Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | MOURAZ LOPES | ||
Descritores: | INJÚRIA RETORSÃO DISPENSA DA PENA | ||
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Data do Acordão: | 02/09/2011 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | TRIBUNAL JUDICIAL DO FUNDÃO | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Legislação Nacional: | ARTIGOS 181º E 186º CP | ||
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Sumário: | 1. A retorsão configura, no âmbito dos crimes contra a honra, a resposta imediata, no mesmo acto com uma injúria a outra injúria. 2. Justifica-se a aplicação da dispensa da pena a que se alude no artigo 186º n.º 3 do CP, ao arguido que injuria outro, no âmbito de uma discussão e como reacção a uma outra injuria que tenha sofrido. | ||
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Decisão Texto Integral: | I. RELATÓRIO. No processo Comum 283/07.5TAFDN.C2 o Tribunal Judicial do K... condenou: I) o arguido M..., pela prática de: a) um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art.143°, nº1 do Código Penal, na pena de multa de 70 (setenta) dias, à taxa diária de €7 (sete euros), no montante global de €490,00 (quatrocentos e noventa euros); b) pela prática de um crime de injúria (de que foi vitima a assistente MJ…), p. e p. pelo art.181º, nº1 do Código Penal, na pena de multa de 80 (oitenta) dias, à mesma taxa diária, no montante global de €560,00 (quinhentos e sessenta euros); c) pela prática de um crime de injúria (de que foi vitima o assistente C...), p. e p. pelo art.181º, nº 1 do Código Penal, dispensando-o de qualquer pena (art.186°, nº 3 e nº 1 e 3, do art. 74° do Código Penal e nº 3, do art.375º do CPP); d) em cúmulo jurídico das penas parcelares referidas em a) e b), na pena única de 120 (cento e vinte) dias, à mesma taxa diária, no montante global de €840,00 (oitocentos e quarenta euros); II) o arguido C..., pela prática de um crime de injúria (de que foi vitima o assistente M...), p. e p. pelo art.181º nº 1 e 184° do Código Penal, com referência à al. j), do nº 2, do art.132º do mesmo código, dispensando-o de qualquer pena (art.186°, nº 3 e nº 1 e 3, do art.74° do Código Penal e nº 3, do art.375º do CPP); Na mesma decisão o Tribunal absolveu a arguida MJ…, da prática do crime de crime de injúria, p. e p. pelo art.181º nº 1 e 184° do Código Penal, com referência à al. j), do nº 2, do art.132º do mesmo código, que lhe vinha imputado; No que respeita ao pedido de Indemnização civil formulado pela assistente (arguida), MJ…, o Tribunal decidiu julgá-lo parcialmente procedente, e em consequência, condenou o arguido/demandado, M..., a pagar aquela a quantia global de €900,00 (novecentos euros), a título da indemnização que lhe é devida para ressarcimento pelos danos não patrimoniais sofridos em consequência da agressão de que foi vítima e das palavras que lhe foram dirigidas, e que a ofenderam na sua honra e consideração (sendo €400,00 pelos primeiros e €500,00 pelos segundos). No que respeita ao pedido de Indemnização civil formulado pelo assistente (arguido) C..., o Tribunal decidiu julgá-lo parcialmente procedente, e em consequência, condenou o mesmo arguido/demandado, M..., a pagar aquele a quantia de €450,00 (quatrocentos e cinquenta euros), a título da indemnização que lhe é devida para ressarcimento pelos danos não patrimoniais sofridos em consequência das palavras que lhe foram dirigidas, e que o ofenderam na sua honra e consideração. No que respeita ao pedido de Indemnização civil formulado pelo assistente(arguido) M..., decidiu, julgá-lo parcialmente procedente, e em consequência, condenou o arguido/demandado, C..., a pagar aquele a quantia de €450,00 (quatrocentos e cinquenta euros), a título da indemnização que lhe é devida para ressarcimento pelos danos não patrimoniais sofridos em consequência das palavras que lhe foram dirigidas, e que o ofenderam na sua honra e consideração, e absolvendo-se de tal pedido a arguida/Demandada, MJ… . Não se conformando com a decisão, o arguido M... veio interpor recurso da mesma para este Tribunal, concluindo na sua motivação nos seguintes termos: 1ª – A douta sentença recorrida veio a condenar o arguido M... com base na única prova que consiste dos depoimentos das testemunhas JC….e MJ…, mormente daquela primeira, assentou a Mma. Juiz a quo fundamentalmente a sua convicção na credibilidade dos depoimentos daquelas testemunhas; O Ministério, nas suas contra-alegações pronunciou-se pela procedência do recurso, invocando também a nulidade da sentença por se verificar falta de fundamentação da mesma. Os assistentes pronunciaram-se pela improcedência do recurso. O Senhor Procurador Geral-adjunto neste Tribunal da Relação deu o seu parecer no sentido da improcedência do recurso. * II FUNDAMENTAÇÃO As questões a decidir: Em face das conclusões do recorrente são três as questões a decidir: (i) omissão e apreciação critica da prova, nos termos do disposto no artigo 374 nº 2 do CPP; (ii) erro notório na apreciação da prova e violação do princípio da livre apreciação da prova; (iii) aplicação do instituto da dispensa de pena. Importa antes de mais atentar na matéria de facto provada e não provada e respectiva fundamentação que consta na decisão em apreciação. Da discussão da causa resultaram provados os factos seguintes constantes da decisão recorrida: 2.3 Razões da Convicção do Tribunal Nos termos previstos no art.127° do Código de Processo Penal, o Tribunal aprecia livremente a prova, segundo a sua convicção e as regras da experiência. Como se afirma no Acórdão do Tribunal Constitucional n°1165/96, de 19/11, “O julgador ao apreciar livremente a prova, ao procurar através dela atingir a verdade material, deve observar as regras da experiência comum, utilizando como método de avaliação critérios objectivos genericamente susceptíveis de motivação e controlo”. A convicção deve assim ser racional, objectivável e motivável. A este propósito, escreve-se no douto aresto do Tribunal da Relação do Porto de 24.09.2008, disponível em www.dçisi.pt/jtrp o seguinte: “A livre apreciação da prova não deve ser entendida como operação subjectiva, pela qual se chega a uma conclusão unicamente por meio de impressões ou conjecturas, de difícil ou impossível objectivação, mas valoração racional e crítica, de acordo com as regras da lógica, da razão, das máximas da experiência e dos conhecimentos científicos, que permita objectivar a apreciação, requisito necessário para efectiva motivação da decisão”. Debruçando-se detalhadamente sobre tal questão, sustenta-se no douto aresto da RC de 04.03.2009, disponível também em www.dqsLpt/itrc o seguinte: “Considerando que os factos são acontecimentos que, no instante imediatamente posterior à sua ocorrência, deixam de existir, dado que depois do acontecer o que resta são apenas dados, comprovações, registos desta sua ocorrência, que irão formar, na grande maioria das vezes, toda a prova possível de ser produzida, ou seja, aquilo que chega ao conhecimento do juiz não é o facto em si, mas um registo do seu acontecimento, que se apresenta — quase sempre — contaminado por deformações oriundas dos sentidos, dos valores e de processos psíquicos daqueles que com ele têm contacto. “Afirmar que un enunciado fáctico está probado, ou que constituye una prueba, significa que ha sido verificada, que su verdad ha sido comprobada; de manera que la expresión “probar un hecho” no es mas que una elipsis, una forma de decir probar la hipótesis de que los hechos han sucedido”. Na lição de Jürgen Habermas, para quem a “verdade” não se descobre, mas que se constrói através da argumentação, a verdade sobre um facto é um conceito dialéctico, construído com base na argumentação desenvolvida pelos sujeitos do processo. A perspectiva actual da verdade, não se encontra no objecto, nem mesmo no sujeito, mas naquilo que os sujeitos produzem a partir de certos elementos comuns (linguagem). Agora, o sujeito deve interagir com os demais sujeitos, a fim de atingir um consenso sobre o que possa significar conhecer o objecto e dominar o objecto; não é mais a subjectividade que importa, mas sim a intersubjectividade. Nas palavras de Enrico Altavilia, a realidade tem sempre, portanto, um valor subjectivo, e por conseguinte, relativo, porque é uma projecção do mundo exterior que chega ao nosso eu, deformado por nossos sentidos e por todos os processos psíquicos. Para Marinoni e Arenhart, a reconstrução de um fato ocorrido no passado sempre vem influenciada por aspectos subjectivos das pessoas que assistiram ao mesmo, ou ainda do juiz, que há-de valorar a evidência concreta. Há sempre uma interpretação formulada sobre tal facto — ou sobre a prova directa dele derivada — que altera o seu real conteúdo, acrescentando-lhe um toque pessoal que distorce a realidade. Mais do que isso, o julgador (ou o historiador, ou, enfim, quem quer que deva tentar reconstruir fatos do passado) jamais poderá excluir, terminantemente, a possibilidade de que as coisas possam ter-se passado de outra forma. (...) O julgador deve, pois, mais do que esgrelhar a consciência das testemunhas procurar encontrar uma correspondência entre aquilo que lhe foi dado para provar — enunciado fáctico — para dessumir a solução de direito do caso e a realidade — verdade — que poderá estar subjacente a esse enunciado, sendo certo que a “verdade” que encontrará mais não será que a melhor aproximação possível com a realidade ocorrida no mundo dos factos, O julgador deve, por imposição legal, justificar ou tentar demonstrar, argumentando, que a solução encontrada é aquela que mais se aproxima da realidade ocorrida. Mas já não será permitido, fora de um processo (endoprocessual) argumentativo coerente e adequado, justificar opções probatórias assumidas resultantes de impressões e convicções intimistas ou preconcebidas. Se não é vedado, antes é inevitável e se constitui como requisito infranqueável, que o julgador, no seu múnus de apreciação da prova, transporte para a sua actividade cognitiva o cabedal de conhecimentos e a especial mundividência de que se encontra armado e que constituem o cadinho da sua experiência técnica e do arsenal jurídico imprescindível ao acto de julgar, já não será, no entanto, ajustado que julgue segundo impressões ou juízos particulares ao arrepio ou contra aquilo que os elementos de prova evidenciam. Não pode o julgador, porque lhe “pareceu” ou ficou com a impressão que determinado grupo de testemunhas orientou a prova de determinada maneira, julgar contra o que objectivamente foi dito e confirmado por esse conjunto de pessoas sob pena de abjurar o princípio da livre apreciação da prova (motivada). O julgador não pode deixar de se movimentar no âmbito da actividade probatória que lhe é dado experienciar e conhecer devendo do que dela resulta extrair a solução de facto que melhor corresponde à realidade trazida ao seu conhecimento. Ao perspectivar, mediar ou avaliar a objectividade dos elementos de prova com os tons do seu subjectivismo o julgador introduz factores de perturbação no sentido de previsibilidade que uma actividade probatória cingida induz e acrisola em qualquer dos destinatários da decisão (motivada) que lhe incumbe proferir e que eles irão receber. (. A operação intelectual para fixação dos enunciados fácticos em que os pressupostos evidenciadores da ocorrência de um determinado acontecimento exterior se ancoram decorre, na maior parte dos juízos apreciativos da prova, da chamada prova indirecta, isto é, daquela prova que não assegura a “certeza” do facto observado. Do que a possibilidade de aquisição do conhecimento judicial tendente á fixação da matéria de facto resultará, a maior parte das vezes, de uma operação lógica indutiva. Nestes casos a prova dos factos supõe que o juiz reconstrua uma hipótese sobre esses factos que seja explicativa das provas obtidas (ou mais exactamente dos enunciados probatórios). (...) O processo de formação da convicção não é um processo linear e passível de ser descrito sem intervenção e apelo a soluções exteriores, porque interiormente acumuladas com o saber e a experiência de quem decide, sendo passível de serem encontradas fissuras ou descompensações intelectivas que, contudo não podem abalar a compreensão de quem analisa e textualiza a explicação critica apresentada numa decisão. O processo de formação de um juízo de probabilidade acima de uma dúvida razoável (clear, precise and indubitabte evidence ou, no standard da common law, beyond any reasonable doubt) e cerca da certeza histórica constitui-se como um proceder entretecido e entramado de pontos essenciais, que congraçados com alguns outros de menor densidade real/material, se concitam num núcleo mental arrimado a uma realidade histórica que se nos prefigura como plausível e adequada ao acontecer histórico normal e comum.” No caso dos autos, contribuíram de forma decisiva para a formação da convicção do Tribunal, quanto à matéria de facto dada como provada, os seguintes meios de prova: Depoimento das testemunhas indicadas no despacho de pronúncia, em primeiro lugar, JC…, pai do arguido C…, cujo depoimento se revelou essencial para o esclarecimento dos factos, uma vez que presenciou os mesmos, tendo aliás tido intervenção directa nestes, os quais tiveram na sua génese uma troca de palavras, seguida de discussão, entre o mesmo e o arguido M…, derivada do facto de naquele dia se ter apercebido que se encontrava no local, onde existia um jardim que ali tinha plantado por autorização do Director da ex-JAE, que para isso lhe forneceu, inclusivamente, algumas árvores, e do qual o mesmo e os seus familiares sempre cuidaram, o que vinham fazendo de forma contínua, à vista de toda a gente, há mais de 30 anos, uma máquina retroescavadora, a qual pretendia arrasar o referido jardim, trabalho a efectuar por ordem do referido arguido, o Presidente da Junta de Freguesia de CN..., que também se encontrava no local, a acompanhar a execução de tais trabalhos. Confirmou ainda tal testemunha ter sido ele o autor das cartas juntas aos autos e que foram endereçadas ao Presidente da Assembleia de Freguesia de CN... e ao Presidente da Câmara Municipal do K..., a primeira das quais foi inclusivamente assinada pelo seu destinatário, esclarecendo que o aí solicitado nunca foi satisfeito, não tendo até à data da ocorrência dos factos recebido qualquer cópia da acta da assembleia onde teria sido deliberada a realização das referidas obras. Mais declarou que as testemunhas, PJ… e JC... Fevereiro, se encontravam distanciadas do local onde ocorreram os factos, mais precisamente, junto à oficina cujo proprietário é este último, e de volta de um pneu. Depois o depoimento da testemunha, MJ…, casada com a testemunha anterior e mãe do arguido C…, a qual se encontrava igualmente no local, embora não exactamente no sitio onde o seu marido e o arguido M... “se travaram de razões”, mas que presenciou os factos, e que afirmou que aí se encontravam, além dos seus familiares e do referido arguido, apenas o manobrador da máquina, o qual depois este último (o arguido M...) mandou desviar do referido local; - Depoimento das testemunhas da acusação deduzida pelo MP no Apenso A, desde logo, de JM…, o qual na mencionada altura manobrava a máquina retroescavadora com a finalidade de desmanchar o jardim que aí existia, tendo sido contratado para fazer tal serviço pela Junta de Freguesia de CN..., representada pelo seu Presidente, o arguido, M..., e que referiu não ter assistido á discussão que terá tido lugar entre os três arguidos, uma vez que tal arguido o mandou sair daquele local e ir limpar valetas no Caminho do ..., e que durante o tempo que aí permaneceu manteve sempre a máquina ligada, tendo declarado ainda que as únicas pessoas que viu no local foram os arguidos, os pais do arguido C...e JC... Fevereiro, proprietário de uma oficina situada a pouca distância do local onde ocorreram os factos. Também o depoimento deste, o qual afirmou que, na mencionada ocasião se encontrava a trabalhar numa máquina na sua oficina, e que para executar tal trabalho, umas vezes estava dentro, e outras fora da referida oficina, e que confirmou que se apercebeu apenas que entre os “C…” e o arguido L... decorria uma discussão, acrescentando que desde que tem a oficina no referido local, ou seja, há cerca de 14 a 16 anos, que sempre quem viu a tratar do aludido jardim foram o pai e a mãe do arguido C…. Acrescente-se que revelaram-se tais depoimentos, com particular incidência para este último, coerentes, isentos e imparciais, não merecendo ao Tribunal, atenta a forma como foram prestados, e entrando-se aqui em linha de conta com o discurso, o raciocínio desenvolvido, a espontaneidade dos mesmos, a linguagem utilizada (também a corporal) e o tom de voz, qualquer reserva. - Depoimento das testemunhas JM... e JA..., arroladas pelo arguido M..., no que respeita ao pedido de indemnização civil pelo mesmo deduzido, apenas na parte referente ao impacto e divulgação dos factos ocorridos na localidade de CN..., uma vez que como as próprias declararam não presenciaram os factos em discussão neste processo; - Depoimento das testemunhas arroladas pela Defesa dos arguidos, C... e MJ..., H..., Vereador da Câmara Municipal do K..., a quem estão atribuídos os Pelouros da saúde, educação, cemitérios e qualidade de vida, o qual declarou ser do seu conhecimento que o Presidente da Junta de Freguesia de CN... tinha um projecto de intervenção para o local em questão, e também que o arguido C...em determinada altura se deslocou à Câmara Municipal revelando preocupação com as intenções e projectos daquele, uma vez que desde há, pelo menos 17 anos, era o mesmo quem cuidava daquele local, tendo carinho pelo mesmo, embora não reivindicasse a sua propriedade, e afirmando ainda que as obras de beneficiação e limpeza são da responsabilidade das Juntas de freguesia, por delegação de funções e, por último de, MP…, Presidente, em exercício, da Assembleia de Freguesia de CN..., o qual confirmou ter recebido a carta junta a fls.233 dos autos, na qual apôs a sua assinatura, que leu em assembleia, conforme lhe foi solicitado, e que depois devolveu ao seu autor, esclarecendo ainda que não existe a acta cuja cópia lhe foi solicitada, e também que só relativamente às obras de grande envergadura (por ex, mudança de um caminho) a assembleia de freguesia delibera, o que não era o caso da obra referenciada nos autos; - Documentos juntos a fls.233, 234-235, 243, 243-A e 243-C dos presentes autos, e documentos juntos a fls.33 e 39 do apenso A; - Declarações prestadas pelo arguido, M..., apenas na parte respeitante à sua situação pessoal, familiar, profissional e condição social, e quanto aos arguidos MJ… e C…, também na parte respeitante aos crimes de que vinham acusados e aqueles relativamente aos quais foi proferido despacho de pronúncia, tendo o arguido confessado ter praticado o crime de injuria, o que fez depois do arguido M... o ter apelidado de “pulha” e “cobarde”; - Por último, no teor dos certificados de registo criminal dos arguidos juntos aos autos. Para além das testemunhas supra indicadas, prestou depoimento em julgamento, arenas mais uma, a testemunha PJ..., arrolada pelo Ministério Público e pelo assistente/arguido M... nas acusações deduzidas no Apenso A, bem como no pedido de indemnização civil, e arrolada ainda pelo mesmo arguido como testemunha de defesa. O depoimento prestado por tal testemunha, não foi, no entanto, valorado positivamente pelo Tribunal, porque claramente contraditório com o depoimento prestado pelos arguidos C... e esposa, e os quais mereceram credibilidade, atenta a forma como foram prestados, mas especialmente com o depoimento da testemunha JC... Fevereiro, também arrolada pela acusação, e a qual não tinha nos factos nenhum interesse pessoal, revelando-se o seu depoimento aliás — conforme referido in supra - coerente, isento e imparcial, e tendo mesmo sido realizada uma acareação entre as duas testemunhas, cujos resultados foram inconclusivos, e não apresentando a testemunha PJ... qualquer explicação para a existência das aludidas contradições. Por fim, impõe-se tecer algumas considerações quanto às declarações prestadas pelo arguido e assistente M.... Negou este a prática de todos os factos que lhe vinham imputados, afirmando, em contrapartida, que na referida ocasião os arguidos C...e MJ… lhe dirigiram várias palavras e expressões ofensivas da sua honra e consideração, e que para além disso, se colocaram debaixo da pá da máquina retroescavadora, impedindo o homem que a manobrava, por conta da Junta de Freguesia de CN..., de prosseguir os trabalhos que estava a efectuar, e tendo o mesmo ficado á espera que os pudesse prosseguir. Afirmou ainda que na mesma ocasião foi empurrado e que a arguida deitou-lhe as mãos ao puH-over que trazia vestido, e rasgou-lhe a camisa. Acrescentou que já depois de ter chamado a GNR ao local, os dois arguidos avançaram para ele e ameaçaram-no, tendo-se, por isso, refugiado num coberto de pneus que se localiza ali perto daquele local, onde se encontravam o dono deste, e ainda um individuo a trocar os pneus do seu tractor e um empregado da Junta, que fugiu, de imediato. Das testemunhas mencionadas pelo arguido apenas esta última, cuja identificação se desconhece, não prestou depoimento. Mas as outras, as quais o Tribunal ouviu, não confirmaram — como resulta do que acima ficou exposto — a versão dos factos que o arguido apresentou. Realce-se ainda que tendo o mesmo arguido participado criminalmente dos outros dois, pouco tempo depois da ocorrência dos factos (queixa constante de fls.3 do apenso A), não referiu então ter sido ameaçado por qualquer um deles. * Vejamos cada uma das questões suscitadas. (i) Omissão da apreciação critica da prova, nos termos do disposto no artigo 374 nº 2 do CPP; Importa ante de mais constatar, face às alegações de recurso efectuadas pelo recorrente sintetizadas nas suas conclusões, que a sua discordância sobre esta questão decorre de, na sua opinião, não existir fundamentação do tribunal no que respeita à prova fixada e não ter sido efectuado um juízo critico sobre a mesma. Tratar-se de uma questão também alegada nas contra alegações do Ministério Público junto do Tribunal da primeira instância à qual, no entanto, não adere o Exmo Senhor procurador Geral-Adjunto neste Tribunal. A concretização normativa do princípio constitucional da fundamentação das decisões, na sua vertente endoprocessual possibilita o controlo da sentença por um Tribunal superior, evitando decisões arbitrárias, concretizando a garantia de defesa do arguido (na medida em que apenas com a fundamentação pode ser concretizado o direito constitucional ao recurso) e assume um mecanismo de autocontrolo do próprio Tribunal. Por outro lado as finalidades extraprocessuais subjacentes à fundamentação concretizam ainda o princípio da transparência do órgão decisor mas também garantem uma efectiva responsabilização e prestação contas de quem julga. Este amplo princípio assume, no entanto, um conjunto de requisitos que, no caso do CPP, pode retirar-se do quadro normativo dos artigos 374º, 379º e 380º. Assim, na concretização da estrutura da sentença a fundamentação impõe que todas as questões suscitadas e decididas devem ser objecto de fundamentação (o chamado princípio da completude), embora de uma forma concisa. Igualmente a fundamentação deve sempre ser suficiente, coerente e razoável, de modo a permitir cumprir as finalidades que lhes estão subjacentes (endo processuais referida e extra processuais, essencialmente, de legitimação). Nesta incursão pela dimensão normativa e constitucional da fundamentação importa, para os autos, fazer salientar que a sentença como documento onde estão reflectidas as opções decorrentes do julgamento, funciona como um todo e nesse sentido as várias dimensões factuais e justificativas que a compõem devem articular-se, em toda a estrutura da fundamentação (relativa à matéria de facto e relativa às questões de direito). Quanto à testemunha o tribunal refere que não valorou tal depoimento porque «claramente contraditório com o depoimento prestado pelos arguidos C...e esposa, e os quais mereceram credibilidade, atenta a forma como foram prestados, mas especialmente com o depoimento da testemunha JC... Fevereiro, também arrolada pela acusação, e a qual não tinha nos factos nenhum interesse pessoal, revelando-se o seu depoimento aliás — conforme referido in supra - coerente, isento e imparcial, e tendo mesmo sido realizada uma acareação entre as duas testemunhas, cujos resultados foram inconclusivos, e não apresentando a testemunha PJ... qualquer explicação para a existência das aludidas contradições. Quanto ao arguido, refere o Tribunal que negou «a prática de todos os factos que lhe vinham imputados, afirmando, em contrapartida, que na referida ocasião os arguidos C...e MJ… lhe dirigiram várias palavras e expressões ofensivas da sua honra e consideração, e que para além disso, se colocaram debaixo da pá da máquina retroescavadora, impedindo o homem que a manobrava, por conta da Junta de Freguesia de CN..., de prosseguir os trabalhos que estava a efectuar, e tendo o mesmo ficado á espera que os pudesse prosseguir. Afirmou ainda que na mesma ocasião foi empurrado e que a arguida deitou-lhe as mãos ao puH-over que trazia vestido, e rasgou-lhe a camisa. Acrescentou que já depois de ter chamado a GNR ao local, os dois arguidos avançaram para ele e ameaçaram-no, tendo-se, por isso, refugiado num coberto de pneus que se localiza ali perto daquele local, onde se encontravam o dono deste, e ainda um individuo a trocar os pneus do seu tractor e um empregado da Junta, que fugiu, de imediato. Das testemunhas mencionadas pelo arguido apenas esta última, cuja identificação se desconhece, não prestou depoimento. Mas as outras, as quais o Tribunal ouviu, não confirmaram — como resulta do que acima ficou exposto — a versão dos factos que o arguido apresentou. Realce-se ainda que tendo o mesmo arguido participado criminalmente dos outros dois, pouco tempo depois da ocorrência dos factos (queixa constante de fls.3 do apenso A), não referiu então ter sido ameaçado por qualquer um deles. Ou seja não há, de todo, qualquer omissão de fundamentação na decisão tomada que possa sustentar o vício que se pretende encontrar, nomeadamente a ausência de exame crítico das provas a que se refere o artigo 374º nº 2 do CPP. Assim a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, a contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão e o erro notório na apreciação da prova, consubstanciam, respectivamente, a inexistência de factos provados suficientes, a incompatibilidade, insusceptível de ser ultrapassada através da própria decisão recorrida, entre os factos provados, entre estes e os não provados ou entre a fundamentação e a decisão e o erro notório da apreciação da prova efectuada pelo Tribunal. Tudo isto, repete-se, desde que resulte do próprio texto da sentença, por si só ou conjugada com as regras da experiência. Recorde-se que estes vícios, podendo e devendo ser alegados, são no entanto de conhecimento oficioso. No caso sub judice, o recorrente sustenta essencialmente a sua argumentação do recurso no facto do Tribunal ter sustentado a sua decisão no depoimento das testemunhas C...e MJ…, e não ter considerado quer o depoimento do arguido M..., na parte concernente aos factos sobre que vinha acusado, bem como relativamente aos factos sobre os quais fez queixa, não tendo fundamentado em toda a sentença ora recorrida o porquê da não consideração das declarações do ora recorrente e ainda não ter valorado as declarações dos demais arguidos, sem qualquer fundamento ou justificação; No que respeita ao arguido M... igualmente o tribunal efectua uma fundamentação «negativa» inequívoca a propósito da sua não valoração: «Negou este a prática de todos os factos que lhe vinham imputados, afirmando, em contrapartida, que na referida ocasião os arguidos C...e MJ… lhe dirigiram várias palavras e expressões ofensivas da sua honra e consideração, e que para além disso, se colocaram debaixo da pá da máquina retroescavadora, impedindo o homem que a manobrava, por conta da Junta de Freguesia de CN..., de prosseguir os trabalhos que estava a efectuar, e tendo o mesmo ficado á espera que os pudesse prosseguir. Afirmou ainda que na mesma ocasião foi empurrado e que a arguida deitou-lhe as mãos ao puH-over que trazia vestido, e rasgou-lhe a camisa. Acrescentou que já depois de ter chamado a GNR ao local, os dois arguidos avançaram para ele e ameaçaram-no, tendo-se, por isso, refugiado num coberto de pneus que se localiza ali perto daquele local, onde se encontravam o dono deste, e ainda um individuo a trocar os pneus do seu tractor e um empregado da Junta, que fugiu, de imediato. Das testemunhas mencionadas pelo arguido apenas esta última, cuja identificação se desconhece, não prestou depoimento. Mas as outras, as quais o Tribunal ouviu, não confirmaram — como resulta do que acima ficou exposto — a versão dos factos que o arguido apresentou. Realce-se ainda que tendo o mesmo arguido participado criminalmente dos outros dois, pouco tempo depois da ocorrência dos factos (queixa constante de fls.3 do apenso A), não referiu então ter sido ameaçado por qualquer um deles». A valoração global da prova, neste tipo de casos em que estão em causa depoimentos cruzados e antagónicos de declarantes (arguidos ou outros) é efectuada com base na audição e credibilização dos mesmo depoimentos e na sua articulação com outras provas em função das regras da experiência. Foi exactamente isso que o Tribunal efectuou, conforme se pode ver da sua extensa fundamentação. O que o arguido agora pretende é que seja efectuada uma outra valoração do depoimento da testemunha PJ... e do depoimento do arguido M..., sem dar razões objectivas probatórias suficientes que ponham em causa a opção justificada do Tribunal. Importa referir que em momento algum da decisão é indiciado a existência de qualquer erro, contradição ou insuficiência que posa sustentar as alegações e sobretudo as conclusões agora efectuadas pelo Recorrente. Dir-se-á finalmente, porque o arguido alude a isso no seu recurso, mas como decorrência da sua versão factual dos factos que o Tribunal não existe qualquer violação do princípio da livre apreciação da prova, previsto no artigo 127º do Código penal. O Tribunal, como foi abundantemente referido, decidiu, no seu livre critério e fundamentou as suas escolhas probatórias, de uma forma sustentada e coerente e sobretudo com uma justificação clara do modo como fez.
A decisão, nesta matéria não sofre qualquer vício, pelo que soçobra integralmente o recurso formulado. (iii) Da aplicação do instituto da dispensa de pena. Embora de uma forma pouco clara (contrariamente ao que lhe exige a lei) e envolvida no âmbito da questão de facto que acabou de ser conhecida, o recorrente insurge-se contra a pena (dispensa de pena) aplicada o arguido C..., invocando que « não resultaram factos que pudessem conduzir à aplicação do disposto no artigo 186º, nº 3 do Código Penal, uma vez, e como já se concluiu acima, não resultou provada a prática do crime de injúrias pelo arguido/recorrente M...». A dispensa de pena a que se alude no artigo 186º n.º 3 do Código Penal, decorre da valoração dada pelo legislador, no âmbito dos crimes contra a honra (aplicáveis por isso a todos os crimes em que esteja em causa este bem jurídico) ao fenómeno da retorsão. Ou seja, «na reacção ilícita de agressão diante de uma agressão, também ela ilícita» (cf. Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário ao Código penal, Lisboa, 2008, p. 386) que se configura, no âmbito dos crimes contra a honra na «resposta imediata (“no mesmo acto”) com uma injúria a outra injúria» (Pulo Albuquerque, ibidem, p. 507). Ora, no caso está provado que o arguido «que discutia com o assistente, e que se encontrava junto da referida máquina, disse para este "És um cobarde", "és um pulha." Com tais expressões quis o arguido, o que conseguiu, atingir a honra e consideração do assistente, bem sabendo que este era o Presidente da Junta de Freguesia de CN..., e que se encontrava naquele local a acompanhar uma obra da freguesia. O arguido proferiu tais expressões em resposta às palavras do assistente descritas em 2.1.6, [dirigindo-se ao assistente, C..., disse-lhe "és um pulha", "és um cobarde"] III. DECISÂO Pelo exposto acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente o recurso, confirmando-se a decisão recorrida. |