Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01800/10.9BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:01/13/2022
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Rosário Pais
Descritores:OPOSIÇÃO; REVERSÃO; CULPA DO TOC NA ENTREGA DAS DECLARAÇÕES; FALTA DE IMPUGNAÇÃO DAS DÍVIDAS;
CULPAS DOS REVERTIDOS
Sumário:I – A oposição à execução fiscal não é o meio próprio para apreciar a legalidade concreta das dívidas exequendas revertidas de IRC dos anos de 2002 a 2005.

II- Para afastar a responsabilidade subsidiária pelas dívidas de impostos cujo termo do prazo para pagamento ou entrega terminou durante o período da sua administração, é necessária a demonstração de que não é imputável aos gerentes ou administradores das sociedades a falta de pagamento ou de entrega do imposto [artigo 24.º, n.º 1, alínea b), da LGT].

III - Neste caso, existe uma presunção legal de culpa, recaindo sobre o administrador ou gerente o ónus da prova de que não lhe é imputável a falta de pagamento ou de entrega da prestação tributária.*
* Sumário elaborado pela relatora
Recorrente:A. E OUTROS
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
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Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
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1. RELATÓRIO
1.1. A. e L., devidamente identificados nos autos, vêm recorrer da sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto em 30.04.20214, pela qual foi julgada improcedente a oposição deduzida à execução fiscal n.º 337920040102072075…., contra ambos revertida por dívidas de IRC dos anos de 2002 a 2005, no montante global de 5.500,21€.

1.2. Os Recorrentes terminaram as respetivas alegações formulando as seguintes conclusões:
1- Salvo o devido respeito, o Tribunal a quo, errou na apreciação da prova e na subsunção dos factos ao Direito, ignorando a prova produzida, designadamente, a prova testemunhal.
2- As testemunhas foram unânimes e os seus depoimentos objectivos e coerentes, confirmando a inactividade da devedora originária, durante o período da tributação.
3- Deve ser reapreciada a prova, dando-se como provados os seguintes factos:
i) A "S., Lda." foi criada com o intuito, exclusivo, de gerir a prática de Karting por parte do filho e neto dos oponentes, Dr. A..
ii) A "S., Lda." tinha como única receita o pagamento de patrocínios.
iii) Desde 2001 que o filho e neto dos oponentes deixou de praticar Karting por falta de patrocínios.
iv) A "S., Lda." não auferiu qualquer proveito desde 2001.
v) A "S., Lda." esteve inactiva desde 2001.
vi) A "S., Lda." não auferiu proveitos, de 2001 até à data da sua dissolução em 2005, por motivos externos à Sociedade e alheios à gerência.
4- Em face da prova produzida nos autos, não se pode abstrair a realidade em beneficio de uma declaração.
5- A sociedade devedora originária não auferiu proveitos nos anos em que foi tributada, designadamente, 2002, 2003, 2004 e 2005, não obstante as declarações submetidas.
6- Os impostos em execução incidem sobre o rendimento da sociedade.
7- Se não existiram rendimentos, não existiu facto tributário, não pode existir imposto para pagar.
8- A decisão sob recurso viola o princípio da verdade material, o princípio da justiça e o princípio da legalidade.

9 - Se improceder a oposição, serão pagos impostos com base em impostos que não existiram.

10 - É comum na gestão corrente e no dia-a-dia de uma Sociedade Comercial, que todas as relações com a Administração Tributária, o exercício material das obrigações declarativas, o processamento de salários, o acesso ao portal das finanças e a gestão, elaboração e organização da contabilidade sejam efectuados pelo Técnico Oficial de Contas da Sociedade.
10- O próprio legislador obriga todas as Sociedades Comerciais a terem um Técnico Oficial de Contas registado junto da Administração Tributária.
12- A contabilidade é efectuada com base nas informações e nos documentos de suporte que são entregues ao TOC pela gerência da Sociedade.
13- Se a Sociedade não auferiu proveitos, não gerou despesas, não teve actividade, não existem documentos de suporte para ser entregues ao TOC.
14- Não é crível para a gerência da Sociedade que o TOC apresente declaração de rendimentos com proveitos ou despesas, numa Sociedade que está inactiva.
15- In casu, acresce a relação pessoal e familiar, umbilical, existente entre o Sócio-­gerente da U., responsável pela contabilidade da devedora originária, irmão da gerente L., bem como do gerente A. com o seu cunhado e amigo de infância.

16- A relação entre os gerentes e o responsável pela contabilidade era de uma confiança inabalável.
17- O responsável pela contabilidade da devedora originária tinha conhecimento directo da actividade real da Sociedade, dos seus proveitos e das suas despesas, bem como da inexistência de ambos durante o lapso temporal de 2001 a 2005.
18- Os gerentes não tivessem conhecimento da entrega das Modelo 22 com valores que não correspondiam à realidade.
19- Quando os sócios-gerentes tomaram conhecimento dessa situação procederam à dissolução imediata da Sociedade.
20- O oponente A. nunca alegou que a responsabilidade era da sociedade que procedia à contabilidade e que desconhecia os procedimentos por ela adoptados.
21- O oponente alegou que a sociedade não auferiu quaisquer proveitos durante o período de 2001 a 2005, não obteve nenhum valor que fosse sujeito a IRC, logo não poderia ser tributada nem pagar o imposto.
22- O oponente alegou que quem submeteu, materialmente, as declarações fiscais a sociedade que procedia à contabilidade e que desconhece onde e como é que essa empresa apurou os valores declarados.
23- Os gerentes acreditaram, como seria normal dadas as circunstâncias, que seriam declarados os valores reais, ou seja, a zero.
24- O oponente não se afastou das suas obrigações enquanto gerente.
25- O oponente delegou no TOC da Sociedade a elaboração da contabilidade e a submissão das declarações, tal como é estipulado por Lei.
26- O que oponente alegou a falsidade do conteúdo das Modelo 22 apresentadas pelo TOC da devedora originária.
27- Não é exigível aos oponentes, enquanto gerentes, que numa Sociedade que está inactiva por falta de proveitos e de despesas, verifiquem à posteriori os resultados financeiros da Sociedade, quando sabe, de antemão, que são iguais a zero.
28- Acresce, ainda, a relação de confiança derivada das relações familiares directa e de amizade existentes entre os gerentes e o responsável pela contabilidade da devedora originária.
29- Face a todos estes factos e circunstancialismos, é abusivo e descontextualizado concluir-se que o comportamento do oponente foi relapso e desinteressado em relação à Sociedade.
30- Como resulta de toda a prova produzida nos presentes autos, nunca o gerente se desinteressou pelos destinos e pelo futuro da sociedade devedora originária.
31- O futuro da devedora originária era o mesmo da carreira desportiva profissional do seu filho.
32- Conforme resulta dos depoimentos das testemunhas, o oponente continuou a procurar obter receitas para a Sociedade, de forma a que a mesma prosperasse e, consequentemente, o seu filho prosseguisse a sua carreira profissional.
33- Daí que a devedora originária não tivesse sido liquidada.
34- A Sociedade não tinha passivo e não gerava proveitos, logo a sua manutenção na ordem jurídica era neutra e inofensiva.
35- Existia a esperança e o trabalho diário no sentido do exercício da actividade social.
36- Tal não veio a acontecer, por factos aos quais os oponentes são alheios.
37- Não pode ser censurável a conduta dos oponentes ao terem mantido a sociedade inactiva sem a dissolver.
38- Conforme se provou nos presentes autos, os oponentes foram gerentes diligentes e zelosos.
39- Os oponentes procuraram o sucesso da actividade societária.
40- Os oponentes não geraram dívidas para a Sociedade, nem dissiparam o património social.
41- Não podem ser responsabilizados por uma actuação do Técnico Oficial de Contas expressamente contrárias às instruções e elementos por eles fornecidos.
42- À luz do critério do bonnus pater familiae não existe culpa dos oponentes na falta de entrega ou pagamento dos tributos da devedora originária.
43- Foram violadas as normas contantes dos artigos 23°, 24°, 55° e 990 da Lei Geral Tributária e o artigo 13° do Código de Procedimento e Processo Tributário.
NESTES TERMOS, DEVE REVOGAR-SE A SENTENÇA RECORRIDA NA PARTE EM QUE JULGOU IMPROCEDENTE A OPOSIÇÃO QUANTO AOS OPONENTES L. E A., JULGANDO-SE A OPOSIÇÃO PROCEDENTE QUANTO A ESTES OPONENTES E EXTINGUINDO-SE A EXECUÇÃO.».

1.3. A Recorrida Fazenda Pública não apresentou contra-alegações.

1.4. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu o parecer com o seguinte teor:
«(…)
A oposição — artigo 204 e segs. do CPPT "é o meio processual, pelo qual se visa a extinção da execução, mediante o reconhecimento da actual inexistência do direito exequendo ou da falta de um pressuposto, específico ou geral, da acção executiva.
A oposição em processo fiscal só pode ter como fundamento em geral, a ilegalidade abstracta da dívida exequenda, ou seja, o Tribunal não pode apreciar da legalidade da concreta liquidação que deu causa á execução, dos factos que deram origem à obrigação do imposto e do modo como foi feita a aplicação do direito ao caso concreto.
O contribuinte, perante uma liquidação de que discorde, deve recorrer ao processo de impugnação judicial para fazer apreciar pelo tribunal a legalidade do imposto que lhe é exigido. Se não o fizer tempestivamente, o direito a ver o seu caso julgado por um tribunal fica precludido." Rui Duarte Morais in a Execução Fiscal, p. 65 e segs.
No caso em apreço e conforme se escreveu na sentença" a ilegalidade das dívidas, por a primitiva devedora estar inactiva desde 2001 e por as declarações apresentadas e a contabilidade serem da total responsabilidade da sociedade " U.", cumpre desde logo referir que tais fundamentos não podem aqui ser invocados uma vez que nenhum deles se reconduz aos fundamentos vertidos no artigo 204° do CPPT.
Efectivamente, as relações entre a primitiva devedora e a sociedade que fazia a contabilidade e lhe prestava esses serviços, são factos externos à relação jurídico-tributária não sendo relevante a sua análise em sede de oposição.
...a todo o direito corresponde o meio processual mais adequado de o fazer valer em juízo. Ora estes fundamentos não se coadunam com a forma processual utilizada (oposição) sendo antes fundamento de impugnação judicial.
Acresce que estes fundamentos nunca levariam ao pedido de extinção do processo executivo mas apenas á anulação da liquidação", não tendo base legal que os sustente.
A reversão foi efectuada com basa no artigo 24° n°1 b) da LGT. Dispõe este artigo relativamente á falta de culpa na insuficiência do património da originária devedora:
1 —" Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento."
Citando Jorge de Sousa in" LGT anotada e comentada" 4a ed. p. 236: "Na LGT só relativamente às dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período de exercício do cargo se faz incidir sobre o gerente ou o administrador o ónus de provar que a falta de pagamento das dívidas tributárias pela sociedade não lhe é imputável.
Assim, a LGT limita a inversão do ónus de prova da culpa do não pagamento das dívidas, às dívidas vencidas no período do exercício das funções."
No caso em apreço, no despacho de reversão, que foi dado como provado, consta que os recorridos são sócio da sociedade devedora e exerceram a gerência de facto e de direito durante o período em que se verificou o facto constitutivo e também durante o período em que decorreu o prazo legal de pagamento, cabendo-lhe assim o ónus de demonstrar a ausência de culpa do não pagamento das dívidas.
O que não lograram efectuar, conforme se menciona na sentença.
Examinada a sentença, constata-se que a Mma Juiz nela fez constar as razões de facto e/ou de direito em que assentou a decisão, os motivos pelos quais decidiu de determinada forma. Analisou a prova e fundamentou a decisão, em nosso entender merecedora de confirmação, não se verificando os alegados vícios, pelo que se deve negar provimento ao recurso.».
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Dispensados os vistos legais, nos termos do disposto no artigo 657º, nº 4, do CPC, cumpre apreciar e decidir, pois que a tanto nada obsta.
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2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR
Uma vez que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações dos Recorrentes, cumpre apenas apreciar e decidir se a sentença recorrida enferma de erro no julgamento de facto e de direito.


3. FUNDAMENTAÇÃO
3.1. DE FACTO
A decisão recorrida contém a seguinte fundamentação de facto:
«Com interesse para a decisão da causa resulta apuradas a seguinte factualidade:
a) Por dívidas de IRC dos anos de 2002, 2003, 2004 e 2005 e coimas de 2006, foi instaurado no Serviço de Finanças do Porto …, contra a sociedade S., Lda., o processo executivo n° 337920040102… e apensos (cf. fls. 11, 13 a 16 dos autos).---
b) Por se ter constatado a inexistência naquela sociedade de bens susceptíveis de penhora, o processo executivo referido em a) foi revertido contra os, aqui, oponentes (cf. doc. de fls. 19 a 33 dos autos).
c) A reversão teve por fundamentos "A inexistência ou insuficiência os bens penhoráveis do devedor principal e responsáveis solidários, sem prejuízo do beneficio da excussão prévia (art. 23°, n° 2 da LGT. Dos administradores, directores, ou gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entidades fiscalmente equiparadas, por não terem provado não lhes ser imputável a falta de pagamento da dívida, quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período de exercício do cargo — art. 24°, n° I alínea b) da LGT" (cf. fls. 36 a 46 dos autos). ---
d) Todos os oponentes eram sócios e gerentes da primitiva devedora, sendo certo que a devedora obrigava-se pela assinatura de um gerente (cf. doc. de fls. 21 a 23 dos autos). ---
e) Em 28/05/2003, 27/05/2004, 27/05/2005 e 31/05/2006, foram entregues as declarações Modelo 22 dos anos de 2002, 2003, 2004 e 2005, respectivamente, relativas à primitiva devedora contendo como identificação do representante legal da sociedade o n° de contribuinte (…) pertencente à gerente L. (cf. fls. 63 a 79 dos autos).—
f) A primitiva devedora foi dissolvida e liquidada por escritura de
29/12/2005, registada pela Ap. 5/20060329 (cf. fls. 22 dos autos).

g) O oponente A. foi gerente de facto e de direito (cf. ponto 20 da petição inicial e depoimento das testemunhas arroladas).---
h) A contabilidade da primitiva devedora era realizada pela sociedade "U.", através de um contabilista que era familiar cunhado do primeiro oponente o irmão da segunda oponente (cf. depoimento das testemunhas). ---
Factos não provados
Dos autos não resultam provados outros factos com interesse para a decisão dos autos. ---
Das testemunhas ouvidas em sede de inquirição nada mais resultou provado com interesse para a decisão da causa. ---
O Tribunal firmou a sua convicção na consideração dos documentos juntos aos autos e no depoimento das testemunhas. ---.».

3.2. DE DIREITO
3.2.1. Do erro de julgamento
Os Recorrentes começam por invocar a existência de erro de julgamento de facto na medida em que, na sua ótica, resulta da prova testemunhal que a sociedade foi constituída para de gerir a prática de Karting por parte do filho e neto dos oponentes, tinha como única receita o pagamento de patrocínios, desde 2001 que o filho e neto dos oponentes deixou de praticar Karting por falta de patrocínios, a sociedade não auferiu qualquer proveito desde 2001 mantendo-se inativa desde então, até à data da sua dissolução em 2005, por motivos externos à Sociedade e alheios à gerência.
Se bem percebemos a tese dos Recorrentes, provada tal inatividade, não haveria imposto a pagar, daí que, não tendo os gerentes gerado quaisquer dívidas da empresa nem dissipado quaisquer bens da mesma, não lhes pode ser assacada culpa pela insuficiência patrimonial da devedora originária.
Tal factualidade não foi relevada na sentença recorrida por não ter sido considerada com interesse para a decisão a proferir. Atentemos no discurso fundamentador da sentença para perceber porquê:
«No que tange à ilegalidade das dívidas por a primitiva devedora estar inactiva desde 2001 e por as declarações apresentadas e a contabilidade serem da total responsabilidade da sociedade "U.", cumpre desde logo referir que tais fundamentos não podem aqui ser invocados uma vez que nenhum deles se reconduz aos fundamentos vertidos no art. 204° do CPPT.---
Efectivamente, as relações entre a primitiva devedora e a sociedade que fazia a contabilidade e lhe prestava esses serviços, são factos externos à relação jurídico-­tributária não sendo relevante a sua análise em sede de oposição. -
Como bem refere a FP, nos termos do disposto no art. 95° e 97°, n° 2 da LGT, a todo o direito corresponde o meio processual mais adequado de o fazer valer em juízo. -
Ora, estes fundamentos não se coadunam com a forma processual utilizada (oposição) sendo antes fundamentos de impugnação judicial. ---
Acresce que estes fundamentos nunca levariam ao pedido de extinção do processo executivo mas apenas à anulação da liquidação. ---
Destarte, não se ponderará estes fundamentos, restando a análise da ilegitimidade dos oponentes como acima referido.---».
E, de facto, tais alegações, de facto e de direito, respeitam à legalidade das liquidações exequendas, cuja discussão deve ser feita em processo próprio, de impugnação judicial. Saber se os impostos exequendos são ou não devidos deve ser determinado em processo de impugnação judicial e não em processo de oposição à execução fiscal, por a tanto de opor inequivocamente o elenco taxativo contido no n.º 1, do artigo 204.º do CPPT. De acordo com a alínea h) do nº 1 do artigo 204º do CPPT, a ilegalidade concreta da liquidação da dívida exequenda apenas pode ser apreciada em processo de oposição se a lei não assegurar meio judicial de impugnação ou recurso contra a mesma.
Ora, no caso que nos ocupa, não sobra margem para qualquer dúvida em como os Recorrentes tiveram duas oportunidades de reagir contra as liquidações exequendas através do meio e no tempo próprios, uma em nome da sociedade e outra em seu próprio nome, após a citação como revertidos.
O certo é que nada fizeram, permitindo que as dívidas se consolidassem na esfera jurídica da sociedade, e na sua própria, de nada lhes servindo apelar agora ao princípio da justiça, porque este se realiza através dos meios processuais adequados e legalmente previstos, sem prejuízo das correções que, mesmo oficiosamente, se imponha realizar.
Isto serve para concluir que nenhuma utilidade reveste apreciar o erro de julgamento de facto alegado, pois, mesmo dando de barato que, ao apresentar as declarações que originaram as dívidas revertidas, o TOC atuou contra expressas instruções dos ora Recorrentes (o que não se mostra sequer alegado), a verdade é que, como acabámos de demostrar, a consolidação das dívidas apenas pode ser imputada à sua conduta omissiva que, no mínimo, deve ser qualificada de negligente e, por isso, culposa. Em suma, ao contrário do que afirmam, os Recorrentes não tiveram uma atuação conforme à de um bonnus pater familiae.
Ademais, cumpre relembrar que o processo de execução fiscal em causa nos autos de oposição agora em recurso visa a cobrança coerciva de dívida proveniente de IRC dos anos de 2002, 2003, 2004 e 2005.
O regime de responsabilidade subsidiária aplicável é o vigente no momento em que se verifica o facto gerador dessa responsabilidade, sendo, então, de aplicar artigo 24.º da LGT, que prevê a responsabilidade subsidiária dos administradores ou gerentes relativamente a dívidas cujo facto constitutivo tenha ocorrido no período do exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento tenha terminado depois deste exercício - alínea a) - ou vencidas no período do seu mandato - alínea b).
No caso dos autos não vem questionado que o prazo legal de pagamento das dívidas exequendas terminou no período do exercício, pelos Recorrentes, da gerência da devedora originária, pelo que, sendo a situação enquadrável na alínea b) do n.º 1 do artigo 24.º da LGT, para que os oponentes, agora Recorrentes, afastassem a sua responsabilidade subsidiária teriam que demonstrar que a falta de entrega da prestação tributária não lhes era imputável, o que não lograram fazer. Aliás, como vimos, os Recorrentes centraram a sua defesa na ausência de culpa sua pela constituição da dívida – tese que não lograram ver reconhecida.
Tudo isto ponderado, impera negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida.

4. DECISÃO
Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida.

Custas a cargo dos Recorrentes, que saem vencidos neste recurso, nos termos do artigo 527º, nº 1 e 2 do CPC.


Porto, 13 de janeiro de 2022

Maria do Rosário Pais
Tiago Afonso Lopes de Miranda
Cristina da Nova