Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
616/03
Nº Convencional: JTRC 05603
Relator: BARRETO DO CARMO
Descritores: CRIME DE DANO
Data do Acordão: 03/19/2003
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Área Temática: DIREITO PENAL
Legislação Nacional: ART. 212º DO C.P
Sumário: I - No crime de dano (art. 212º do Código Penal), o bem jurídico protegido é a propriedade, isto é, o dano protege a propriedade alheia contra agressões que atingem directamente a existência ou integridade do estado da coisa.
II - A incriminação não protege directa e tipicamente o património, podendo afirmar-se, por isso, que o dano não configura um crime contra o património embora o prejuízo patrimonial configure uma consequência ou efeito do dano, tal não é necessário nem inevitável.
III - São elementos do tipo objectivo de ilícito:
1. O objecto da acção "coisa alheia", sendo que:
- O conceito de coisa, como objecto do crime de dano, se identifica, no essencial, com o conceito de coisa no contexto do crime de furto, com a diferença de que, o dano pode também ter como objecto coisas imóveis.
- Deve entender-se a corporeidade (coisificação) no sentido de dever tratar-se de coisa materialmente apreensível ou, de qualquer forma exposta à acção (destruidora ou modificativa) do homem.
- Coisas também podem ser o espaço e o tempo, enquanto coisificados e passíveis de apropriação (e de destruição ou danificação) - assim o tempo de lazer, o espaço de ocupação, o lugar cibernético.
- A coisa terá algum valor e a conduta lesiva se revista de algum relevo, para que o facto atinja o limiar da dignidade penal.
IV - Alheia:
1 - A qualificação da coisa como alheia é determinada pelos princípios da lei civil, excluindo-se as coisas insusceptíveis de apropriação, as rei nullius, as coisas próprias.
2. - Excluem do âmbito de protecção desta norma o arrendatário, considerando exclusivamente ofendido típico deste tipo de crime o portador do bem jurídico tutelado, isto é, o proprietário e assim, o inquilino não é qua tale, tipicamente protegido pela incriminação do dano;
V - A acção - "destruir, danificar, desfigurar, tornar não utilizável":
1. A destruição (grau máximo de dano) significa a perda total da utilidade da coisa, implicando, normalmente, o sacrifício da sua substância (o processo causal não está tipificado - execução não vinculada).
2. A danificação abrange os atentados à substância ou à integridade física da coisa que não atinjam o limiar da destruição, podendo concretrizar-se pela produção de uma lesão nova ou pelo agravamento de uma lesão preexistente.
3. Por desfigurar compreende-se, os atentados à integridade física que alteram a imagem exterior da coisa, querida pelo respectivo proprietário.
4. "Tornar não utilizável", abrange acções que reduzem a utilidade da coisa segundo a sua função.
VI - O elemento subjectivo haverá que destacar, desde já que o dano só é punível a título de dolo (sendo bastante o dolo eventual); não há dano negligente,
1. Admite-se qualquer das causas de justificação gerais de exclusão da ilicitude do facto, quer por direito de necessidade (art. 34º) quer por exercício de um direito (31º b) quer por legítima defesa (32º e 33º) quer por consentimento justificante (38º e 39º).
VII - O crime de dano é um crime material, consumando-se com a efectiva destruição (total ou parcial), danificação, desfiguração ou inutilização da coisa, isto é, a consumação começa com a produção da lesão ou defeito da coisa.
Decisão Texto Integral: