Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00210/21.7BECBR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:06/02/2023
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Ricardo de Oliveira e Sousa
Descritores:PENSÃO DE VELHICE;
CONTAGEM DE TEMPO DE SERVIÇO MILITAR OBRIGATÓRIO;
CASO RESOLVIDO;
Sumário:I- Com a entrada em vigor da Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro, foi garantido o reconhecimento geral e a contagem integral do tempo de serviço militar obrigatório e das eventuais bonificações a que haja lugar, para efeitos de aposentação ou reforma, abrangendo esta garantia apenas os subscritores da CGA, I. P., e os beneficiários da segurança social que (i) ainda não tinham requerido a contagem do tempo de serviço militar obrigatório ou das bonificações ou (ii) que, já o tendo requerido, os respetivos processos ainda não estavam concluídos.

II- Apresentando-se distintivo que o Recorrente não preenche nenhuma destas condições, é de concluir que o Recorrente não pode beneficiar da extensão dos efeitos desta normação à sua situação particular, tanto mais que o reconhecimento da tutela pretendida pelo Autor sempre brigaria com os efeitos do “caso resolvido” firmados a propósito dos pedidos de atribuição de pensão de velhice formulados pelo Autor nos anos de 2015 e 2018, o que não é de admitir sob pena de subversão do princípio da segurança jurídica, imanente ao Estado de Direito.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
* *
I – RELATÓRIO
1. «AA», Autor nos autos à margem referenciados de AÇÃO ADMINISTRATIVA em que é Réu o INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, IP – CENTRO NACIONAL DE PENSÕES, vem interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença promanada nos autos, que julgou improcedente a presente ação.
2. Alegando, o Recorrente formulou as seguintes conclusões: “(…)
1- Na presente acção, não poderia a Meritíssimo Juiz de 1ª Instância ter decidido como decidiu, ou seja, não poderia ter julgado a acção interposta pelo ora recorrente, totalmente improcedente, porquanto,
2- tendo em conta a factualidade dada como provada nos Pontos 2.1.1) a 2.1.7) da sentença recorrida, conjugada com o requerimento de pensão de velhice apresentado pelo recorrente em 27 / 10 / 2017, junto como doc.... da P.I., sempre será de aplicar ao caso o disposto no art. 112° da Lei n° 114 / 2017 de 29 de dezembro e, assim,
3- deverá ser reconhecido ao recorrente o seu direito de atribuição de pensão de velhice a partir de 1 / 1 / 2018, data esta em que entrou em vigor a alteração introduzida ao art. 48° do DL n° 187 / 2007 de 10 de maio, sendo que,
4- aquando tal alteração entrou em vigor, encontrava-se o recorrente a aguardar decisão por parte do recorrido, do citado requerimento de pensão de velhice que apresentou em 27/10/2017, decisão essa que veio a ser proferida mediante o oficio de 20 / 2 / 2018 (Ponto 2.1.7) da sentença recorrida).
5- Em todos os requerimentos apresentados pelo recorrente junto da recorrida, com vista à obtenção da respectiva pensão de velhice, o recorrente sempre instruiu os mesmos com a certidão a que alude o Ponto 2.1.5) da sentença recorrida, para efeitos de contagem do respectivo período de serviço militar obrigatório, sendo essa certidão de 29 / 4 / 2010.
6- deveria assim a Meritíssima Juiz de 1a Instância, ter declarado o inicio do direito de atribuição da pensão de velhice ao recorrente, em 1 / 1/ 2018, com a inerente condenação do recorrido a reconhecer esse mesmo direito e a efetuar o pagamento àquele dos respectivos retroativos.
7- Efetivamente, o art. 112° n°2 da Lei n° 114 / 2017 de 29 de dezembro, é esclarecedor que, o disposto no número 1 desse mesmo preceito legal, aplica-se aos beneficiários que tenham requerido a contagem do tempo de serviço militar obrigatório, a partir do dia 1 / 1 / 2018 ou que, já o tendo requerido, ainda não tenha sido notificados da respectiva decisão, precisamente o que sucedeu no presente caso (…)”.
*
3. Notificado que foi para o efeito, o Recorrido Instituto da Segurança Social, IP – Centro Nacional de Pensões, produziu contra-alegações, defendendo a manutenção do decidido quanto à improcedência da presente ação.
*
4. O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso, fixando os seus efeitos e o modo de subida.
*
5. A Digna Magistrada do Ministério Público junto deste Tribunal Superior emitiu parecer a que se alude no nº.1 do artigo 146º do C.P.T.A, que rematou da seguinte forma: “(…) Tudo exposto, somos do parecer que o R. devia ter sido absolvido da instância, face à verificação da exceção inominada insuprível da inidoneidade de meio processual, que é do conhecimento oficioso, e que agora se suscita. Caso, assim se não entenda, não padece a sentença de qualquer erro na subsunção dos factos ao direito. Pelo que, deve ser julgado totalmente improcedente a presente recurso (…)”.
*
6. O Recorrente respondeu ao parecer do M.P. nos termos e com os fundamentos que fazem fls. 140 e seguintes dos autos [suporte digital].
*
7. Com dispensa de vistos prévios, cumpre apreciar e decidir.
* *
II - QUESTÃO PRÉVIA
8. A Digna Magistrada do M.P. junto deste Tribunal vem, no parecer emanado a fls. 126 e seguintes dos autos [suporte digital], clamar pela absolvição da instância do R. “(…) face à verificação da exceção inominada insuprível da inidoneidade de meio processual, que é do conhecimento oficioso, e que agora se suscita (…)”.
9. Porém, a invocada matéria excetiva não pode ser apreciada e julgada no presente recurso, por ter sido apenas agora introduzida no processo e nunca antes debatida pelas partes, ou seja, por se tratar de uma questão nova.
10. Realmente, os recursos são específicos meios de impugnação de decisões judiciais, que visam modificar as decisões recorridas, e não criar decisões sobre matéria nova [cf. entre outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 27.06.2012. recurso 218/12., de 25.01.2012, recurso 12/12, de 23.02.2012. recurso 1153/11, de 11.03.2011. recurso 4/11. de 01.07.2009, recurso 590/09, 04.12.2008, rec. 840/08, de 30.10.08, rec. 112/07, de 2.06.2004, recurso 47978 (Pleno), de 29.11.1995, recurso 19369 c do Supremo Tribunal de Justiça, recurso 259/06.0TBBMAC.E1.S1, todos in www.dgsi.pt.]
11. E nada disto bule com a circunstância da questão em causa assumir natureza excetiva e de ser de conhecimento oficioso.
12. De facto, no contencioso administrativo vigora o princípio da preclusão do conhecimento, o que significa que mesmo a oficiosidade do conhecimento só pode ser exercitada até determinada fase processual, concretamente, até ao saneamento dos autos, em harmonia com o prescrito no art.º 88.º, n.ºs 1, al. a) e 2 do C.P.T.A.
13. Assim sendo, constituindo a matéria que se vem de referir, inquestionavelmente, questão nova, nos termos acima caracterizados, não pode assim ser apreciada.
14. Termos em que se desatende a matéria excetiva em análise.
* *
III- DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR
15. O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.
16. Neste pressuposto, a questão essencial a dirimir é a de determinar se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de direito.
17. É na resolução de tal questão que se consubstancia a matéria que a este Tribunal Superior cumpre solucionar.
* *
IV- FUNDAMENTAÇÃO
IV.1 – DE FACTO
10. O quadro fáctico apurado na decisão judicial recorrida – aqui sem reparos - foi o seguinte: “(…)
1) Em 2011 o autor requereu a atribuição de pensão de velhice;
(facto provado por acordo - não controvertido);
2) O requerimento do autor foi indeferido pelo réu com fundamento em incumprimento do prazo de garantia necessário à atribuição da pensão de velhice
(facto provado por acordo - não controvertido);
3) Em 29.11.2011, pela Diretora da Unidade Prestação e Atendimento (UPA) do Centro Distrital de Coimbra do Instituto da Segurança Social, I.P. foi emitido ofício de notificação, com o seguinte teor:
"(...) Na sequência da notificação em referência, e em resposta à sua exposição informamos V.ª Ex.a que o sentido da decisão comunicada se mantém, uma vez não foram apresentados elementos que possam obstar à decisão (…)"
(facto provado por documento - vide ofício de fls. 14-21 do processo eletrónico);
4) Entre 2015 e 2018, o autor apresentou diversos requerimentos junto do réu relacionados com a atribuição de pensão de velhice;
(facto provado por acordo - não controvertido); 
5) Em 17.04.2015, o autor apresentou, nos serviços do réu, requerimento de cálculo do montante provável de Pensão, através de formulário tipo, constante do Mod. RP 5070 - DGSS, juntando para o efeito certidão emitida em 29.04.2010, pelo Arquivo Central do Estado Maior da Força Aérea, Ministério da Defesa Nacional onde consta, entre o mais, que o autor prestou serviço militar obrigatório entre 26.09.1966 e 07.09.1972 no total de 5 anos e 346 dias.
(facto provado por documento - vide recibo de entrega de documentos e certidão de fls. 14-21 do processo eletrónico);
6) Nessa sequência o réu emitiu ofício de notificação dirigido ao autor com o seguinte teor:
"(…) Em referência ao requerimento de montante provável de pensão apresentado em 2015/04/17, informa-se que em seu nome apenas constam contribuições para o regime geral de Segurança Social nos seguintes períodos:
Até: 31/12/1993: de 09/1974 a 12/1974 - 04 meses, de 07/1983 a 01/1992 - 103 meses, num total de 107 meses, a que corresponde 08 anos civis.
A partir de 01/1994: de 09/2005 a 12/2005-90 dias - 0 anos, e de 01/2006 a 11/2006 - 1 ano.
Os períodos indicados totalizam 09 anos civis;
Pelo que não reúne as condições legais para a atribuição de uma pensão de velhice -15 anos civis seguidos ou interpolados com registo de remunerações, art° 19º do DL 187/2007 de 10/05.
Mais se informa que o período de serviço militar não releva para prazo de garantia.
Face ao exposto o seu pedido vai ser arquivado. "
(facto provado por documento - vide ofício de fls. 14-21 do processo eletrónico);
7) Em 20.02.2018, o réu emitiu ofício dirigido ao autor com o seguinte teor:
“(…) Em referência ao requerimento apresentado, informa-se V. Ex.a. que em seu nome apenas constam descontos para o regime geral da Segurança Social nos seguintes períodos:
- Até Dezembro de 1993: de 01/09/1974, de 31/01/1992, num total de 107 meses.
- A partir de janeiro de 1994: de 01/10/2015 a 31/05/2006, num total de 01 anos civis, calculados nos termos do art. 12 do Dec. Lei. nº 187/2007.
Os períodos indicados, totalizam 09 anos civis, pelo que não reúne as condições legais para a atribuição de uma pensão de:
(...) velhice (15 anos civis seguidos ou interpolados com registo de remunerações - art. 19 - D.L. 187/2007, de 10/05)."
(facto provado por documento - vide ofício de fls. 24-34 do processo eletrónico);
8) Em 09.05.2018, o réu emitiu ofício dirigido ao autor com o seguinte teor:
“(…) Em resposta à carta de V.ª Ex.ª, a qual mereceu a nosso melhor atenção, cumpre-nos informar que se mantêm o teor do nosso ofício de 2018/02/20; no qual informamos que não possui prazo de garantia para atribuição de pensão por velhice.
Relativamente ao período de serviço militar de 09/1966 a 09/19721 anterior à inscrição não é contabilizado para prazo de garantia."
(facto provado por documento - vide ofício de fls. 24-34 do processo eletrónico);
9) Em 17.04.2020 o réu apresentou junto do autor requerimento para efeitos de contagem de tempo de serviço militar obrigatório normal
((facto provado por acordo - não controvertido - vide documento de resposta ao aludido requerimento constante de fls. 58-65 do PA);
10) Em 16.10.2020 o réu emitiu ofício de notificação dirigido ao autor, em resposta ao requerimento por este apresentado em 14.07.2020, com o seguinte teor:
“(…) Pelo presente ofício, informa-se V.ª Ex.ª, que o requerimento acima identificado para contagem de tempo do período de 26.09.1966 a 07.09.1972 foi deferido, correspondendo a (73) meses. Esclarece-se que o período considerado corresponde apenas a serviço militar obrigatório normal, Decreto Regulamentar n.º 17/81 de 28 de abril. "
(facto provado por documento, vide ofício constante do PA a fls. 58-65 do processo eletrónico);
11) Em 4.11.2020, o autor apresentou no Centro Distrital de Coimbra do Instituto de Segurança Social, IP., requerimento de pensão de velhice - através de formulário tipo constante do Mod. RP 5068-DGSS
(facto provado por documento - vide requerimento constante de fls. 58-65 do processo eletrónico);
12) Em 11.02.2021, pelo Diretor da Segurança Social do CNP, foi emitido ofício, dirigido ao autor, com o seguinte teor:
“(…) Informo V. Exa. que, no uso da competência delegada pelo Diretor deste Centro, o requerimento de pensão oportunamente apresentado foi DEFERIDO ao abrigo da legislação acima indicada.
A pensão por VELHICE tem inicio em 2020-11-04, sendo o seu valor 748,44 Euros (…)”
(facto provado por documento - vide ofício de fls. 24-34 do processo eletrónico).
*
IV.2 – DE DIREITO
*
11. Assente a factualidade que antecede, cumpre, agora, apreciar a questão suscitada no recurso jurisdicional em análise, não sem antes procedermos ao seu enquadramento para cabal compreensão dos autos.
12. Assim, e no que para o que aqui releva, cabe notar que o Autor formulou em 2011 um pedido de atribuição de pensão de velhice, o qual foi indeferido com fundamento em incumprimento do prazo de garantia necessário à atribuição da pensão de velhice [cfr. pontos 1) e 2) do probatório].
13. Reiterou tal pretensão no ano de 2015, logrando obter a mesma decisão de indeferimento, por não reunir as condições legais para a atribuição de uma pensão de velhice - 15 anos civis seguidos ou interpolados com registo de remunerações [cfr. pontos 4),, 5) e 6) do probatório].
14. O mesmo sucedendo no ano de 2018, em virtude de não possuir prazo de garantia para atribuição da pensão de velhice [cfr. pontos 4) e 8) do probatório].
15. A situação alterou-se no ano de 2020, pois que, em 04.11.2020, o Autor veio a apresentar novo pedido de atribuição de pensão de velhice, este sim, objeto de decisão de deferimento em 11.02.2021, com efeitos reportados a 04.11.2020 [cfr. pontos 11) e 12) do probatório].
16. Ora, é precisamente contra a operacionalização dos efeitos da pensão de velhice a 04.11.2020 que se insurge o Autor, pois entende que esta deve retroagir a 01.01.2018, em harmonia com o prescrito no artigo 112º, nº. 1 da Lei n° 114/2017, de 29 de dezembro, ou, quando assim não se entenda, à data de 01.01.2019, desta feita, nos termos do artigo 48º do D.L. nº. 187/2007, de 10.05.
17. Motivação pela qual intentou no T.A.F. de Coimbra a presente ação administrativa, tendo formulado o seguinte petitório: “(…) NESTES TERMOS e nos demais de direito, deverá a presente acção ser julgada procedente, por provada e, em consequência;
1- Ser declarado o inicio do direito de atribuição da pensão de velhice ao A. em 1/1/2018, nos termos do art. 112° n°1 da Lei n° 114/2017 de 29 de dezembro, sendo o R. condenado a reconhecer esse mesmo direito, assim como, condenado a pagar ao A. o valor referente a retroativos da citada pensão, desde aquela data até 4/11/2020.
2- Na hipótese de não merecer acolhimento o pedido formulado no número anterior, deverá ser declarado o inicio da atribuição da pensão de velhice ao A. em 1/1/2019, nos termos do art. 48° n°2 a) do DL n° 187/2007 de 10 de maio, na redação dada pelo DL n° 33/2018 de 15 de maio, condenando-se o R. a reconhecer esse mesmo direito e condenado a pagar ao A. o valor referente a retroativos citada pensão desde aquela data até 4/1/2021 (…)”.
18. O T.A.F. de Coimbra, por sentença editada em 31.05.2021, julgou improcedente a presente ação, o que se estribou no entendimento de que não é “(…) aplicável à situação do autor a norma do artigo 112.° da Lei n.° 114/2017 de 29 de dezembro (…)”, já que “(…) à data da entrada em vigor do referido diploma, em 01.01.2018 (cfr. o seu artigo 333.º), o autor já tinha requerido a contagem do tempo de serviço militar obrigatório em 17.04.2015, tendo o mesmo sido indeferido pelo réu conforme consta factos provados 5. e 6. do probatório (…)”.
19. Esteou-se ainda na convicção de que, tendo decorrido mais de dois anos sobre o ultimo pedido de contagem do tempo de serviço, sempre assistia ao Recorrente a possibilidade “(…) a requerer, novamente, a apreciação da sua pretensão, ao abrigo do princípio da decisão que consta do artigo 13.º n.º 2 do CPA (…)”, regendo-se este novo pedido pelo enquadramento previsto no artigo 51º do Decreto-Lei 187/2007, de 10 de Maio, apresentando-se, por isso, “(…) legal e correta a decisão proferida pelo réu, tendo que improceder a pretensão do autor (…)”.
20. O Recorrente discorda do assim decidido, impetrando-lhe erro de julgamento de direito.
21. Realmente, clama o Recorrente, no mais fundamental, que “(…) tendo em conta a factualidade dada como provada nos Pontos 2.1.1) a 2.1.7) da sentença recorrida, conjugada com o requerimento de pensão de velhice apresentado pelo recorrente em 27/10/2017, junto como doc.... da P.I., sempre será de aplicar ao caso o disposto no art. 112º da Lei nº 114/2017 de 29 de dezembro e, assim, (…) ser reconhecido ao recorrente o seu direito de atribuição de pensão de velhice a partir de 1/1/2018, data esta em que entrou em vigor a alteração introduzida ao art. 48º do DL nº 187/2007 de 10 de maio, sendo que, (…) aquando tal alteração entrou em vigor, encontrava-se o recorrente a aguardar decisão por parte do recorrido, do citado requerimento de pensão de velhice que apresentou em 27/10/2017, decisão essa que veio a ser proferida mediante o oficio de 20/2/2018 (Ponto 2.1.7) da sentença recorrida).
22. Ou seja, entende que o Tribunal a quo errou na formação da sua convicção, já que a ponderação do tecido fáctico apurado nos autos e a análise do documento nº. ... junto com o libelo inicial permitem concluir que o Recorrente preenche os requisitos de aplicação do disposto no artigo 112º da Lei nº 114/2017 de 29 de dezembro, devendo-lhe, por isso, ser reconhecido o seu direito de atribuição de pensão de velhice a partir de 01.01.2018.
23. Contudo, a razão não está do seu lado.
24. Explicitemos pormenorizadamente esta nossa convicção.
25. É o seguinte o teor do artigo 112º da Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro: “(…)
Artigo 112.º
Reconhecimento geral e contagem integral do tempo de serviço militar obrigatório
1 - É garantido o reconhecimento geral e a contagem integral do tempo de serviço militar obrigatório e das eventuais bonificações a que haja lugar, para efeitos de aposentação ou reforma, independentemente de os beneficiários estarem abrangidos ou não por regimes de segurança social à data da prestação do serviço militar e sem necessidade de exigir o pagamento de contribuições ou quotizações.
2 - O disposto no número anterior aplica-se aos subscritores da CGA, I.P., e aos beneficiários da segurança social que ainda não requereram a contagem do tempo de serviço militar obrigatório ou das bonificações ou que, já o tendo requerido, os respetivos processos ainda não estejam concluídos. (…)”.
26. Ressuma assim da normação que se vem de transcrever que, com a entrada em vigor da Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro, foi garantido o reconhecimento geral e a contagem integral do tempo de serviço militar obrigatório e das eventuais bonificações a que haja lugar, para efeitos de aposentação ou reforma.
27. Esta garantia, porém, abrangeu apenas os subscritores da CGA, I. P., e os beneficiários da segurança social que (i) ainda não tinham requerido a contagem do tempo de serviço militar obrigatório ou das bonificações ou (ii) que, já o tendo requerido, os respetivos processos ainda não estavam concluídos.
28. Ocorre, porém, que nenhum destes dois pressupostos de acesso é verificável no caso em apreço.
29. Na verdade, o probatório coligido nos autos é inequívoco que o Autor, aqui Recorrente, instruiu o seu pedido de atribuição de pensão de velhice formulado em 2015 com uma certidão de contagem de tempo de serviço militar obrigatório, situação que tem um verdadeiro efeito de implosão em relação à eventual verificação do primeiro pressuposto legalmente exigido.
30. De igual modo, é perentório na falta de aquisição processual de que, à data de entrada em vigor da Lei nº. 114/2017, de 29 de dezembro, o Autor, aqui Recorrente, já tinha requerido tal contagem de tempo de serviço, encontrando-se tal requerimento ainda a aguardar decisão por parte da entidade militar competente.
31. De facto, a previsão in fine do nº. 2 do citado artigo 112º reporta-se ao requerimento de contagem de tempo de serviço militar obrigatório e não a um qualquer pedido de atribuição de pensão de velhice, como defende o Recorrente.
32. Donde se conclui que se mostra destituída de qualquer sustentáculo a alegação recursiva atravessada neste domínio, o que impossibilita que os efeitos da pensão de velhice deferida em fevereiro de 2021 possam retroagir à 01.01.2018, em harmonia com o prescrito no artigo 112º, nº. 1 da Lei n° 114/2017, de 29 de dezembro.
33. Idêntica asserção é atingível com base no artigo 48º do D.L. nº. 187/2007, na redação dada em DL nº. 33/2018, de 15/05, que veio estabelecer que o serviço militar obrigatório releva, para efeitos do cumprimento da contagem do prazo de garantia, para acesso às pensões de invalidez e velhice.
34. Efetivamente, tendo esta previsão apenas entrada em vigor em maio de 2018, não pode deixará de se entender que não é possível retroagir os efeitos da pensão de velhice a 01.01.2018, já que a esta data ainda não existia sequer o direito do Autor.
35. O juízo que se vem de asseverar é particularmente potenciado pelo disposto no artigo 51º do D.L. nº. 187/2007, que estabelece que a pensão de velhice é devida a partir da data da apresentação do respectivo requerimento, in casu, 04.11.2020.
36. Outrossim é de referir que o reconhecimento da tutela pretendida pelo Autor sempre brigaria com os efeitos do “caso resolvido” firmados a propósito dos pedidos de atribuição de pensão de velhice formulados pelo Autor nos anos de 2015 e 2018, o que não é de admitir sob pena de subversão do princípio da segurança jurídica, imanente ao Estado de Direito.
37. Por tudo isto, nega-se provimento ao recurso jurisdicional em análise e confirma-se a decisão judicial recorrida, ao que se provirá no dispositivo.
* *
V – DISPOSITIVO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Administrativa deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202º da CRP, em NEGAR PROVIMENTO ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pelo Recorrente.
Registe e Notifique-se.
* *
Porto, 02 de junho de 2023,

Ricardo de Oliveira e Sousa
Rogério Martins
Luís Migueis Garcia