Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | ANTÓNIO CARVALHO MARTINS | ||
Descritores: | HERANÇA REPÚDIO DÍVIDAS DA HERANÇA HERDEIRO PENHORA RECURSO DELIMITAÇÃO OBJECTIVA | ||
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Data do Acordão: | 03/20/2018 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA - POMBAL - JUÍZO EXECUÇÃO | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Legislação Nacional: | ARTS.2062, 2063, 2064, 2068 CC, ART.635 CPC | ||
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Sumário: | 1.O repúdio da herança é sempre expresso e deve constar de documento escrito: de escritura pública, se na herança existirem bens cuja alienação deva ser feita por essa forma; de simples documento particular, nas restantes hipóteses. 2.A responsabilidade do herdeiro pelas dívidas da herança está limitada às “forças da herança”, consubstanciando um caso de responsabilidade objectivamente limitada. 3.O herdeiro pode opor-se à penhora de bens, cabendo-lhe provar que os bens penhorados não provieram da herança. Até lá, os herdeiros continuam a ser responsáveis pelos encargos da herança, na medida do conjunto de bens que lhe couberem na partilha. 4. Em função do disposto no art. 635º NCPC (delimitação objectiva do recurso), o requerimento de interposição de recurso, ao identificar a decisão de que se recorre, delimita, numa primeira vez, o objecto do recurso. Depois, o recorrente tem a faculdade de, nas conclusões, o restringir, questionando apenas segmentos da decisão de que recorreu. Mas, já não lhe é permitido que amplie esse objecto, indo para além da decisão recorrida, com o propósito de abranger uma outra (questão) de que não recorreu. | ||
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Decisão Texto Integral: | Procº nº 6031.04.4TBLRA.E.C1 2ª Secção – (Cível) Apelação – Recurso de Apelação em Separado (Não Aceitação da Herança; Encargos) Acordam, em Conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I - A Causa: N…, Oponente no processo à margem referenciado, em que é Exequente: Banco C…., com sede (…), não se conformando com a sentença de fls., com a referência nº 85761394, veio dela interpor recurso é de Apelação, alegando e concluindo que: (…) * Banco C…, Exequente nos presentes autos, em que é Executado N (…), tendo sido notificada de Alegações de Recurso de fls. (…), veio apresentar contra-alegações, por sua vez, concluindo que: (…) * II. Os Fundamentos: Colhidos os Vistos legais, cumpre decidir: São ocorrências materiais, com interesse para a decisão da causa as que constam do elemento narrativo dos Autos; destacando que: - Na decisão em causa, em particular, se consagrou: «(…) No caso vertente, o Oponente não logrou provar os factos que alega. No que tange à não aceitação da herança, nenhuma prova foi realizada. Sendo certo que, oportunamente, o Executada foi citado para os termos da habilitação de herdeiros e não deduziu contestação, pelo que foi julgado provado não só que o executado é herdeiro da parte falecida, mas também demonstrado que este lhe sucedeu na relação jurídica em litígio, ambos elementos necessários à procedência do pedido de habilitação. No que respeita à titularidade do dinheiro depositado na conta, também nenhuma prova foi realizada. O mesmo se diga quanto ao pagamento da quantia exequenda. Diante do exposto, haverão de ser julgados totalmente improcedentes, por não provados, os presentes autos de oposição à penhora. 6.Dispositivo Com os fundamentos de facto e de direito expostos, julgo improcedente, por não provada, a presente oposição à penhora. Custas a cargo do Executado». * Nos termos do art. 635º, do CPC, o objecto do recurso acha-se delimitado pelas alegações do recorrente, sem prejuízo do disposto no art. 608°, do mesmo Código. * As questões suscitadas, na sua própria matriz constitutiva e redactorial, consistem em se apreciar: I. 18) Ao contrário do que ficou explanado e decidido na Sentença, o Oponente provou que a conta e o dinheiro são seus; Apreciando, diga-se não sair controvertido que, de acordo com o estatuído na al. b), do n.º1, do art. 784.°, do NCPC, que o executado pode opor-se contra a imediata penhora de bens seus que só subsidiariamente respondam pela dívida exequenda. Tratando-se, pois, de uma situação de impenhorabilidade subsidiária objectiva (Cf. Ac. RP, de 17.12.2014: Proc. 1518/1 I.5T20VR-A.Pl.dgsi.Net). Em todo o caso - perante a prova produzida -, já se não pode controverter que: “Em 19 de Março de 2014, foi junta aos autos declaração bancária, emitida pela K…, datada de 12/03/2014, de titularização da conta nº XXX, da qual resulta que o Recorrente é titular da mesma, ficando a questão da titularização sanada, tendo sido este factos dado como provado. Contudo, não resulta da declaração bancária que o dinheiro que ali se encontra depositado é propriedade exclusiva do Recorrente, resulta apenas que é titular da conta bancária. Não tendo sido produzida pelo Executado qualquer prova da propriedade exclusiva do dinheiro, pois a titularização da conta não demonstra a titularização do dinheiro nela depositado”. O que, também, e com esse alcance, não resulta diferente, face à informação que se pode recolher da cópia de documento constante de fls. 33 dos Autos. Consequentemente, não pode deixar de permanecer intangível o que se consagra em motivação, designadamente ao considerá-la decorrência de: «Como prova documental, haver sido junta aos autos a declaração emitida pela K… de Leiria, de fls. 38 do apenso A, onde se assevera a titularidade da conta bancária penhorada nos autos; Como prova testemunhal ter sido inquirido (…), advogado, que confirmou que, no exercício das suas funções de advogado representou a Executada (…) nos autos de execução apensos, mais concretamente, num acordo de pagamento em prestações que veio a ser celebrado entre Exequente e Executados e no âmbito do qual se limitou a transmitir à Exequente as cópias dos pagamentos efectuados. Do mesmo modo, terem sido, ainda, inquiridos (…) tios do Executado, ora Oponente, que referiram ter-lhe sido transmitido pelo sobrinho que o dinheiro depositado na conta ora em crise é seu. P (…) referiu que os herdeiros de (…) já fizeram partilhas e estão desavindos por conta da mesma, enquanto, para (…), ainda não foram feitas partilhas. Para além da assinalada prova nenhuma outra foi realizada. Destarte, O Tribunal fundou a sua convicção, quanto aos factos provados, no teor do auto de penhora lavrado nos autos de execução, conjugado com a declaração que se mostra junta ao apenso A) a fls. 38 Os factos não provados foram assim considerados em face da ausência de prova bastante que os sustente. De facto, a titularidade da conta não demonstra a titularidade do dinheiro nela depositada. Por outro lado, o depoimento das testemunhas (…) é, de per si, insuficiente para sustentar a prova da titularidade do mencionado dinheiro, tanto mais porque estas testemunhas limitaram-se a reproduzir o que ouviram dizer». Mais emergindo, como inferência, a circunstância – imediatamente, a adiantar (para ulterior prossecução) - de: « - Por outro lado, acerca da aceitação (ou falta dela) nenhuma prova foi realizada. - O mesmo se dizendo quanto à liquidação da quantia exequenda - e tudo sem prejuízo do que, afinal, se vier a decidir em sede de execução». - O que, necessariamente, se projecta quanto ao circunstancialismo alegado pelo Recorrente de haver sido celebrado acordo de pagamento da quantia exequenda, mormente, afirmam que foram liquidadas 34 prestações no montante global de € 17.000,00, não tendo o Recorrido informado os autos do invocado recebimento daquela quantia, mais concluindo que deverá ser apresentada a liquidação do julgado, uma vez que - também quanto a eles -, não foi lograda pelo Recorrentes qualquer prova. Tudo, como resultado decorrente de referencial condicionador de específico ónus de prova como obrigação que recai (art. 342º Código Civil), sobre uma pessoa de provar algum facto ou alguma circunstância com interesse para um determinado fim. Exactamente, porque, em direito processual, sendo a prova o acto ou série de actos processuais através dos quais há que convencer o juiz da existência ou inexistência dos dados lógicos que tem que se ter em conta na causa, o ónus da prova é a obrigação que recai sobre os sujeitos processuais da realidade de tais actos. A traduzir-se - haverá de dizer-se, agora e sempre -, para a parte a quem compete, no encargo de fornecer a prova do facto visado, incorrendo nas desvantajosas consequências de se ter como líquido o facto contrário, quando omitiu ou não logrou realizar essa prova (Anselmo de Castro, Proc. Civil, 1966, 3.°- 259). O que determina responder negativamente à questão em I. II. 19) Não é pelo facto do Oponente não ter contestado a habilitação de herdeiros, que prova que o Oponente recebeu qualquer bem por herança do seu pai; 20) Muito menos prova que os bens que são próprios do Executado respondem pela dívida do pai; 21) O pai do Executado, aqui Recorrente faleceu em 2005 e a conta bancária foi aberta em 2011, volvidos mais de cinco anos; 22) Nunca o dinheiro constante na referida conta poderia ser penhorado com o fundamento de que o dinheiro nela depositado era proveniente do pai do Executado; Neste segmento fulcral, exactamente, acerca da aceitação (ou falta dela) - já se disse -, nenhuma prova ter sido realizada, bem como no que respeita à liquidação da quantia exequenda. Não obstante, tudo - sempre -, sem prejuízo do que, a final, se vier a decidir em sede de execução. Com tal projecção, refira-se, em função do disposto no art. 2062º Código Civil, que o repúdio da herança é um negócio jurídico unilateral não receptício, incondicional e não sujeito a termo (art. 2064º), irrevogável (art.º 2066º) e pode ser solene ou formal (art. º 2063º do Código Civil e 89º, al. d), do Código do Notariado (Cf. Galvão Teles, Sucessões, I, 109). Sendo que a aceitação e o repúdio são, por natureza, incompatíveis. Assim, uma vez aceite, não pode haver repúdio (Cf. Ac. RE, 21.06.2007, Proc. 1049/07-2.dgsi.Net). O que serve, do mesmo modo, para dizer que o repúdio é sempre expresso e deve constar de documento escrito: de escritura pública, se na herança existirem bens cuja alienação deva ser feita por essa forma; de simples documento particular, nas restantes hipóteses. É o que resulta da referência à forma inserta no final do art. 2063º Código Civil, preceito que implica uma remissão para o art. 2126º (Cf. Nuno Espinosa Gomes da Silva, Sucessões, 1980,306). Não constituindo forma de repúdio declaração processual nesse sentido. Com efeito, não tendo o executado apresentado documento demonstrando a não aceitação da herança, ou o seu repúdio, continua a ser parte legítima na execução em que intervém como herdeiro (Cf. Ac. RC, 12.01:CJ,2010, 1º-5). - Em tais termos, fazendo relevar, pois, para o efeito (art. 2068º CC - responsabilidade da herança), que: o herdeiro deve, a sua responsabilidade é que é limitada às forças da herança. Trata-se de um caso de responsabilidade objectivamente limitada, sendo esta, como se sabe, uma das soluções invocadas pelos partidários da doutrina da dívida, e da responsabilidade a favor da sua ideia (Cf. Pereira Coelho, Sucessões, 2ª Edição, 1968, pp. 61, ss.). O herdeiro pode opor-se a esta penhora, cabendo-lhe provar que os bens penhorados não provieram da herança. Até lá, isso significa que os herdeiros continuam a ser responsáveis pelos encargos da herança, na medida do conjunto de bens que lhe couberem na partilha (Cf. Ac. RP. 15.13.2011: CJ, 2011, 2011, 2º, 194; também, João António Lopes Cardoso Partilhas Judiciais, Volume II, 3ª Edição, 1980, pp. 112-113). Sendo que, não havendo sido produzida, pelo Executado, qualquer prova da propriedade exclusiva do dinheiro, e na temporalidade a que os Autos respeitam, a tal se não pode eximir. É, por isso, do mesmo modo, negativa a resposta às questões em II. III. 24) Nos termos dos artigos 6º, 7º e 417º do CPC, para a descoberta da verdade e para a justa resolução do litígio, o Tribunal deveria ter diligenciado no sentido de se averiguar se foi participado o óbito e respetivo imposto de selo, a fim de se decidir com toda a certeza que o pai do Oponente tinha deixado bens, bem como no sentido de diligenciar no sentido de ser junta aos autos escritura de partilha dos bens deixados pelo pai do Oponente; Cumpre dizer, neste segmento, que a delimitação objectiva do recurso é feita pelas conclusões da alegação do recorrente e o tribunal apenas pode conhecer das questões nelas compreendidas (Parecer de Calvão da Silva, em Col. Jur., 1995, 1.°-7). Exactamente, porque, sendo os recursos meio de impugnação das decisões dos tribunais inferiores, o seu âmbito encontra-se, ao menos em princípio, objectivamente, limitado pelas questões postas ao tribunal recorrido. (Cf. Ac STJ, de 25.2.1993: CJ, 1993, 1.°-150). Assim, pois, os recursos visam o reestudo, por um Tribunal Superior, de questões já vistas e resolvidas pelo tribunal a quo, e não a pronúncia do Tribunal ad quem sobre questões novas. Esta regra, que decorre, e designadamente, dos arts. 676.º, n.º 1, e 684.º, n.º 3, do Cód. Proc. Civil (627º e 635º NCPC), (só) comporta duas excepções: 1.ª - situações em que a lei expressamente determina o contrário; 2.ª - situações em que em causa está matéria de conhecimento oficioso (Cf. Ac. STJ, de 7.1.1993:BMJ, 423.º-539). Ainda assim, mais se diga que, em função do disposto no art. 635º NCPC (delimitação objectiva do recurso), o requerimento de interposição de recurso, ao identificar a decisão de que se recorre, delimita, numa primeira vez, o objecto do recurso. Depois, o recorrente tem a faculdade de, nas conclusões, o restringir, questionando apenas segmentos da decisão de que recorreu. Mas, já não lhe é permitido que amplie esse objecto, indo para além da decisão recorrida, com o propósito de abranger uma outra (questão) de que não recorreu (Ac. RG, de 10.11.2014: Proc. 1258/ll.dgsi.Net). Não obstante, refira-se, em função do disposto no art. 6º NCPC (dever de gestão processual), o legislador analisa o dever de gestão processual - como decorre do enunciado do Ac. RL, de 17.12.2015, 5º, -106) -, em três vertentes: - adoptar a tramitação processual adequada às especificidades da causa e adaptar o conteúdo e a forma dos actos ao fim que visam atingir; - garantir que não são praticados actos inúteis, recusando o que for impertinente ou meramente dilatório; - e, finalmente, adoptar os mecanismos de agilização processual previstos na lei. Com tal tessitura institucional e, para este efeito, antes da revisão do CPC de 1961, a lei previa a sanação da falta de alguns pressupostos processuais, como a capacidade e a legitimidade em caso de litisconsórcio necessário. Com a revisão, o que era excepção, dependente duma lei que especialmente a previsse, tornou-se a regra e a falta, em geral, dum pressuposto processual deixou de conduzir, automaticamente, à absolvição da instância, que só tem lugar quando a sanação for impossível ou quando, dependendo ela da vontade da parte, esta se mantiver inactiva. Ver LEBRE DE FREITAS, A ação declarativa cit., n.º 11.2. Cabe na iniciativa oficiosa a determinação da realização dos actos necessários à sanação, designadamente na fase da condensação (art. 590-2-a; ver também o art. 726-4). Mas, no domínio do princípio do dispositivo, o juiz não pode sobrepor-se à parte (pelo que lhe cabe apenas convidá-la à prática do ato necessário à sanação (Cf. José Lebre de Freitas/Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Volume 1º, 3ª Edição, 2014, p. 24). - Assim, pois que, muito embora alicerçado em conceitos indeterminados, que têm sempre associadas uma ampla margem de discricionariedade, o dever de gestão processual não pode ser exercitado de forma arbitrária e/ou autoritária, subordinado como está tanto ao princípio do contraditório (art. 3.°-3) como da igualdade das partes (art. 4.º), além de estar balizado pelo próprio fim da sua atribuição: a rápida e justa resolução do litígio, nomeadamente o respeito dos direitos de cada uma das partes (Cf. Glosa de Abílio Neto ao art. 6º NCPC, in Novo Código de Processo Civil Anotado, 4ª Edição Revista e Ampliada, Março/2017, p.42). Ao que acresce - revelando-se incontornável -, na acção executiva, o juiz não tem a direcção formal do processo. O agente de execução tem aí um conjunto de tarefas que engloba a promoção das diligências executivas e permite afirmar que lhe cabe a direcção formal da execução (Cf. Lebre de Feitas, A Acção Executiva, cit., nº1.6). - Por sua vez, o art. 7.º, n.º 4 do NCPC (princípio da cooperação) consagra, como sucedia com o art. 266.º. n.º 4 do anterior CPC, um poder-dever do tribunal no sentido da colaboração com as partes, tendo em vista, designadamente, a obtenção de documentos ou informações de que as mesmas careçam para o exercício dos seus direitos de acção ou de defesa. Todavia, para que se possa afirmar este poder-dever de colaboração do tribunal, é suposto que a parte interessada justifique, atempadamente, de forma convincente, perante o tribunal a existência de um qualquer obstáculo legal ou factual que a impeça de aceder, ela própria, aos documentos ou informações em apreço, ou que o acesso aos mesmos, por sua iniciativa, importa um sacrifício desproporcionado e, por isso, inexigível (Ac. RG. de 5.1 1.2015: CJ. 2015. 5.º-293). O que não foi, circunstancialmente, nem praticado, nem evidenciado. Por outras palavras, o “providenciar pela remoção do obstáculo" a que se refere o art. 7.°. n.º 4, do NCPC, não está apenas dependente da alegação justificada da dificuldade séria da parte em oferecer documento ou informação, tendo corno pressuposto, também, que esse documento ou informação se assumam, em concreto, ao menos em termos plausíveis, como relevantes para o eficaz exercício de uma faculdade ou do cumprimento de um ónus ou dever processual, de modo a que a sua falta seja idónea a condicionar esse "eficaz exercício" (Ac. RC, de 20.04.2016: Proc. 89/13.2TBCLB-B.C1.dgsi.Net). O que os Autos, na sua concepção holística, não evidenciam. A pretexto do consagrado no art. 417º NCPC (dever de cooperação para a descoberta da verdade), o seu alcance também não sai postergado, pois que o dever de cooperação para a descoberta da verdade, de que trata este artigo (que reproduz, com a mera alteração dum tempo verbal, a redacção do art. 519 do CPC de 1961), constitui, enquanto radicado nas próprias partes, emanação do dever geral de cooperação consagrado no art. 7 no campo da instrução da causa. Tal como o dever de esclarecer imposto pelo n.º 2 do art. 7, respeita ao plano da cooperação material, dele se distinguindo, porém, por respeitar, já não ao esclarecimento da alegação, mas ao esclarecimento dos factos, isto é, à prova. Além disso, incumbe também a terceiros (Cf. José Lebre de Freitas/Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Volume 2º, 3ª Edição, 2017, p. 221). Em tais termos, uma vez que, no CPC, depois de se impor no n.º 1 do arte 417.º (a todas as pessoas, sejam ou não partes) o "dever de prestar a sua colaboração para a descoberta da verdade, respondendo ao que lhes for perguntado, submetendo-se às inspecções necessárias, facultando o que for requisitado e praticando os actos que forem determinados" (entendemos, aliás, que, dada a latitude dos deveres impostos, o dever de colaboração excede a estrita finalidade de "descoberta da verdade"). Constituindo antes um amplo dever de colaboração com a justiça, em ordem ao genérico bom andamento do processo), estabelece no n.º 3 a legitimidade da recusa de prestar a dita colaboração se esta importar a "intromissão na vida privada ou familiar" (al.b) ou a violação do sigilo profissional (aI. c). Mas, logo de seguida (no n.º 4), se dispõe que, ainda que haja esta recusa inicial com fundamento no sigilo profissional, se aplica ("com as adaptações impostas pela natureza dos interesses em causa") o disposto no Código de Processo Penal. O qual, no art. 135.º. n.º 3, admite, afinal, que possa ser ordenado o acto que importe quebra do sigilo profissional, "sempre que esta se mostre justificada, segundo o principio da prevalência do interesse preponderante (destaque nosso), nomeadamente tendo em conta a imprescindibilidade do depoimento para a descoberta da verdade [...] e a necessidade de protecção de bens jurídicos" (Cf. Francisco Pereira Coelho, em CDP, nº 49, 2015, p. 41, nota 22). Sendo certo que nada disso sai comprometido na tramitação de que os Autos em causa foram objecto, na sua própria diegese. Assim, não podendo deixar de ser negativa a resposta à questão em III. IV. 31) Ao decidir como se decidiu vai existir um enriquecimento da Exequente à custa do empobrecimento dos Executados, que nada recebeu do seu pai, e vê os seus bens penhorados por dívidas que não são suas e que nenhuma responsabilidade têm para pagamento das mesmas. Trata-se, “de novo”, de “questão nova”, por isso não permitida, nesta sede processual e recursiva. Não obstante, diga-se - ex abundante -, que o pagamento dos encargos da herança, traduz, apenas, cumprimento ou pagamento, como decorrência de imperativo legal para os herdeiros, o que se perfila como causa justificativa da transferência económica para esse efeito. Mais uma vez, aqui, o elemento fundacional se reconduz - como, de resto já, a outro propósito, supra se destacou - a que: “o herdeiro deve, a sua responsabilidade é que é limitada às forças da herança”. Daí ser negativa a resposta à questão em IV. V. 32) Verifica-se assim, que na Sentença recorrida não se procedeu a uma correta interpretação dos elementos constantes dos autos, da prova produzida em sede de audiência de julgamento, dos documentos juntos, bem como se efetuou uma incorreta interpretação e aplicação das normas jurídicas aplicáveis ao caso em concreto; 37) Deixando a Meritíssima Juiz de se pronunciar sobre algumas questões que são essenciais à boa decisão da causa, nomeadamente as acima expostas; 38) Neste caso em concreto, a Meritíssima Juiz não fundamentou de facto e de direito a sua decisão, cometeu pois uma nulidade; A este respeito - e, em função do que vem de se enunciar -, considera-se que a nulidade da sentença, por falta de fundamentação, consiste na total omissão dos fundamentos de facto ou dos fundamentos de direito em que assenta a decisão, e não quando a especificação dessa matéria possa ser apenas incompleta, deficiente, medíocre ou, no limite, até, errada, tal, aqui, e, nessas dimensões, também, não ocorrida. A nulidade da sentença, por oposição dos fundamentos com a decisão, consubstancia um vício, puramente, lógico do discurso judicial, conduzindo, necessariamente, a uma decisão de sentido oposto ou, pelo menos, de sentido diferente ao que vem expresso na sentença. Não já quando se verifica uma errada subsunção dos factos à norma jurídica aplicável, nem, tão pouco, quando ocorra uma errada interpretação da mesma, situações, essas, que configuram antes um erro de julgamento (Cf. Ac. STJ. de 15.12.2015. Proc. 311/04: Sumários. 2015. p. 709). O que, não obstante, não só na revelação do próprio perfil decisório evidenciado, mas, também, em função do que já se deixou consagrado, não aconteceu. Do mesmo modo, nesse horizonte, não deve confundir-se a nulidade da sentença, por omissão de pronúncia, com vício da decisão da matéria de facto ou com erro de julgamento (Cf. Ac. RC. de 16.12.2015. Proc. 2153/13: dgsi.Net). Por outro lado, segundo jurisprudência pacífica do STJ, resolver todas as questões não significa considerar todos os argumentos das partes, ainda que, segundo as várias vias, sejam plausíveis a solucionar o pleito. As nulidades não são, em regra, vícios que inquinem a maioria das vicissitudes processuais que as partes consideram como tal, pois o legislador português foi bastante cauteloso em não fulminar com nulidade toda e qualquer omissão ou insuficiência que as partes entendam ter ocorrido. Aliás, em consonância com a orientação perfilhada, por vários ordenamentos jurídicos, tendo, como trave mestra, o vetusto principio francês "pas de nulité sans texte” (Cf. Ac. STJ. de 17.12.2015. Proc. 969/03: Sumários, 2015. p. 719). - Acresce que, o cometimento do vício de omissão de pronúncia supõe que a questão cujo conhecimento se omitiu seja relevante para composição da lide, o que exclui a relevância de argumentos e de matérias despiciendas para aquele propósito, ou cujo conhecimento se tenha por prejudicado pela solução dada ao litígio (Cf. Ac. STJ. de 7.4.2016. Proc. 6500/07: Sumários. Abri1/2016. p. 18). A própria nulidade da sentença decorrente dos fundamentos estarem em oposição com a decisão só se verifica quando a fundamentação aponta num certo sentido que é contraditório com o que vem a decidir-se e, enquanto vício de natureza processual, não se confunde com o erro de julgamento, que se verifica quando o juiz decide mal - ou porque decide contrariamente aos factos apurados ou contra lei que lhe impõe uma solução jurídica diferente (Cf. Ac. RP. de 2.5.2016. Proc. 1556/14: dgsi.Net). O que, no presente caso, declaradamente, se verificou não ter acontecido. Desta arte, a mera discordância em relação ao decidido não constitui fundamento para invocação da previsão da aI. c) do n.º 1 do art. 615.° do NCPC (2013), tanto mais que a estrutura do discurso apresenta coerência entre o juízo e as premissas que a ele conduzem. Encontrando-se o decidido devidamente ancorado na factualidade provada, adrede explicitada, não é reconduzível ao vício da falta de fundamentação (Tal como consagrado no Ac. STJ. de 12.5.2016, Proc. 1738/04: Sumários, Maio/2016, p. 43). Razões pelas quais, consequentemente, nestas circunstâncias, não poderiam, nem deveriam “9) ter sido dado como provados os factos dos pontos nºs 1, 2 e 3, constantes dos factos não provados na Sentença de que ora se recorre”, sem outras consequências daí resultantes, que não as, em decisório, consideradas. O que, igualmente, também, determina resposta negativa para as questões em V. * Podendo, assim, concluir-se, sumariando (art. 663º. Nº7 NCPC), que: 1. De acordo com o estatuído na al. b), do n.º1, do art. 784.°, do NCPC, que o executado pode opor-se contra a imediata penhora de bens seus que só subsidiariamente respondam pela dívida exequenda. Tratando-se, pois, de uma situação de impenhorabilidade subsidiária objectiva. 2. Constitui referencial condicionador de específico ónus de prova, obrigação que recai (art. 342º Código Civil), sobre uma pessoa de provar algum facto ou alguma circunstância com interesse para um determinado fim. Exactamente, porque, em direito processual, sendo a prova o acto ou série de actos processuais através dos quais há que convencer o juiz da existência ou inexistência dos dados lógicos que tem que se ter em conta na causa, o ónus da prova é a obrigação que recai sobre os sujeitos processuais da realidade de tais actos. A traduzir-se - haverá de dizer-se, agora e sempre -, para a parte a quem compete, no encargo de fornecer a prova do facto visado, incorrendo nas desvantajosas consequências de se ter como líquido o facto contrário, quando omitiu ou não logrou realizar essa prova. 3. O repúdio é sempre expresso e deve constar de documento escrito: de escritura pública, se na herança existirem bens cuja alienação deva ser feita por essa forma; de simples documento particular, nas restantes hipóteses. É o que resulta da referência à forma inserta no final do art. 2063º Código Civil, preceito que implica uma remissão para o art.. Não constituindo forma de repúdio declaração processual nesse sentido. Com efeito, não tendo o executado apresentado documento demonstrando a não aceitação da herança, ou o seu repúdio, continua a ser parte legítima na execução em que intervém como herdeiro. 4. Para o efeito (art. 2068º CC - responsabilidade da herança: o herdeiro deve, a sua responsabilidade é que é limitada às forças da herança. Trata-se de um caso de responsabilidade objectivamente limitada, sendo esta, como se sabe, uma das soluções invocadas pelos partidários da doutrina da dívida, e da responsabilidade a favor da sua ideia. 5. O herdeiro pode opor-se a esta penhora, cabendo-lhe provar que os bens penhorados não provieram da herança. Até lá, isso significa que os herdeiros continuam a ser responsáveis pelos encargos da herança, na medida do conjunto de bens que lhe couberem na partilha. 6. Em função do disposto no art. 635º NCPC (delimitação objectiva do recurso), o requerimento de interposição de recurso, ao identificar a decisão de que se recorre, delimita, numa primeira vez, o objecto do recurso. Depois, o recorrente tem a faculdade de, nas conclusões, o restringir, questionando apenas segmentos da decisão de que recorreu. Mas, já não lhe é permitido que amplie esse objecto, indo para além da decisão recorrida, com o propósito de abranger uma outra (questão) de que não recorreu. 7. A mera discordância em relação ao decidido não constitui fundamento para invocação da previsão da aI. c) do n.º 1 do art. 615.° do NCPC (2013), tanto mais que a estrutura do discurso apresenta coerência entre o juízo e as premissas que a ele conduzem. Encontrando-se o decidido devidamente ancorado na factualidade provada, adrede explicitada, não é reconduzível ao vício da falta de fundamentação. 8. Verificando-se, pois, que na sentença recorrida constam os factos e as razões de direito em que o tribunal alicerçou a sua decisão e esta é consequência lógica daquela fundamentação, é evidente que aquela peça processual não está inquinada de qualquer nulidade (art. 668°, nº1, alíneas b), c) e e) do CPC (615° NCPC). * III. A Decisão: Pelas razões expostas, nega-se provimento ao presente recurso, confirmando-se a decisão proferida. Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC.. * Coimbra, 20, de março, de 2018. António Carvalho Martins ( Relator ) Carlos Moreira Moreira do Carmo |