Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 02456/15.8BEPRT |
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Secção: | 1ª Secção - Contencioso Administrativo |
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Data do Acordão: | 02/16/2018 |
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Tribunal: | TAF do Porto |
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Relator: | Frederico Macedo Branco |
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Descritores: | ABONO PARA FALHAS; POLICIA MUNICIPAL; |
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Sumário: | 1 – O abono para falhas é um suplemento remuneratório atribuído em função do manuseamento funcional de dinheiro, destinando-se a compensar os trabalhadores da Administração Pública pelos riscos inerentes a tal manuseamento. 2 - O direito ao abono para falhas pressupõe que o trabalhador ocupe posto de trabalho no âmbito do qual predominantemente manuseie dinheiro e que essas funções se mostrem descritas no seu conteúdo funcional e correspondente no mapa de pessoal. O abono por falhas tem carater excecional, pressupondo pois uma atividade funcional predominante relacionada com o manuseamento de dinheiro. 3 – Não integrando o conteúdo funcional dos Policias Municipais a necessidade de manuseamento de dinheiro como atividade predominante, não têm os mesmos direito o referido Abono para Falhas, ao abrigo do DL n° 247/87. * *Sumário elaborado pelo relator |
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Recorrente: | Sindicato dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais do Norte |
Recorrido 1: | Município da Maia |
Votação: | Unanimidade |
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Meio Processual: | Acção Administrativa Comum |
Decisão: | Negar provimento ao recurso |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | Não emitiu parecer |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório O Sindicato dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais do Norte, em representação de oito Associados devidamente identificados nos autos, no âmbito da ação administrativa Comum, intentada contra o Município da Maia tendente, em síntese, à atribuição àqueles do “abono para falhas”, inconformado com a Sentença proferida em 25 de maio de 2017, no TAF do Porto, veio interpor recurso jurisdicional. Formula a aqui Recorrente/Sindicato nas suas alegações do Recurso Jurisdicional, apresentadas em 26 de junho de 2017, as seguintes conclusões (Cfr. fls. 151v a 153 Procº físico). “1. Quanto ao regime jurídico aplicável até 31 de Dezembro de 2008, excetuando os RA PSAPC e de MJSRC, aplicar-se-á o regime previsto no Decreto-Lei n.º 247/87, de 17 de Junho; 2. Regime esse que, nos termos do n.º 4 do artigo 17.º do referido Decreto-Lei, continha um direito – decorrente diretamente da lei e sem necessidade de apreciação discricionária por parte da Administração Autárquica - a um suplemento remuneratório para o pessoal integrado em carreira cujo conteúdo funcional implique o manuseamento de dinheiro terá direito a abono para falhas, de montante igual a metade do referido no n.º 1, devendo prestar caução nos termos do artigo 16.º; 3. No caso concreto, o conteúdo funcional da carreira de polícia municipal inclui, como decorrência da fiscalização do cumprimento das normas de estacionamento de veículos e de circulação rodoviária e da instrução de processos de contraordenação, incluiu o manuseamento de dinheiro; 4. Pelo que, quanto aos RA do Recorrido, relativamente ao período compreendido entre as datas de admissão e até 31 de Dezembro de 2008, terão direito ao abono para falhas de acordo com o regime constante no Decreto-Lei n.º 247/87, de 17 de Junho; 5. Quanto à determinação do direito ao abono para falhas a partir de 1 de Janeiro de 2009, há que atender ao regime presente no Decreto-Lei n.º 4/89 de 6 de Janeiro, alterado pela Lei n.º 64-A de 2008, de 31 de Dezembro, que alargou o seu campo de aplicação aos serviços das administrações autárquicas; 6. Determinou este regime que teriam direito ao suplemento remuneratório de abono para falhas os trabalhadores que manuseassem ou tivessem à sua guarda, nas áreas de tesouraria ou cobrança, valores, numerário, títulos ou documentos, sendo por eles responsáveis; 7. Ademais, e nos termos deste Decreto-Lei, a regulamentação das carreiras, categorias e trabalhadores abrangidos seria determinado por despacho conjunto do respetivo membro do Governo e dos responsáveis pelas áreas das finanças e da Administração Pública; 8. O Despacho n.º 15409/2009, de 30 de Junho, emitido pelo Gabinete do Ministro do Ministério das Finanças e da Administração Pública definiu que apenas os trabalhadores da administração titulares da categoria de coordenador técnico da carreira de assistente técnico ou de subsistente de tesoureiro-chefe veriam reconhecido o direito ao abono para falhas; 9. Contudo, os trabalhadores que ocupassem postos de trabalho cuja carreira e categoria não fosse a de assistente técnico teriam o reconhecimento do seu direito ao abono para falhas relegado para concretização posterior em sede de despacho conjunto do membro do Governo responsável pelas áreas da Administração Pública e da tutela respetiva; 10. Concretização essa que foi omitida, vendo-se os trabalhadores impedidos de verem reconhecidos na sua esfera jurídica o direito ao referido abono; 11. Pelo que, na falta de despacho normativo, será de aplicar, ao caso concreto dos RA, o regime presente no Decreto-Lei n.º 4/89 de 6 de Janeiro, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 64-A de 2008, de 31 de Dezembro, reconhecendo-se o direito ao um suplemento remuneratório do abono para falhas, na medida em que o conteúdo funcional das funções desempenhadas pelos RA incluiu o manuseamento e guarda, nas áreas de tesouraria ou cobrança, de valores, numerário, títulos ou documentos, sendo por eles responsáveis; 12. Por fim, diversa interpretação e aplicação do Decreto-Lei n.º 4/89 de 6 de Janeiro, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 64-A de 2008, de 31 de Dezembro, baseada no Despacho n.º 15409/2009, de 30 de Junho, Gabinete do Ministro do Ministério das Finanças e da Administração Pública, fez incorrer o Tribunal a quo em inconstitucionalidade, por violação dos arts. 2º, 13º, 18º, 112º e 266º da CRP, por violação, respetivamente dos Princípios da proteção da confiança e segurança jurídica, da Igualdade, da irretroatividade das leis, da prevalência hierárquica das leis e das garantias dos administrados. Termos em que, sempre com mui douto suprimento desse Venerando Tribunal, deve, pois, a douta sentença do Tribunal a quo ser revogada, aplicando-se corretamente os normativos em causa, o que, no caso sub judice, implicará a condenação do Recorrido ao pagamento das quantias retributivas referentes ao abono para falhas dos RA nos termos peticionados em sede de petição inicial, só assim se fazendo integral e sã Justiça!” A Entidade Recorrida/Município, devidamente notificada, veio a apresentar as suas Contra-alegações de Recurso em 4 de agosto de 2017, nas quais concluiu (Cfr. fls. 162v a 164 Procº físico): “1º - Nenhum Agente de Polícia Municipal da Maia tem direito a 'abono para falhas' porquanto não manuseiam dinheiro nem valores, nos termos das competências legais das Polícias Municipais e da Maia em concreto, estando esta fixada no seu Regulamento de Organização e Funcionamento, aprovado pela Câmara Municipal da Maia na reunião ordinária realizada em 6 de junho de 2007 e junta aos autos na contestação como doc. n° 1; 2° - Até 31 de dezembro de 2008, o 'abono para falhas' era regulado pelo DL n° 4/89, que definia as situações em que os trabalhadores - nomeadamente da carreira de tesoureiro - tinham direito a esse suplemento remuneratório; 3° - Então, o 'abono para falhas' era calculado e atribuído mensalmente, devendo o seu titular prestar caução, nos termos admitidos legalmente; 4° - Nenhum dos 6 representados do Recorrente que foram contratados antes de 31 de dezembro de 2008 alguma vez manusearam dinheiro ou valores e, também por isso, não prestaram caução para o efeito; 5° - Após 1 de janeiro de 2009, o 'abono para falhas' teve novo regime jurídico, mas pressupondo sempre a sua aplicação apenas a quem, de uma forma principal, manuseia dinheiro (no sentido lato), tendo passado a ser contabilizado e atribuído por dia e deixando de ser necessário a prestação da caução anteriormente prevista; 6° - Nas Câmaras Municipais, o despacho de indicação e reconhecimento das pessoas com direito a 'abono para falhas' é do Presidente da Câmara Municipal, não tendo nunca na Maia existido tal despacho a favor de um Policia Municipal, porque nenhum dos seus membros manuseia dinheiro que permitisse tal atribuição. 7° - Este 'abono para falhas' tem um carácter excecionalíssimo, nem é para qualquer funcionário/agente, nem aliás para qualquer valor movimentado ou momento! Nestes termos e nos demais de Direito deverá o presente recurso - se analisado for tendo em conta o aproveitamento que o Recorrente fez alargando o mesmo sem que a petição inicial da Ação o abrangesse... - ser totalmente improcedente, mantendo-se na íntegra a decisão recorrida, pelo que; a) - não deve o Município da Maia ser condenado a pagar qualquer montante - mensal ou diário - de 'abono para falhas' a qualquer Agente da Polícia Municipal, nem aos contratados antes nem depois de 1 de janeiro de 2009; b) - não deve o Presidente da Câmara Municipal da Maia emitir qualquer despacho que reconheça direito a abono para falhas a qualquer Agente da Polícia Municipal da Maia; c) - deve manter-se a responsabilidade total do Autor, ora Recorrente, pelas custas judiciais da presente ação, cujo valor foi fixado em 72.138,44Euros. Assim decidindo, farão V'. Exas. Venerandos Desembargadores JUSTIÇA!” O Recurso interposto veio a ser admitido por Despacho de 11 de setembro de 2017 (Cfr. fls. 170 Procº físico). O Ministério Público junto deste TCAN, notificado em 23 de outubro de 2017 (Cfr. fls. 177 Procº físico), nada veio dizer, requerer ou Promover. Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento. * II - Questões a apreciarAs questões a apreciar resultam da necessidade de verificar, designadamente, os suscitados erros de julgamento por alegada indevida interpretação legal adotada pelo Tribunal a quo, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA. III – Fundamentação de Facto O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade como provada, a qual aqui se reproduz: “1) A representada do A. GCCM, com o n.º mecanográfico …..8, exerce funções na Câmara Municipal da Maia em regime de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, desde 18/01/2002, tendo a categoria de Agente Municipal Graduado (cfr. doc. de fls. 20 do suporte físico do processo). 2) O representado do A. BAMP, com o n.º mecanográfico …..3, exerce funções na Câmara Municipal da Maia em regime de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, desde 28/01/2002, tendo a categoria de Agente Municipal Graduado (cfr. doc. de fls. 21 do suporte físico do processo). 3) A representada do A. SITS, com o n.º mecanográfico …..9, exerce funções na Câmara Municipal da Maia em regime de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, desde 24/01/2003, tendo a categoria de Agente Municipal 1.ª Classe (cfr. doc. de fls. 22 do suporte físico do processo). 4) O representado do A. CASP, com o n.º mecanográfico …..23, exerce funções na Câmara Municipal da Maia em regime de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, desde 24/03/2008, tendo a categoria de Agente Municipal 1.ª Classe (cfr. doc. de fls. 23 do suporte físico do processo). 5) O representado do A. VHCPVS, com o n.º mecanográfico …..25, exerce funções na Câmara Municipal da Maia em regime de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, desde 18/04/2008, tendo a categoria de Agente Municipal 1.ª Classe (cfr. doc. de fls. 24 do suporte físico do processo). 6) A representada do A. RCAM, com o n.º mecanográfico …..24, exerce funções na Câmara Municipal da Maia em regime de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, desde 18/04/2008, tendo a categoria de Agente Municipal 1.ª Classe (cfr. doc. de fls. 25 do suporte físico do processo). 7) O representado do A. PSAPC, com o n.º mecanográfico …..46, exerce funções na Câmara Municipal da Maia em regime de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, desde 06/09/2011, tendo a categoria de Agente Municipal 2.ª Classe (cfr. doc. de fls. 26 do suporte físico do processo). 8) O representado do A. MJSRC, com o n.º mecanográfico …..45, exerce funções na Câmara Municipal da Maia em regime de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, desde 06/09/2011, tendo a categoria de Agente Municipal 2.ª Classe, encontrando-se atualmente em regime de mobilidade ao serviço da Câmara Municipal de Gondomar, na qual ingressou em 23/06/2015 (cfr. doc. de fls. 27 do suporte físico do processo). 9) Desde a data de admissão de cada um dos representados do A. e até ao presente, o R. nunca lhes pagou qualquer montante relativo a abono para falhas (cfr. docs. de fls. 28 a 43 do suporte físico do processo). 10) A petição inicial da presente ação deu entrada em juízo no dia 13/10/2015 (cfr. doc. de fls. 3 do suporte físico do processo). IV – Do Direito O Sindicato, em representação dos seus Associados identificados, não se conformando com a decisão adotada pelo Tribunal a quo, veio recorrer da mesma. Desde logo, no que ao direito concerne e no que aqui releva, discorreu-se em 1ª instância: “(...) O pagamento do abono para falhas no âmbito da Administração Local começou por ser regulado no Decreto-Lei n.º 247/87, de 17/06, diploma que estabelecia, além do mais, o regime de carreiras e categorias, bem como as formas de provimento, do pessoal das câmaras municipais, serviços municipalizados, federações e associações de municípios, assembleias distritais e juntas de freguesia (art.º 1.º, n.º 1). Dispunha o art.º 17.º, n.º 1, deste diploma que “o abono para falhas dos tesoureiros é fixado em 10% do vencimento ilíquido da respetiva categoria”, acrescentando o n.º 4 que “o pessoal integrado em carreira cujo conteúdo funcional implique o manuseamento de dinheiro terá direito a abono para falhas, de montante igual a metade do referido no n.º 1, devendo prestar caução nos termos do artigo 16.º”. Este art.º 16.º prescrevia que “não pode ser conferida posse ao funcionário provido na categoria de tesoureiro sem que se mostre ter sido prestada caução” (n.º 1), que “a caução a prestar será fixada pelo órgão executivo e o seu valor nunca poderá ser superior a metade do vencimento ilíquido anual da categoria de ingresso na carreira de tesoureiro” (n.º 2), e que “a caução poderá ser prestada mediante depósito de dinheiro, títulos de dívida pública fundada, hipoteca sobre prédios rústicos ou urbanos ou seguro caução” (n.º 3). Sucede que a Lei n.º 12-A/2008, de 27/02 (que fixa o regime de vinculação de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas) veio revogar o Decreto-Lei n.º 247/87, de 17/06, com efeitos a partir de 01/01/2009 (cfr. os art.ºs 116.º, alínea q), e 118.º, n.º 7, da Lei n.º 12-A/2008, de 27/02, e o art.º 23.º da Lei n.º 59/2008, de 11/09, que aprova o regime do contrato de trabalho em funções públicas). Com esta revogação, o pagamento do abono para falhas no âmbito da Administração Local passou a ser regulado pelo Decreto-Lei n.º 4/89, de 06/01, o qual era, na sua versão inicial, aplicável apenas aos funcionários e agentes da administração central e dos institutos públicos que revestissem a natureza de serviços personalizados ou de fundos públicos (art.º 1.º, na redação originária). Com efeito, a Lei n.º 64-A/2008, de 31/12, que aprovou o Orçamento do Estado para 2009, alterou os art.ºs 1.º, 2.º e 4.º, do Decreto-Lei n.º 4/89, de 06/01 (cfr. o respetivo art.º 24.º), passando esse art.º 1.º a estipular que este último diploma “é aplicável aos serviços da administração direta e indireta do Estado, bem como, com as adaptações respeitantes às competências dos correspondentes órgãos das autarquias locais, aos serviços das administrações autárquicas”. Nos termos do art.º 2.º do Decreto-Lei n.º 4/89, de 06/01 (na redação conferida pela Lei n.º 64-A/2008, de 31/12), “têm direito a um suplemento remuneratório designado ‘abono para falhas’ os trabalhadores que manuseiem ou tenham à sua guarda, nas áreas de tesouraria ou cobrança, valores, numerário, títulos ou documentos, sendo por eles responsáveis ” (n.º 1), sendo que “as carreiras e ou categorias, bem como os trabalhadores que, em cada departamento ministerial, têm direito a ‘abono para falhas’, são determinadas por despacho conjunto do respetivo membro do Governo e dos responsáveis pelas áreas das finanças e da Administração Pública” (n.º 2) Por seu turno, o art.º 4.º, n.º 1, do mesmo diploma legal passou a dizer que “o montante pecuniário do ‘abono para falhas’ é fixado na portaria referida no n.º 2 do artigo 68.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro”. Trata-se da Portaria n.º 1553-C/2008, também de 31/12, que aprovou, ao abrigo do art.º 68.º, n.ºs 2 e 4, da Lei n.º 12-A/2008, de 27/02, a tabela remuneratória única dos trabalhadores que exercem funções públicas, prescrevendo no seu ponto 9.º que, nos termos do n.º 1 do art.º 4.º do Decreto-Lei n.º 4/89, de 06/01, o montante pecuniário do abono para falhas é de € 86,29. Já o Despacho n.º 15409/2009, de 30/06, com produção de efeitos a 01/01/2009, publicado em Diário da República, II Série, n.º 130, de 08/07/2009, aprovado ao abrigo do n.º 2 do art.º 2.º do Decreto-Lei n.º 4/89, de 06/01, e proveniente do Ministério das Finanças e da Administração Pública, refere, no seu preâmbulo, o seguinte: “O suplemento remuneratório designado «abono para falhas», regulamentado pelo Decreto-Lei n.º 4/89, de 6 de janeiro, com a redação dada pelo Decreto-Lei n.º 276/98, de 11 de setembro, foi já objeto da revisão a que se reporta o artigo 112.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, através da Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro, tendo já sido fixado o seu valor pela Portaria n.º 1553-C/2008, de 31 de dezembro. No entanto, o reconhecimento do direito ao seu abono depende da identificação das carreiras e ou categorias, bem como dos trabalhadores que manuseiem ou tenham à sua guarda, nas áreas de tesouraria ou cobrança, valores, numerário, títulos ou documentos, sendo por eles responsáveis. Atendendo a que, no atual elenco das carreiras, não existe qualquer carreira ou categoria inequivocamente associada a esta área, como anteriormente acontecia com a carreira de tesoureiro, e ao facto de os trabalhadores nela integrados terem transitado para a carreira e categoria de assistente técnico, reconhece-se o direito a esse abono aos trabalhadores integrados nessa carreira e categoria que ocupem postos de trabalho nas áreas de tesouraria ou cobrança que envolvam a responsabilidade inerente ao manuseamento ou guarda de valores, numerário, títulos ou documentos. (...)” E, neste sentido, determina o Despacho n.º 15409/2009 que “têm direito ao suplemento designado «abono para falhas», regulado pelo Decreto-Lei n.º 4/89, de 6 de janeiro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 276/98, de 11 de setembro, e pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro, os trabalhadores titulares da categoria de assistente técnico da carreira geral de assistente técnico que ocupem postos de trabalho que, de acordo com a caracterização constante do mapa de pessoal, se reportem às áreas de tesouraria ou cobrança que envolvam a responsabilidade inerente ao manuseamento ou guarda de valores, numerário, títulos ou documentos” (1.º parágrafo) Acresce que, “nas autarquias locais, têm ainda direito ao suplemento a que se refere o número anterior os trabalhadores titulares da categoria de coordenador técnico da carreira de assistente técnico que se encontrem nas mesmas condições, bem como os titulares da categoria subsistente de tesoureiro-chefe” (2.º parágrafo) (...) Ante o exposto, temos que, no tocante ao abono para falhas no âmbito da Administração Autárquica: i. até 31/12/2008 regeu o Decreto-Lei n.º 247/87, de 17/06; ii. a partir de 01/01/2009 regem o Decreto-Lei n.º 4/89, de 06/01 (alterado pelo Decreto-Lei n.º 276/98, de 11/09, e revisto pela Lei n.º 64.º-A/2008, de 31/12), a Portaria n.º 1553-C/2008, de 31/12, e o Despacho n.º 15409/2009, de 30/06. Volvendo ao caso concreto, o A. peticiona, além do mais, o pagamento das quantias devidas a cada um dos seus representados a título de abonos para falhas desde a data da respetiva admissão e até ao presente, admissão que se situa, consoante os casos, nas datas de 18/01/2002, 28/01/2002, 24/01/2003, 24/03/2008, 18/04/2008 e 06/09/2011 (cfr. pontos 1 a 8 dos factos provados). Por conseguinte, no que concerne ao reconhecimento do direito a receber o abono para falhas, exceto nos casos de PSAPC e de MJSRC (admitidos em 06/09/2011), aos restantes representados do A. é aplicável o regime do Decreto-Lei n.º 247/87, de 17/06, no período compreendido entre as datas de admissão e 31/12/2008, e, bem assim, o regime do Decreto-Lei n.º 4/89, de 06/01, desde 01/01/2009 e até ao presente. Aos dois representados do A. atrás excecionados é unicamente aplicável este último diploma legal, atenta a data da sua admissão. (...) De acordo com o regime previsto no Decreto-Lei n.º 247/87, de 17/06 (cfr. art.º 17.º), constata-se que o direito ao abono para falhas decorre diretamente da lei, sem necessidade de apreciação discricionária por parte da Administração Autárquica, uma vez que a sua atribuição só dependia de o funcionário (que não pertencesse à carreira de tesoureiro) estar integrado em carreira cujo conteúdo funcional implicasse o manuseamento de dinheiro, bem como da prestação de caução. Importa, pois, averiguar se os representados do A. estavam (e estão) inseridos em carreira cujo conteúdo funcional implicasse (e implique) o manuseamento de dinheiro, nos termos legais, tendo presente que o abono para falhas não é de atribuição genérica a todo e qualquer trabalhador que eventualmente manuseia numerário (pese embora o A. peticionar o pagamento do abono para falhas unicamente ao abrigo do Decreto-Lei n.º 4/89, de 06/01, o Tribunal não está sujeito às alegações das partes no tocante ao enquadramento e qualificação jurídica dos factos e à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito, nos termos do art.º 5.º, n.º 3, do CPC). Relevante é que esse manuseamento faça parte do núcleo das funções exercidas pelos trabalhadores, atenta a carreira em que se integram. E julgamos que tal não sucede com os representados do A., os quais integram a carreira de Polícia Municipal, com as categorias de Agente Graduado, Agente Municipal de 1.ª Classe e Agente Municipal de 2.ª Classe, consoante os casos. (...) Ora, da descrição do conteúdo funcional da carreira em que os representados do A. se encontram inseridos, enquanto agentes da polícia municipal, não decorre que os mesmos exerçam funções que impliquem, em si mesmas e isoladamente consideradas, manuseamento de dinheiro. Mesmo admitindo, como alega o A., que os seus representados possam ver-se na situação de terem, em casos concretos e determinados, de manusear e guardar dinheiro e outros valores (segundo o A., os seus representados receberiam ordens nesse sentido), tal assumiria uma natureza totalmente secundária e lateral em face das características essenciais dessas funções. Como vimos, tal não basta para que lhes seja reconhecido o direito ao abono para falhas nos termos do art.º 17.º do Decreto-Lei n.º 247/87, de 17/06, direito esse que não resulta do mero manuseamento ou guarda de dinheiros públicos, pois o que efetivamente importa é que esse manuseamento de numerário assuma um papel principal, preponderante, na descrição do conteúdo funcional da sua carreira, o que não sucede. Assim, conclui-se que os representados do A. não têm direito ao abono para falhas de acordo com o regime constante do Decreto-Lei n.º 247/87, de 17/06, por referência ao período compreendido entre as datas de admissão e 31/12/2008. E o que dizer do reconhecimento desse direito com base no Decreto-Lei n.º 4/89, de 06/01, desde 01/01/2009 e até ao presente? Também aqui julgamos que a pretensão do A. não pode obter provimento. (...) Para além de ter sido alterado o montante do abono para falhas, que deixou de corresponder a metade do atribuído mensalmente aos tesoureiros para passar a ser determinado diariamente, segundo uma fórmula fixada na lei, e distribuído na proporção do tempo de serviço prestado no exercício das funções que o justificam, constatamos que mudou, também, a forma de reconhecimento do respetivo direito. De uma leitura conjugada dos preceitos do Decreto-Lei n.º 4/89, de 06/01, (alterado pelo Decreto-Lei n.º 276/98, de 11/09, e revisto pela Lei n.º 64-A/2008, de 31/12), e do Despacho n.º 15409/2009, de 30/06, decorre que, para a atribuição do abono para falhas, é exigido cumulativamente: - que o trabalhador, titular da categoria de assistente técnico da carreira geral de assistente técnico, ocupe posto de trabalho que se reporte às áreas de tesouraria ou cobrança; - que esse posto de trabalho envolva a responsabilidade inerente ao manuseamento ou guarda de valores, numerário, títulos ou documentos; - que tais funções sejam assim descritas no mapa de pessoal. (...) De facto, o reconhecimento do direito ao abono para falhas deixou de decorrer diretamente da lei, sem necessidade de apreciação discricionária por parte da Administração Autárquica, para exigir decisão administrativa expressa que o reconheça de forma fundamentada, designadamente por referência à ou às carreiras abrangidas, aos riscos efetivos, aos montantes anuais movimentados e às responsabilidades que impendem sobre os funcionários ou agentes para os quais o mesmo é solicitado. Ora, atentos os requisitos acima evidenciados, é manifesto que aos representados do A., porque não preenchem todos esses requisitos, não pode ser reconhecido o direito a o abono para falhas nos termos do regime agora em análise. Verifica-se, desde logo, que os representados do A. não são titulares da categoria de assistente técnico da carreira geral de assistente técnico (ocupam categorias inerentes à carreira de Polícia Municipal), não ocupam posto de trabalho que se reporte às áreas de tesouraria ou cobrança, nem se pode entender que o seu posto de trabalho, à luz do respetivo conteúdo funcional que acima deixámos descrito, envolve necessariamente a responsabilidade inerente ao manuseamento ou guarda de valores, numerário, títulos ou documentos. Também não são titulares da categoria de coordenador técnico da carreira de assistente técnico, nem da categoria subsistente de tesoureiro-chefe. (...) Assim sendo, não cumprindo os requisitos impostos pelo Decreto-Lei n.º 4/89, de 06/01, e pelo Despacho n.º 15409/2009, de 30/06, para que os representados do A. pudessem ter direito à perceção do abono para falhas ao abrigo do regime renovado que entrou em vigor em 01/01/2009, era imperioso que houvesse despacho expresso e fundamentado nesse sentido (cfr. art.ºs 1.º, 2.º, n.º 2, e 2.º-A do Decreto-Lei n.º 4/89, de 06/01, e 5.º parágrafo do Despacho n.º 15409/2009, de 30/06), no caso proferido pelo Presidente da Câmara Municipal da Maia, o que, tanto quanto se sabe, nunca ocorreu nem nada foi alegado pelo A. nesse sentido (cfr. o acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 19/10/2012, acima citado). E, note-se, esta concessão do abono para falhas mediante despacho expresso e fundamentado envolverá momentos discricionários, próprios da Administração Autárquica, que o poder jurisdicional não pode nem deve ultrapassar, sob pena de atentar contra a separação de poderes. Por todo o exposto, conclui-se que os representados do A. não têm direito, nos termos legais, ao recebimento do abono para falhas, o que determina a improcedência do pedido de condenação do R. no seu pagamento, nos termos indicados na petição inicial, incluindo quantias vincendas e juros de mora até efetivo e integral pagamento.” Vejamos: Do objeto do recurso Atenda-se, desde logo, que o abono para falhas é um suplemento ou acréscimo remuneratório atribuído em função de uma particularidade específica da prestação de trabalho, que se traduz no manuseamento de dinheiro, caracterizando-se e justificando-se como um subsídio destinado a indemnizar funcionários e agentes pelas despesas e riscos inerentes a tal manuseamento que é suscetível de gerar falhas contabilísticas em operações de tesouraria (cfr. João Alfaia, in “Conceitos Fundamentais do Regime Jurídico do Funcionalismo Público”, II, 1988, págs. 872 e 873; Paulo Veiga e Moura in “Função Pública”, 1º. vol., 2ª edição, pág. 345; Parecer do Conselho Consultivo da PGR n.º 123/96 in: DR II Série, de 24/03/1998). Aliás a presente questão não é nova, tendo já sido repetidamente tratada, até por este TCAN. Como se sumariou no Acórdão deste TCAN nº 02018/10.6BEPRT, de 08/02/2013 “o abono para falhas é um suplemento ou acréscimo remuneratório atribuído em função de uma particularidade específica da prestação de trabalho, que se traduz no manuseamento de dinheiro, caracterizando-se e justificando-se como um subsídio destinado a indemnizar funcionários e agentes pelas despesas e riscos inerentes a tal manuseamento que é suscetível de gerar falhas contabilísticas em operações de tesouraria. O direito ao abono para falhas exige que: - o trabalhador, titular da categoria de assistente técnico, ocupe posto de trabalho que se reporte às áreas de tesouraria ou cobrança; e, - que esse posto de trabalho envolva a responsabilidade inerente ao manuseamento ou guarda de valores, numerário, títulos ou documentos; e ainda que - que tais funções sejam assim descritas no mapa de pessoal.” Numa dicotomia não coincidente com aquela que adotara em 1ª instância, veio o Sindicato Recorrente cindir as situações objetivas em apreciação, conforme os seus associados tenham sido admitidos antes ou depois de 2009, sendo que essa estratégia não altera a situação de facto, pois que o que está em causa, independentemente do regime legal vigente, será verificar se os seus associados lidavam, ou não, predominantemente no âmbito da sua atividade funcional, com dinheiro. Diga-se desde já que se entende que o expendido pelo tribunal a quo e precedentemente transcrito, interpreta adequada e lapidarmente o quadro legal à situação dos trabalhadores aqui representados, pelo que pouco mais haverá a referir que não o reiterar do explicitado. É incontornável o facto do abono por falhas ter carater excecional e pressupor uma atividade funcional predominante relacionada com o manuseamento de dinheiro. Não se põe em causa que os identificados trabalhadores possam, esporádica e residualmente, ter tido contacto com dinheiro no âmbito da sua atividade funcional. O que está, em qualquer caso, por provar é que esse manuseamento possa, em algum momento, ter tido carater principal e predominante. Da Substancia do Recurso a) - Regime jurídico aplicável até 31 de Dezembro de 2008 Estão aqui em causa os trabalhadores que iniciaram funções anteriormente a 31 de dezembro de 2008, e face aos quais importará verificar se o regime previsto no DL n° 247/87, de 17 de junho, lhes asseguraria o recebimento do almejado Abono. É desde logo claro, e tal como explicitado exaustivamente pelo tribunal a quo, que o conteúdo funcional dos referidos trabalhadores não evidencia a necessidade de manuseamento de dinheiro como atividade predominante. Não merece pois censura o entendimento adotado pelo tribunal a quo, no sentido de não reconhecer que os identificados Policias Municipais devessem auferir o controvertido Abono por Falhas, ao abrigo do DL n° 247/87. Se é certo, como alega o Recorrente, que se admite que a enunciação de funções dos Policias Municipais constante do DL n° 39/2000, de 17 de março, não é necessariamente taxativa, o que é facto é que nada se aduz da mesma que os referidos agentes devam lidar, ainda que residualmente, com dinheiro. Refira-se finalmente que sendo pressuposto, entre outros, do recebimento do abono para falhas ao abrigo do art°. 16° do DL n° 247/87, a prestação da caução, está até por provar, que a mesma tenha siso prestada ou sequer requerida. b) — Regime jurídico aplicável após 1 de janeiro de 2009: No que concerne à aplicabilidade do regime vigente a partir de 1 de janeiro de 2009, diga-se desde logo, e como resulta da sentença proferida em 1ª instância, que igualmente se não reconhece que por essa via os representados do Recorrente devessem auferir o controvertido Abono por Falhas, tanto mais que inultrapassável e incontornável o facto dos mesmos não manusearem dinheiro com atividade funcional predominante, ao que acresce a inexistência de despacho prévio a viabilizar tal abono, como resulta expresso do novo regime jurídico aplicável. Efetivamente, da leitura conjugada do Decreto-Lei n.º 4/89, de 06/01, (alterado pelo Decreto-Lei n.º 276/98, de 11/09, e revisto pela Lei n.º 64-A/2008, de 31/12), e do Despacho n.º 15409/2009, de 30/06, resulta que a atribuição do abono para falhas pressupõe cumulativamente que: - O trabalhador seja titular da categoria de assistente técnico da carreira geral de assistente técnico e ocupe posto de trabalho que se reporte às áreas de tesouraria ou cobrança; - Que esse posto de trabalho envolva a responsabilidade inerente ao manuseamento ou guarda de valores, numerário, títulos ou documentos; e - Que tais funções sejam assim descritas no mapa de pessoal. Já no âmbito das autarquias locais, que é o que aqui está em causa, o direito a auferir o aludido abono reconduz-se singelamente aos trabalhadores com a categoria de coordenador técnico da carreira de assistente técnico que se encontrem nas mesmas condições acima referidas, bem como aqueles que sejam titulares da categoria de tesoureiro-chefe. Em face de tudo quanto precede, não merece censura a decisão proferido pelo tribunal a quo. * * * Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Norte, negar provimento ao Recurso, confirmando-se a decisão proferida em 1ª instância.Custas pelo Recorrente, sem prejuízo da isenção subjetiva de que goza Porto, 16 de fevereiro de 2018 Ass. Frederico de Frias Macedo Branco Ass. Rogério Martins Ass. Luís Migueis Garcia |