Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | MARIA JOÃO AREIAS | ||
Descritores: | AUDIÇÃO JUDICIAL ATRAVÉS DE TELEFONE OU OUTRO MEIO DE COMUNICAÇÃO ACORDO DAS PARTES | ||
Data do Acordão: | 01/21/2020 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DA GUARDA J. L. CÍVEL J1 | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Legislação Nacional: | ARTºS 254º E 520º, Nº 1 DO NCPC. | ||
Sumário: | 1. No caso de comunicações determinadas em diligência em que a parte se encontre presente, a respetiva notificação é imediatamente feita, por via oral, dispensando-se as formalidades prescritas no artigo 253º CPC. 2. Se a parte nunca exerceu nos autos a pretensão da sua audição através da utilização de telefone ou outro meio de comunicação direta com o tribunal, meio este cuja utilização, além do mais, o nº 1 do artigo 520º faz depender do acordo das partes, a omissão de tal procedimento nunca poderá constituir uma nulidade processual tal como se encontra prevista no artigo 195º, nº1, CPC. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I – RELATÓRIO O... e mulher, A..., intentam a presente ação declarativa sob a forma de processo comum contra J..., alegando, em síntese, que no dia 31 de agosto de 2017 o Réu dirigiu ao autor marido expressões injuriosas e ameaçadoras, tentando invadir a residência dos autores, pedindo, em consequência, a condenação do Réu no pagamento de uma indemnização no montante de 16.000,00 € a cada um dos autores, bem como numa sanção pecuniária compulsória no valor de 2.000,00 €, pelas práticas equivalentes a que se decida contra os autores. O Réu contesta negando os factos que lhe são imputados, concluindo pela improcedência da ação. Por despacho de 27 de dezembro de 2018, o juiz a quo indeferiu o requerimento da autora a solicitar a requisição ou atribuição de verba para custear o seu transporte em ambulância para a audiência final, decisão esta que, tendo sido objeto de recurso, veio a ser confirmada por este tribunal (por acórdão de 26-011-2019). Realizada a audiência final a 24 de janeiro de 2019, vieram os autores, por requerimento enviado a 28 de janeiro, requerer que se elaborasse imediatamente a ata da audiência final para “poder responder com toda a serenidade à suspeita e labéu de litigância de má-fé que lhes foi lançada pelo tribunal”. Por requerimento de 7 de fevereiro de 2019 vieram os autores requerer que tendo a Ata da Audiência de 24.01.2019 sido colocada só a 06 de fevereiro de 2019, e não lhe tendo sido certificada qualquer cota “que referisse o anacronismo, pois a ata figura no cititus como tendo sido descarregada no próprio dia, requer que lhe seja aditada uma quota no sentido acima referido”. Em simultâneo com a prolação da sentença, o juiz a quo proferiu o seguinte despacho: “Requer ainda a A. que lhe seja “aditada uma cota” no sentido de um alegado anacronismo da ata que só foi colocada a 6/02/2019 mas aparece com a data do julgamento. Com todo o respeito, não se entende o que pretende a A. e para que finalidade. A ata de julgamento tem a data da realização do mesmo, independentemente da data em que a Sra Funcionária a pôde elaborar e da que foi analisada e assinada pela Magistrada, o que nem sempre é possível, como não foi, no próprio dia, devido ao demais serviço do tribunal. De todo o modo, qualquer prazo para impugnar as decisões proferidas na audiência contam-se da mesma, onde a A. estava representada, e não da data em que a mesma ficou disponível. Assim, é irrelevante a pretensão deduzida para os interesses da A. Pelo exposto, indefere-se o requerido. Custas do incidente pela A. que se fixa em 2 Ucs, sem prejuízo do apoio judiciário – art.º 7º do RCP.” Foi proferida sentença a julgar a ação improcedente, absolvendo o Réu do pedido. Inconformados com tal decisão, vêm os autores dela interpor recurso de apelação, terminando a sua motivação com as seguintes conclusões: I. As apelações pendentes, no desígnio da recorrente, prosseguirão para acórdão. II. A cota que falta no processado a assinalar a data exata em que foi descarregada no “citius” a acta da Audiência, é elemento essencial, visto nomeadamente o disposto no art.º 253.º do CPC. III. A Audiência é nula, por não ter sido praticado ato essencial à boa e justa decisão da causa, em infração ao disposto no art.º 195.º/1 do CPC. IV. Com efeito, estando documentada a impossibilidade justificada da presença da recorrente na Audiência, mas capaz de depor, podia e devia ser utilizado meio adequado para lhe tomar as declarações (deslocação do Tribunal ou via telefone). V. Isso mesmo prescrevem os art.ºs 457.º/1/2 e 520.º/1/2 do CPC, que foram infringidos. VI. Enquanto é contrário à regra de terceiro imparcial do juiz pressupor que um “depoimento” não prestado seja irrelevante para o julgamento da matéria de facto. VII. Nula a Audiência, nula a sentença recorrida, condicionada in totum pelo vício assinalado. VIII. Assim, a sentença recorrida deve ser revogada, para que a Audiência de Discussão e Julgamento venha a ser repetida. Não foram apresentadas contra-alegações. Falecido o Autor marido, foi, por despacho de 03-10-2019, declarada extinta a instância relativamente ao falecido autor. O tribunal a quo indeferiu o pedido da autora/apelante de “aditamento” de uma cota a certificar que a ata de audiência de julgamento apenas foi disponibilizada a 6 de fevereiro de 24-01-2019, com fundamento em que a ata tem a data do dia em que foi realizada não se entendendo qual a finalidade do pedido, uma vez que o prazo para impugnar as decisões proferidas na audiência conta-se da mesma, onde a autora estava representada, e não da data em que se encontra disponível. Insurge-se a Apelante contra o decidido invocando o disposto no artigo 253º CPC, segundo o qual quando se notifiquem despachos deve disponibilizar-se ao notificado cópia legível da decisão e fundamentos. Não assiste razão à Apelante. Com efeito, se o artigo 253º CPC dispõe uma regra geral para as notificações – exigindo a disponibilização ao notificado de cópia ou fotocópia legível da decisão e dos fundamentos –, a lei processual civil prevê um específico regime para as notificações feitas em “ato judicial”: valem como notificações as convocatórias e comunicações feitas aos interessados presentes em ato processual, por determinação da entidade que a ele preside (artigo 254º). O artigo 254º reproduz a norma do artigo 260º do CPC, introduzida pelo DL 239-A/95, consagrando expressamente um entendimento corrente na prática dos tribunais, no sentido de que estando o destinatário da notificação presente em diligência processual não faria sentido que a notificação não fosse imediatamente feita, por via oral, dispensando as formalidades dos artigos anteriores[1]. Não se reconhece, assim, a verificação da invocada nulidade. 2. Nulidade da audiência por o tribunal não se ter feito deslocar o tribunal a casa da autora. Tendo os autores manifestado, na petição inicial, a sua intenção de prestar declarações, e tendo o seu requerimento, de requisição de ambulância ou verba para custear a ambulância por parte do tribunal, sido indeferido, a autora não compareceu à audiência de julgamento. Da Ata de audiência ocorrida a 24 de janeiro de 2019 consta que o ilustre mandatário da Autora, invocando ter interposto recurso do despacho que indeferiu o pedido de requisição de ambulância ou custeio do respeito custo, e que ao mesmo fosse atribuído efeito suspensivo, manifestou a sua oposição ao início da produção de prova. Como tal, a nulidade que agora, em sede de recurso, vem invocar, resultante da não deslocação do tribunal à residência da autora a fim de aí ser ouvida ou da sua não audição pelo telefone, respeita a um procedimento que, embora previsto na lei, não foi pelo mandatário da autora oportunamente requerido. Com efeito, o artigo 456º dispõe que o depoimento deve, em regra, ser prestado na audiência final, salvo se for urgente ou o depoente estiver impossibilitado de comparecer no tribunal. Ora, face à alegada impossibilidade da autora de se deslocar pelos seus próprios meios, a pretensão exercida pela autora foi a de pedir a requisição de uma ambulância e não a de deslocação do tribunal à residência da mesma a fim de aí ser ouvida pelo tribunal. Assim como, a autora, através do seu mandatário, nunca exerceu nos autos a pretensão da sua audição através da utilização de telefone ou outro meio de comunicação direta com o tribunal, meio este cuja utilização, além do mais, o nº 1 do artigo 520º faz depender do acordo das partes. Uma vez que a audição da autora pelo tribunal por outros meios que não através da sua comparência em tribunal não integra uma formalidade que a lei prescreva com caráter obrigatório – é apenas uma das possibilidades previstas na lei a título de exceção de audição das partes ou das testemunhas –, a omissão de tal procedimento (que a autora não requereu atempadamente), nunca poderá constituir uma nulidade processual tal como se encontra prevista no artigo 195º, nº1, CPC. De qualquer modo, ainda que integrasse uma nulidade processual, o que se não reconhece, a apreciação de tal questão em sede de recurso sempre se encontraria dependente da sua arguição prévia junto do tribunal recorrido, uma vez o âmbito de ação do tribunal de recurso se circunscreve à reapreciação de questões julgadas na 1ª instância. Não se reconhece, assim, a verificação de qualquer nulidade da audiência final (nulidade esta que, além do mais, não foi arguida perante o tribunal a quo) que pudesse afetar a decisão recorrida. A Apelação é manifestamente improcedente. IV – DECISÃO Pelo exposto, acordando os juízes deste tribunal da Relação em julgar improcedente o recurso, confirmando-se a decisão recorrida. Custas a suportar pela Apelante. Coimbra, 21 de janeiro de 2020
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