Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1588/19.8T8CBR-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ALBERTO RUÇO
Descritores: CONFIANÇA PARA ADOPÇÃO
CONFIANÇA DA MENOR A AVÓ
INEXISTÊNCIA DE LAÇOS AFECTIVOS ENTRE A AVÓ E A NETA
Data do Acordão: 01/23/2024
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO DE FAMÍLIA E MENORES DE COIMBRA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 25.º; 34.º E 38.º-A, DA LEI 147/99, DE 1/9
ARTIGOS 1978.º, DO CÓDIGO CIVIL
Sumário: A pretensão da mãe da menor, no sentido da filha se 5 anos ser entregue aos cuidados da avó paterna, manifestada numa altura em que a confiança para adoção estava equacionada no processo – artigo 1978.º do Código Civil e artigo 38.º-A da Lei n.º 147/99, de 1 de setembro –, sem que antes tivesse existido qualquer tentativa por parte da avó de evitar tal desfecho e sem esta mostrar ter condições habitacionais e laborais para cuidar da neta, não permitem ao tribunal enveredar por essa solução, pois, em termos de prognose, os autos indicam que não há factos que mostrem que o futuro iria ser diferente do passado; que a menor deixaria de estar institucionalizada ou não voltaria a ser institucionalizada em breve e que neste cenário de incerteza se estabeleceriam os vínculos afetivos próprios da filiação entre avó e neta.
Decisão Texto Integral:

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra,


*

Juiz relator………….....Alberto Augusto Vicente Ruço

1.º Juiz adjunto……….João Manuel Moreira do Carmo

2.º Juiz adjunto………. Rui António Correia Moura


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(…)

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Recorrente …………………..AA (mãe da menor BB)

Recorrido……………………..Ministério Público

I. Relatório

a) O presente recurso vem interposto do acórdão de 10 de outubro de 2023, o qual decretou a medida de confiança a instituição da menor BB, nascida em .../.../2019, com vista à sua adoção, ao abrigo do disposto nos artigos 35.º n.º 1, al. g) e 38.º-A, al. b) da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo, tendo confiado a mesma ao CAT ...» da Santa Casa da Misericórdia ....

Em breve síntese, o tribunal verificou que a menor se encontra em acolhimento residencial há 662 dias; que a mãe não aproveitou a sua integração numa comunidade de inserção com a filha, onde poderia ter adquirido competências parentais e estabelecido vínculos afetivos com a filha; não a visitando na instituição e desinteressando-se dela. Concluiu que a mãe da menor não tinha competências para cuidar da filha, outro tanto sucedendo com o pai, este a cumprir uma pena de prisão, restando como familiar disponível a avó paterna.  Porém, a avó paterna, que trabalha e vive em ..., visitou apenas a neta 3 vezes, durante o internamento no CAT em ... e contatou telefonicamente o CAT por 4 vezes; tem contatado mais assiduamente o CAT desde que foi visitada em ... pelas Técnicas da Segurança Social. Concluiu pela ausência de mudanças significativas que mostrassem existir um interesse perene em ter a neta consigo, diverso do manifestado até então.

Na ausência de respostas familiares à situação da menor e ponderando que que não era adequada a prorrogação da medida de acolhimento residencial, o tribunal decidiu aplicar, como se disse, a medida de confiança a instituição com vista a futura adoção.

b) É desta decisão que vem interposto recurso por parte de AA, mãe da menor, cujas conclusões são as seguintes:

«1. Entende a recorrente AA que os superiores interesses da sua filha BB são eficazmente salvaguardados se for aplicada in casu a medida de apoio junto da família, na pessoa da avó paterna CC.

2. O seu entendimento resulta da excelência de pessoa que é, e do facto incontornável de aquela desde o nascimento da BB a amar de uma forma incondicional.

3. Apesar das incompreensões e erros e porque não dizer, desgostos que quer a recorrente, quer o pai da menor, filho da Sr.ª D. CC lhe proporcionaram, aquela excelsa pessoa nunca misturou as coisas e de uma forma digamos que cega, sempre cuidou que nada faltasse à criança tanto a nível material como sobretudo a nível dos afectos.

4. É entendimento da recorrente que pelo menos por ora e nos seis meses subsequentes à tomada de uma decisão assertiva nestes autos, a menina deve permanecer na companhia da avó que para tanto se reinstalou numa nova morada com todas as condições para acolher a BB.

5. Volvidos seis meses sobre a aplicação da medida que aqui preconizámos, e na eventualidade improvável de a execução da medida não decorrer da forma que todos desejamos, ai já seria de aceitar a medida constante do dispositivo do acórdão.

6. Por ora, a medida aplicada é prematura e poderá vir a ser assaz perniciosa para o crescimento e desenvolvimento da BB, crescimento e desenvolvimentos esses não são indiferentes à pessoa da aqui recorrente.

7. Se existe alguém com um nexo de parentesco próximo da criança (avó) com disponibilidade para dela cuidar, alguém que inclusive mudou para uma casa maior para que as condições materiais a proporcionar à criança melhores exponencialmente, se existe uma pessoa cuja voz do sangue a impele para a amada neta, não se vislumbra que pelo menos por ora o tribunal esteja em condições de repudiar ou rejeitar uma solução desta natureza.

8. Não pode o tribunal preferir e optar pelo desconhecido em detrimento desta solução, sublinhe-se, não experimentada.

9. Consta do acórdão recorrido a fls. 22, que "Ainda que a avó tenha mudado de residência, não muda o desinteresse evidente que sente pela neta".

10. Este infeliz considerando, esta confusão entre coisas tão diferentes como amor e desinteresse, resulta ao que nos parece, do numero de visitas efectuadas pela avó paterna à neta domiciliada numa instituição em ....

11. Com efeito, a avó só lá foi três vezes.

12. Agora se atentarmos que não são permitidas visitas aos fins de semana e que a avó trabalha de segunda a sábado, compreende-se essa exiguidade de visitas e melhor se compreenderá se atentarmos no facto de essa avó não conduzir nem possuir viatura própria e a rede pública de transportes não ser particularmente generosa com essa vila do nordeste do distrito ....

13. Podemos dizer que as três visitas sem qualquer dose de exagero se consubstanciaram em três verdadeiras epopeias para a pessoa da avó paterna, só compensadas pela mutua alegria que ambas, avó e neta, fruíram pelo reencontro.

14. Assim, e no que tange à matéria julgada provada entendemos que os pontos 18, 20, 21, 25 e 26 foram incorrectamente julgados, devendo, face ao depoimento de CC, prestado entre o minuto 15:27:48 a 15:47:13, ser outrossim julgados como não provados, conforme constante da motivação.

Termos em que, e nos melhores de Direito que V. Exc. doutamente suprirão, deve o presente recurso ser considerado provido, alterando-se a decisão proferida conforme alegado.»

c) O Ministério Público respondeu ao recurso no sentido da manutenção da decisão.

Argumenta que os factos provados 18, 20, 21, 25 e 26, foram corretamente julgados e que o tribunal ponderou a entrega da criança à avó paterna e fê-lo de uma forma que não deixa dúvida, como se pode ver pelos excertos que a seguir se transcrevem:

“A avó paterna surge, uma vez mais, numa clara tentativa de impedir o ingresso de BB numa família.

Destes 662 dias em que BB está em acolhimento, no CAT de ..., à exceção de 27 dias com a mãe na AKTO, a avó esteve com ela três vezes!

Desde o acolhimento inicial da criança, em 17 de dezembro de 2021, e o dia 14 de julho de 2023, a avó contactou o CAT quatro vezes.

No mês de julho de 2023 contactou 11 vezes.

A partir de agosto de 2023 começou a contactar diariamente.

A avó começou a contactar o CAT depois de ter sido abordada pelo Núcleo de Assessoria Técnica ao Tribunal — Promoção e Proteção da Santa Casa da Misericórdia de ..., em sede de visita domiciliária, a 14 de julho de 2023.

A casa da avó avaliada pelo referido núcleo foi precisamente a mesma avaliada e cujas condições foram dadas como provadas no Acórdão anterior, a que acrescia um odor intenso a cães.

A avó, conforme resulta da factualidade provada no anterior Acórdão, não reconheceu qualquer constrangimento ao nível da habitação para receber BB em sua casa, pretendendo receber, no seu T1, onde já reside o seu neto, o namorado quando se desloca a ... e um vizinho idoso, não só a neta BB, mas também o seu filho DD, quando colocado em liberdade.

Não tendo reconhecido qualquer constrangimento à data, tendo recebido as Técnicas do Núcleo de Assessoria Técnica ao Tribunal — Promoção e Proteção da Santa Casa da Misericórdia de ... na mesma morada para fazer visita domiciliária e não tendo informado da sua atual morada, mal se compreende que a avó tenha efetuado qualquer mudança de habitação.

Ainda que a avó tenha mudado de residência, não muda o desinteresse evidente que sente por esta neta.

Em 662 dias de acolhimento só em três viu e esteve com a neta.

Entre 17 de dezembro de 2021 e o dia 14 de julho de 2023 — 574 dias! - a avó contactou o CAT quatro vezes.

Só após a visita domiciliária começou a contactar e, com sucesso, deitando por terra o argumento de que contactava e não a atendiam.

Não há outra justificação para o interesse recente da avó diferente da vontade de impedir a adoção da neta, nem a avó o alegou ou referiu em sede de debate.

Mas esse interesse recente nem sequer a impeliu a contactar com a Técnica Coordenadora do SATT para se apresentar como alternativa para o projeto de vida da criança, nem sequer para informar da sua atual morada, bem sabendo que as visitas domiciliárias tinham sido realizadas na morada que disse ser a sua, argumentando agora ter mudado, não sabendo dizer para onde.

Não é uma casa nova que altera o interesse ou a falta dele.

A avó teve 662 dias para se apresentar como alterativa para o projeto de vida da BB e não são conhecidas quaisquer mudanças que permitam considera-la como tal.”

“Admitindo que os constrangimentos com a habitação estão ultrapassados e que a nova casa tem condições para acolher todas estas pessoas, há que avaliar o vínculo que existe entre avó e neta e que possa justificar que a criança continue acolhida a aguardar pela integração no agregado familiar desta avó.

Em 5 de julho de 2019, BB ficou a residir junto da tia materna EE, não sendo conhecido qualquer contacto com avó paterna.”

“Entretanto, a menina foi acolhida no CAT a 17 de dezembro de 2021.

Não podendo ignorar o acolhimento da neta, cujos familiares pretendiam que ficasse consigo, a avó não contactou o CAT nesse mês de acolhimento, apenas fez o primeiro contacto telefónico a 27 de janeiro, mais de um mês depois do acolhimento, e, depois disso, só voltou a contactar a 10, 14 e 27 de fevereiro de 2022.

Mais, a avó esteve de férias em janeiro de 2022 e não foi ver a menina.

A avó esteve completamente ausente da vida da criança até 14 de julho de 2023, até ser contacta pelo Núcleo de Assessoria Técnica ao Tribunal — Promoção e Proteção da Santa Casa da Misericórdia de ... e, seguramente, equacionar a possibilidade de a criança ingressar numa nova família.

Não há qualquer justificação para a ausência da avó da vida da neta por quase um ano e meio.

A avó nunca demonstrou uma preocupação genuína com a neta, não procurou saber da criança, não cuidou de se inteirar da vida dela.

Esta tentativa de última hora de procurar a criança, mais não é do que um apaziguar de consciência, de uma vontade de ser considerada como a avó que “lutou pela neta”. Estes dois meses e meio de interesse pela criança não apagam os dezanove meses de total desinteresse.”

Aqui chegados, resta-nos dizer que concordamos, na íntegra, com o douto acórdão recorrido, não merecendo qualquer reparo, encontrando-se clara e devidamente fundamentado e sem qualquer nulidade ou erro de julgamento. 

Termos em que deve negar-se provimento ao recurso interposto pela progenitora, mantendo-se o douto acórdão proferido, como é de JUSTIÇA!»

II. Objeto do recurso.

As questões que este recurso coloca são as seguintes:

(I) A primeira questão respeita à impugnação da matéria de facto.

A recorrente pretende que os factos dos pontos 18, 20, 21, 25 e 26, face ao depoimento de CC, sejam julgados como não provados.

 (II) Face à matéria de facto provada, verificar se a decisão recorrida deve ser revogada e substituída por outra que decrete a medida de apoio junto da família, na pessoa da avó paterna CC.

III. Fundamentação

a) Impugnação da matéria de facto

Factos provados n.º 18, 20 e 21.

«18. A avó mantinha-se na casa avaliada antes do debate que culminou na decisão de 20 de junho de 2022.»

«20. A avó paterna informou, em sede de debate, ter mudado de residência.»

«21. A avó paterna, na data anterior ao debate, não informou o SATT de ... nem o Núcleo de Assessoria Técnica ao Tribunal — Promoção e Proteção da Santa Casa da Misericórdia de ... da sua morada atual.»

Vejamos. Quanto a esta factualidade, a qual não se mostra relevante para a decisão final, resultou do depoimento da avó paterna que a dada altura mudou de residência; disse que foi residir para ... (minuto 01.02), para morada que não soube indicar, mas que tinha o respetivo endereço escrito num papel (minuto 01:11).

Consta também de fls. 261 (página 3 do relatório da Seg. Social, de 22 de setembro de 2023) que a avó paterna informou o SATT, por telefone, em 22 de setembro de 2023, que tinha mudado de residência para a zona de ..., tendo dito que não sabia indicar a morada.

Ignora-se se prestou igual informação ao Núcleo de Assessoria Técnica ao Tribunal — Promoção e Proteção da Santa Casa da Misericórdia de ....

Resulta da «Informação» remetida aos autos, datada de 20 de julho de 2023, sobre uma visita domiciliária à habitação da avó paterna, que esta, nesta data, ainda não tinha mudado de residência para ....

Face a esta factualidade, decide-se o seguinte:

O facto impugnado n.º 18 mantém-se porque não há evidência de que efetivamente tenha mudado para outra casa em ... pois não existe verificação de tal facto, designadamente por parte da Segurança Social.

O facto provado 20 fica com esta redação: «20. A avó paterna declarou, em sede de debate, ter mudado de residência, e antes tinha referido ao SATT, por telefone, em 22 de setembro de 2023, que tinha mudado de residência para a zona de ..., não tendo indicado então a morada.»

O facto 21 fica com esta redação: «21. A avó paterna, na data anterior ao debate, disse ao SATT de ... que tinha mudado de residência para ..., mas não informou sobre o respetivo endereço.»

Factos n.º 25 e 26.

«25. A avó paterna contactou o CAT telefonicamente nos dias 14, 18, 19, 20, 22, 23, 25, 27, 29, 30 e 31 de julho de 2023 e diariamente a partir de 1 de agosto de 2023.

«26. Visitou a criança no CAT nos dias 24 de julho, 18 de agosto e 12 de setembro de 2023, na companhia do irmão consanguíneo da criança.»

Os factos n.º 25 e 26 constam da informação fornecida pela Segurança Social e que se encontra a fls. 260 verso do processo físico. E a recorrente nas alegações não impugna esta factualidade, diz sim que fez mais tentativas, em data anterior, mas que telefonava para um número de telefone «fixo» e ninguém atendia, podendo isso ter ficado a dever-se ao facto de estar desativado.

Estas declarações da avó paterna poderão corresponder à realidade histórica ou não, mas não é possível formar a convicção nesse sentido. Por conseguinte, não há fundamento para alterar a factualidade estabelecida em 1.ª instância.

b) 1. Matéria de facto – Factos provados (mantém-se a numeração constante do acórdão recorrido, incluindo a sequência 1, 2, 3, 11…).

1. BB nasceu no dia .../.../2019 e é filha de DD e de AA.

2. Em 5 de julho de 2019 foi celebrado acordo de promoção e proteção tendo sido aplicada à criança a medida de promoção e proteção de apoio junto de outro familiar, concretizada junto da tia materna EE.

3. Em 15 de dezembro de 2021 foi aplicada provisoriamente à criança a medida de promoção e proteção de acolhimento residencial, ficando acolhida no CAT ...» da Santa Casa da Misericórdia ..., onde foi acolhida a 17 de dezembro de 2021.

11. Em 20 de junho de 2022, na sequência de debate judicial, foi proferida decisão tendo sido aplicada à menina BB a medida de promoção e proteção de apoio junto dos pais, concretizada na pessoa da mãe, com obrigação de a mãe permanecer em Comunidade de Inserção destinada ao acolhimento de mulheres com filhos, com o propósito de adquirir competência pessoais, incluindo ao nível da parentalidade.

12. Em 18 de novembro de 2022, BB e a mãe integraram a AKTO­ Associação para a Promoção dos Direitos Humanos.

13. Em 14 de dezembro de 2022 foi aplicada provisoriamente à criança a medida de promoção e proteção de acolhimento residencial, ficando acolhida no CAT ... da Santa Casa da Misericórdia ..., onde foi acolhida a 15 de dezembro de 2022.

(Decisão de 20 de junho de 2022)

14. Em 20 de junho de 2022, na sequência de debate judicial, foi proferida decisão, transitada em julgado, tendo sido, além do mais, considerada como provada a seguinte factualidade:

4. Antes do acolhimento, BB viveu com a mãe em casa da tia EE, onde residiam oito pessoas (sendo quatro menores), tratando-se de apartamento de tipologia T2.

5. A mãe da BB teve um namorado, de nome FF.

6. AA referiu à avó paterna da menor que FF era agressivo, lhe batia e controlava com quem ela falava.

7. A Tia EE não pretende continuar ou ficar responsável pela BB, mostrando-se saturada perante um agregado tão numeroso num apartamento T2.

8. A Tia EE entende que AA não reúne condições para cuidar da filha, nem a levar ao infantário, tendo de ser ela própria a entregar e recolher a BB na creche quando estava aos seus cuidados.

9. A Tia EE propôs que a menor ficasse aos cuidados da avó paterna, podendo assim ficar com a AA no seu agregado familiar e cuidar da mesma.

10. A Tia EE entende que AA está deprimida e que o que estará na origem da depressão da AA é o facto de o FF ir para França, sendo que AA pretendia ir junto, mas levando a filha.

11. A Avó trabalha num restaurante, de segunda-feira a sábado, com horário das 10h30 às 16h00 e das 18h30 às 23h00.

12. Reside com um neto, irmão consanguíneo de BB, num apartamento de tipologia T1, dormindo a avó num sofá e ocupando o neto uma cama colocada no primeiro piso, sendo sua pretensão que a neta dormisse consigo no sofá.

13. A Avó paterna tem um namorado que pernoita no apartamento quando se desloca a ....

14. A Avó deu guarida a um vizinho idoso cuja habitação se encontrava irregular no pagamento e com falta de higiene.

15. A Avó paterna e o irmão consanguíneo de BB beneficiam de apoio ao nível das refeições, de segunda a sexta-feira.

16. A Avó paterna, em debate, afirmou estar disponível para cuidar da BB, com o apoio de uma sua filha de nome GG, aos cuidados de quem ficaria a menor quando a avó estivesse a trabalhar.

17. Não reconheceu qualquer constrangimento ao nível da habitação para ali residir também a BB, a mãe e o pai quando for colocado em liberdade.

18. Em julho de 2021 foi proposto à Mãe que integrasse uma casa de acolhimento com a BB, o que a mãe declinou.

19. Em 20 de novembro de 2021, EE participou à PSP ... o desaparecimento da mãe da menina, referindo que esta se ausentou do quarto onde pernoita, deixando a filha sozinha, cerca das 2:00 horas, tendo sido encontrada cerca das 12:00 horas do mesmo dia.

20. A mãe da menor está a ter acompanhamento médico e toma medicação para problemas de saúde que identifica como depressão.

21. A mãe da menor está a residir com a Tia EE.

22. Não trabalha.

23. A mãe da menor pretende residir com a filha BB em casa da avó paterna da menina.

24. A mãe da menor concordou em ser integrada em Comunidade de Inserção destinada ao acolhimento de mulheres com filhos, com o propósito de adquirir competência pessoais, incluindo ao nível da parentalidade.

25. Desde o acolhimento e por referência a 14 de abril de 2022, os contactos da família com o CAT foram os seguintes:

- Visita da mãe e da Tia EE a 12 de janeiro de 2022 (manifestaram vontade de marcar visita para o dia do aniversário da BB, 24 de janeiro, não o fizeram, nem tão pouco contataram a casa nesse mesmo dia para falarem com a menina);

- Visita da mãe, da Tia EE e das primas a 20 de maio de 2022;

- 3 contactos telefónicos da Tia EE (17 e 21 de dezembro de 2021 e 16 de  maio de 2022);

- 4 contactos telefónico da Mãe (17 de dezembro de 2021,4 e 6 de maio de 2022 e 2 de junho de 2022);

-4 contacto telefónico da Avó paterna (27 de janeiro, 10, 14 e 27 de fevereiro de 2022).

26. A avó paterna esteve de férias no mês de janeiro de 2022.

27. Foi solicitada à FPCEUC a realização de avaliação psicológica à mãe da menor, incluindo ao nível das competências parentais.

(Decisão de 14 de dezembro de 2022)

15. Em 14 de dezembro de 2022, foi proferida decisão de aplicação de medida provisória de promoção e proteção de acolhimento residencial, transitada em julgado, tendo sido, além do mais, considerada como provada a seguinte factualidade:

- BB tem 3 anos;

- Está a beneficiar de medida de promoção e proteção de apoio junto dos pais, concretizada na pessoa da mãe, com obrigação de a mãe permanecer em Comunidade de Inserção destinada ao acolhimento de mulheres com filhos, com o propósito de adquirir competência pessoais, incluindo ao nível da parentalidade;

- Esta medida concretizou-se a 18 de novembro de 2022, com o acolhimento de mãe e filha na AKTO- Associação para a Promoção dos Direitos Humanos;

- Já beneficiou de medida de apoio junto de outro familiar (a tia materna EE);

- E beneficiou de medida de acolhimento residencial no CAT de ..., entre 17 de dezembro de 2021 e 18 de novembro de 2022;

- No início do acolhimento residencial a menor demonstrava inexistência de regras, não sabia estar sentada à mesa e comia com as mãos;

- Durante o acolhimento revelou-se uma criança bem-disposta, sociável, muito ativa, a exigir supervisão constante dos cuidadores;

- Tem muita dificuldade na linguagem;

- Durante o acolhimento e por referência a 14 de abril de 2022, os  contactos da família com o HH foram os seguintes:

- Visita da mãe e da Tia EE a 12 de janeiro de 2022 (manifestaram vontade de marcar visita para o dia do aniversário da BB, 24 de janeiro, não o fizeram, nem tão pouco contataram a casa nesse mesmo dia para falarem com a menina);

- Visita da mãe, da Tia EE e das primas a 20 de maio de 2022;

- 3 contactos telefónicos da Tia EE (17 e 21 de dezembro de 2021 e 16 de maio de 2022);

- 4 contactos telefónico da Mãe (17 de dezembro de 2021, 4 e 6 de maio de 2022 e 2 de junho de 2022);

-4 contactos telefónicos da Avó paterna (27 de janeiro, 10, 14 e 27 de fevereiro de 2022).

- Depois de 7 de junho de 2022, os contactos da família com o CAT foram os seguintes:

- Visita presencial da mãe em 23/08/2022, apenas de 20 minutos;

- 5 contactos telefónicos da mãe nos dias 05/07, 18/07, 18/08,08/10 e 20/10/2022.

- Durante a permanência de mãe e filha na AKTO- Associação para a Promoção dos Direitos Humanos, a mãe tem relevado não ter paciência para dar comida à filha, gritando com ela e chamando-lhe nomes ou sentando-se de costas para ela e deixando-a a chorar;

- BB riscou paredes na AKTO e a mãe recusou-se a limpá-Ias, dizendo à Técnica "tu é que tens de limpar";

- BB; na presença da mãe, destrói portas, batendo com objetos, risca as paredes e bate nos monitores, sem que a mãe a repreenda ou consiga acalmar;

- A mãe puxou com força o cabeça de BB;

- No dia 6 de dezembro de 2022, na AKTO, a mãe deu um estalo na cara de BB,'

- A mãe grita no interior da AKTO, dirige ameaças aos funcionários da Casa e à filha;

- A AKTO- Associação para a Promoção dos Direitos Humanos está indisponível para continuar a acolher a BB e a mãe, face aos reflexos negativos do comportamento da mãe na filha e nos demais utentes da casa, incluindo crianças;

(A família depois do segundo acolhimento de BB, concretizado a 15 de dezembro de 2022)

16. Desde 20 de junho de 2022 (data da prolação da decisão subsequente ao debate) os familiares de BB não tomaram a iniciativa de contactar com a Técnica Coordenadora do SATT para se inteirarem da situação da criança.

(A avó paterna CC)

17. O Núcleo de Assessoria Técnica ao Tribunal - Promoção e Proteção da Santa Casa da Misericórdia de ... realizou visita domiciliária a casa da avó paterna, CC, a 14 de julho de 2023.

18. A avó mantinha-se na casa avaliada antes do debate que culminou na decisão de 20 de junho de 2022.

19. A casa tinha odor intenso a cães.

20. A avó paterna declarou, em sede de debate, ter mudado de residência, e antes tinha referido ao SATT, por telefone, em 22 de setembro de 2023, que tinha mudado de residência para a zona de ..., não tendo indicado então a morada.

21. A avó paterna, na data anterior ao debate, disse ao SATT de ... que tinha mudado de residência para ..., mas não informou sobre o respetivo endereço.

22. A Técnica Coordenadora conseguiu contactar duas vezes com a avó paterna.

23. A primeira, imediatamente a seguir ao segundo acolhimento de BB, tendo a avó paterna informado que a mãe de BB estava a viver consigo.

24. A segunda, na 6.ª feira, 22 de setembro de 2023, três dias antes da data agendada para o debate judicial, dia útil imediatamente anterior, tendo a avó relatado nada saber da mãe da criança e ter mudado de residência, não sabendo indicar a sua morada atual.

25. A avó paterna contactou o CAT telefonicamente nos dias 14, 18, 19, 20, 22, 23, 25, 27, 29, 30 e 31 de julho de 2023 e diariamente a partir de 1 de agosto de 2023.

26. Visitou a criança no CAT nos dias 24 de julho, 18 de agosto e 12 de setembro de 2023, na companhia do irmão consanguíneo da criança.

(o pai DD)

27. O pai mantém-se em reclusão.

28. O pai não contactou nem visitou BB.

(A mãe AA)

29. A mãe não compareceu nas sessões agendadas pela FPCEUC tendo em vista a sua avaliação psicológica, incluindo ao nível das competências parentais.

30. A Técnica Coordenadora tentou, sem sucesso, contactar a mãe de BB.

31. A mãe contactou o CAT telefonicamente nos dias 15 e 17 de dezembro de 2022, 9, 10, 11, 13, 16, 17, 24, 26, 28 e 30 de janeiro de 2023, 2, 10, 11 e 15 de   fevereiro de 2023, 13 de março de 2023 e 2 de junho de 2023.

32. A mãe não visitou a criança no CAT.

(A tia EE)

33. A Técnica Coordenadora tentou, sem sucesso, contactar a tia EE.

34. A tia EE contactou o CAT a 14 de maio de 2023 para agendar visita e contactou no dia 16 de maio de 2023 para cancelar a visita.

35. Os familiares das crianças acolhidas no CAT ... da Santa Casa da Misericórdia ... podem contactar telefonicamente o CAT, todos os dias, entre as 9h e as 19h.

36. Os familiares das crianças acolhidas no CAT ... da Santa Casa da Misericórdia ... podem conviver com as crianças em qualquer dia da semana.

37. A primeira visita é supervisionada por um elemento da equipa técnica do CAT e tem de ser agendada de 2.ª a sábado.

2. Matéria de facto – Factos não provados

A avó paterna, na data anterior ao debate, não informou o Núcleo de Assessoria Técnica ao Tribunal — Promoção e Proteção da Santa Casa da Misericórdia de ... da sua morada atual.

c) Apreciação da restante questão objeto do recurso

Cumpre ponderar se a decisão recorrida deve ser revogada e substituída por outra que decrete a medida de apoio junto da família, na pessoa da avó paterna CC.

A resposta a esta questão é negativa, pelas seguintes razões:

1 – Como vem referido no acórdão recorrido, invocando-se o disposto no artigo 34.º da Lei n.º 147/99, de 1 de Setembro, as medidas de promoção dos direitos e de proteção das crianças e dos jovens em perigo, visam afastar o perigo em que estes se encontram, proporcionando-lhes as condições que permitam proteger e promover a sua segurança, saúde, formação, educação, bem-estar e desenvolvi­mento integral, bem como garantir a recuperação física e psicológica das crianças e jovens vítimas de qualquer forma de exploração ou abuso.

Tais medidas de promoção e protecção são as que constam do artigo 25.º da mesma lei, a saber: a) Apoio junto dos pais; b) Apoio junto de outro familiar; c) Confiança a pessoa idónea; d) Apoio para a autonomia de vida; e) Acolhimento familiar; f) Acolhimento em instituição.

No caso dos autos, foi aplicada a medida de confiança a instituição com vista a futura adoção, tendo-se afastado a prorrogação da medida de acolhimento em instituição.

A decisão baseou-se no facto dos pais da menor não revelarem capacidade para cuidar dela, não existindo alternativa viável dentro da família, nomeadamente por parte da avó paterna.

A medida aplicada está prevista no artigo 38.º-A da mesma lei onde se determina que «A medida de confiança a pessoa seleccionada para a adopção ou a instituição com vista a futura adopção, aplicável quando se verifique alguma das situações previstas no artigo 1978.º do Código Civil, consiste …»

Por sua vez, o artigo 1978.º (Confiança com vista a futura adopção) do Código Civil, tem a seguinte redacção, na parte que interessa a este caso:

«1 - Com vista a futura adopção, o tribunal pode confiar o menor a casal, a pessoa singular ou a instituição quando não existam ou se encontrem seriamente comprometidos os vínculos afectivos próprios da filiação, pela verificação objectiva de qualquer das seguintes situações:

a) (…); b) (…);

d) Se os pais, por acção ou omissão, mesmo que por manifesta incapacidade devida a razões de doença mental, puserem em perigo grave a segurança, a saúde, a formação, a educação ou o desenvolvimento do menor;

e) Se os pais do menor acolhido por um particular ou por uma instituição tiverem revelado manifesto desinteresse pelo filho, em termos de comprometer seriamente a qualidade e a continuidade daqueles vínculos, durante, pelo menos, os três meses que precederam o pedido de confiança.

2 - Na verificação das situações previstas no número anterior o tribunal deve atender prioritariamente aos direitos e interesses do menor.

3 - Considera-se que o menor se encontra em perigo quando se verificar alguma das situações assim qualificadas pela legislação relativa à protecção e à promoção dos direitos dos menores.

4 – (…). 5 – (…). 6 – (…)»

O critério para decidir se se deve ordenar a confiança do menor a uma instituição com vista a futura adoção consiste, pois, em apurar se ocorre uma situação em que se verifica, objetivamente, a inexistência de vínculos afetivos próprios da filiação entre pais e filhos ou uma situação em que tais vínculos estejam «seriamente comprometidos».

O que pretende a lei dizer com isto?

Um «vínculo» significa o mesmo que «ligação entre dois ou mais polos» e tratando-se de um vínculo afetivo, ficamos a saber que a sua natureza pertence à realidade mental, emocional, da pessoa, tratando-se, pois, de um estado mental relativo a sentimentos.

Tratando-se de vínculo afetivo próprio da filiação estamos então perante um sentimento que nasce e se desenvolve entre os filhos e os pais e vice-versa, recíproco, resultante do facto dos filhos descenderem biologicamente dos pais e se estabelecer naturalmente uma convivência que se inicia imediatamente a seguir ao seu nascimento, gerando sentimentos mútuos de pertença e união, diferentes de quaisquer outros, reforçados ainda pela própria sociedade que os valoriza e institucionaliza como algo de positivo e de perene, como fazendo parte da «natureza das coisas», exigindo e esperando a sociedade, em qualquer caso, a sua verificação.

Trata-se, pois, de uma zona da realidade pertencente ao mundo da mente o que implica, dada a sua natureza, que não possa ser apreendida diretamente pelos nossos sentidos.

Por conseguinte, quando tal vínculo existe (ou quando não existe) só pode ser detetado por terceiros quando se revela na atuação dos pais ou dos filhos, de forma consciente, intencional e livre, no sentido de, tratando-se dos pais, zelarem pelos filhos, disponibilizando-lhes meios de subsistência e segurança enquanto deles necessitarem e na manifestação de um sentimento de amor paternal que tende a perdurar pela vida inteira, colocando os pais os interesses dos filhos em primeiro lugar e os seus, em iguais domínios, em segundo lugar.

E, nos filhos, revela-se no facto de tratarem os progenitores por pais, querendo estar com eles, esperando deles o sustento, a segurança e manifestações de afetividade filial.

Sentindo uns e outros a falta física ou emocional do outro como algo de negativo e sofrendo ou rejubilando emocional e reciprocamente com as respetivas desventuras ou sucessos.

Dada a natureza imaterial destes vínculos, para aferirmos da sua existência ou da sua não existência ou, ainda, da medida dessa existência, resta-nos, como se disse, a interpretação objetiva das ações dos pais e dos filhos, daquelas ações com capacidade para revelarem a existência de tais vínculos ou para os negarem.

As situações enumeradas nas diversas alíneas do n.º 1 do artigo 1978.º do Código Civil, mostram, precisamente, situações objetivas que indiciam a ausência de tais vínculos ou o seu sério comprometimento.

Sintetizando:

Os «vínculos afetivos próprios da filiação», a que alude o n.º 1 do artigo 1978.º do Código Civil, são o resultado de um processo que se prolonga no tempo, sujeito, inclusive, a retrocessos e que, por isso, exige para se formarem e manterem que os pais se dediquem aos filhos de forma permanente, verificando e satisfazendo as suas necessidades físicas e emocionais, corrigindo-lhes as suas ações desadequadas e mostrando-lhes por palavras e ações o afeto que sentem por eles e fazendo-lhes sentir que eles têm valor para os pais e que aquela relação tem existido assim, existe e existirá para sempre.

As ações dos pais e dos filhos, na sua mútua convivência, são factos que expressam os seus estados mentais, cognitivos e afetivos, e revelam se esses «vínculos próprios da filiação» existem, não existem, estão em processo de construção, de consolidação ou desagregação e permitem, ainda, efetuar um juízo de prognose sobre se no futuro tais vínculos serão ou não algo de existente, de real, de efetivo.

Se os pais não conseguem cumprir os deveres de pais e com isso impedem no presente a formação dos «vínculos próprios da filiação» e idêntico prognóstico é feito para o futuro, o interesse dos filhos indica que o caminho a seguir é o da adoção.

Nas ações dos pais e outros familiares também se compreende o seu próprio comportamento declarativo, aquilo que eles dizem a propósito desta matéria. Assim, como os compromissos que eles assumem; aquilo que dizem pretender fazer, cumprindo, no entanto, ter na devida conta que aquilo que os pais dizem pode não corresponder ao que eles têm, na verdade, em mente, seja porque dizem aquilo que sabem dever ser dito, para evitarem a censura social, seja por qualquer outro motivo, como seja o caso de garantirem o acesso a prestações sociais.

E, mesmo quando há correspondência entre o que dizem e o seu genuíno desejo, podem não ter força de vontade para, depois, no dia-a-dia, dirigirem a sua ação de acordo com aquilo que sabem ser os seus deveres, não sendo de colocar de parte casos de ausência de capacidade permanente para cumprir os deveres da paternidade.

Daí que, dada a natureza não percecionável de tais vínculos, o artigo 1978.º do Código Civil, aluda no seu n.º 1 à inexistência ou comprometimento sério dos vínculos afetivos próprios da filiação e de seguida enumere situações factuais, suscetíveis de revelarem a inexistência ou o comprometimento desses vínculos.

2 – Vejamos agora o caso concreto.

A questão colocada no recurso pela mãe da menor não respeita a ela mesma ou ao pai da criança, mas à avó paterna, a quem pretende que a filha seja entregue, valendo quanto à avó, em geral, o que acabou de ser referido a respeito dos pais.

Quanto aos pais verifica-se, efetivamente, que nunca conseguiram criar condições para terem a criança nos respetivos agregados familiares, salvo a mãe, por curtos lapsos de tempo, sob orientação da Segurança Social, motivo pelo qual a criança voltou a ser institucionalizada.

Verifica-se, assim, que durante a curta vida da menor, nascida em .../.../2019, há 5 anos, não se estabeleceram quaisquer laços afetivos próprios da filiação entre a criança, pais e avó paterna, por ausência de convívio.

É certo que a avó paterna ultimamente tem mostrado interesse em cuidar da neta e tê-la no seu agregado familiar.

Porém, o histórico da relação entre neta e avó paterna, porventura fruto da falta de recurso económicos e dificuldades que essa situação acarreta, mostra a quase inexistência desse relacionamento.

Com efeito, a criança foi acolhida no CAT ...» da Santa Casa da Misericórdia ... em 17 de dezembro de 2021 – facto provado n.º 3.

Em 18 de novembro de 2022, a menor e a sua mãe integraram a AKTO­ Associação para a Promoção dos Direitos Humanos – facto 13.

Antes de decorrido um mês, a criança voltou a ser acolhida no CAT ...» da Santa Casa da Misericórdia ... em 15 de dezembro de 2022 – facto provado n.º 13.

Desde o acolhimento e por referência a 14 de abril de 2022, os contactos de familiares com o CAT foram os seguintes: 4 contactos telefónicos da Avó paterna (27 de janeiro, 10, 14 e 27 de fevereiro de 2022) – facto provado n.º 14 (25).

Desde 20 de junho de 2022 (data da prolação da decisão subsequente ao debate) os familiares de BB não tomaram a iniciativa de contactar com a Técnica Coordenadora do SATT para se inteirarem da situação da criança – facto provado n.º 16.

A avó paterna contactou o CAT telefonicamente nos dias 14, 18, 19, 20, 22, 23, 25, 27, 29, 30 e 31 de julho de 2023 e diariamente a partir de 1 de agosto de 2023 – facto provado n.º 25 – E visitou a criança no CAT nos dias 24 de julho, 18 de agosto e 12 de setembro de 2023, na companhia do irmão consanguíneo da criança – facto provado n.º 26.

Verifica-se que a avó paterna entre 17 de dezembro de 2021 e 24 de julho de 2023 não contatou presencialmente com a neta e depois fê-lo apenas por 3 vezes.

As condições de trabalho, as distâncias e as dificuldades económicas terão contribuído certamente para este relacionamento débil.

Ora, nestas condições, não se estabeleceram laços afetivos próprios da filiação entre neta e avó paterna e, antes disso, se algo se estabeleceu neste âmbito desvaneceu-se pela ausência de continuidade.

Resultou provado – facto provado n.º 14 (16) – que «A Avó paterna, em debate, afirmou estar disponível para cuidar da BB, com o apoio de uma sua filha de nome GG, aos cuidados de quem ficaria a menor quando a avó estivesse a trabalhar.»

A Avó trabalha num restaurante, de segunda-feira a sábado, com horário das 10:30 às 16:00 e das 18:30 às 23:00 – facto provado n.º 14 (11).

Poderá esta manifestação de disponibilidade ser suficiente para alterar o decidido no acórdão recorrido?

A resposta é negativa.

Com efeito, esta disponibilidade manifestou-se numa altura em que a confiança para adoção estava equacionada no processo e surge objetivamente como uma tentativa de evitar que se abra este caminho.

Poderia ser diferente se em vez da disponibilidade a avó paterna já tivesse requerida anteriormente, antes mesmo de se colocar a hipótese da confiança, que a neta lhe fosse entregue, para cuidar dela, e mostrasse depois, com ações concretas, querer mesmo concretizar esse projeto.

Tal não ocorreu.

Por conseguinte, esta vontade agora manifestada, não se apoiando em factos objetivos do passado, capazes e levar o tribunal a concluir que o futuro irá ser oposto ao que conhecemos do passado, não permite formar a convicção de que, revogando o decidido no acórdão recorrido, ficaria fundadamente afastada a hipótese da menor deixar a breve trecho de estar institucionalizada, como está, ou de não voltar, em breve, a ser institucionalizada, caso a neta lhe fosse entregue. E que, neste cenário incerto, se estabeleceriam os vínculos afetivos próprios da filiação entre avó e neta.

Certamente se argumentará que não, que o passado é passado e não se iria repetir.

Como se disse, em termos de prognose, os autos indicam que não há factos que mostrem ou façam supor que o futuro irá ser diferente do passado, caso se revogasse a decisão recorrida com vista a entregar a menor aos cuidados da avó paterna.

Acresce que apesar da sua afirmada boa vontade, a avó não mostrou ter condições para receber a neta, pois trabalha de sexta a sábado e teria de deixar a menor a cargo de uma sua filha quanto à qual nada se sabe das suas reais disponibilidades e aptidões.

Concluindo.

Como se referiu no acórdão do STJ de 30 de junho de 2011, «…o tribunal deve ter sempre em conta, prioritariamente, o superior interesse do menor, pelo que a respectiva aferição deve ser feita objectivamente: a medida em causa não tem como objectivo punir ou censurar os pais, mas garantir a prossecução do interesse do menor» (processo n.º 52/08,5TBCMN, in www.dgsi.pt).

Deve, por isso, manter-se a decisão da 1.ª instância no sentido de encaminhar a menor para a adoção, por se verificarem factos que mostram com objetividade não existirem entre a menor, pais e avó paterna «os vínculos afetivos próprios da filiação» e não ser previsível que o futuro venha a ser diverso do passado e se pudessem vir a estabelecer.

Nestas condições, o interesse da menor aponta no sentido de se pôr fim imediato a esta situação e se procure uma alternativa familiar para a criança que permita inseri-la numa família, quanto antes, dados os prejuízos que a falta de inserção familiar causam na formação da personalidade das crianças, para se construir aí uma relação de paternidade/filiação.

Improcede, pois, o recurso.

IV. Decisão.

Considerando o exposto, decide-se julgar o recurso improcedente e confirmar a sentença. Custas pela Recorrente.


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Coimbra, …