Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00306/10.0BECBR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:04/24/2024
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:ISABEL CRISTINA RAMALHO DOS SANTOS
Descritores:AÇÃO ADMINISTRATIVA;
CONDENAÇÃO À PRÁTICA DE ATO ADMINISTRATIVO;
MEIO DE REAÇÃO ADEQUADO;
Sumário:
I- O meio próprio para reagir contra atos administrativos relativos a questões tributárias que não comportem apreciação da legalidade do ato de liquidação é a ação administrativa especial.

II- O meio próprio para a recusa de decisão da Reclamação Graciosa por parte da representação da Fazenda Pública é a ação administrativa especial para impugnação de ato administrativo, cumulado com a condenação à prática de ato devido.
O modo de reação adequado contra atos administrativos de conteúdo negativo é a dedução de um pedido de condenação à prática de um ato administrativo.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência, os juízes da Subsecção Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. RELATÓRIO

A Fazenda Pública veio recorrer da sentença proferida a 08-09-2016, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, a qual julgou procedente a ação administrativa especial e, em consequência, condenou a Entidade Demandada a apreciar a Reclamação Graciosa deduzida pela A. no prazo de execução espontânea da sentença, sem prejuízo da presunção do seu indeferimento tácito em igual prazo.
Nas suas alegações, a Fazenda concluiu nos seguintes termos:
I) A Autoridade Tributária e Aduaneira recorrente nos Autos supra identificados em que é recorrida [SCom01...] Lda, vem recorrer Jurisdicionalmente, da douta sentença proferida em 08/09/2016, que julgou procedente a Acção Administrativa Especial e condenou a Entidade Demandada a apreciar a Reclamação Graciosa deduzida pela A.
II) A sentença a quo, ao decidir que « (…)tem a A., ainda, o direito a que aquela Reclamação seja efectivamente decidida, de molde a que, caso seja julgada improcedente, se possa iniciar o prazo de impugnação contenciosa», errou, tanto no que se refere à interpretação da matéria de facto fixada nos presentes autos, como na interpretação e aplicação das normas aos factos.
III) A sentença recorrida, salvo o devido respeito, incorreu em vício de violação de lei, ao desconsiderar a aplicação dos artigos, 97º n.1 alínea q) e 146º, todos do CPPT, e 157º e seguintes do CPTA, razão pela qual se pugna pela sua revogação.
IV) Sendo certo que a todo o direito corresponde uma ação adequada a fazê-lo reconhecer em juízo (cfr. art. 2º nº 2 do CPC, e art. 2º nº 2 do CPTA), salvo o devido respeito, a presente Ação Administrativa Especial não é o meio processual adequado para tutelar o direito ou interesses legalmente protegidos da Autora (artº 96º n.º 1 CPPT).
V) Ora, a Autora ora Recorrida, pretendeu com a acção administrativa especial intentada, que a AT apreciasse uma Reclamação Graciosa que se encontra apensada a uma impugnação judicial nos termos do artigo 111º n.º3 do CPPT, depois de ter deixado precludir todos os prazos de reacção e de execução da decisão proferida na referida Impugnação Judicial.
VI) Na verdade, a Autora apresentou Reclamação Graciosa da liquidação de IVA de 04/12 no valor de € 7.955,92 em 02/01/2008 à qual foi atribuído o
n.º ...29;
VII) Em 13/04/2008 impugnou a mesma liquidação, a qual seguiu os seus termos com o n.º 293/08.5BECBR;
VIII) Em 27/06/2008 o Chefe do Serviço de Finanças proferiu despacho que determinou a extinção da Reclamação Graciosa e a sua apensação à referida Impugnação;
IX) Ora, como se vê, a então Autora, optou pela via judicial – Impugnação Judicial - para ver apreciados os vícios atribuídos à liquidação, que havia inicialmente invocado na Reclamação Graciosa.
X) Ao fazer esta opção, obteve uma decisão/sentença na impugnação Judicial n.º 293/08.5BECBR, a qual, tal como se encontra consignado no ponto 4 dos factos provados na douta sentença, determinou: «indeferir a impugnação nos termos expostos, remetendo-se o processo às instâncias administrativas competentes por ser intempestiva a presente impugnação»;
XI) Ora, a sentença a quo reconhecendo que foi proferida uma sentença na impugnação, transitada em julgado, andou mal ao decidir pela condenação da AT a proferir decisão no procedimento de Reclamação Graciosa.
XII) Na verdade, ao considerar que estava transitada em julgado a sentença proferida no processo de Impugnação Judicial o meio próprio para a fazer cumprir, dado que a Reclamação Graciosa está a ela apensada, seria a execução de julgados, meio que a ora recorrida não utilizou.
XIII) Reafirme-se que, perante a decisão proferida na impugnação judicial, a ora recorrida tinha meios próprios para concretizar a decisão da Impugnação judicial, nomeadamente por aplicação dos artigos, 97º n.1 alínea q) e 146º, todos do CPPT,
XIV) Donde, a Recorrida devia ter intentado uma acção para execução de sentença, nos termos dos artigos 157º e seguintes do CPTA.
XV) Não o tendo feito em tempo, não pode agora, vir fazer renascer outro meio judicial para anular o acto praticado pelo Chefe do Serviço de Finanças ..., que cumpriu uma determinação legal imposta pelo artigo 111º nº3 do CPPT e que determinou que a Reclamação Graciosa fosse apensada à Impugnação Judicial, ficando a Administração Tributária impedida de o decidir.
XVI) Ao ter feito uma interpretação diferente da supra exposta, a sentença ora recorrida, errou, pois que entendeu que a sentença da Impugnação Judicial está transitada em julgado, mas não aplicou os artigos, 97º n.1 alínea q) e 146º, todos do CPPT, e 157º e seguintes do CPTA, pelo que incorreu no vício de violação de lei, ao condenar a AT a apreciar a Reclamação Graciosa.
XVII) Não podemos deixar de realçar, que foi a então Autora, ao intentar a Impugnação Judicial na pendência da Reclamação Graciosa, que demonstrou a sua preferência por decisão judicial em detrimento da decisão pela via administrativa.
XVIII) Razão pela qual, em consonância com essa decisão, deveria ter judicialmente executado a sentença da impugnação, não podendo vir agora
pedir “que seja julgada improcedente uma decisão tomada em 27/06/2008 em sede de Reclamação Graciosa”.
XIX) Pelo exposto, o meio utilizado pela A. não é o meio próprio para fazer valer os seus direitos e interesses legalmente protegidos, pelo que não havendo fundamentação legal para a decisão recorrida, pois a presente acção não é o meio próprio para a Recorrida executar a sentença proferida nos autos de impugnação, e por sentença a quo ter incorrido no vício de violação de lei ao não aplicar artigos, 97º n.1 alínea q) e 146º, todos do CPPT, e 157º e seguintes do CPTA não deve a mesma ser mantida na Ordem Jurídica.

Termos pelos quais e, com o douto suprimento de V. Exas., deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional e, em consequência, ser revogada a sentença recorrida com as legais consequências.

A Autora (doravante recorrida) apresentou as seguintes contra-alegações:
A. A decisão proferida nos presentes autos tem de ter consequências, na medida em que foi decidido no âmbito do procedimento em apreço, que se encontra preterida formalidade essencial com referência a necessidade de permitir ao sujeito passivo o use da faculdade de ver decidida a reclamação graciosa par si formulada;
B. Só assim se pode entender o dispositivo em causa quando determina que a A./recorrida pode apresentar reclamação graciosa, em requerimento fundamentado dirigido ao órgão da AT da área do seu domicílio fiscal;
C. Não diga a AT que está em cause uma interpretação do teor da sentença transitada em julgado que julgou improcedente/intempestiva a impugnação judicial do acto tributário em causa, sob pena de tomar o procedimento determinado um total absurdo, pois que, afinal, a recorrida nenhum meio poderia lançar para a defesa dos seus interesses;
D. Apenas a possível uma leitura saudável da situação, quando se atribui sentido ao ora decidido e, deste modo, a prossecução do procedimento de reclamação graciosa com decisão omissa;
E. A remissão que se faz no n.º 1 do art.° 146‘° do CPPT para o meio processual de execução de julgados regulado pelas normas sabre a processo nos tribunais administrativos passou a abranger também a n.º 3 do art.° 157.° do CPTA e, assim sendo, o recurso a tal expediente jurídico/processual apenas será de impor Administração Tributaria no sentido da execução de actos consolidados e não impugnáveis por ela praticados, o que, manifestamente, não é a caso;
F. Não existe, tal como pretende a recorrente AT, qualquer violação de lei, muito menos a nível dos propalados arts 97. °, n.º 1, alínea q) e 146. ° do CPPT com remissão ao art° 157. °, n.º 3 do CPTA;
G. Nestes termos, tem assim como nos melhores de direito quo as Venerandos Juízes Desembargadores doutamente proverão, deve a decisão recorrida manter-se, por legal e justa, mantendo-se a obrigação de a AT / Serviço de Finanças ... na apreciação da reclamação graciosa. - cfr fls 214 do sitaf.

Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos (cfr.
artigo 657.º n.º 4 do Código de Processo Civil, submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso.

II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR
Em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282.º, do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso.
No presente recurso cabe decidir se:
1. a sentença padece de erro de julgamento de direito por vício de violação de lei ao não aplicar artigos, 97º n.1 alínea q) e 146º, todos do CPPT, e
157º e seguintes do CPTA;

III. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
III.A. O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto:
Compulsados os autos e analisada a prova documental produzida, dão-se como provados, com interesse para a decisão, os seguintes factos:
1. Em 02.01.2008 deu entrada no Serviço de Finanças ... Reclamação Graciosa da ora A., visando a liquidação adicional de IVA n.º ...28, respeitante ao período de 04/12, no valor de €7.955,92, que foi autuada sob o n.º ...29; Cfr. fls. 2 e ss. do Processo Administrativo (PA) em apenso.
2. Em 13.03.2008 deu entrada no Serviço de Finanças ... petição de Impugnação Judicial interposta pela ora A. da liquidação referida no ponto anterior, com invocação do acto de indeferimento tácito da Reclamação Graciosa aludida no ponto anterior, a qual correu termos no presente Tribunal sob o n.º 293/05.8BECBR; Acordo.
Cfr. consulta à petição da visada impugnação, via SITAF.
3. Em 27.06.2008 o Chefe do Serviço de Finanças ... proferiu no procedimento aludido em 1. despacho com o seguinte teor: «Considerando o disposto no artigo 111.º, n.º 3 do CPPT, bem como a remessa do processo administrativo ao Ex.mo Senhor Representante da Fazenda Pública, nos termos previstos no seu n.º 1, e dentro das competências que me foram atribuídas pelo Despacho n.º 10425/2008 publicado no DR, II Série, n.º 67, de 04/04/2008 e pelo artigo 73.º do CPPT, deverão os presentes autos ser considerados extintos e apensos à impugnação judicial.»; Cfr. despacho a fls. 30 do PA em apenso.
4. Em 03.12.2009 foi proferida sentença no processo de impugnação aludido em 2., na qual se considerou que atenta a data de interposição da impugnação «…nem sequer ainda estava expirado o prazo da AT para se pronunciar no âmbito da reclamação graciosa. Não existindo qualquer indeferimento tácito, objecto imediato do processo de impugnação judicial falha um dos pressupostos da impugnação que obsta ao seu conhecimento, anulando-se o acto de apensação e de declaração de inutilidade da reclamação», e se decidiu, em consequência, «indeferir a impugnação nos termos expostos, remetendo-se o processo às instâncias administrativas competentes por ser intempestiva a presente impugnação»; cfr. sentença a fls. 16 e ss. dos autos, também consultada no processo respectivo, via SITAF.
5. Por ofícios do Tribunal de 04.12.2009 foi a visada sentença notificada às partes; Cfr. consulta dos visados autos, via SITAF.
6. Em 14.12.2009 a Fazenda Pública recorreu da visada sentença, apenas quanto à sua condenação em custas; cfr. fls. finais, não numeradas, do PA, e consulta dos visados autos, via SITAF.
7. A 04.01.2010 a ora A. apresentou junto do Serviço de Finanças ... requerimento solicitando que «se digne proferir decisão expressa e fundamentada quanto à Reclamação Graciosa em causa, nomeadamente julgando a mesma procedente, conforme peticionado»; Cfr. requerimento com a entrada naquele Serviço n.º 42, a fls. do PA não numeradas. Igualmente a fls. 72 dos autos.
8. Tendo aquele Serviço informado a ora A., por ofício enviado em 05.01.2010, que a «reclamação foi arquivada, por despacho de 2008/06/27 (fotocópia anexa), sendo considerada, para todos os efeitos, no âmbito respectivo processo de impugnação, nos termos do n.º 3 do art.º 111.º do CPPT»; Cfr. ofício n.º ...3, a fls. do PA não numeradas. Igualmente a fls. 74 dos autos.
9. Tendo a ora A., em requerimento que deu entrada no Serviço de Finanças ... em 22.01.2010, reiterado o seu pedido aludido em 7., alegando que o «art.º 111.º, n.º 3 do CPPT determina que no presente caso, a reclamação graciosa é apensa à impugnação judicial. Assim, a mesma não determina - nem poderia determinar nunca - o arquivamento da mesma»; Cfr. requerimento com a entrada naquele Serviço n.º 908, a fls. do PA não numeradas. Igualmente a fls. 75 dos autos.
10. Tendo em sequência o Chefe do Serviço de Finanças ... assinado oficio datado de 02.02.2010, dirigido à ora A. e enviado por carta registada com aviso de recepção, no qual se pode ler, entre o mais, o seguinte: «Entendemos que será o Tribunal, e não a Administração Tributária, que fará a apreciação das questões suscitadas na reclamação graciosa. Prefere-se, em absoluto, a decisão jurídica, impedindo-se que sei apreciada por via administrativa a legalidade de um acto tributário que seja objecto de impugnação judicial. Face ao exposto, informo que no caso em apreço, tendo sido apresentada Impugnação Judicial entendemos não existir dever de pronúncia por parte dos serviços da Administração Tributária encontrando-se inclusive proibida de fazer. À Administração Tributária apenas restará a possibilidade de nos termos do art.º 112.º do CPPT revogar o acto impugnado. No entanto, não consta que tenha siso utilizada essa prerrogativa. Em anexo, junta-se fotocópia do despacho de extinção e apensação à impugnação Judicial, proferido em 2008/06/27.»; Cfr. ofício n.º ...35, a fls. do PA não numeradas. Igualmente a fls. 78 dos autos.
11. Em 27.04.2010 foi enviada por correio registado a p.i. que deu origem aos presentes autos. Cfr. envelope a fls. 28 dos autos.

IV. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.

IV.I Do erro de julgamento de direito por vício de violação de lei ao não aplicar à situação dos autos os artigos, 97º nº1 alínea q) e 146º, todos do CPPT, e 157º e
seguintes do CPTA;

Decorre da norma do artigo 2º, nº 2, do Código de Processo Civil (CPC), aqui aplicável por forma do estatuído no artigo 2º, alínea e), do CPPT, que “a todo o direito, excepto quando a lei determine o contrário, corresponde a acção adequada a fazê-lo reconhecer em juízo”.
Tendo em consideração o pedido, ou conjunto de pedidos, formulados pelo interessado, é que se afere a adequação de uma determinada forma processual e, consequentemente, da existência, ou não, de erro na forma de processo utilizada. Nesta medida, tem sido entendimento jurisprudencial e doutrinal que a ocorrência de tal erro deve aferir-se pelo pedido formulado na ação. Com efeito, e face a essa correspondência entre direito e a ação adequada a fazê-lo reconhecer em juízo, haverá apenas um determinado meio processual que, em cada caso, pode ser utilizado para obter a tutela judicial.
No caso em concreto, a Autora, perante a recusa de decisão da Reclamação Graciosa por parte da representação da Fazenda Pública interpôs a ação administrativa especial para impugnação de ato administrativo, cumulado com a condenação à prática de ato devido, pedindo:
I- Ser julgada improcedente a decisão de extinção da Reclamação Graciosa, por manifestamente infundada;
II- Ser julgada procedente a presente ação condenando-se a R. a pronunciar-se e apreciar os fundamentos da Reclamação Graciosa, praticando assim o acto devidos (…)”
Não está em causa nos autos qualquer ato de liquidação emanado da administração fiscal, nem é peticionada a anulação da liquidação.
Ora, nos termos do disposto no art.º 97.º, n.º 1, alínea p), 2ª parte do CPPT, o meio próprio para reagir contra atos administrativos relativos a questões tributárias que não comportem apreciação da legalidade do ato de liquidação, como é a presente lide, é a ação administrativa especial.
E foi este o meio processual utilizado pela Autora, visando a condenação da entidade demandada à prática de ato devido, tido como a apreciação da visada Reclamação perante a recusa expressa da mesma, e nada tendo sido comunicado aos autos quanto a qualquer ulterior vicissitude daquele procedimento, como de resto se impõe às entidades administrativas nos termos do artigo 8.º do CPTA;
Ora alega ainda a Recorrente que a sentença sob recurso ao considerar que estava transitada em julgado a sentença proferida no processo de Impugnação Judicial o meio próprio para a fazer cumprir, dado que a Reclamação Graciosa está a ela apensada, seria a execução de julgados, meio que a ora recorrida não utilizou.
O art. 146º nº 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário “para além do meio previsto no artigo seguinte, são admitidos no processo judicial tributário os meios processuais acessórios de intimação para a consulta de documentos e passagem de certidões, de produção antecipada de prova e de execução dos julgados, os quais serão regulados pelo disposto nas normas sobre o processo nos tribunais administrativos.
Nesta sequência, e quando se analisa o exposto no Código de Processo nos Tribunais Administrativos, temos que nos termos do art. 158º nº 1 daquele diploma “as decisões dos tribunais administrativos são obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas e prevalecem sobre as de quaisquer autoridades administrativas.”, sendo que nos termos do nº 2 “a prevalência das decisões dos tribunais administrativos sobre as das autoridades administrativas implica a nulidade de qualquer acto administrativo que desrespeite uma decisão judicial e faz incorrer os seus autores em responsabilidade civil, criminal e disciplinar, nos termos previstos no artigo seguinte.”.
Como decorre da matéria de facto dada como provada, em 03.12.2009 foi proferida sentença no processo de Impugnação deduzido pela A. no pressuposto de que a sua Reclamação Graciosa havia sido indeferida tacitamente, em que se julgou aquela Impugnação improcedente, por não estar afinal expirado o prazo de decisão do procedimento de reclamação graciosa e, como tal, inexistir qualquer indeferimento tácito da mesma (cfr. factos provados sob os pontos 2. e 4.).
Mais se expendeu na visada sentença que se anulava «o acto de apensação e de declaração de inutilidade da reclamação (…) remetendo-se o processo às instâncias administrativas competentes por ser intempestiva a presente impugnação» (cfr. facto provado sob o ponto 4.).
No entanto e, diga-se desde, já, não se ordenou que fosse decidida a Reclamação Graciosa, apenas anulou o ato de apensação remetendo o processo às instâncias administrativas.
Como já supra se referiu, o mecanismo de execução de julgados consiste no meio processual acessório previsto no artigo 146.º do CPPT e 102.º da LGT, mas cuja regulação se rege pelo disposto nas normas sobre o processo nos tribunais administrativos, utilizado para obter a execução coerciva das decisões quando a Administração Tributária não dê execução espontânea à sentença no prazo jurisdicional ou legalmente estabelecido.
No caso em concreto pretende a Autora pretende ver apreciada a Reclamação Graciosa ato que considera devido e cuja prática lhe foi recusada – veja-se ponto 7), 8) e 9) do probatório (sublinhado nosso).
A este propósito referem Aroso de Almeida /Fernandes Cadilha:
“Como a impugnação prevista nos artigos 50.° e segs. [do CPTA] se dirige à anulação ou declaração de nulidade ou inexistência de actos administrativos, ela é o modo de reacção adequado contra actos administrativos de conteúdo positivo, por parte de quem pretenda o restabelecimento da situação por eles alterada: como o acto modificou a situação existente, a sua remoção da ordem jurídica permite restabelecer a situação pré-existente. É o que sucede com os actos ablativos, que retiram direitos (como o acto que expropria um bem), os actos impositivos, que impõem deveres (como o acto que exige o pagamento de uma quantia), e os actos que aplicam sanções (como o acto que determina a demissão ou a suspensão de um funcionário). Pelo contrário o modo de reacção adequado contra actos administrativos de conteúdo negativo é a dedução de um pedido de condenação à prática de um acto administrativo. Pense-se no acto que indefere o pedido de uma licença, de uma pensão, de uma bolsa ou de um subsídio; como no acto que se recusa mesmo a apreciar o requerimento. Se o acto indeferiu (ou recusou a própria apreciação de) um requerimento dirigido à introdução de uma situação jurídica nova, o modo adequado de pugnar pela introdução dessa situação jurídica não é pedir a remoção do acto negativo, uma vez que nada há que se pretenda restabelecer, mas pedir a condenação à prática do acto alegadamente devido…» ( In Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 3.ª Ed. Revista, Livraria Almedina, Coimbra, 2010, pg. 353/354. )
Assim e como e como foi instaurada a presente ação para condenação da Entidade Demandada à prática do ato devido, tido como a apreciação da visada Reclamação perante a recusa expressa da mesma, entendemos não assistir razão à recorrente, considerando-se ser este o meio idóneo para apreciação da sua pretensão, não existindo como alegada a violação de lei por não ter aplicado os artigos, 97º n.1 alínea q) e 146º, todos do CPPT, e 157º e seguintes do CPTA.



Pelo exposto, nega-se provimento ao recurso e mantem-se na ordem jurídica a sentença.
*
No concerne a custas, atenta a improcedência total do recurso, é a Recorrente a responsáveis pelas custas do recurso – vide artigo 527.º, nos. 1 e 2 do e 529.º, n.º 2 do Código de Processo Civil.
**

Nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do Código de Processo Civil, elabora-se o seguinte sumário:
I- O meio próprio para reagir contra atos administrativos relativos a questões tributárias que não comportem apreciação da legalidade do ato de liquidação é a ação administrativa especial.
II- O meio próprio para a recusa de decisão da Reclamação Graciosa por parte da representação da Fazenda Pública é a ação administrativa especial para impugnação de ato administrativo, cumulado com a condenação à prática de ato devido.
III- O modo de reação adequado contra atos administrativos de conteúdo negativo é a dedução de um pedido de condenação à prática de um ato administrativo.


V. DECISÃO

Face ao exposto, acorda-se em conferência na Subsecção Tributária Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

a) Negar provimento ao recurso, mantendo-se na ordem jurídica a sentença recorrida.

b) Custas pela Recorrente nos termos do artigo 527.º, nos. 1 e 2 do e 529.º, n.º 2 do Código de Processo Civil.

Porto, 24 de abril de 2024

Isabel Ramalho dos Santos (Relatora)
Carlos Castro Fernandes (1.º Adjunto)
Paulo Moura (2.º Adjunto)