Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00483/09.3BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:02/16/2018
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Rogério Paulo da Costa Martins
Descritores:AMPLIAÇÃO DO PEDIDO; DANOS MORAIS; ACTUALIZAÇÃO; NO ARTIGO 569º DO CÓDIGO CIVIL E NO 265º Nº 2 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (DE 1995); RECURSO JURISDICIONAL;
ALTERAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO; RESPONSABILIDADE POR DEFICIENTE ASSISTÊNCIA MÉDICO-HOSPITALAR; SONDA NASOGÁSTRICA; PERFURAÇÃO DO ESÓFAGO; INDEMNIZAÇÃO; DANO MORTE.
Sumário:
1. Mostra-se fundado e válido o despacho que admitiu a ampliação do pedido inicial, ao abrigo do disposto no artigo 569º do Código Civil e no 265º nº 2 do Código de Processo Civil (de 1995), pelos danos, notórios e que como tal, não carecem de alegação, nem de prova, resultantes da normal demora do processo, traduzida na actualização dos montantes indemnizatórios por danos morais, por se traduzir tal ampliação numa consequência e desenvolvimento do pedido primitivo.
2. Em sede de recurso jurisdicional o tribunal de recurso, em princípio, só deve alterar a matéria de facto em que assenta a decisão recorrida se, após ter sido reapreciada, for evidente que ela, em termos de razoabilidade, foi mal julgada na instância recorrida.
3. Verificam-se todos os pressupostos quer da responsabilidade contratual quer da responsabilidade extracontratual, incluindo a culpa que aqui não é preciso presumir, antes se mostra efectiva, se ficou provado que um funcionário, não identificado, do hospital demandado, violou as leges artis na colocação de uma sonda nasogástrica de forma atípica, com perfuração do esófago, que conduziu à drenagem de cerca de 4 litros de líquido alimentar para a pleura, o que provocou uma infecção que veio a determinar a morte do internado.
4. Em termos absolutos não há dinheiro nenhum que pague uma vida mas a partir do momento em que se ficciona um valor para a vida para efeitos de indemnização não se vê como não atender a factores objectivos que distinguem cada situação para no caso concreto fixar um valor equitativo.
5. No caso, em que a vítima tinha à data do óbito 48 anos, faltando oito dias para completar os 49 anos de idade, tinha sofrido meses antes um grave acidente de viação que lhe causou traumatismo vertebro-medular com paraplegia e bexiga neurogénica com algaliação crónica, mostra-se equitativo e justo fixar a indemnização, ao abrigo do disposto no artigo 496º nº 1 do Código Civil, pela perda do direito à vida, em 60.000 € (sessenta mil euros), um pouco acima dos valores mínimos habitualmente fixados pela jurisprudência.
6. Para compensação do enorme sofrimento que a vítima suportou entre a ocorrência dos deficientes tratamentos médicos prestados por funcionários do réu e a data da sua morte, mostra-se equitativo e justo fixar a indemnização de 25.000 € (vinte e cinco mil euros) cabendo 12.500 € a cada autor, a viúva e o filho sobrevivo, em via sucessória.
7. Para compensar os danos moras próprios dos autores e recorrendo de novo a critérios de bom senso e razoabilidade, mostram-se equitativos e justos os montantes de 17.500 € (dezassete mil e quinhentos euros) de indemnização a atribuir à autora mulher, que vivia com o marido e, por isso, mais sente a sua falta, e de 12.500 € (doze mil e quinhentos euros) ao autor filho, que sendo maior e com vida independente do pai, terá maior facilidade em superar a ausência.*
*Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:MFM
Recorrido 1:CHP, E.P.E.
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum - Forma Ordinária (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:
Negar provimento ao recurso do Réu
Conceder parcial provimento ao recurso dos Autores
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer
1
Decisão Texto Integral:EM NOME DO POVO
Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

MFM e SOC vieram interpor RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, pela qual foi julgada parcialmente procedente a acção administrativa comum, intentada pelos recorrentes contra CHP, E.P.E., e que, em consequência, condenou o Réu a pagar aos Autores, ora Recorrentes, as quantias a seguir discriminadas, acrescidas de juros de mora, à taxa legal, desde a sua citação até efectivo e integral pagamento: a) a quantia de 35.000 € (trinta e cinco mil euros) pela privação do direito à vida do JMC; b) a quantia de 17.500 € (dezassete mil e quinhentos euros), a título de danos não patrimoniais sofridos pelo JMC; c) a quantia de 20.000 € (vinte mil euros), a título de danos não patrimoniais sofridos pelos Autores (14.000 € para a Autora mulher e 6.000 € para o Autor filho), absolvendo o Réu nos demais pedidos.

Invocaram, para tanto, em síntese, que as quantias fixadas pela 1ª Instância pecam por defeito e pugnam pela fixação, em sua substituição, das seguintes quantias: a) pela perda do direito à vida do familiar dos Autores, 60.00,00 €; b) pelos danos não patrimoniais do marido e pai dos Autores, 50.000 €; c) pelos danos não patrimoniais dos Autores, 50.000 €; d) pelos danos patrimoniais decorrentes da morte do marido e pai dos Autores, 40.000 €.

O CHP, E.P.E. contra-alegou discordando das quantias propostas pelos recorrentes para os danos não patrimoniais e discordando de que se tivesse feito prova dos danos patrimoniais.

O CHP, E.P.E. interpôs RECURSO JURISDICIONAL: 1- do despacho que admitiu a ampliação do pedido em sede de audiência de julgamento, pedindo a revogação de tal despacho e o indeferimento da ampliação do pedido, por nulidade derivada da falta de fundamentação dessa ampliação, já que os Autores se limitaram a requerer um aumento do valor peticionado de €210.000,00 para €285.000,00, sem, no entanto, explicarem ou densificarem as razões que subjazem à pretendia ampliação; 2- da sentença proferida nos autos, arguindo contradições entre a matéria de facto dada como provada: contradição entre o que vinha provado nas alíneas C), D), E), F), G) e H) da matéria assente (pontos 3, 4, 5, 6, 7, 8 e 9 dos factos dados como provados na sentença) e o que foi dado por provado na resposta ao quesito 2º (ponto 11 dos factos dados como provados na sentença); contradição patente na matéria dada como provada nas respostas aos quesitos 3º, 4º, 5º, 6º e 7º, por um lado e a matéria dada como provada nas respostas dadas aos quesitos 16º a 22º (pontos 21 a 27º dos factos dados como provados na sentença) por outro; contradição, ou pelo menos, obscuridade, resultante do que foi dado como provado na resposta ao quesito 38º (ponto 41 dos factos provados da sentença), quando confrontado, por um lado, com o dado como provado na resposta ao quesito 36º (ponto 39º dos factos provados na sentença), e por outro com os factos dados como provados nas respostas aos quesitos 25º a 31º (pontos 28 a 34 dos factos provados na sentença, contradições e obscuridades que impõem a anulação das respostas dadas quer em contradição com a matéria já assente, quer em contradição entre si, quer por obscuras; arguindo também factos erradamente dados como provados – resposta aos quesitos 2º; 4º a 7º, 23º, 24º, 36º e 38º.

Sustenta que, diante da matéria de facto que considera provada, não resulta provada qualquer violação por parte do Réu dos seus deveres nem qualquer violação das leges artis por parte dos seus funcionários e agentes; não resulta a prática de qualquer ilícito por acção ou omissão, como não resulta qualquer nexo de causalidade entre a acção positiva ou negativa do Réu e dos seus funcionários e o que sucedeu a JMC, não tendo o Réu incorrido em responsabilidade civil perante os Autores.
Invocou, para tanto e, em síntese, que a acção deve ser julgada improcedente, por não provada, com os referidos fundamentos.

Os Autores contra-alegaram, defendendo que a ampliação do pedido consubstancia desenvolvimento do pedido primitivo, pelo que nenhuma censura merece o despacho que deferiu a mesma e que a sentença é clara quanto aos factos que desencadearam a morte do marido e pai dos Autores, atento o nexo causal daqueles com o resultado, de acordo com a perícia médico-legal realizada, tendo aquele falecido em consequência dos erros médicos cometidos pelo Réu, ou seja, deficiente colocação da algália, bem como deficiente colocação da sonda nasogástrica, conforme resulta das referências existentes no processo clínico.

O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer.

Cumpre decidir já que nada a tal obsta.
*
I.I. - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do recurso jurisdicional interposto pelos Autores, MFMA e SOC:
1 – Para ressarcir a perda do direito à vida do marido e pai dos Autores, deve, de harmonia com a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, ser-lhes atribuída uma quantia nunca inferior a 60.000 €.
2- Sendo o direito à vida igual para todos, não devendo a vida de ninguém ser desvalorizada, muito menos pelos argumentos esgrimidos na sentença recorrida, sob pena de se violar o princípio da igualdade.
3- Para ressarcir o dano não patrimonial do marido e pai dos Autores – dores, sofrimento, angústia, ansiedade, abalo moral, tratamentos dolorosos, etc… - deve ser fixada quantia nunca inferior a 50.000 €.
4- Para ressarcir os danos não patrimoniais dos Autores – profundo abalo moral, perda de um marido e pai exemplar em circunstâncias trágicas, inesperadas e absolutamente evitáveis face à manifesta negligência da Ré – deve ser-lhes atribuída uma quantia nunca inferior a 50.000 €.
5- Para ressarcir o dano patrimonial decorrente da morte do marido e pai dos Autores, pela perda dos rendimentos que poderia continuar a auferir com a direcção e orientação da oficina de reparação de automóveis, deve ser-lhes atribuída uma quantia nunca inferior a 40.000 €.
6- Foram violados os artigos 483.º n.º 1, 496.º n.º 1 e 4, 562.º, 563.º, 564.º e 566.º, todos do Código Civil.

I.II. - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do recurso jurisdicional interposto pelo Réu CHP, E.P.E.:
1. Ocorre nulidade de decisão por falta de fundamentação de facto de despacho de folhas 456, pois a decisão não indica um único facto e que permita extrair a conclusão de que a ampliação do pedido obedece aos requisitos do n.º2 do artigo 265º do Código de Processo Civil nem os Autores os alegaram.
2. A decisão é assim, nula por falta de fundamentação – artigo 615º, n.º1 alínea b) do Código de Processo Civil.
3. Foram assim violados o n.º2 do art.º 265º e 615º, n.º1, alínea b) ambos do Código de Processo Civil.
4. Existe contradição entre o que vinha provado das alíneas C), D), E), F), G) e H) da matéria assente (pontos 3, 4, 5, 6, 7, 8 e 9 dos factos dados por provados na sentença) e o que foi dado por provado na resposta ao quesito 2º (ponto 11 dos factos dados por provados na sentença) por se ter confundido a data de ingresso na Unidade de Cuidados Intensivos Polivalente do Réu com a data de ingresso no Réu.
5. Mais grave, porém, por respeitar ao cerne da questão, é uma outra contradição patente na matéria dada por provada nas respostas dadas aos quesitos 3º, 4º, 5º, 6º e 7º, por um lado, e a matéria dada por provada nas respostas dadas aos quesitos 16º, 17º, 18º, 19º, 20º, 21º e 22º (pontos 21, 22, 23, 24, 25, 26 e 27 dos factos dados por provados na sentença) por outro.
6. Ainda uma outra contradição, ou, pelo menos obscuridade, resulta do que foi dado por provado na resposta ao quesito 38º (ponto 41 dos factos provados da sentença) quando confrontado, por um lado, com o dado por provado na resposta ao quesito 36º (ponto 39 dos factos provados da sentença), e por outro com os factos dados por provados nas respostas aos quesitos 25º a 31º (pontos 28 a 34 dos factos provados da sentença).
7. Estas contradições e obscuridades configuram erros de julgamento que impõem a anulação das respostas dadas quer em contradição com matéria já assente quer em contradição entre si ou obscuras (artigo 662º, nº 2, al. c), do Código de Processo Civil).
Sem prescindir,
8. Há, assim um manifesto lapso na resposta ao quesito 2º (ponto 11 da matéria provada da sentença) que deve ser corrigido substituindo-se a expressão “Antes de ingressar no Réu, o que ocorreu em 25.11.2005…” por “Antes de ingressar na UCIP do Réu, o que ocorreu em 25.11.2005…”.
9. Deve ser eliminada a palavra “grave” da resposta dada ao quesito 4º (ponto 13 da matéria provada da sentença) por ser juízo de valor sem fundamento nos factos apurados.
10. A matéria dos quesitos 5º, 6º, 7º, 23º, 24º, 36º e 38º encontra-se mal julgada, pois que os pontos 5º, 6º, 7º e 38º deveriam ter sido julgados não provados, os 23º e 24º deveriam ter sido julgados provados e, quanto ao 36º, não deveria ter sido dado por provado que o líquido drenado tinha as características de Fresubin, pois que as não tinha, tudo com base na prova documental, testemunhal e esclarecimentos da Senhora Perita referidos supra em III.
11. Não resultou provada qualquer acção ou omissão por parte do Réu e seus funcionários ou agentes geradora de responsabilidade perante os Autores nem qualquer nexo de causalidade entre a actuação destes e o sucedido ao malogrado JM.
*
II- A nulidade da ampliação do pedido – recurso do CHP, E.P.E..
É entendimento pacífico o de que apenas padece de nulidade por falta de fundamentação a decisão judicial que careça, em absoluto, de fundamentação de facto ou de direito; a simples deficiência, mediocridade ou erro de fundamentação afecta o valor doutrinal da decisão que, por isso, poderá ser revogada ou alterada, mas não produz nulidade (artigos 666º, n.º 3, e 668º, n.º 1, al. b), do Código de Processo Civil de 1995; artigos 613º, n.º3, e 615º, n.º1, al. b), do Código de Processo Civil de 2013; Alberto Reis, Código de Processo Civil anotado, volume V, Coimbra 1984 (reimpressão), p.140; acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 11.9.2007, recurso 059/07).
Neste sentido se pronunciou também o acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte, de 13.01.2017, no processo 00371/16.7 AVR.
Do processo (concretamente da acta de audiência de julgamento de 27.05.2014) consta o seguinte requerimento apresentado pelo Mandatário dos Autores:
“Em virtude do tempo decorrido entre a propositura da acção e a data em que venha a ser prolatada a sentença, por se verificarem desactualizados os montantes indemnizatórios reclamados na petição inicial, os AA. vêm ampliar o pedido, nos termos do art. 265º do CPC, sendo a ampliação um novo desenvolvimento do pedido primitivo.
Quanto ao direito à vida, alegado no art. 21º da petição inicial, tendo em conta a orientação da jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, o valor deverá ser ampliado para €60.000,00 (sessenta mil euros).
O montante reclamado no artigo 20º da petição inicial (danos não patrimoniais) deverá ser ampliado para €50.000,00 (cinquenta mil euros).
Por fim, quanto ao montante peticionado no art. 23º da petição inicial, o mesmo deve ser ampliado para €125.000,00 (cento e vinte e cinco mil euros).
Termos em que deve ser admitida a ampliação requerida, passando o somatório global do pedido a ser de €285.000,00 (duzentos e oitenta e cinco mil euros), tudo acrescido de juros a contar da citação.”
Sobre este requerimento incidiu o despacho do Tribunal a quo ditado para a acta de 18.06. 2014, do seguinte teor:
“Considerando que o Tribunal está, no seu julgamento, limitado ao valor do pedido, tendo subjacente nos artigos 265º nº 2 e 609º nº 1, ambos do C.P.C. e no art. 569º do C.C., e porque os Autores não estão limitados na faculdade de reclamarem quantia mais elevada, contando que o façam até ao encerramento da discussão na primeira instância, atenta a tempestividade do pedido, admito a requerida ampliação.”
O despacho tendo sido ditado de imediato para a acta na sequência do pedido formulado pelos Autores, não pode ser deste desligado, antes lido no contexto desse pedido.
Trata-se, de resto, de uma questão adjectiva, a da admissibilidade do pedido, e não de uma questão substantiva, pelo que o único facto a ter em conta é o teor do próprio requerimento para o confrontar com a norma aplicável.
A norma essencial foi expressamente invocada na decisão em causa, o n.º 2 do artigo 265º do Código de Processo Civil (de 2013)
“O autor pode, em qualquer altura, reduzir o pedido e pode ampliá-lo até ao encerramento da discussão em 1.ª instância se a ampliação for o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo”.
Vê-se claramente qual a fundamentação da decisão recorrida: a ampliação do pedido é um desenvolvimento do pedido inicial e como se estava em plena audiência de julgamento era processualmente admissível pelo que foi admitida.
E olhando para o teor do requerimento sobre o qual recaiu o despacho em análise, mostra-se acertada tal decisão.
O artigo 569º do Código Civil permite aos Autores reclamarem, no decurso do processo, quantia mais elevada, se o processo vier a revelar danos superiores aos que foram inicialmente previstos.
Por outro lado, não necessitam de alegação, nem de prova, os factos notórios, devendo considerar-se como tais os factos que são do conhecimento geral (artigo 514º nº 1 do Código Processo Civil de 1995; artigo 412º nº 1 do Código de Processo Civil de 2013).
Os danos resultantes da demora do processo e que conduzem à actualização de certos montantes indemnizatórios são factos notórios, que não carecem de alegação, nem de prova.
Ora, se os Autores pedem a actualização dos valores peticionados e o Tribunal conhece, como não pode deixar de conhecer, que entre a interposição da acção e a data da ampliação do pedido decorreram mais de cinco anos, não pode deixar de admitir essa ampliação do pedido que se traduz numa consequência e desenvolvimento do pedido primitivo, admissível nos termos dos artigo 569º do Código Civil, 265º nº 2 do Código de Processo Civil de 1995, em vigor à data em que foi apresentada a ampliação do pedido e 566º, nº 2, do Código Civil, por força do qual, o montante indemnizatório deve cobrir não só o montante fixado pelos danos, mas também o quantitativo correspondente à desvalorização desta importância entre a data da prática do facto e o encerramento da discussão em primeira instância, não sendo mesmo necessário que os lesados aleguem a facticidade correspondente, atenta a sua notoriedade. Neste sentido se pronunciou, entre muitos outros, o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 06.01.1987, in Colectânea de Jurisprudência, 1987, tomo I, pág. 298.
O referido é sobremaneira importante na fixação dos danos morais ou não patrimoniais que são fixados segundo a equidade no momento da prolação da sentença, atendendo-se aos elementos do artigo 496º nº 3 do Código Civil, na redacção anterior à introduzida pela Lei nº 23/2010, de 30.08, entre os quais se inclui a flutuação do valor da moeda.
A inflação deve pois ser atendida de modo à compensação adequada em dinheiro, na altura do encerramento da discussão, tendo em conta o valor da moeda em tal momento e atendida independentemente da invocação das partes por ser um facto notório. Neste sentido também o acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 13.07.1989, in Colectânea de Jurisprudência, ano 1987, tomo II, pág. 85). Os juros de mora sobre este tipo de danos só incidem sobre o montante fixado a partir da data da sentença.
Conclui-se, pelo exposto, que carece de razão o Réu, ora Recorrente, quando se insurge contra o despacho que admitiu e bem a ampliação do pedido, nesta parte improcedendo o recurso em apreciação.

III – O julgamento da matéria de facto – recurso do CHP, E.P.E..
Conforme já sustentado em acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte, de 13.09.2013, no processo nº 00802/07.7 VIS, com o mesmo Relator e que ora damos por reproduzido:
“Determina o artigo 712º do Código de Processo Civil, sob a epígrafe “Modificabilidade da decisão de facto”, no seu nº 1, aplicável por força do disposto no artigo 140º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, que:
«A decisão do tribunal de 1ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação:
a) Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artigo 685º B, a decisão com base neles proferida;
b) Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas;
(…)»
Na interpretação deste preceito tem sido pacífico o entendimento segundo o qual em sede de recurso jurisdicional o tribunal de recurso, em princípio, só deve alterar a matéria de facto em que assenta a decisão recorrida se, após ter sido reapreciada, for evidente que ela, em termos de razoabilidade, foi mal julgada na instância recorrida (neste sentido os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, de 19.10.05, processo nº 394/05, de 19.11.2008, processo nº 601/07, de 02.06.2010, processo nº 0161/10 e de 21.09.2010, processo nº 01010/09; e acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte, de 06.05.2010, processo nº 00205/07.3BEPNF, e de 14.09.2012, processo nº 00849/05.8BEVIS).
Isto porque o Tribunal de recurso está privado da oralidade e da imediação que determinaram a decisão de primeira instância: a gravação da prova, por sua natureza, não fornece todos os elementos que foram directamente percepcionados por quem julgou em primeira instância e que ajuda na formação da convicção sobre a credibilidade do testemunho.
Como defende Antunes Varela, no Manual de Processo Civil, 2ª Edição, pág. 657:
«Esse contacto directo, imediato, principalmente entre o juiz e a testemunha, permite ao responsável pelo julgamento captar uma série valiosa de elementos (através do que pode perguntar, observar e depreender do depoimento, da pessoa e das reacções do inquirido) sobre a realidade dos factos que a mera leitura do relato escrito do depoimento não pode facultar.
Por outro lado o respeito pela livre apreciação da prova por parte do tribunal de primeira instância impõe um especial cuidado no uso dos seus poderes de reapreciação da decisão de facto, e reservar as alterações da mesma para os casos em que ela se apresente como arbitrária, por não estar racionalmente fundada, ou em que seja seguro, de acordo com as regras da lógica ou da experiência comum, que a decisão não é razoável.”
Como consta, em resumo, do sumário deste acórdão (ponto I):
“1- Em sede de recurso jurisdicional o tribunal de recurso, em princípio, só deve alterar a matéria de facto em que assenta a decisão recorrida se, após ter sido reapreciada, for evidente que ela, em termos de razoabilidade, foi mal julgada na instância recorrida.”
Em sentido idêntico se pronunciam os acórdãos deste Tribunal Central Administrativo Norte:
- De 24.02.2012, no processo nº 00168/07.5 PNF:
“1- O tribunal de recurso só deve modificar a matéria de facto quando a convicção do julgador, em 1ª instância, não seja razoável, isto é, quando seja manifesta a desconformidade dos factos assentes com os meios de prova disponibilizados nos autos, dando-se assim a devida relevância aos princípios da oralidade, da imediação e da livre apreciação da prova e à garantia do duplo grau de jurisdição sobre o julgamento da matéria de facto.”
- De 07.03.2013, no processo n.º 00906/05.0 PRT:
“2. O tribunal de recurso apenas e só deve alterar a decisão sobre a matéria de facto em casos excepcionais de manifesto erro na apreciação da prova, de flagrante desconformidade entre os elementos probatórios disponíveis e essa mesma decisão.”
Feitas estas considerações genéricas, vejamos os erros de julgamento da matéria de facto em concreto apontados.

1. Contradições e obscuridades.
Alegou o Recorrente CHP, E.P.E.: antes de mais, são patentes flagrantes contradições entre a matéria dada por provada; desde logo, uma primeira contradição entre o que vinha provado das al.s C), D), E), F), G) e H) da matéria assente (pontos 3, 4, 5, 6, 7, 8 e 9 dos factos dados por provados na sentença) e o que foi dado por provado na resposta ao quesito 2º (ponto 11 dos factos dados por provados na sentença).
Com efeito, enquanto nesta resposta se diz que o falecido JMC ingressou no Réu em 25.11.2005 e que antes havia padecido de paragem cardio-respiratória no contexto de urosepsis com disfunção múltipla de órgãos, naquelas alíneas diz-se que ingressou no dia 17.08.2005 e que esteve internado no Serviço de Fisiatria até 18.11.2005, data em que teve alta passando ao regime de Hospital de Dia, e que voltou no dia 23.11.2005 para uma consulta de Fisiatria, no decorrer da qual se verificou que apresentava febre (38.5º), o que motivou que fosse enviado para o Serviço de Urgência do Réu a fim de ser diagnosticada a causa do síndroma febril, tendo-lhe sido diagnosticada urosepsis que, na noite de 23 para 24 evoluiu para choque séptico com DMO e que, tendo ficado em OBS desde as 01:45 h de 24 e ocorrido pelas 09:40 h uma PCR que se conseguiu reverter, tendo ficado internado na UCIP do Réu a partir de 25.11.2005.
Esta contradição parece resultar de se ter confundido a data de ingresso na UCIP do Réu com a data de ingresso no Réu. A verdade é aquela que já vinha provada daquelas alíneas da matéria assente, aliás admitida por acordo.
Não existe aqui uma contradição mas uma menor exactidão. A unidade de Cuidados Intensivos do Réu não é uma entidade ou realidade distinta do Réu. Apenas é mais preciso dizer que aquele internamento, a partir de 25.11.2005 não foi em qualquer outro serviço do Réu mas na UCIP.
O que conduz à necessidade de corrigir, para dar mais precisão, à resposta ao quesito 2º de forma a torná-la exactamente coincidente com a matéria já admitida por acordo, e consequente rectificação da sentença, no seu ponto 11 dos factos dados como provados, pela seguinte forma:
“Antes de ser transferido para a UCIP do Réu, o que ocorreu em 25.11.2005, o falecido havia padecido de paragem cárdio-respiratória, no contexto de urosepsis com disfunção múltipla de órgãos.”
Aponta o Réu uma outra contradição, ou, pelo menos obscuridade, resultante do que foi dado por provado na resposta ao quesito 38º (ponto 41 dos factos provados da sentença) quando confrontado, por um lado, com o dado por provado na resposta ao quesito 36º (ponto 39 dos factos provados da sentença), e por outro com os factos dados por provados nas respostas aos quesitos 25º a 31º (pontos 28 a 34 dos factos provados da sentença).
É que a matéria da resposta ao quesito 36º (ponto 39 dos factos provados da sentença) reporta-se à data de 22.12.2005 e a dos quesitos 25º a 31º (pontos 28 a 34 dos factos provados da sentença) a datas compreendidas entre 26.11.2005 e 13.12.2005.
Ora, sustenta, além de não se compreender como um facto posterior no tempo possa ser causa de factos anteriores no tempo, também se não entende como é que, sem perfuração da mucosa esofágica, possam ter sido drenados da cavidade pleural 4000 ml de um líquido com as características de Fresubin e que isso possa ter sido causa dos derrames referidos nas respostas aos quesitos 25º a 31º (pontos 28 a 34 dos factos provados da sentença), como se disse anteriores no tempo, quando, da análise à amostra retirada da drenagem efectuada em 13.12.2005, se mostrou tratar-se de líquido pleural não se tendo registado a presença de qualquer líquido alimentar (resposta aos quesitos 31º e 32º (pontos 34º e 35º dos factos provados da sentença).
Mas esta contradição não existe.
E não existe porque o Recorrente, neste ponto, parte de um pressuposto errado: o de que a data de 22.12.2005 se refere ao episódio de perfuração traumática do esófago com drenagem de líquido alimentar na pleura.
A data de 22.12.2005, referida no ponto 39 dos factos provados, é o dia em que foram drenados 4000 ml [4 litros] de um líquido da pleura.
Assim como a data de 13.12.2005, como o ora Recorrente reconhece, é o dia em que se fez uma primeira drenagem de líquido pleural.
Em ponto nenhum da matéria de facto dada como provada se refere a data em que terá ocorrido a perfuração do esófago.
Podem, em abstracto, não ter coincidido a data da perfuração do esófago e as datas da drenagem, pelo que não há contradição evidente, lógica.
Alega ainda o Réu que mais grave, porém, por respeitar ao cerne da questão, é uma outra contradição patente na matéria dada por provada nas respostas dadas aos quesitos 3º, 4º, 5º, 6º e 7º, por um lado, e a matéria dada por provada nas respostas dadas aos quesitos 16º, 17º, 18º, 19º, 20º, 21º e 22º (pontos 21, 22, 23, 24, 25, 26 e 27 dos factos dados por provados na sentença) por outro.
Com efeito, defende, enquanto naquele primeiro grupo de respostas aos quesitos se diz que a morte do marido e pai dos Autores foi consequência directa e necessária de deficiência na colocação de sonda nasogástrica com perfuração do esófago e drenagem de líquido alimentar em grande quantidade para a pleura, que teria sido devido a complicações causadas por grave infecção das vias urinárias provocada por deficiente colocação de algália com fractura da uretra, no último grupo de respostas diz-se que em 04.11.2005 ocorreu uma hematúria em consequência de algaliação traumática que originou um falso trajecto, que as hematúrias são ocorrências normais da utilização dessa técnica, que no dia 05.11.2005 foi substituída a sonda vesical, mantendo-se hematúria ligeira que desapareceu completamente a 08.11.2005 na sequência do tratamento instituído e que essa lesão traumática foi, pois, completamente curada, nada tendo a ver com a urosepsis que aconteceu 15 dias depois, tanto mais que o doente ficou em algaliação contínua e que nenhum outro incidente relacionado com a algaliação ocorreu.
Ou seja, conclui este Recorrente, enquanto num lado se considera a deficiente colocação da algália como o factor desencadeador de um conjunto de ocorrências que culminaram na morte do JMC, no outro afirma-se o contrário, contradição essa que também é extensiva à gravidade da infecção.

Vejamos.
Na verdade esta contradição existe no que diz respeito a dar por provado que a morte do JMC resultou de complicações decorrentes da fractura da uretra, devida a deficiente algaliação feita em 04.11.2005.
Isto porque tal facto é logicamente incompatível com o facto, também dado como provado, de essa lesão se encontrar completamente curada em 08.11.2005.
E a dar-se como provado será este segundo facto, o de esta lesão, da uretra, ter ficado curada, pois nesse ponto o depoimento da Senhora Perita e os registos clínicos em que se apoiou são peremptórios no sentido de que se verificou.
Já quanto ao nexo entre essa ocorrência e a morte se mostra afirmado com debilidade.
A título de exemplo, no esclarecimento prestado por escrito de 17.07.2012, a Senhora Perita, embora refira, a propósito do quesito 7º, que a “causa da morte terá sido (sic) a infecção respiratória e urinária que sobrevieram como complicação da perfuração da uretra e do esófago”, na mesma peça, imediatamente antes, afirmou que a causa da morte indicada no certificado de óbito não é informativa no que diz respeito à doença, traumatismo ou complicação que levaram directamente à morte”. Isto depois de ter afirmado, no relatório de 18.04.2012, sobre o mesmo quesito, que “não foi presente ao perito cópia do certificado de óbito no qual consta a causa da morte atribuída pelo médico que verificou o óbito pelo que o perito não possui elementos para responder ao quesito.
Ou seja: depois de afirmar que só perante o certificado de óbito poderia determinar a causa da morte e que este não continha a indicação da causa da morte, concluiu, sem mais, e não peremptoriamente, que causa da morte “terá sido” a infecção urinária, para além da infecção respiratória.
E os esclarecimentos prestados pela Senhora Perita, por videoconferência, em audiência de julgamento, quando a este ponto em concreto, nada esclareceram, mantendo-se a mesma incerteza.
No que diz respeito à perfuração do esófago a conclusão terá de ser diversa, não se vislumbrando no caso erro, menos ainda evidente, no julgamento de que a mesma se verificou e foi a causa directa e necessária do estado clínico que determinou a morte do JM.
A decisão deste ponto da matéria de facto baseou-se essencialmente no relatório pericial e nos registos hospitalares que apontam nesse sentido, pese embora alguma aparente contradição na prova produzida.
Desde logo o facto, incontroverso, de terem sido drenados, na segunda drenagem, mais de 4 litros de líquido da zona torácica, o que, é uma quantidade muito anormal como produção do próprio organismo, tanto assim que se suspeitou logo de perfuração do esófago, suspeita reforçada por outro facto, incontroverso, de a sonda nasogástrica ter sido “colocada e, posição atípica, com discreta bolha de ar na TAC de mediastino” (resposta da Senhora Perita ao quesito 23º).
A que acresce que, segundo os registos clínicos examinados pela Senhora Perita, numa análise macroscópica do líquido drenado, apresentava as “características de fresubin substância adequada como suplemento nutricional ou como única forma de nutrição em doentes em risco” – resposta da Senhora Perita aos quesitos 23º e 36º.
A circunstância de em posteriores exames não ter sido detectada perfuração do esófago e se ter determinado, em análise microscópica, que se tratava de líquido pleural não é incompatível com a conclusão anterior.
Como se refere na fundamentação da resposta dada ao quesito 23º a Senhora Perita declarou que pelos registos clínicos a análise feita na altura da drenagem, macroscópica, dispensava a análise microscópica feita posteriormente, pois o líquido apresentava as características de fresubin, amarelo, pastoso e sem cheiro, ao contrário do líquido pleural, produzido pelo próprio organismo, de aspecto purulento e mau cheiro.
A explicação dada mostra-se plausível e a única compatível com o exame macroscópico feito na altura da drenagem: a testemunha TC, médica da UCI do Réu, declarou que para a análise microscópica foi retirada apelas uma pequena amostra – ver fundamentação da resposta dada ao quesito 23º; pode esta pequena amostra ter sido retirada do líquido pleural – que também foi detectado – dando a errada ideia de que todo o líquido drenado era pleural.
Factos incontroversos apontam, com razoabilidade, para que o líquido drenado da cavidade abdominal do JMC fosse fresubin, líquido introduzido pela sonda nasogástrica para nutrição do paciente: o exame macroscópico que não suscita dúvidas apontava nesse sentido face às características que apresentava; a quantidade anormal de líquido drenado (mais de 4 litros) e a posição atípica detectada na sonda nasogástrica.
Factos que apenas são compatíveis com uma ruptura do esófago. Ruptura que por não ter sido detectada nos exames posteriores não significa que não tenha ocorrido: quer por ter entretanto cicatrizado, quer pela deficiência dos exames feitos. Neste sentido os esclarecimento da Senhora Perita prestados em audiência de julgamento e a que se refere a motivação da resposta dada ao quesito 23º.
E que, de acordo, com os critérios de normalidade, foi a causa directa e necessária do processo infeccioso que se desencadeou e da morte com que culminou esse processo.
Sendo certo que com o historial clínico do JMC, a sua extrema debilidade física, “qualquer desequilíbrio pode levar à infecção e consequente morte”. Tendo sobretudo em conta a enorme quantidade de líquido que se encontrava na cavidade abdominal, agravando a deficiência cardio-respiratória – ver depoimento e esclarecimentos da Senhora Perita que serviram de fundamento á resposta ao quesito 23º.
Deve ser, portanto, alterado o julgamento da matéria de facto quanto à fractura da uretra como causa directa e necessária da morte, por contraditória com outros factos, incontroversos, em concreto, com a cura dessa complicação decorrente de incorrecta algaliação.
E deve manter-se o julgamento da matéria de facto quanto à ocorrência da perfuração do esófago do JMC e a ocorrência da morte como causa directa dessa perfuração e da infecção daí resultante.
Assim se sanando a contradição acima apontada.

2. Os factos erradamente dados como provados.
2.1. O erro na resposta dada ao quesito 2º.
Alega o Réu, ora Recorrente: conforme já constava da matéria assente, o JMC ingressou no Réu em 17.08.2005 e aí se manteve até 18.11.2005, data em que teve alta e passou ao regime de Hospital de Dia. Voltou em 23.11.2005 para uma consulta de Fisiatria e, por apresentar febre, foi encaminhado para o SU onde ficou em OBS desde as 01:45 h de 24.11.2005. Em 25.11.2005 ingressou, não no Réu, mas mais precisamente na UCIP do Réu - alíneas C) a I) da matéria assente e documentos 3, 4 e 5 juntos com a petição inicial (folhas 30 a 38 dos autos). Há, assim, um manifesto lapso na resposta ao quesito 2º (ponto 11 da matéria provada da sentença) que deve ser corrigido substituindo-se a expressão “Antes de ingressar no Réu, o que ocorreu em 25.11.2005…” pela expressão mais exacta “Antes de ingressar na UCIP do Réu, o que ocorreu em 25.11.2005…”.
Vejamos.
A esta questão já acima foi dada resposta, no sentido de ser corrigida a resposta dada ao quesito 2º e, logo, o ponto 11 dos factos dados como provados, para maior precisão e conformidade com os factos assentes, no sentido apontado pelo ora Recorrente.

2.2. O erro na resposta dada ao quesito 4º.
Invoca neste ponto o ora Recorrente: deu-se como provado, em resposta ao quesito 3º (fractura da uretra do JMC por deficiente colocação da algália) “lhe provocou uma grave infecção das vias urinárias”; não se põem aqui em causa que tenha existido infecção das vias urinárias, nem que tal infecção possa ter sido resultado de traumatismo da uretra ou falso trajecto que tenham ocorrido na colocação da algália, pois que isso, ao provocar uma ruptura na parede da uretra, criaria uma possível porta de entrada para microrganismos infecciosos; como é abundantemente referido pelos médicos que testemunharam nos autos, a ocorrência de infecções nas vias urinárias em doentes algaliados é frequente, mesmo sem traumatismos da uretra; mas já não se pode aceitar que tal infecção seja qualificada de grave; por um lado tal qualificação representa um juízo de valor e, como tal, deveria ser expurgado da matéria de facto, pois não é matéria de facto; por outro lado as provas existentes nos autos não permitem a formulação de um tal juízo; com efeito, conforme se pode ver dos documentos 5 e 6 juntos com a petição inicial (folhas 60 a 63), o traumatismo ou falso trajecto terá ocorrido em 04.11.2005, em 05.11.2005 a hematúria era ligeira e em 08.11.2005 o JMC encontrava-se curado de tal infecção. De resto, como resulta das respostas aos quesitos 16º a 22º, tal cura foi completa, nada teve a ver com a urosepsis que aconteceu 15 dias depois, nenhum outro incidente ocorreu relacionado com a algaliação e essa é ocorrência normal da utilização dessa técnica; deve, pois, ser eliminada a palavra “grave” da resposta dada ao quesito 4º (ponto 13 da matéria provada da sentença).
Vejamos:
Na verdade o adjectivo “grave” que já constava do quesito 4º a que foi simplesmente dada a resposta “provado” é conclusivo.
Adjectivo que, de resto, não é utilizada pela Senhora Perita cujo relatório, conjugado com os registos clínicos, foi a principal prova para este quesito.
Neste relatório pode ler-se que o JMC “sofreu uma infecção urinária após algaliação traumática que originou um falso trajecto”.
Deverá, assim, no ponto correspondente ponto 13 dos factos dados como provados constar apenas:
“O que lhe provocou uma infecção das vias urinárias”.

2.3. As respostas dadas aos quesitos 5º, 6º, 7º, 23º, 24º, 36º e 38º.
Alega o Recorrente: tenha-se em conta que a infecção urinária referida nas respostas aos quesitos 3º e 4º, como se disse, se terá instalado em 04.11.2005 e que em 08.11.2005 estava curada, cura essa que, conforme resulta das respostas aos quesitos 16º a 22º (pontos 21 a 27 dos factos provados da sentença) foi completa, nada teve a ver com a urosepsis e nenhum outro incidente ocorreu com a algaliação; tenha-se também presente que a sonda nasogástrica foi colocada na sequência da rápida evolução desfavorável da urosepsis que ocorreu na noite de 23 para 24.11.2005 e que o falecido tinha vindo ao Hospital Réu no dia 23 para uma consulta de Fisiatria no decorrer da qual se verificou que apresentava febre, tendo sido encaminhado para o Serviço de Urgência para diagnóstico e tratamento do síndroma (alíneas E), F) e G) da matéria assente, factos 5, 6 e 7 da sentença); logo por aqui se vê que, não só a colocação da sonda nasogástrica referida no quesito 5º não ocorreu “quase simultaneamente” com a infecção resultante da algaliação referida nos quesitos 3º e 4º, como também que não pode ter existido qualquer relação entre esta infecção e a colocação da sonda com hipotética perfuração traumática do esófago que foi imposta pela rápida e desfavorável evolução clínica do doente ocorrida na noite de 23 para 24.11.2005; e, mais importante ainda, não há qualquer prova ou evidência de que tenha existido qualquer deficiência de colocação da sonda nasogástrica que tenha provocado perfuração traumática do esófago fazendo o líquido alimentar drenar para a pleura em grande quantidade (4.000 ml), apontando todas as provas em sentido contrário; é certo que a Senhora Perita MJCSPC, no seu relatório de folhas 214 e seguintes, pronunciando-se sobre a matéria do quesito 5º, afirma a perfuração traumática do esófago em consequência da colocação da sonda, mas pronunciando-se sobre a matéria do quesito 6º, afirma que os 4.000 ml de líquido drenado foi de líquido pleural, que não é o mesmo que líquido alimentar; porém, nos esclarecimentos que prestou em audiência em 26/05/2014, gravados no sistema de gravação Cícero Plus de 00:01:53 a 01:20:14, admite – de 00:34:00 a 00:37:10 – que tal perfuração não existiu; o que aconteceu foi que, logo que tal quantidade de líquido foi detectada foi posta, pelos médicos do Réu a hipótese de tal líquido poder ser líquido alimentar Fresubin (folhas 104 do processo clínico junto aos autos) drenado para a cavidade pleural por perfuração do esófago aquando da colocação da sonda, hipótese essa que veio a ser afastada quer pelas análises à amostra retirada desse líquido quer pela TAC e exames endoscópios para pesquisa de indícios da eventual perfuração, todos de resultados negativos para essa hipótese (v. folhas 105, 109 vº, 117, 611, 612 e 617 do processo clínico junto aos autos); isso, bem como a impossibilidade de tal acumulação de líquido alimentar Fresubin na cavidade pleural pela via da perfuração do esófago ou por outra relacionada com a colocação da sonda é confirmado e explicado nos depoimentos das testemunhas: - TMCC, especialista de medicina interna, no seu depoimento de 26.05.2014 gravado em CD no sistema Cícero Plus de 00:52:47 a 01:53:26 – v. de 01:02:45 a 01:06:25; de 01:15:30 a 01:20:10; de 01:23:20 a 01:29:30 e de 01:33:10 a 01:50:25; - AMSB, especialista de medicina interna, no seu depoimento de 26.05.2014 gravado em CD no sistema Cícero Plus de 01:54:25 a 02:33:09 – v. de 01:58:30 a 02:03:30; 02:04:05 a 03:12:57 e de 02:13:20 a 02:32:20; - IMCA, especialista em anestesia e cuidados intensivos, no seu depoimento de 27/05/2014 gravado em CD no sistema Cícero Plus de 00:01:15 a 01:04:27 – v. de 00:13:50 a 00:31:30; de 00:34:00 a 00:48:50 e de 00:54:30 a 01:03:00; - FMCP, especialista em gastrenterologia, no seu depoimento de 27/05/2014 gravado em CD no sistema Cícero Plus de 02:45:24 a 03:09:35 – v. de 02:48:00 a 03:09:30; - PDBMMP, especialista de medicina física e de reabilitação, no seu depoimento gravado de 27/05/2014 gravado em CD no sistema Cícero Plus de 01:06:34 a 01:49:37 – v. de 01:19:00 a 01:20:00 e de 01:29:00 a 01:48:00; - MJNSA, especialista em medicina física e de reabilitação, no seu depoimento de 27/05/2014 gravado em CD no sistema Cícero Plus de 01:50:26 a 02:44:02 – v. de 01:53:00 a 01:56:10, e de 01:03:00 a 02:18:00; - NRML, especialista de urologia, no seu depoimento de 27.05.2014 gravado em CD no sistema Cícero Plus de 03:10:15 a 03:19:47 –v. de 03:13:00 a 03:19:45; acresce que a urosepsis, diagnosticada a 23.11.2005 e que se complicou na noite de 23 para 24.11.2005, encontrava-se resolvida em 07.12.2005, conforme anotação de folhas 90 do processo clínico junto aos autos, tendo a morte ocorrido em 09.03.2006; resulta assim que a matéria dos quesitos 5º, 6º, 7º, 23º, 24º, 36º e 38º se encontram mal julgada, pois que os 5º, 6º, 7º e 38º deveriam ter sido julgados não provados, os 23º e 24º deveriam ter sido julgados provados e, quanto ao 36º, não deveria ter sido dado por provado que o líquido drenado tinha as características de Fresubin, pois que as não tinha.

Apreciemos:
Já acima se adiantou em parte a resposta a esta questão, a propósito da contradição detectada na resposta aos quesitos 3º, 4º, 5º, 6º e 7º, por um lado, e a matéria dada por provada nas respostas aos quesitos 16º, 17º, 18º, 19º, 20º, 21º e 22º (pontos 21, 22, 23, 24, 25, 26 e 27 dos factos dados por provados na sentença) por outro.
No que diz respeito à ruptura da uretra não ficou provado que tenha sido a causa da infecção que acabou por se espelhar pelo organismo do JMC e foi a causa da sua morte pois se provou que ficou curada.
Já no que toca à perfuração do esófago a conclusão é diversa, não se mostrando errado, menos ainda de forma evidente, antes acertado, o julgamento da matéria de facto quanto a este ponto, de que tal perfuração se verificou e foi a causa directa e necessária do estado clínico que determinou a morte do JMC.
A decisão deste ponto da matéria de facto baseou-se essencialmente no relatório pericial e nos registos hospitalares que apontam nesse sentido, pese embora alguma aparente contradição na prova produzida.
Desde logo o facto, incontroverso, de terem sido drenados, na segunda drenagem, mais de 4 litros de líquido da zona torácica, o que, é uma quantidade muito anormal como produção do próprio organismo, tanto assim que se suspeitou logo de perfuração do esófago, suspeita reforçada por outro facto, incontroverso, de a sonda nasogástrica ter sido “colocada e, posição atípica, com discreta bolha de ar na TAC de mediastino” (resposta da Senhora Perita ao quesito 23º).
A que acresce que, segundo os registos clínicos examinados pela Senhora Perita, numa análise macroscópica do líquido drenado, apresentava as “características de fresubin substância adequada como suplemento nutricional ou como única forma de nutrição em doentes em risco” – resposta da Senhora Perita aos quesitos 23º e 36º.
A circunstância de em posteriores exames não ter sido detectada perfuração do esófago e se ter determinado, em análise microscópica, que se tratava de líquido pleural não é incompatível com a conclusão anterior.
A explicação dada na fundamentação da decisão recorrida mostra-se plausível e a única compatível com o exame macroscópico feito na altura da drenagem: a testemunha TC, médica da UCI do Réu, declarou que para a análise microscópica foi retirada apelas uma pequena amostra – ver fundamentação da resposta dada ao quesito 23º; pode esta pequena amostra ter sido retirada do líquido pleural – que também foi detectado – dando a errada ideia de que todo o líquido drenado era pleural.
Factos incontroversos apontam, com razoabilidade, para que o líquido drenado da cavidade abdominal do JMC fosse líquido para nutrição do paciente: o exame macroscópico que não suscita dúvidas apontava nesse sentido face às características que apresentava; a quantidade anormal de líquido drenado (mais de 4 litros) e a posição atípica detectada na sonda nasogástrica.
Factos que apenas são compatíveis com uma ruptura do esófago. Ruptura que por não ter sido detectada nos exames posteriores não significa que não tenha ocorrido: quer por ter entretanto cicatrizado, quer pela deficiência dos exames feitos. Neste sentido os esclarecimento da Senhora Perita prestados em audiência de julgamento e a que se refere a motivação da resposta dada ao quesito 23º.
E que, de acordo, com os critérios de normalidade, foi a causa directa e necessária do processo infeccioso que se desencadeou e da morte com que culminou esse processo pois face ao historial clínico do JMC, à sua extrema debilidade física, qualquer desequilíbrio poderia levar – como levou, concluímos - à infecção e consequente morte. Tendo sobretudo em conta a enorme quantidade de líquido que se encontrava na cavidade abdominal, agravando a deficiência cardio-respiratória, de acordo com o depoimento e esclarecimentos da Senhora Perita que serviram de fundamento á resposta ao quesito 23º.
Deve ser, portanto, alterado o julgamento da matéria de facto quanto à fractura da uretra como causa directa e necessária da morte, por contraditória com outros factos, incontroversos, em concreto, com a cura dessa complicação decorrente de incorrecta algaliação.
E deve, manter-se o julgamento da matéria de facto quanto à ocorrência da perfuração do esófago do JMC e a ocorrência da morte como causa directa dessa perfuração e da infecção daí resultante.
Olhando em concreto para os quesitos postos em crise pelo ora Recorrente:
-A resposta ao quesito 5º, com a consequente alteração do ponto 14º dos factos provados deve ser:
Provado apenas que “Ao ser-lhe colocada uma sonda nasogástrica para o alimentar, ocorreu, por grave deficiência de colocação, perfuração traumática do esófago”.
- A resposta ao quesito 6º, retirando-se o conceito conclusivo e desnecessário de “grande”, com a consequente alteração do ponto 15º dos factos provados:
Provado apenas que “Pelo que o líquido alimentar drenou para a pleura em cerca de 4 litros”.
Resposta ao quesito 7º com a consequente alteração do ponto 16º dos factos provados:
Provado apenas que “Tendo o marido e pai dos Autores acabado por falecer como consequência directa e necessária da infiltração de líquido alimentar na pleura e da infecção que daí adveio”:
Deve manter-se a resposta aos quesitos 23º e 24º de “não provado”, dado se ter provado que houve deficiente colocação da sonda nasogástrica e consequente perfuração do esófago e drenagem de cerca de 4 litros de líquido alimentar para a pleura.
Quanto ao quesito 36º - e, logo, ponto 39º dos factos provados -, a resposta está correcta e funda-se nos relatórios clínicos que serviram de base ao relatório da Senhora Perita em que se baseou a decisão recorrida neste ponto.
Finalmente, quanto ao quesito 38º - e o facto dado como provado sob o n.º 41 – deve manter-se, dado o acerto no julgamento da matéria de facto na resposta aos quesitos 25º a 31º e 33º - pontos 28º a 34º e 36º dos factos provados – face ao consistente depoimento da Senhora Perita nesta matéria na análise dos registos clínicos que também nesta parte não suscitam dúvidas.

Consideram-se, por isso, provados os seguintes factos:
1 - No dia 17.03.1957 nasceu JMC– vide certidão de nascimento de folhas 8 dos autos.
2 - Em 09.03.2006 faleceu sem testamento JMC, no estado de casado com a Autora MFMA, deixando como único descendente seu filho e da Autora, SOC, nascido a 02.12.1980 – vide certidões de fls. 8 a 12 dos autos.
3 - O falecido JMC ingressou no então HGSA, EPE, hoje UHGSA do Réu, no dia 17.08.2005, vindo transferido do HCSB, hoje UST do CHMA, acompanhado das informações constantes dos documentos de fls. 51 e 52 dos autos.
4 - O falecido esteve internado no HSA, no Serviço de Fisiatria, até 18.11.2005, data em que teve alta, passando a regime de Hospital de Dia – Documento de fls. 53 a 58 dos autos.
5 - O falecido voltou ao HSA no dia 23.11.2005 para uma consulta de Fisiatria, no decorrer da qual se verificou que apresentava febre (38,5°), tendo o próprio doente referido que apresentou, no fim-de-semana anterior, sindroma febril que passou com antipiréticos – documento de folhas 59 dos autos.
6 - Por tal motivo, o falecido foi imediatamente encaminhado para o Serviço de Urgência do Réu a fim de se diagnosticar a causa do síndrome, tendo sido diagnosticada urosepsis e iniciado tratamento com amoxicilina /ácido clavulânico – documento fls. 60 e 61 dos autos.
7 - A situação clínica do doente evoluiu desfavoravelmente muito rapidamente, de tal modo que, na noite de 23 para 24.11.2005, evoluiu para choque séptico com DMO (respiratória, metabólica e renal).
8 - Ainda neste Serviço ficou em observação desde as 01,45 horas de 24.11.2005, tendo, pelas 09,40 horas ocorrido uma paragem cardio-respiratória no contexto de choque séptico por urosepsis (por proteus mírabilis), tendo feito encefalopatia por anóxia, paragem crdio respiratória que se conseguiu reverter.
9 - Em 25.11.2005, JMC foi internado na Unidade de Cuidados Intensivos UCIP do Réu, onde se manteve até 24.01.2006, data em que foi transferido para Medicina l-D, onde permaneceu até 27.02.2006, altura em que foi transferido para o Serviço de Fisiatra, onde veio a falecer em 09.03.2006.
10 - Em Julho de 2005, o falecido JMCsofreu um grave acidente de viação, que lhe causou traumatismo vertebro-medular com paraplegia e bexiga neurogénica com algaliação crónica.
11 - Antes de ser transferido para a Unidade de Cuidados Intensivos UCIP do Réu, o que ocorreu em 25.11.2005, o falecido havia padecido de paragem cardio-respiratória, no contexto de urosepsis com disfunção múltipla de órgãos.
12 - Em pleno internamento no Réu e encontrando-se o falecido então em franca recuperação, por deficiente colocação da algália, sofreu fractura da uretra.
13 - O que lhe provocou uma infecção das vias urinárias.
14 - Ao ser-lhe colocada uma sonda nasogástrica para o alimentar, ocorreu, por grave deficiência de colocação, perfuração traumática do esófago.
15 - Pelo que o líquido alimentar drenou para a pleura, em cerca de 4 litros.
16 - Tendo o marido e pai dos Autores acabado por falecer, como consequência directa e necessária da infiltração de líquido alimentar na pleura e da infecção que daí adveio.
17 - O falecido era sócio gerente de uma oficina de chaparia e pintura de automóveis.
18 - O falecido foi submetido a múltiplos e dolorosos tratamentos, tendo-lhe sido feito, nomeadamente, uma traqueotomia.
19 – O falecido padeceu de abalo moral e angústia profunda.
20 - Os Autores sofreram abalo moral com a morte do visado [enquanto marido, e enquanto pai].
21 - No dia 05.11.2005, de manhã, foi substituída a sonda vesical ao falecido, mantendo-se hematúria ligeira desde essa altura na sequência de traumatismo/descompressão pós retenção.
22 - Tal hematúria havia desaparecido completamente a 08.11.2005 na sequência do tratamento antibiótico que foi instituído.
23 - Essa lesão traumática foi, pois, completamente curada, nada tendo a ver com a urosepsis que aconteceu quinze dias depois.
24 - Tanto mais que o doente ficou em algaliação contínua.
25 - Nenhum outro incidente relacionado com a algaliação ocorreu.
26 - Em 04.11.2005, ocorreu uma hematúria em consequência de algaliação traumática que originou um falso trajecto.
27 – As hematúrias são ocorrências normais da utilização dessa técnica.
28 - O que sucedeu foi que, desde 26.11.2005 o doente começou a apresentar secreções brônquicas purulentas, por vezes em grande quantidade.
29 - Em 01.12.2005, o falecido apresentou derrame de médio volume à direita, revelado por ecografia.
30 - Apesar da terapêutica antibiótica instituída, mantiveram-se as referidas secreções.
31 - Em 10.12.2005 registou-se novo derrame pleural à direita bilateral.
32 - Em 12.12.2005 detectou-se derrame pleural bilateral de grande volume à direita e de médio volume à esquerda, suspeitando-se de empiema.
33 - No dia 13.12.2005 procedeu-se à drenagem por técnica cirúrgica de desbridamento.
34 - Do líquido drenado, na parte que foi tomado para análises, revelou ser líquido pleural.
35 – À data da realização das análises, e tomada uma amostra, não se registou a presença de qualquer líquido alimentar.
36 - Apesar dos cuidados e tratamentos que lhe foram efectuados, o JMC veio a falecer em 09.03.2006 por paragem cardio-respiratória em contexto de infecção respiratória em doente com tetraplegia e encefalopatia anóxica.
37 - Os tratamentos a que o falecido foi submetido foram dolorosos.
38 - O abalo moral e a angústia de que o falecido padeceu, para lá das consequências do acidente de que foi vítima, teve a ver com os tratamentos que lhe foram feitos no Réu.
39 – Os registos clínicos documentam que não foi detectada a perfuração da mucosa esofágica, e que em 22.12.2005, foram drenados 4000 ml [4 litros] de um líquido com características de fresubin e 1500 ml [1,5 litros] de líquido purulento.
40 - O falecido esteva em regime de Auto algaliação intermitente e após a colocação traumática da algália, em 04.11.2005, ficou com algaliação permanente.
41 - O que foi dado como provado sob os pontos 28 a 34, e 36, da matéria de facto enunciada supra, foi causado pelo que foi dado como provado sob o ponto 39 da matéria de facto enunciada supra.
42 - A petição inicial que motiva os presentes autos, foi remetida a este Tribunal em 20.02.2009, e o Réu foi citado em 22.06.2009 – cfr. folhas 2 e 17 dos autos em suporte físico.
*
IV - Enquadramento jurídico.
1. A existência de responsabilidade – recurso do CHP, E.P.E..
O Réu veio defender que não se verificam os pressupostos da responsabilidade que lhe é imputada pois não ficou provada qualquer acção ou omissão culposa e ilícita da sua parte ou dos seus funcionários ou agentes nem qualquer nexo de causalidade entre a actuação destes e o sucedido ao malogrado JM.
Já se defendeu, no acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte de 30.11.2012, no processo 01425/04.8 BRG (com voto de vencido lavrado com o projecto integral que ficou vencido) que se justifica nestes casos, de alegado erro médico, a aplicação da presunção de culpa prevista no artigo 799º, n.º1 Código Civil, por estarmos perante uma situação de facto equivalente a da prestação de serviços, de saúde, neste caso.
Posição que se manteve no voto de vencido no acórdão Tribunal Central Administrativo Norte de 18.11.2016, no processo 783/10.0 CBR.
A posição maioritária, até ao momento, tem sido no entanto a que fez vencimento neste último acórdão e, entre outros, no acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte de 19.02.2016, no processo 473/07.0 CBR, de que estamos perante um caso de responsabilidade extracontratual sem qualquer presunção de culpa.
No caso, porém, a solução que se impõe é a mesma, a sustentada na decisão recorrida pois estão verificados todos os pressupostos de ambos os tipos de responsabilidade, incluindo a culpa que aqui não é preciso presumir, antes se mostra efectiva.
Um funcionário do Réu, não identificado, violou as leges artis na colocação de sonda nasogástrica de forma atípica, com perfuração do esófago, que conduziu à drenagem de cerca de 4 litros de líquido alimentar para a pleura, o que provocou uma infecção que veio a determinar a morte do JMC (factos provados sob os n.ºs 14 a 16.
Esse agente podia e devia ter colocado a sonda nasogástrica de forma a não perfurar o esófago da vítima, evitando assim a sua morte.
Violou, por isso, o dever de cuidado a que estava obrigado qualquer funcionário de um Centro Hospitalar colocado na situação de ter que colocar uma sonda nasogástrica, agindo, por isso, com culpa, porque podia e devia ter agido segundo as leges artis e não agiu.
Quanto ao nexo de causalidade, o artigo 563º do Código Civil, pela sua redacção e pela análise dos trabalhos preparatórios do Código Civil, na parte referente a este preceito, revela a consagração da teoria da causalidade adequada, pois que outra interpretação da vontade do legislador parece estar excluída.
Para quem defende uma formulação positiva da causa adequada o dano é causa adequada se for consequência normal, típica do facto.
Quem defende a via da formulação negativa da causa adequada, da autoria de Ennecerus Nipperdey, o facto é causa adequada do dano se foi condição que não se mostrou de todo em todo indiferente para a verificação do dano, segundo a sua natureza geral, não tendo o dano sido resultado de circunstâncias excepcionais, anormais, extraordinárias ou anómalas que intercederam no caso concreto.
Sendo esta versão que sufragamos e defendida por Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol. I, 4ª edição, pág. 797/798.
Provou-se – facto 16 – que o JMC faleceu como consequência directa e necessária da actuação do dito funcionário do Réu, pelo que se verifica o nexo de causalidade entre os factos e os danos que se verificara, quer na sua vertente positiva, quer na sua vertente negativa, já que não foi alegado, nem consequentemente provado que outras circunstâncias excepcionais, anormais, extraordinárias ou anómalas tivessem concorrido para causar a morte daquele.
Determinada a responsabilidade civil do Réu, cumpre determinar os danos causados à vítima e aos seus familiares directos e quantificá-los.

2. Os danos indemnizáveis – recurso dos Autores.
São pedidos valores de indemnização de danos de natureza patrimonial e não patrimonial, assim discriminados:

2.1. Danos patrimoniais:
Determina o artigo 495º nº 5 do Código Civil que têm direito a indemnização os que podiam exigir alimentos ao lesado ou aqueles a quem o lesado os prestava no cumprimento de uma obrigação natural.
Como dano patrimonial estão pedidos pelos seus herdeiros legais, os Autores, também ora Recorrente, lucros cessantes, danos futuros, decorrentes do facto do JC ser sócio-gerente de uma oficina de chaparia e pintura de automóveis, o que se provou; do facto de ele nela trabalhar como chapeiro e pintor de automóveis, auferindo um rendimento mensal líquido médio de 2.000 euros e que, se não tivesse falecido, mesmo padecendo de paraplegia, em cadeira de rodas, poder continuar a dirigir e orientar a sua oficina, o que permitiria, nessas condições físicas, auferir um rendimento mensal médio e líquido, nunca inferior a 750 euros, o que se não provou.
O ónus da prova dos danos sofridos é da competência dos Autores – artigo 342º, nº 1, do Código Civil -, pelo que a ausência dessa prova reverte contra os por ela onerados.
Assim, decidiu bem a 1ª Instância ao não fixar qualquer quantia, a este título, julgando o pedido nessa parte improcedente, uma vez que não se provou que tivesse havido uma perda de rendimentos do agregado familiar do falecido por virtude da morte deste.

2.2. Danos não patrimoniais:
O artigo 496º nº 1 do Código Civil dispõe que “na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito”, acrescentando o seu nº 3, na redacção anterior à introduzida pela Lei nº 23/2010, de 30.08 que “o montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494º”. Por sua vez, neste artigo 494 diz-se que “quando a responsabilidade se fundar na mera culpa, poderá a indemnização ser fixada, equitativamente, em montante inferior ao que corresponderia aos danos causados, desde que o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso o justifiquem”.

2.2.1. Dano da perda do direito à vida.
Em consequência dos factos supra descritos faleceu JMC, marido da Autora, MF e do Autor, SO.
Provou-se que JMC morreu em consequência de deficientes técnicas de tratamentos que foram causa adequada da sua morte; sobrevindo a lesão do bem fundamental, impõe-se fixar a indemnização pela supressão do direito à vida, que se transmite aos referidos Autores.
Nesta sede de danos não patrimoniais, e dada a natureza imaterial dos valores ofendidos, vedando a possibilidade de restauração natural, procura-se o montante que, segundo critérios de equidade, nos termos do artigo 496º nº 3 do Código Civil, na redacção anterior à introduzida pela Lei nº 23/2010, de 30.08, compense o lesado da perda sofrida, assegurando-lhe uma real e efectiva compensação.
In casu, a vítima, à data da sua morte, tinha 48 anos, faltando oito dias para completar os 49 anos de idade. Tinha sofrido em Julho de 2005 um grave acidente de viação que lhe causou traumatismo vertebro-medular com paraplegia e bexiga neurogénica com algaliação crónica e que motivou o seu internamento no HCSB, hoje UST do CHMA e a partir do dia 17.08.2005 e até 18.11/2005 e desde 23/11/2005 até à data da sua morte, no Réu, condicionado na sua capacidade física, psíquica e emocional.
Defendem os Autores que a fixação pela 1ª instância da compensação pela perda do direito à vida tem de ser igual para todos, independentemente das circunstâncias em que ocorreu o decesso.
Entendemos no entanto que, embora contida dentro de determinados limites, a indemnização pelo dano morte não é a mesma no caso de falecer uma criança de 10 anos, que tinha toda uma vida pela sua frente para ser vivida e gozada, ou de morrer um adulto de 70 anos, que, tendo presente a esperança média de vida, somente viveria por volta de mais uma dezena de anos ou alguém que, como no caso do JC ficou tetraplégico e que, por isso, tinha uma esperança de vida mais reduzida que a média das pessoas, não se justifica uma indemnização próxima dos limites máximos mas antes próximas dos limites mínimos praticados pelos nossos Tribunais.
Em termos absolutos não há dinheiro nenhum que pague uma vida mas a partir do momento em que se ficciona um valor para a vida para efeitos de indemnização não se vê como não atender a factores objectivos que distinguem cada situação para no caso concreto fixar um valor equitativo.
Só assim se respeita o princípio da igualdade, fixando diferentes valores para situações diferentes.
JC faleceu com praticamente 49 anos mas numa condição física que lhe permitia uma fraca esperança de vida, pelo que, atendendo a que os valores indemnizatórios que vêm sendo atribuídos pela perda do direito à vida, têm na maioria dos casos oscilado entre os 50.000€ e os 80.000 € como é afirmado no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 16.03.2017, no processo nº 294/07. 0 TBPCV.C1.S1 (cfr. toda a jurisprudência aí citada) ponderando estas circunstâncias e os critérios enunciados no artigo 494º do Código Civil, designadamente os jurisprudenciais, fixa-se em 60.000 € (sessenta mil euros) a indemnização pela perda do direito à vida daquele.
Quantia fixada com referência à presente data, ou seja, actualizada, pelo que os juros de mora só são devidos a partir da presente data e não a partir da citação, como defendeu o Réu nas suas contra-alegações do recurso interposto pelos Autores.
Transmite-se à esposa e ao seu filho, por via sucessória, cabendo metade a cada um deles nos termos dos artigos 2133º alínea a) e 2139º, nº 1, do Código Civil, ou seja, 30.000 € a cada Autor.

2.2.2. O sofrimento da vítima com os tratamentos a que foi sujeito desde que ingressou no Réu até ao falecimento.
Este dano foi fixado em 17.500 €, o que os Autores reputaram de muito escasso, tendo pedido a sua fixação na quantia de 50.000€.
Provado ficou que a vítima foi submetida a múltiplos e dolorosos tratamentos, e, nomeadamente, tendo sofrido fractura da uretra, com consequente grave infecção das vias urinárias, quase simultaneamente e devido a complicações causadas pela dita infecção, ao ser-lhe colocada sonda nasogástrica para o alimentar, ocorreu, por grave deficiência de colocação, perfuração do esófago, com drenagem para a pleura de cerca de 4 litros de liquido alimentar, tendo ainda sido submetido a uma traqueotomia, o que tudo lhe causou abalo moral e angústia profunda, apresentou ainda desde 26.11.2005 secreções brônquicas purulentas, por vezes em grande quantidade, em 01.12.2005 derrame de médio volume à direita, seguido em 10.12.2005 de novo derrame pleural à direita bilateral, a que se seguiu em 12.12.2005 derrame pleural bilateral de grande volume à direita e de médio volume à esquerda, suspeitando-se de empiema, teve que ser submetido, em 13.12.2005 a drenagem por técnica cirúrgica de desbridamento e em 22.12.2005 foram drenados 4 litros de um líquido com características de fresubin e 1,5 litros de líquido purulento, tudo tendo causado enorme sofrimento àquele até à data da sua morte – em 09.03.2006 – ou seja, durante cerca de 4 meses.
Assim, afigura-se-nos que a quantia de 25.000 € é ajustada para compensação do enorme sofrimento que a vítima suportou entre os deficientes tratamentos médicos prestados por funcionários do Réu e a data da sua morte, cabendo 12.500 € a cada Autor, em via sucessória, por este dano.

2.2.3. O sofrimento de cada um dos Autores causado pela morte do, respectivamente, marido e pai.
De harmonia com o nº 2 do artigo 496º do Código Civil são também indemnizáveis os danos não patrimoniais causados aos familiares da vítima, no caso concreto, os seus pais.
MF e SO perderam um marido e pai, que naturalmente amavam, tendo sofrido abalo moral e angústia com a morte do visado.
Para compensar tais danos, e apelando, mais uma vez, a critérios de bom senso e razoabilidade, fixa-se em 17.500 € euros a indemnização a atribuir à Autora mulher, que vivia com o marido e, por isso, mais sente a sua falta e 12.500 € euros ao Autor filho, que sendo maior e com vida independente do pai, terá maior facilidade em superar a ausência.

2.2.4. Os juros de mora.
Sobre as importâncias devidas a título de danos morais são devidos também juros de mora às taxas legais sucessivamente em vigor e que nesta data é de 4% ao ano, contados desde a prolação do presente acórdão até efectivo e integral pagamento – artigo 805º nº 3, 806º nºs 1 e 2, 559º nº 1, todos do Código Civil e Portaria n.º 291/03, de 08.04.
À partida, no caso de indemnização por danos morais, os juros tanto se podem contar desde a citação como desde a prolação da decisão condenatória.
Como se refere no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26.02.2004, no processo 04B3378 (sumário):
“Na interpretação do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência nº4/2002, de 9/5 tem vindo a ser entendido no Supremo que:
- embora não seja exigível, para se concluir ter havido a actualização indemnizatória nos termos do artigo 566º, nº2 do Código Civil, que disso se faça expressa menção na decisão, deve, no entanto, transparecer do seu teor que a actualização teve lugar, designadamente com a referência aos respectivos critérios utilizados (taxa de inflação, correcção monetária, decurso do tempo desde a propositura da acção);
- se a actualização não transparecer do teor da decisão, os juros moratórios deverão ser contabilizados desde a citação sem que se distinga, para tal efeito, entre danos não patrimoniais e as demais diversas categorias de danos indemnizáveis em dinheiro e susceptíveis, portanto, de cálculo actualizado nos termos do nº2 do artigo 566º do CC.”
Sucede que no caso concreto, e tendo em conta a Jurisprudência citada, o valor atribuído a este título é um valor actualizado pelo que os juros são devidos não desde a citação, mas desde a presente data.

2.2.5. Resumo dos valores devidos.
São, em suma, os seguintes montantes indemnizatórios que entendemos serem devidos, como justos e equitativos:
Dano da perda da vida do JMC: 60.000 €.
Dano do sofrimento próprio: 25.000 €
Dano do sofrimento da Autora:17.500 €.
Dano do sofrimento do Autor: 12.500 €.
*

V - DECISÃO:
Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em:
V.I. – Negar provimento ao recurso interposto pelo Réu.
V.II. – Conceder parcial provimento ao recurso interposto pelos Autores, pelo que:
1. Revogam parcialmente, a decisão recorrida, julgando a acção parcialmente procedente e, em consequência:
a) Condenam o Réu CHP, E.P.E. no pagamento da quantia global de 115.000 € (cento e quinze mil euros), sendo 60 € (setenta mil euros) à Autora MFMA e 55.000€ (cinquenta e cinco mil euros) ao Autor SOC.
b) Condenam o referido Réu no pagamento de juros de mora à taxa legal anual (agora de 4%) sobre as referidas quantias a cada um dos Autores, vencidos a partir da presente data até integral e efectivo pagamento.
c) Absolvem o aludido Réu do demais contra si peticionado.
Custas do recurso interposto pelos Autores, por estes e pelo Réu, na proporção do decaimento, sem prejuízo do apoio judiciário de que os Autores beneficiam.
Custas do recurso interposto pelo Réu da exclusiva responsabilidade deste.
*
Porto, 16.02.2018
Ass. Rogério Martins
Ass. Luís Garcia
Ass. Alexandra Alendouro
***
Em 19-04-2018, foi proferido o seguinte acórdão de rectificação:

Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

MFM e SOC vieram interpor RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, pela qual foi julgada parcialmente procedente a acção administrativa comum, intentada pelos recorrentes contra CHP, E.P.E., e que, em consequência, condenou o Réu a pagar aos Autores, ora Recorrentes, as quantias a seguir discriminadas, acrescidas de juros de mora, à taxa legal, desde a sua citação até efectivo e integral pagamento: a) a quantia de 35.000 € (trinta e cinco mil euros) pela privação do direito à vida do JMC; b) a quantia de 17.500 € (dezassete mil e quinhentos euros), a título de danos não patrimoniais sofridos pelo JMC; c) a quantia de 20.000 € (vinte mil euros), a título de danos não patrimoniais sofridos pelos Autores (14.000 € para a Autora mulher e 6.000 € para o Autor filho), absolvendo o Réu nos demais pedidos.
*
Invocaram, para tanto, em síntese, que as quantias fixadas pela 1ª Instância pecam por defeito e pugnam pela fixação, em sua substituição, das seguintes quantias: a) pela perda do direito à vida do familiar dos Autores, 60.00,00 €; b) pelos danos não patrimoniais do marido e pai dos Autores, 50.000 €; c) pelos danos não patrimoniais dos Autores, 50.000 €; d) pelos danos patrimoniais decorrentes da morte do marido e pai dos Autores, 40.000 €.
*
Foi relatado por este Tribunal, em 16.02.2018, acórdão que terminou com o seguinte dispositivo decisório:
“Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em:
V.I. – Negar provimento ao recurso interposto pelo Réu.
V.II. – Conceder parcial provimento ao recurso interposto pelos Autores, pelo que:
1. Revogam parcialmente, a decisão recorrida, julgando a acção parcialmente procedente e, em consequência:
a) Condenam o Réu CHP, E.P.E. no pagamento da quantia global de 115.000 € (cento e quinze mil euros), sendo 60 € (setenta mil euros) à Autora MFMA e 55.000€ (cinquenta e cinco mil euros) ao Autor SOC.
b) Condenam o referido Réu no pagamento de juros de mora à taxa legal anual (agora de 4%) sobre as referidas quantias a cada um dos Autores, vencidos a partir da presente data até integral e efectivo pagamento.
c) Absolvem o aludido Réu do demais contra si peticionado.
Custas do recurso interposto pelos Autores, por estes e pelo Réu, na proporção do decaimento, sem prejuízo do apoio judiciário de que os Autores beneficiam.
Custas do recurso interposto pelo Réu da exclusiva responsabilidade deste”.
*
Imediatamente antes, tinha-se feito o resumo das quantias a pagar aos Autores, como montantes indemnizatórios:
“2.2.5. Resumo dos valores devidos.
São, em suma, os seguintes montantes indemnizatórios que entendemos serem devidos, como justos e equitativos:
Dano da perda da vida do JMC: 60.000 €.
Dano do sofrimento próprio: 25.000 €
Dano do sofrimento da Autora:17.500 €.
Dano do sofrimento do Autor: 12.500 €.”
Feitas as contas, cabe à Autora 60.000 € (sessenta mil euros) de total indemnizatório ((60.000:2) + 12.500 + 17.500).
O que, de resto, resulta de se ter fixado o valor global indemnizatório de 115.000 € (cento e quinze mil euros) para ambos os Autores, sendo 55.000 € para o Autor SOC.
Pelo que é manifesto o lapso de escrita constante da transcrita alínea a) do dispositivo decisório:
“… sendo 60 € (setenta mil euros) à Autora MFMA”.
*
Deste acórdão não foi interposto qualquer recurso dentro dos prazos legais.
O que não impede que, por rigor, o acórdão não seja rectificado por iniciativa do Tribunal e a todo o tempo, dado não ter sido interposto recurso – artigos 613º, n.ºs 1 e 2, 614º, n.ºs 1 e 3, e 666º, n.º2, todos do Código de Processo Civil (de 2013), aplicáveis por força do disposto nos artigos 1º e 140º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
*
Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em rectificar o acórdão de 16.02.2018 pelo presente acórdão que daquele passará a fazer parte integrante, passando o respectivo dispositivo decisório, o seguinte:
“Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em:
V.I. – Negar provimento ao recurso interposto pelo Réu.
V.II. – Conceder parcial provimento ao recurso interposto pelos Autores, pelo que:
1. Revogam parcialmente, a decisão recorrida, julgando a acção parcialmente procedente e, em consequência:
a) Condenam o Réu CHP, E.P.E. no pagamento da quantia global de 115.000 € (cento e quinze mil euros), sendo 60.000 € (sessenta mil euros) à Autora MFMA e 55.000€ (cinquenta e cinco mil euros) ao Autor SOC.
b) Condenam o referido Réu no pagamento de juros de mora à taxa legal anual (agora de 4%) sobre as referidas quantias a cada um dos Autores, vencidos a partir da presente data até integral e efectivo pagamento.
c) Absolvem o aludido Réu do demais contra si peticionado.
Custas do recurso interposto pelos Autores, por estes e pelo Réu, na proporção do decaimento, sem prejuízo do apoio judiciário de que os Autores beneficiam.
Custas do recurso interposto pelo Réu da exclusiva responsabilidade deste”.
Porto, 19.04.2018
Ass. Rogério Martins
Ass. Luís Garcia
Ass. Alexandra Alendouro