Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00842/20.0BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:03/21/2024
Tribunal:TAF de Braga
Relator:VITOR SALAZAR UNAS
Descritores:OPOSIÇÃO;
IFAP, IP;
PRESCRIÇÃO;
Sumário:
I – O artigo 3.º, n.º 2 do Regulamento 2988/95, que dispõe: «O prazo para a execução da decisão que aplica a sanção administrativa é de três anos. Este Prazo corre desde o dia em que a decisão se torna definitiva».

II – O prazo de execução da decisão (administrativa), de 3 anos, começa a correr desde o dia em que tal decisão se torna definitiva, ou seja, quando se tenha consolidado na ordem jurídica, prazo este cujos casos de interrupção e de suspensão são regidos pelas disposições pertinentes do direito nacional, ou seja, do Código Civil.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos de Contraordenacionais, do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte:


I – RELATÓRIO:

O Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas, I.P. (IFAP, IP), interpôs recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, que julgou totalmente procedente a oposição apresentada por «AA», contra a execução fiscal nº.....................981, instaurada pelo Serviço de Finanças ..., para cobrança coerciva no montante de € 29.340,92, decorrente da falta de pagamento de incentivos financeiros concedidos pelo IFAP, IP, através de fundos comunitários.
O Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
«(…).
A. O presente recurso vem interposto da douta sentença de 20/10/2023, que, julgou procedente a ação, porquanto entendeu o Tribunal, grosso modo, “(…) definido que o prazo de prescrição aplicável é o de 3 anos, constituindo a prescrição do procedimento previsto no n.º 1 do artigo 3.º do Regulamento um vício da decisão que não é susceptível de apreciação em sede de oposição, por se tratar de questão que tem a ver com a legalidade do acto e, ainda, não se verificando a condição de que a alínea h) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT faz depender a admissibilidade dessa discussão, já o n.º 2, que estabelece um prazo para “executar a decisão que aplica a sanção administrativa” é passível de ser conhecido em sede de oposição, nos termos da alínea d) do artigo 204.º do CPPT.
Assim sendo, resulta do probatório, que a decisão final tomada pelo IFAP, IP, foi proferida em 09-06-2016 (alínea A) dos factos provados).
Mais se provou que a execução fiscal foi instaurada em 28-01-2020 (alínea D) dos factos provados).
Ora do probatório não se vislumbra terem ocorrido quaisquer causas interruptivas ou suspensivas que afectassem o decurso do prazo de três anos, pelo que desde 09-06-2019 (ou 15-06-2019 e assumindo-se o dies quo do prazo prescricional em 16-06-2016 por ser o 1º dia ao 3º dia útil seguinte ao de uma eventual notificação da decisão nos termos do disposto no art. 39º nº1 do CPPT e para efeitos meramente teóricos), que a dívida exequenda se encontra prescrita.
Assim sendo, como é, do exposto conclui-se ter ocorrido a prescrição da dívida exequenda, o que se decidirá. (…)”
B. Salvo melhor entendimento, como seguidamente se demonstrará, a decisão parece fazer uma incorreta interpretação dos factos e do direito aplicável, tendo em conta os factos dados como provados na sentença.
C. Em 15/06/2010 foi proferida a Decisão Final do procedimento que concluía pelo incumprimento do projeto e pela devolução das quantias indevidamente recebidas no valor de € 25.552,01, sendo-lhe concedido prazo de 30 dias para efetuar o pagamento voluntario sob pena de ser acionada a compensação nos termos da lei e do estatuto do IFAP IP., e como a Recorrida não cumpriu com as obrigações a que se encontrava adstrita, tem a União Europeia e o Estado Português, através do IFAP, I.P. o direito à restituição do indevido.
D. Os processos com decisão final de quantias indevidamente recebidas pelos beneficiários dão origem, após os 30 dias para o pagamento voluntario, à colocação dessa divida em conta corrente para efeitos de compensação, e esse é um procedimento que é transversal a todos os processos de irregularidade de verbas e está de acordo com as prerrogativas da Lei e em particular do Estatuto do IFAP IP.
E. Assim, após os 30 dias para o pagamento voluntario da divida e como esta não foi objeto desse pagamento, como consta dos factos provados, o IFAP IP lançou em conta corrente a mesma para que fosse compensada com quaisquer quantias que a Recorrida viesse a auferir a título de ajudas.
F. Ora, neste processo das compensações, sendo ele ativado logo após o prazo para o pagamento voluntario, cumpre não só os princípios legais da compensação, como ainda cumpre aquele que está aqui em causa, ou seja, é acionado dentro dos 3 anos do prazo para a cobrança da divida nos termos do preconizado na Regulamento nº 2988/95, do Conselho, de 18 de dezembro, e o facto de as compensações não terem ocorrido, quer dizer que a Recorrida não terá recebido ajudas pagas pelo IFAP IP, até à data em que foi instaurada a execução fiscal..
G. No entanto e para o que aqui releva, a divida estava lançada em conta corrente para efeitos de compensação desde o 31º dia após a Decisão Final, logo, a execução da divida, além de certa, líquida e exigível, operou dentro dos prazos convencionados para o efeito, não tendo corrido qualquer ilegalidade.
H. Mas mesmo que assim não se entenda, importa aferir as regras da prescrição à luz dos mais recentes entendimentos jurisprudenciais sobre a mesma.
I. Nos termos do artº 3º nº 2 do Regulamento nº 2988/95, do Conselho, de 18 de dezembro o prazo de prescrição para a execução de uma sanção administrativa, neste caso, da decisão final proferida pelo IFAP, IP em 03/03/2010, é de 3 anos.; sucede que, o legislador comunitário estabeleceu no nº 3 do artº 3º do Regulamento nº 2988/95 que “Os Estados-membros conservam a possibilidade de aplicar um prazo mais longo que os previstos respetivamente nos nºs 1 e 2.”
J. Com a entrada em vigor do CPA/2015, o prazo de 5 anos previsto no nº 4 do artº 168º do CPA, é havido como o «prazo mais longo» a que alude o nº 3 do artº 3º do Regulamento nº 2988/95.
K. Nesse sentido, existe já jurisprudência, nomeadamente, do TCA Sul a respeito da determinação de “prazo mais longo” a que alude o nº 3 deste preceito do Regulamento nº 2988/95, constante do Acórdão de 04/10/2017 (Proc. n.° 689/16.9BEALM-A), no sentido de que, “estando em causa a devolução de ajudas de Estado em sede de protecção dos interesses financeiros da União Europeia, a que se refere, i.a., o Regulamento (CEE) n° 2988/95, vale hoje o prazo prescricional de 5 anos previsto no artigo 168°, n° 4, alínea c), do C.P.A”, e a referida jurisprudência foi recentemente chamada à colação no Acórdão proferido pelo TCA Sul, de 10/10/2019, proferido no Processo nº 34/19.1BECTB e, ainda, na Sentença proferida no Processo nº 166/18.3BESNT, pelo TAF de Sintra, em 28/04/2023.
L. Donde se conclui, sem necessidade de grande demonstração, não estar prescrita a dívida exequenda, nem por aplicação do artº 3º nºs 2 e 3 do Regulamento nº 2988/2005, do Conselho, de 18 de dezembro, nem pela aplicação do artigo 168º nº 4 do CPA.
M. Verifica-se assim, inexistir qualquer tipo de prescrição no que toca ao montante a título de subsídio comunitário.
N. Face ao exposto, o entendimento do Tribunal ao julgar a ação procedente, não parece ter sido correta, pelo que, deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e em consequência ser proferido acórdão considerando válida a execução fiscal do IFAP, I.P.
****
Face ao exposto, o entendimento do Tribunal ao julgar a ação procedente, não parece ter sido correta, pelo que, deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e em consequência ser proferido acórdão considerando improcedente a ação em apreço.»


*
O Recorrido não apresentou contra alegações.

*
O Digno Procurador Geral Adjunto emitiu parecer, concluindo no sentido de ser negado provimento ao recurso.
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Com dispensa dos vistos legais [cfr. artigo 657.º, n.º 4, do Código de Processo Civil], cumpre apreciar e decidir o presente recurso.

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III - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR.
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, cujo objeto do recurso está delimitado pelas conclusões das respetivas alegações - cfr. artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 4 e 5, todos do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigo 2.º, alínea e) e artigo 281.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) –, e que se centram em saber, em suma, se a sentença recorrida padece de erro de julgamento ao concluir pela prescrição da quantia exequenda constituída por incentivos financeiros concedidos pelo IFAP, IP. ao Oponente, através de fundos comunitários, os quais não foram reembolsados voluntariamente.

*
IV – FUNDAMENTAÇÃO:
III.1 - DE FACTO:
No âmbito da factualidade considerada pela Sentença recorrida, dela consta o que por facilidade para aqui se extrai como segue:
«(…).
A) Em 09-06-2016, o IFAP, IP elaborou um ofício designado “Decisão Final (…)”, dirigido ao Oponente do qual consta, além do mais, o seguinte (cfr. fls. 4/7 SITAF e cujo teor se dá por reproduzido):

[documento no original]

B) Em 15-06-2016 o documento referido na alínea anterior foi remetido ao Oponente por via postal registada (cfr. data aposta no mesmo a fls.4/7 SITAF);
C) Em 16-01-2020, o IFAP, IP, emitiu documento designado “CERTIDÃO DE DÍVIDA” com o seguinte teor (cfr. fls.4 SITAF):

[documento no original]

D) D)Em 28-01-2020, foi instaurado pelo OEF contra o Oponente, o PEF nº.....................981, para cobrança coerciva de dívidas ao “IFAP, IP.”, no montante de €29.111,09 (cfr. informação a fls. 10/12 SITAF);

E) Em 09-02-2020 foi remetido pelo OEF ao Oponente por via postal no âmbito do PEF m.i. em D) um documento intitulado “CITAÇÃO POSTAL” (cfr. fls.8 SITAF e cujo teor se dá por reproduzido);

F) Em 06-03-2020 foi deduzida oposição ao PEF referido na alínea D) (cfr. informação a fls. 10/12 SITAF).

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MOTIVAÇÃO
A decisão da matéria de facto dada como provada foi efectuada com base no exame e análise dos documentos, não impugnados, que constam dos autos e que foram juntos pelas partes, consoante se anota em cada alínea do probatório.
Foi da análise de toda a prova assim enunciada que, em conjugação com as regras da experiência comum, se sedimentou a convicção do Tribunal quanto aos factos dados como provados e não provados – cfr. artigo 74º LGT, 76º nº 1 LGT e artigo 362º e ss do CC.»
*


V - DE DIREITO:
Constitui objeto do presente recurso a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que julgou a oposição, deduzida por «AA», totalmente procedente, por prescrição da dívida decorrente da falta de reembolso voluntário de incentivos financeiros concedidos pelo IFAP, IP. ao Oponente, através de fundos comunitários.
Constitui o fundamento basilar do presente recurso saber se existiu ou não erro de julgamento na sentença recorrida por nela se ter concluído pela prescrição da quantia exequenda.
Sobre esta matéria, o tribunal a quo explanou o seguinte discurso fundamentador:
«A PRESCRIÇÃO DA DÍVIDA EXEQUENDA
Invoca o Oponente a prescrição da dívida exequenda por considerar ter sido ultrapassado o prazo previsto no art. 48º nº1 da LGT.
Em sede de alegações, o IFAP, IP, defende que ao caso não é aplicável o prazo de prescrição da LGT mas sim o prazo de 20 anos previsto no artigo 309.º do Código Civil.
Vejamos:
A prescrição constitui uma excepção peremptória que determina a transformação da obrigação jurídica em natural, pois que a parte que dela beneficia pode opor-se ao seu cumprimento coercivo, constituindo um facto extintivo do direito invocado em juízo que importa a extinção da execução fiscal (cf. artigos 304.º n.º l do CC, 576.º n.º 3, 729.º alínea g) e 731.º do CPC).
A prescrição, pondo em causa a exigibilidade da obrigação tributária, é, como se sabe, fundamento de oposição à execução fiscal, no âmbito do CPPT (artigo 204.º al. d) do CPPT).
Resulta dos presentes autos estarmos perante uma dívida decorrente de incentivos financeiros concedidos pelo IFAP, IP, através de fundos comunitários.
Na sequência do decidido no Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia de 17-09-2014, estabilizou-se o entendimento de que o artigo 3.° do Regulamento (CE, Euratom) n.° 2988/95, de 18 de dezembro de 1995, relativo à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias, deve ser interpretado no sentido de que se aplica aos procedimentos instaurados pelas autoridades nacionais contra beneficiários de ajudas da União na sequência de irregularidades verificadas pelo organismo nacional (vide processo C- 341/13, disponível em http://eur-lex.europa.eu).
Já no que respeita à aplicação do prazo prescricional de 20 anos previsto no Código Civil o mesmo Acórdão do TJUE expressou o entendimento reiterado deste Tribunal de que “a aplicação de um prazo de prescrição de vinte anos excede o que é necessário para atingir o objetivo de proteção dos interesses financeiros da União” (vide Acórdãos do TJUE de 17/09/2014, processo C- 341/13, de 5/11/2011, processos n.ºs C-201/10 e 202/10 ex vi Acórdão do STA de 18/11/2020, processo n.º 0609/14.5BEBRG , disponível em www.dgsi.pt) pelo que não assiste razão ao IFAP,IP quanto à aplicação deste prazo ao caso em apreço.
Deste modo, preceitua o artigo 3.º do citado Regulamento Comunitário:
“1. O prazo de prescrição do procedimento é de quatro anos a contar da data em que foi praticada a irregularidade referida no nº 1 do artigo 1º.
Todavia, as regulamentações sectoriais podem prever um prazo mais reduzido, que não pode ser inferior a três anos.
O prazo de prescrição relativo às irregularidades continuadas ou repetidas corre desde o dia em que cessou a irregularidade. O prazo de prescrição no que se refere aos programas plurianuais corre em todo o caso até ao encerramento definitivo do programa.
A prescrição do procedimento é interrompida por qualquer acto, de que seja dado conhecimento à pessoa em causa, emanado da autoridade competente tendo em vista instruir ou instaurar procedimento por irregularidade. O prazo de prescrição corre de novo a contar de cada interrupção.
Todavia, a prescrição tem lugar o mais tardar na data em que termina um prazo igual ao dobro do prazo de prescrição sem que a autoridade competente tenha aplicado uma sanção, excepto nos casos em que o procedimento administrativo tenha sido suspenso em conformidade com o nº 1 do artigo 6.º.
2. O prazo de execução da decisão que aplica a sanção administrativa é de três anos. Este prazo corre desde o dia em que a decisão se torna definitiva.
Os casos de interrupção e de suspensão são regidos pelas disposições pertinentes do direito nacional.
3. Os Estados-membros conservam a possibilidade de aplicar um prazo mais longo que os previstos respectivamente nos nºs1 e 2.” (sublinhado nosso)
Do preceito transcrito resulta que o legislador pretendeu regular expressa e directamente a prescrição do procedimento no n.º 1, estabelecendo um prazo de 4 anos, fixando o momento inicial da sua contagem ou o modo como esta se deve processar [em função da natureza instantânea ou continuada ou repetida da (s) irregularidades cometidas], enunciando o único facto que qualificou como facto interruptivo da prescrição do procedimento [de que seja dado conhecimento à pessoa em causa, emanado da autoridade competente tendo em vista instruir ou instaurar procedimento por irregularidade], determinando que a contagem desse prazo se reiniciaria após cada interrupção e impondo como prazo máximo do procedimento administrativo [excepto nas situações de suspensão a que se reporta o artigo 6.º, n.º 1], o prazo de 8 anos para todas as situações em que, nessa data, ainda não tenha sido aplicada uma medida ou sanção.
Já no n.º 2 do mesmo preceito, regulou expressamente o prazo de execução da decisão que aplica a sanção administrativa, fixando-o em três anos, fazendo coincidir o seu termo inicial com a data em que a decisão relativa à sanção aplicada se torna definitiva e remetendo, no que respeita aos factos interruptivos e suspensivos da prescrição da obrigação tributária, para os ordenamentos jurídicos nacionais (distintamente do que ocorre com a regulamentação constante do n.º 1) (cf. Acórdão do STA de 18/11/2020, processo n.º 0609/14.5BEBRG , disponível em www.dgsi.pt).
Assim, o legislador previu, de forma autónoma, a prescrição do procedimento (n.º 1), a prescrição da obrigação tributária e a “prescrição” da execução da decisão final do procedimento ou caducidade do direito de executar (n.º 2).
Ademais, o prazo previsto neste artigo deve ser entendido como sendo aplicável não só à execução de sanção administrativa mas também à execução de medida administrativa pois que, como decidido pelo TJUE supra referido datado de 17-09-2014 (processo C341/13): “O artigo 3.º do Regulamento (CE, Euratom) n.º 2988/95 do Conselho, de 18 de dezembro de 1995, relativo à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias, deve ser interpretado no sentido de que se aplica aos procedimentos instaurados pelas autoridades nacionais contra beneficiários de ajudas da União na sequência de irregularidades verificadas pelo organismo nacional responsável pelo pagamento das restituições à exportação no âmbito do Fundo Europeu de Orientação e Garantia Agrícola (FEOGA)” e que “O prazo de prescrição previsto no artigo 3.º, n.º 1, primeiro parágrafo, do Regulamento n.º 2988/95 aplica-se não apenas aos procedimentos por irregularidades que conduzem à aplicação de sanções administrativas, na aceção do artigo 5.º deste regulamento, como também aos procedimentos que conduzem à adoção de medidas administrativas, na aceção do artigo 4.º do referido regulamento.”.
Como referido no Acórdão do STA supra mencionado, “(…) Em conclusão, a inexistência de natureza tributária da dívida não afasta a aplicação do prazo consagrado no n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento. Como dissemos já, foi precisamente no n.º 2 do preceito em referência que a sentença recorrida se fundou para julgar “prescrita a dívida”, após contabilizar o período decorrido entre a decisão que determinou o reembolso da ajuda comunitária atribuída e a instauração da execução e ter concluído que aquele espaço de tempo era bem superior aos 3 anos ali fixados e que nenhum facto interruptivo ou suspensivo da prescrição se tinha verificado.
[…].
É para nós manifesto que o legislador disciplinou claramente e de forma autónoma a prescrição do procedimento (n.º 1), a prescrição da obrigação tributária e a “prescrição” da execução da decisão final do procedimento ou caducidade do direito de executar (n.º 2). Concluir o contrário (tese do Recorrente) é admitirmos que o legislador regulou duas vezes a mesma situação, no que, naturalmente, não podemos conceder.
Que esse prazo deve ser entendido como sendo aplicável quer à execução de sanção administrativa quer à execução de medida administrativa, é, hoje, absolutamente pacífico.
[…].
Em suma, o artigo 3.º n.º 2 do Regulamente disciplina expressamente a “prescrição” da execução da decisão final (ou caducidade do direito de executar essa decisão) e a prescrição da dívida tributária, fixando-lhe um prazo de 3 anos, remetendo quanto a factos interruptivos e suspensivos para o ordenamento jurídico nacional. (…)”.
Mais recentemente, através do Acórdão do STA proferido no processo nº 3421/15.0BEBRG, o qual recaiu sobre sentença deste Tribunal e da nossa autoria, foi perfilhado, também, o entendimento que “I - Nos termos do artigo 3.º, n.º 2 do Regulamento (CE/Euratom) 2988/95, o prazo de execução da decisão que aplica a sanção ou medida administrativa é de três anos, contado desde o dia em que a decisão final se torna definitiva, sendo esse prazo objecto de interrupção ou suspensão nos termos das disposições pertinentes do direito nacional. II - Os prazos previstos no citado Regulamento são aplicáveis ao caso dos autos, na ausência de disposições de direito interno que prevejam prazos especiais para o efeito. III - Não tendo sido observado o prazo para a execução da decisão do INGA que ordenou a restituição do subsídio (art. 3.º, n.º 2, do Regulamento) e não tendo ocorrido, antes do prazo findar, qualquer facto interruptivo ou suspensivo do seu curso, há que concluir que é inexigível o pagamento da dívida em cobrança na execução fiscal.”
Voltando ao caso sub juditio, definido que o prazo de prescrição aplicável é o de 3 anos, constituindo a prescrição do procedimento previsto no n.º 1 do artigo 3.º do Regulamento um vício da decisão que não é susceptível de apreciação em sede de oposição, por se tratar de questão que tem a ver com a legalidade do acto e, ainda, não se verificando a condição de que a alínea h) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT faz depender a admissibilidade dessa discussão, já o n.º 2, que estabelece um prazo para “executar a decisão que aplica a sanção administrativa” é passível de ser conhecido em sede de oposição, nos termos da alínea d) do artigo 204.º do CPPT.
Assim sendo, resulta do probatório, que a decisão final tomada pelo IFAP, IP, foi proferida em 09-06-2016 (alínea A) dos factos provados).
Mais se provou que a execução fiscal foi instaurada em 28-01-2020 (alínea D) dos factos provados).
Ora do probatório não se vislumbra terem ocorrido quaisquer causas interruptivas ou suspensivas que afectassem o decurso do prazo de três anos, pelo que desde 09-06-2019 (ou 15-06-2019 e assumindo-se o dies quo do prazo prescricional em 16-06-2016 por ser o 1º dia ao 3º dia útil seguinte ao de uma eventual notificação da decisão nos termos do disposto no art. 39º nº1 do CPPT e para efeitos meramente teóricos), que a dívida exequenda se encontra prescrita.
Assim sendo, como é, do exposto conclui-se ter ocorrido a prescrição da dívida exequenda, o que se decidirá.»
Ora, do extratado texto da sentença em crise, verifica-se que na sequência do conhecimento do único fundamento da oposição - prescrição da dívida exequenda -, recaiu uma resposta positiva por parte do tribunal, julgamento agora sindicado pelo Recorrente.
No entanto, sendo aquela a fundamentação da sentença recorrida, adiantamos, desde já, que inexistem motivos para dela divergir, por bem fundamentada e escalpelizada a questão da prescrição, conforme infra se passará a expor.
A resposta à questão recursiva é fácil e resulta hoje clara da jurisprudência do TJUE vertida no acórdão de 07.04.2022 (proc. C-447/20 e C-448/20), em resposta às questões que foram formuladas no reenvio prejudicial solicitado nos acórdãos do STA, de 01.07.2020 [com decisão definitiva a 07.04.2022], 12.05.2021, [com decisão definitiva a 07.12.2022], e 01.07.2021 [com decisão definitiva a 04.05.2022], processos n.ºs 053/16.BEMDL, 01074/17.0BELRA e 03138/12.8BEPRT, respetivamente, todos disponíveis para consulta em www.dgsi.pt.
O acórdão proferido no processo n.º 01074/17.0BELRA supra mencionado, quanto à decisão do TJUE, realça o seguinte:
«3.2. Das questões que foram formuladas no reenvio prejudicial, resultou ainda o seguinte:
3.2.1. O TJUE é claro na resposta que dá no Despacho exarado nos autos ao esclarecer que, o prazo de três anos fixado no n.º 2 do artigo 3.º do dito Regulamento n.º 2988/95 (o qual se aplica entre nós uma vez que o Estado não definiu, ao abrigo da faculdade prevista no n.º 3 do artigo 3.º do mesmo Regulamento n.º 2988/95 um prazo mais alargado para o efeito) é o período de tempo limite para que a entidade responsável para o efeito, segundo o direito nacional, execute aquela cobrança coerciva e que “o termo do referido prazo tem como consequência que o montante em causa já não pode ser recuperado através da execução coerciva”, leia-se, do processo de execução fiscal [§§ 40 e 41 do Despacho exarado no processo C-374/21].
3.2.2. O TJUE é também claro ao afirmar que o que releva é a existência, no direito interno, de um mecanismo que garanta que os executados podem invocar a ultrapassagem daquele prazo e que desse facto resulta a ilegitimidade da cobrança coerciva “não sendo necessário determinar se o termo desse prazo implica igualmente a prescrição da dívida objecto dessa decisão” [§ 44 do Despacho exarado no processo C-374/21].
3.2.3. E o TJUE esclarece também que as regras sobre o cômputo deste prazo de três anos previsto no n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento n.º 2988/95 é uma questão de direito europeu (sem remissão para o direito interno), pelo que se aplica de modo uniforme em todos os Estados, o que significa que o dies a quo deste prazo é o dia em que a decisão de recuperação das verbas, tomada no procedimento/processo administrativo se torna definitiva, seja o dia a seguir ao último em que a decisão poderia ser recorrida, seja o dia seguinte a ter sido proferida a última decisão sobre a matéria, i. e. a decisão que já não admite recurso [§§ 47 a 52 do Despacho exarado no processo C-374/21].» - sublinhado nosso.
Na verdade, o artigo 3.º, n.º 2 do Regulamento 2988/95, que dispõe: «O prazo para a execução da decisão que aplica a sanção administrativa é de três anos. Este Prazo corre desde o dia em que a decisão se torna definitiva», prevê um prazo de três anos para a administração executar o ato, contado do dia "em que a decisão se torna definitiva", prazo este cujos casos de interrupção e de suspensão são regidos pelas disposições pertinentes do direito nacional - cfr. ainda, acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia, de 17.09.2014, processo C-341/13, e acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 03.05.2018, proferido no processo n.º 0337/18, de 08.09.2021, proferido no processo n.º 0919/15.4BECBR (consultáveis em www.dgsi.pt).
Ora o artigo 3.º, n.º 2 do Regulamento 2988/95 é aplicável tanto no caso de uma medida como de uma sanção. Neste sentido, vide por todos, a Acórdão do STA proferido no processo n.º 0164/17 de 07.12.2022, que dispõe da seguinte forma (disponível em www.dgsi.pt), que dispõe da seguinte forma:
«(…), uma vez sedimentada decisão (nacional) que aplique uma medida administrativa, como, por exemplo, a cobrança de ajudas (da União) indevidamente recebidas [ou uma sanção administrativa ( Apesar de o art. 3.º n.º 2 do Regulamento mencionar “sanção administrativa”, segundo o TJUE, o mesmo “visa simultaneamente as sanções administrativas, na aceção do artigo 5.º, n.º 1, deste regulamento, e as medidas administrativas, na aceção do artigo 4.º, n.º 1, do referido regulamento, que podem ser adotadas com vista à proteção dos interesses financeiros da União”.)], o destinatário daquela, se decorrer o prazo de, no mínimo, 3 anos sem que o processo de cobrança coerciva (da dívida respetiva) seja instaurado, pode opor-se ao correspondente processo de execução (fiscal)».
Assim, a administração tem o prazo de três anos, previsto no n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento, para executar decisão de reposição das ajudas, contado do momento em que ela se torna definitiva, ou seja, contado desde o momento em que, por decurso do prazo geral de impugnação mediante, no caso, ação administrativa (três meses) - cfr. artigos 58.º e 59.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, na versão vigente -, se consolidou na Ordem Jurídica aquele ato administrativo, sob pena de a dívida prescrever. Neste sentido, vide, entre outros, acórdãos do STA de 18.05.2022, processo n.º 02502/21.6BEPRT e 13.07.2022, processo n.º 0281/08.1BECTB 0383/18, tendo, neste último, sido elaborado sumário nos seguintes termos «(…). II - O prazo de execução da decisão (administrativa), de três anos, imposto pelo art. 3.º, n.º 2 do Regulamento (primeiro parágrafo), começa a correr desde o dia em que tal se torna definitiva, ou seja, insuscetível de recurso (por termo do prazo ou esgotamento de recurso/impugnação administrativa).» Com a mesma orientação, veja-se, os acórdãos deste TCAN, 13.04.2023, proc. n.º 66/16.1BEMDL e de 16.09.2021, processo n.º 1803/16.0BEBRG, onde ficou sumariado o seguinte: «I – À prescrição da obrigação de devolução das verbas de apoios financeiros da UE, cuja fonte seja uma decisão administrativa de reposição tomada em tempo (dentro prazo de prescrição do procedimento administrativo, de 4 anos, fixado no nº 1 do artigo 3º do regulamento CE Euratom nº 2988/95 do Conselho aplica-se o prazo de três anos resultante do disposto no nº 2 do mesmo artigo, contado desde o momento em que, por decurso do prazo geral de impugnação mediante acção administrativa (três meses), se consolidou na Ordem Jurídica aquele acto administrativo.» - todos consultáveis em www.dgsi.pt.
Donde, o referido prazo da execução da decisão administrativa, de 3 anos, começa a correr desde o dia em que tal se torna definitiva, ou seja, em que se tenha consolidado na ordem jurídica, sendo que as causas de suspensão e interrupção do prazo regem-se pelas disposições do direito nacional.
Ora, analisada a matéria de facto provada verifica-se que o ato administrativo que determinou a devolução das verbas de apoio financeiro da UE que haviam sido concedidas ao Oponente e que estão em cobrança coerciva na execução fiscal, aqui em apreço, foi praticado a 09.06.2016, tendo-lhe sido notificado por via postal registada a 15.06.2016 [cfr. alíneas A) e B) da factualidade assente].
Por outro lado, não evidenciam os autos que aquela decisão tenha sido objeto de qualquer impugnação, designadamente por via da ação administrativa (nem tal foi sequer alegado em momento algum). Logo, aquela decisão tornou-se definitiva, decorrido o prazo de três meses para intentar a respetiva ação administrativa [cfr. art. 58.º, n.º 1, alínea b) do CPTA].
Outrossim, exterioriza o elenco dos factos provados que a execução fiscal foi instaurada a 28.01.2020, tendo o Oponente sido citado a 09.02.2020 [cfr. alíneas D) e E), ibidem], factos, estes, ocorridos depois da ultrapassagem do mencionado prazo dos 3 anos, sendo certo que não demonstram os autos a existência de quaisquer causas de interrupção ou suspensão do prazo prescricional. E, sendo assim, como é, a citação do Oponente não teve a suscetibilidade de interromper o prazo de prescrição [cfr. 323.º, n.º 1 do Código Civil], que, naquela data, já se mostrava extinto pelo seu decurso.
Em suma, a dívida exequenda decorrente de incentivos financeiros concedidos ao Oponente pelo IFAP, IP, através de fundos comunitários, encontra-se prescrita, nos termos do artigo 3.º, n.º 2 do Regulamento 2988/95.
Pelo que, a sentença recorrida que assim decidiu, não padece do apontado erro de julgamento.
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Nestes termos, os Juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos de Contraordenacionais, da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, acordam, em conferência, em negar total provimento ao recurso e, nessa sequência, manter a sentença recorrida na ordem jurídica.
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Assim, nos termos do n.º 7 do art.º 663.º do CPC., formula-se o seguinte SUMÁRIO:
I – O artigo 3.º, n.º 2 do Regulamento 2988/95, que dispõe: «O prazo para a execução da decisão que aplica a sanção administrativa é de três anos. Este Prazo corre desde o dia em que a decisão se torna definitiva».

II – O prazo de execução da decisão (administrativa), de 3 anos, começa a correr desde o dia em que tal decisão se torna definitiva, ou seja, quando se tenha consolidado na ordem jurídica, prazo este cujos casos de interrupção e de suspensão são regidos pelas disposições pertinentes do direito nacional, ou seja, do Código Civil.

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VI – DECISÃO:
Em face do exposto, acordam, em conferência, os Juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos de Contraordenacionais, da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, em negar total provimento ao recurso e, nessa sequência, manter a sentença na ordem jurídica

Custas a cargo do Recorrente.

Porto, 21 de março de 2024

Vítor Salazar Unas
Cristina Bento Duarte
Ana Paula Santos