Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00610/11.0BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:11/28/2024
Tribunal:TAF de Braga
Relator:VIRGÍNIA ANDRADE
Descritores:IRS;
CUSTOS DE CONSTRUÇÃO; IMÓVEL;
MEIOS DE PROVA; ARTIGO 115.º DO CPPT;
Sumário:
I. Em condições normais, face às regulares práticas comerciais, o custo com a construção de imóvel deverá ser demonstrado por meio de faturas e ou recibos.

II. No entanto, tendo decorrido o período no qual estão obrigados, à luz do estatuído à data artigo 128.º n.º 2 do CIRS, a apresentar tais documentos (5 anos), não pode a AT exigir a apresentação desses documentos.

III. Não se verificando estarmos perante uma qualquer das situações elencadas nos artigos 364.º n.º 1, 393.º e 394.º n.º 1, todos do Código Civil, quem tem o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos que invoca pode recorrer a todos os meios de prova disponíveis ao abrigo do disposto no artigo 115.º do CPPT.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1 – RELATÓRIO

A Fazenda Pública, vem interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial intentada por «AA», contribuinte n.º ...67 e «BB» contribuinte n.º ...65 contra a liquidação de IRS do ano de 2005, no valor de €27.131,89.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:
“I. Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida no âmbito da impugnação judicial supra identificada, que teve por objeto a liquidação adicional de IRS do ano de 2005 e, respetivos juros compensatórios, no montante global de € 27.131,89.
II. Na douta sentença recorrida o Tribunal “a quo” julgou parcialmente procedente a impugnação deduzida pelos Impugnantes, determinando, consequentemente, a anulação da liquidação impugnada, ”na parte em que resultou da desconsideração dos custos de construção na determinação do valor de aquisição.”
III. No entender desta Fazenda Pública, e salvo o devido respeito por diferente opinião, erra o Tribunal “a quo”, ao considerar que, “… como resulta claramente do probatório, os Impugnantes lograram demonstrar nos autos que despenderam, pelo menos, a quantia de €99.759,97 na construção do edifício que integra o prédio urbano por eles alienado (cfr. ponto 25. dos factos provados e respectiva motivação), pelo que o valor de aquisição corresponde não a €18.674,99 (valor patrimonial inscrito na matriz), mas sim a €108.239,53 [€8.479,56 (valor de aquisição do terreno) + €99.759,97 (custos de construção)]. Deste modo, verificando-se que os custos de construção não foram considerados para efeitos de determinação do valor de aquisição do imóvel, incorreu a liquidação impugnada em vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto e de direito, impondo-se a anulação da mesma, na parte correspondente.”.
Pelo que, entende esta Fazenda Pública que a douta sentença recorrida padece de erro de julgamento quanto à matéria de facto e quanto à aplicação do Direito, por errada subsunção dos factos ao direito, nomeadamente, por errada interpretação e aplicação do nº 3 do art. 46º do CIRS.
IV. Quanto à matéria de facto, no entender da Fazenda Pública, a sentença sob recurso fez um lacunar julgamento da prova apresentada, ao não dar como provados os seguintes factos, os quais, por se mostrarem relevantes à boa decisão da causa, devem ser acrescidos à matéria de facto assente, impondo-se a ampliação do rol factual provado, nos termos do artigo 662º, n.º 2, alínea c) do Código de Processo Civil, aplicável, ex vi, artigo 2º, alínea e) do CPPT, nos seguintes termos:
17.1) «CC», iniciou a atividade de “Desenhador” em 26-04- 1993, conforme documentos extraídos do sistema informático da AT, de fls. 91 a 101 da Reclamação Graciosa, apensa aos autos.
17.2) Em 12-03-1999, «CC» apresentou uma declaração de alterações no Serviço de Finanças ..., passando a estar coletado pela atividade principal de “Construção Civil e Engenharia Civil” desde 15-03-1999, e pela atividade secundária de “Desenhador”, que vinha exercendo desde 26-04-1993, conforme documentos extraídos do sistema informático da AT, de fls. 91 a 101 da Reclamação Graciosa, apensa aos autos.
V. No que se refere ainda à matéria de facto, no entender desta Fazenda Pública, a sentença sob recurso fez um errado julgamento da matéria factual ao dar como provado o facto identificado no ponto 25) dos FACTOS PROVADOS, o qual deve deixar de constar no rol factual provado e ser considerado como facto não provado, passando, consequentemente, a constar nos FACTOS NÃO PROVADOS.
Assim em II-B) FACTOS NÃO PROVADOS: deve deixar de constar “ Não há factos relevantes para a decisão da causa que não se tenham provado” e, passar a constar o seguinte facto não provado:
II-B) FACTOS NÃO PROVADOS:
1)“Os Impugnantes despenderam a quantia de € 99.759,97 na construção do edifício referido no ponto 2 – cfr.dos. de fls. 16 e 17 do processo de reclamação graciosa apensa aos autos.”
VI. Quanto à matéria de direito, relava o preceituado no nº 3 do artigo 46º do CIRS que prescreve o seguinte:
“O valor de aquisição de imóveis construídos pelos próprios sujeitos passivos corresponde ao valor patrimonial inscrito na matriz ou ao valor do terreno, acrescido dos custos de construção devidamente comprovados, se superior àquele.” (sublinhado nosso).
VII. Nos autos, em termos de prova documental realizada pelos recorridos, apenas foram juntos 3 cheques, no valor total de 20.000.000,00 (€ 99.759,58), emitidos em 27.01.1992, 02.03.1992 e 03.08.1992, à ordem e «CC» – (fls. 16 e 17 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos), – Cfr. facto 17 do rol dos factos dados como provados.
VIII. Além dos identificados cheques, não foram juntos aos autos pelos recorridos para efeitos de prova, quaisquer outros documentos referentes às eventuais despesas com a construção do imóvel dos autos, como sejam, contrato de empreitada, faturas dos serviços eventualmente prestados ou dos materiais de construção adquiridos, recibos ou, segundas vias dos mesmos.
IX. Ora, os cheques supra identificados, no entender desta Fazenda Pública, apenas têm a virtualidade de provar que os mesmos foram emitidos a favor de «CC», pelas quantias neles tituladas.
X. Conforme resulta dos factos cujo aditamento ao rol dos factos dados como provados se requereu, e se encontram identificados sob os 17.1 e, 17.2 o Sr. «CC», na data em que os cheques foram emitidos e, de acordo com o depoimento de uma das testemunhas arroladas lhes foram entregues, não exercia qualquer atividade empresarial ou profissional.
XI. Os cheques em causa, por si só, desacompanhados de quaisquer outros documentos, como os referidos, referentes a eventuais despesas com a construção do imóvel alienado, não têm a virtualidade de permitir estabelecer qualquer nexo de causalidade entre os montantes neles titulados e os custos referentes à realização, pelos impugnantes, ora recorrentes, por sua conta e em seu nome, de quaisquer obras de construção do imóvel e/ou a aquisição de materiais de construção, nas diversas fases de construção.
XII. E diga-se, do depoimento prestado pelas testemunhas nos autos, também não se pode tirar qualquer ilação no que se refere a uma eventual correspondência entre os montantes titulados nos cheques e os custos de construção do imóvel alienado.
XIII. O facto de a testemunha «DD» no seu depoimento ter referido ao Tribunal que os impugnantes encarregaram o Sr. «CC» “para tratar de tudo”, referindo-se à construção do imóvel alienado e, ter confirmado ter entregue os identificados cheques, “emitidos para pagar a casa” ao referido Sr. «CC». Assim como, o facto de a testemunha «EE», ter igualmente confirmado que os impugnantes encarregaram o Sr. «CC» da construção da casa, não permite, por si só, conforme o que tem vindo a ser defendido, fazer a correspondência entre os montantes titulados nos cheques e os custos de construção do imóvel alienado pelo impugnantes.
XIV. Aliás, o facto de os cheques terem sido emitidos a favor e entregues pela própria testemunha ao Sr. «CC», também nada prova quanto ao destino dado às quantias tituladas nos cheques que lhe foram entregues. Ou seja, não prova que o Sr. «CC», tenha afeto tais quantias à aquisição de matérias primas empregues na construção do imóvel, pagamento de serviços prestados ou outras despesas associadas à construção do imóvel alienado no exato valor dos montantes titulados nos cheques juntos aos autos (€ 99.759,58).
XV. Além do mais, o Sr. «CC», iniciou a atividade de “Desenhador” em 26-04-1993, só se tendo coletado pela a atividade principal de “Construção Civil e Engenharia Civil” desde 15-03-1999, conforme resulta da requerida ampliação pela Fazenda Pública da matéria de facto provada sob os pontos 17.1) e 17.2) da matéria de facto dada como provada. Pelo que, não exercendo qualquer atividade empresarial ou profissional em 1992 (data da emissão dos cheques), não se pode tirar qualquer eventual ilação no que se refere a qualquer correspondência entre os montantes titulados nos cheques que lhe foram entregues e os custos de construção do imóvel alienado cuja prova se impõe aos impugnantes fazer.
XVI. Cabia aos impugnantes, ora recorridos, fazer prova dos custos de construção efetivamente por si suportados na construção do imóvel alienado e, no entender da Fazenda Pública, não é suficiente em termos da necessária prova, a junção dos cheques em causa e a prova testemunhal produzida, porquanto são insuscetíveis, por si só, de estabelecer qualquer nexo de causalidade entre os montantes titulados nos cheques e montante dos custos de construção efetivamente suportado pelos recorridos com a construção do imóvel.
XVII. Neste sentido, já se pronunciou o Tribunal Central Administrativo Norte, em 21-02- 2019, no âmbito do processo nº 01126/10.8BEAVR.
XVIII. Assim, a sentença recorrida, ao considerar no Ponto 25 dos factos provados que “Os Impugnantes despenderam a quantia de € 99.759,97 na construção do edifício referido no ponto 2 – cfr.dos. de fls. 16 e 17 do processo de reclamação graciosa apensa aos autos.”, sem atender ao que estipula o nº 3 do artigo 46º do CIRS, que alude aos custos de construção devidamente comprovados, o que não resulta provado, como supra demonstrado, fez errada apreciação da prova documental e testemunhal vertida nos autos e, consequentemente, uma errada subsunção dos factos ao direito, nomeadamente, ao nº 3 do artigo 46º do CIRS, impondo-se consequentemente, como requerido por esta Fazenda Pública que, o facto identificado no ponto 25) dos FACTOS PROVADOS, deixe de constar no rol factual provado e seja considerado como facto não provado, passando, consequentemente, a constar nos FACTOS NÃO PROVADOS, como supra requerido.
XIX. Deve, assim, a douta sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que julgue improcedente a impugnação judicial interposta pelos impugnantes, ora recorridos.
XX. Ao não decidir assim, a douta sentença recorrida fez uma errada interpretação e aplicação do Direito, nomeadamente, do nº 3 do artigo 46º do CIRS, devendo ser substituída por douto acórdão que considere improcedente a impugnação judicial interposta pelos impugnantes, ora recorridos, por não provada, mantendo-se, consequentemente na ordem jurídica a liquidação impugnada.
Nestes termos e no mais que for doutamente suprido por Vossas Excelências, concedendo-se provimento a este recurso, farão, agora como sempre, a costumada JUSTIÇA”

Os Recorridos apresentaram contra-alegações, sustentando que não se verifica o erro de julgamento da matéria de facto, e ainda que “produziram prova bastante, nomeadamente, prova testemunhal, que conjugada com a prova documental junta aos autos permitiu ao Tribunal «a quo» dar como provado que “Os Impugnantes despenderam a quantia de €99.759,97 na construção do edifício referido no ponto 2”, pelo que os factos provados e as conclusões que resultam dos factos provados foram corretamente julgados”

O Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso por considerar que “a sentença, ao dar como provado o teor do ponto 25 do probatório, fez uma errada apreciação da matéria de facto produzida no processo e, consequentemente, uma errada aplicação do disposto no artigo 46.º, n.º 3 do CIRS.”

Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos, cfr. artigo 657.º n.º 4 do Código de Processo Civil, submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso.
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Objecto do recurso

O objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, como resulta do disposto no artigo 608.º n.º 2, artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º n.º 1, todos do Código de Processo Civil.
Assim, considerando o teor das conclusões apresentadas, importa apreciar e decidir i) do erro de julgamento de facto ii) do erro de julgamento quanto à matéria de direito por errada subsunção dos factos ao direito, nomeadamente por errada interpretação e aplicação do artigo 46.º n.º 3 do CIRS.

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2 - Fundamentação
2.1. Matéria de Facto
O Tribunal a quo decidiu a matéria de facto da seguinte forma, que aqui se reproduz:
“II - A) Com relevância para a decisão da causa, mostram-se PROVADOS os seguintes factos:
1. Através de escritura pública celebrada em 06.05.1992, a Impugnante mulher adquiriu, pelo valor de 1.700.000$00 (correspondente a €8.479,56), um lote de terreno destinado a construção (lote nº 2) situado no lugar do ... ou ..., freguesia ..., concelho ..., inscrito na matriz urbana sob o artigo ...72, com o valor patrimonial de 1.428.000$00 e descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...99/... – cfr. doc. fls. 10 a 12 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos
2. No terreno identificado no ponto anterior foi erigido pelos Impugnantes um edifício composto por cave e dois pavimentos para habitação com logradouro – factualidade não controvertida (cfr. ponto 4.2 da proposta de decisão elaborada em 13.04.2010 no procedimento de reclamação graciosa).
3. Em 08.10.1992, após a conclusão das obras e na sequência da entrega de “Declaração para inscrição ou alteração de inscrição de prédios urbanos na matriz” pela Impugnante mulher, o prédio foi inscrito na matriz urbana da freguesia ... sob o artigo ...21, com o valor patrimonial de 18.674,99 euros – cfr. certidão de fls. 70 do suporte físico dos autos e fls. 47 e 48 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos.
4. Por escritura pública outorgada em 18.08.2005, os Impugnantes venderam a «FF» o prédio urbano composto de casa com cave e dois pavimentos para habitação, implantado no lote nº 2 situado no lugar de ..., freguesia ..., do concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...99/... e inscrito na respectiva matriz predial sob o artigo ...21, com o valor patrimonial de 23.903,98 euros – cfr. fls. 13 e 14 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos.
5. Em 01.11.2005, o referido prédio urbano foi avaliado em €120.700,00 (1.ª transmissão na vigência do IMI) – cfr. fls. 72 (frente e verso) do suporte físico dos autos e fls. 18 e 49/50 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos.
6. O referido valor patrimonial tributário de €120.700,00 foi considerado para efeitos de liquidação de IMT na compra e venda referida no ponto 4 – cfr. certidão de fls. 73 do suporte físico dos autos.
7. No dia 28.04.2006, os Impugnantes apresentaram a declaração de rendimentos relativa ao ano de 2005, dela fazendo constar, no anexo G, a alienação do prédio urbano identificado no ponto anterior, pelo valor de €120.700,00, mencionando como valor de aquisição €18.674,99 e como despesas e encargos o valor de €109.735,54 – cfr. fls. 51/52 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos.
8. Com base nessa declaração, a Administração Fiscal procedeu à liquidação do IRS do ano de 2005, apurando de imposto a pagar o montante de €810,97 – cfr. fls. 55 e 56 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos.
9. Através do ofício nº 300.2742, datado de 07.09.2009, remetido via postal registada, a Direcção de Finanças ... notificou o Impugnante marido para apresentar os documentos comprovativos dos elementos constantes do anexo G da declaração de rendimentos respeitante ao ano de 2005, nomeadamente “valor de aquisição, valor de realização e despesas e encargos” – cfr. fls. 76 a 79 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos.
10. A carta referida no ponto anterior foi devolvida ao remetente pelos CTT – cfr. fls. 80 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos.
11. Através do ofício nº 16.09.2009, remetido via postal registada com aviso de recepção foi o Impugnante marido notificado do projecto de decisão, com o seguinte teor: "Tendo sido notificado(s) por este serviço, nos termos do n° 1 do art° 128° do Código do Imposto sobre Rendimentos das Pessoas Singulares, para fazer prova dos elementos declarados nas declarações acima mencionadas no anexo G (despesas e encargos), o mesmo nada veio apresentar. Assim sendo estão reunidos os pressupostos legais do n° 4 do art° 65° do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares para, com base nos factos atrás apontados, alterar a(s) declaração(ões) de rendimentos do(s) ano(s) acima indicado(s), expurgando o valor de 109.735,54 € referentes às despesas e encargos. Notifique-se para o exercício do direito de audição. ..., 16 de Setembro de 2009". – cfr. fls. 72 e 73 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos [conjugados com a informação de fls. 102 a 107].
12. A carta referida no ponto anterior foi devolvida ao remetente pelos CTT – cfr. fls. 74 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos.
13. Por carta registada com aviso de recepção de 23.09.2009, foi o Impugnante marido notificado da decisão de converter em definitivo o projecto de decisão transcrito no ponto 11. – cfr. fls. 69 e 70 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos.
14. A carta referida no ponto anterior foi devolvida ao remetente pelos CTT - cfr. fls. 71 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos.
15. No dia 14.10.2009, com base nos elementos constantes da decisão referida no ponto 13., foi emitida a liquidação adicional de IRS impugnada (incluindo juros compensatórios), com o nº ...30, no valor de €27.942,86, apurando-se, após compensação do montante pago pelos Impugnantes na liquidação anterior, o valor a pagar de €27.131,89 – cfr. doc. fls. 67 e 68 do suporte físico dos autos e fls. 9 e 57/61 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos.
16. Em 27.01.2010, os Impugnantes apresentaram reclamação graciosa, sustentando, em síntese, que o valor de aquisição deveria ser acrescido dos custos de construção no total de €109.735,54 – cfr. fls. 3 a 7 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos.
17. Com o requerimento referido no ponto anterior, os Impugnantes juntaram 3 cheques no valor total de 20.000.000$00 (€99.759,58), emitidos em 27.01.1992, 02.03.1992 e 03.08.1992 à ordem de «CC» – cfr. fls. 16 e 17 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos.
18. Em 13.04.2010, foi elaborada a seguinte proposta de decisão no âmbito do procedimento de reclamação graciosa:
“OBJECTO DA RECLAMAÇÃO:
1.1. Vem os contribuintes, «AA», NIF ...69 e mulher «BB», NIF ...65, reclamar da liquidação adicional de IRS n°...30, relativa ao ano de 2005, com imposto a pagar no montante de € 24.683,17 e juros compensatórios no valor de € 3.259,69, perfazendo o total de € 27.942,86, cuja data limite de pagamento ocorreu a 25-11-2009.
FUNDAMENTO DA RECLAMAÇÃO
2.1. Os sujeitos passivos não concordam com o valor de aquisição que a Administração Fiscal considerou para efeitos de apuramento das mais-valias.
2.2. Argumentam que o valor de aquisição, no caso em apreço, corresponde ao valor do terreno acrescido dos custos de construção, sendo que estes custos ascendem a €109.735,54.
CONDIÇÕES DE ADMISSIBILIDADE:
3.1. Nos termos do artigo 140° do CIRS, é possível afirmar que o processo é meio próprio. a reclamação é tempestiva (cfr. artigos 70°, n.° 1 e 102°, n.° 1, alinea a), do CPPT) e os reclamantes têm legitimidade para o acto (cfr. artigo 9º do CPPT).
FACTOS RELEVANTES PARA A BOA DECISÃO DA CAUSA
4.1. Por escritura pública outorgada no dia 06-05-1993, a reclamante, esposa, solteira à data dos factos, comprou, pelo preço de 1.700.000$00 (€ 8.479,56), um lote de terreno para construção inscrito na matriz urbana da freguesia ... sob o artigo ...72º. com o valor patrimonial de € 7.122,83. (fls. 10 a 12)
4.2. Neste terreno, os reclamantes edificaram um imóvel, com a seguinte descrição: *Casa com cave, r/c e andar, com 7 divisões, sendo 1 na cave, 2 no r/c e 4 no andar, com logradouro, destinada a habitação."
4.3. Este prédio foi concluído em 30-09-1992, tendo sido inscrito na matriz urbana da freguesia ... sob o artigo 3021°, com o valor patrimonial de € 18.674,99. (fls. 46 a 48)
4.4. Em 18-08-2005, por escritura pública outorgada no Cartório Notarial .... venderam o referido prédio pelo preço de € 100.000,00. (fls. 13 a 15)
4.5. Em 28-04-2006, o reclamante e esposa apresentaram a declaração de rendimentos, modelo 3 do IRS, relativa ao ano de 2005 acompanhada dos anexos F e G (alienação quadro 4 este último onerosa de direitos reais sobre bens imóveis), tendo preenchido nos seguintes termos: (51 e 52)
CampoValor de realizaçãoValor de aquisiçãoDespesas e encargos
401€120.700,00€18.674,99€109.735,54
4.6. Esta declaração deu origem à liquidação nº ...68 com imposto a pagar no montante de € 810,97. (fls. 55 e 56)
4.7. Através do oficio n° 300.2742 de 07-09-2009, sob registo postal, da Direcção de Finanças ..., foi o reclamante notificado, nos termos do artigo 128° do CIRS, para apresentar os documentos comprovativos dos valores mencionados no anexo G da declaração de rendimentos a que alude o ponto 4.5, tendo o mesmo sido devolvido pelos CTT. (fls. 78 a 80)
4.8. Em 16-09-2009, foi elaborado um "Projecto de Decisão pelo Exmo. Sr. Director de Finanças Adjunto ..., que a seguir de transcreve: (fls. 75)
"Tendo sido notificado(s) por este serviço, nos termos do n° 1 do art° 128° do Código do Imposto sobre Rendimentos das Pessoas Singulares, para fazer prova dos elementos declarados nas declarações acima mencionadas no anexo G (despesas e encargos), o mesmo nada veio apresentar.
Assim sendo estão reunidos os pressupostos legais do n° 4 do art° 65° do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares para, com base nos factos atrás apontados, alterar a(s) declaração(ões) de rendimentos do(s) ano(s) acima indicado(s), expurgando o valor de 109.735,54 € referentes às despesas e encargos.
Notifique-se para o exercício do direito de audição.
..., 16 de Setembro de 2009"
4.9. No mesmo dia foi o reclamante notificado por carta registada com aviso de recepção, para, no prazo de 10 dias exercer o direito de audição sobre aquele projecto de decisão, tendo a mesma sido devolvida pelos CTT. (fls. 72 a 74)
4.10.Em 23-09-2009, foi notificado por carta registada com aviso de recepção de que o projecto de decisão referido no ponto anterior foi convertido em definitivo. (fls. 69 a 71)
4.11.Esta notificação foi devolvida pelos CTT.
4.12.Foi então enviada nova notificação nos termos do n° 5 do artigo 39° do CPPT, sendo esta também devolvida pelos CTT. (fls. 66 a 68)
4.13.Com base na decisão a que alude o n° 4.10, foi em 14-10-2009 efectuada a liquidação adicional ora reclamada da qual resultou valor a pagar de € 27.942,86, ao qual foi descontado o montante de € 810,97, que os reclamante pagaram em liquidação anterior, restando, após movimentos de compensação, o valor a pagar de € 27.131,89. (Documentos de fls. 55 a 61)
4.14.Para cobrança deste valor foi instaurado o processo executivo ..........3395. (fls. 62) 4.15.Em 29-01-2010, o reclamante apresentou a presente reclamação
4.16.O sujeito passivo pretende que no apuramento das mais-valias a Administração Fiscal considere como valor de aquisição, o valor do terreno acrescido dos custos de construção que totalizaram € 109.735,54 e não o Valor Patrimonial Tributável (€18.674,99).
4.17.Para comprovação do alegado o juntou aos autos fotocópias de 3 cheques no valor total de € 99.759,58 (20.000.000$00), emitidos à ordem de «CC», a saber: (fls. 16 e 17)
Data emissãoN° chequeBancoValor
27-01-1992...80Banco 1...10.000.000$00 (€ 49.879,79)
02-03-1992...53Banco 1...8.000.000$00 (€ 39.903,83)
03-08-1992...89Banco 1...2.000.000$00 (€ 9.975,96)

4.18.Notificado para apresentar os documentos comprovativos daqueles encargos, o mesmo nada veio juntar aos autos.
PROPOSTA DE DECISÃO:
5.1. Prevê o nº 3 do artigo 46° do CIRS sob a epigrafe "Valor de aquisição a titulo oneroso de bens imóveis que: O valor de aquisição de imóveis construídos pelos próprios sujeitos passivos corresponde ao valor patrimonial inscrito na matriz ou ao valor do terreno, acrescido dos custos de construção devidamente comprovados, se superior aquele". (sublinhado nosso)
5.2. Nos termos do nº 1, 2 e 4, para efeitos do número anterior o valor do terreno é o que tiver servido para efeitos de liquidação da SISA ou não havendo liquidação da SISA o valor que lhe serviria de base, caso fosse devida.
5.3. Sucede que o sujeito não apresentou os documentos comprovativos dos custos de construção
5.4. Assim sendo, os cheques referidos no ponto 4.17, não comprovam qualquer encargo com o prédio em causa, pois não têm suporte legal, por não se encontrarem documentados com qualquer factura / recibo, não sendo, por isso, de considerar aquela quantia como custo de construção.
5.5. Requer o reclamante na sua petição a notificação do Sr. «CC», para confirmar ter o dinheiro al mencionado (cheques) servido para pagamento da empreitada de construção do referido edifício.
5.6. Da consulta ao sistema informático, constata-se que existe um sujeito passivo com este nome, com o NIF ...86..., actualmente com domicilio fiscal no Lugar ..., freguesia ... e concelho ..., tendo iniciado a actividade de "Desenhador" em 26-04-1993.
5.7. Em 12-03-1999, o Sr. «CC» apresentou uma declaração de alterações no Serviço de Finanças ..., passando a estar colectado pela actividade principal de "Construção Civil e Engenharia Civil" desde 15-03-1999, e pela actividade secundária de "Desenhador" que já vinha exercendo como actividade principal. (fls. 91 a 101) 5.8. Na verdade, resulta dos autos que o prédio inscrito na matriz urbana da freguesia ... sob o artigo 3021° foi concluído em 30-09-1992, ou seja, antes do início de qualquer actividade empresarial ou profissional por parte do Sr. «CC».
5.9. Por outro lado, os cheques foram emitidos antes da data da conclusão das obras, respectivamente em 27-01-1992, 02-03-1992 e 03-08-1992. 5.10.Daqui se conclui que as diligências que eventualmente poderiam ser efectuadas junto do Sr. «CC», no sentido de se confirmar se os referidos cheques serviram para pagamento da construção do dito prédio estãoprejudicadas, uma vez que aquele apenas iniciou a actividade após a conclusão das obras.
5.11.0 reclamante designou ainda uma testemunha para ser inquirida no âmbito deste procedimento.
5.12. De acordo com o artigo 69° alínea e) do CPPT, em sede de reclamação graciosa, não se aceita que a prova se faça por todos os meios legais admissíveis, mas impõe a prova documental.
5.13.Por outro lado, prevê o artigo 74° da Lei Geral Tributária (LGT), que a prova é feita por quem dela aproveita.
5.14.Neste sentido, competia ao sujeito passivo apresentar os documentos comprovativos dos custos de construção. As despesas devem ser documentadas através de factura/recibo.
5.15.Subsidiariamente o reclamante requer que seja considerado como valor de aquisição o Valor Patrimonial Tributário (€ 120.700,00), resultante da 1 avaliação efectuado nos termos do CIMI, na sequência da venda do referido prédio.
5.16.Parece-me que o reclamante está a fazer alguma confusão entre valor de aquisição e valor de realização. Face ao disposto no n° 2 do artigo 46° do CIRS, aquele VPT, neste caso, corresponde ao valor de realização, aliás foi este o montante que o reclamante mencionou no anexo G da declaração de rendimentos (ver ponto 4.5).
5.17 Assim, por tudo o que foi dito propõe-se o indeferimento do pedido.”
Cfr. fls. 102 a 107 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos.
19. Através do ofício nº 700 06115, a mandatária do Impugnante marido foi notificada do projecto de decisão de indeferimento da reclamação graciosa – cfr. fls. 109 a 113 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos.
20. A reclamação graciosa foi indeferida por despacho proferido pelo Director de Finanças ... em 19.07.2010, com o seguinte teor:
“«AA», contribuinte n. ...67, representado por «GG», advogada com domicílio profissional na Av. ..., 4711-9 ..., reclama da liquidação de IRS n.° ...30, do ano de 2005.
Em causa está a mais valia apurada pela venda de um imóvel - artigo ...21 da freguesia ..., concelho .... O reclamante pretende que o valor de aquisição seja alterado, de € 18.674,99 (valor patrimonial à data de aquisição) para € 118.215,10 (valor de aquisição do terreno acrescido dos custos de construção de moradia). Em alternativa, requer que o valor de aquisição corresponda ao valor patrimonial tributário (€ 102.700,00).
O processo foi analisado pelo Serviço de Finanças ..., tendo merecido uma proposta de decisão (fls. 102-107), que aqui se dá por reproduzida e com a qual se concorda inteiramente, e que resumidamente diz o seguinte:
O prédio alienado foi concluído em 1992, tendo sido inscrito na matriz com o valor patrimonial de € 18.674,99 (valor superior ao da aquisição do terreno). Este valor é o que serve para cálculo da mais valia, como valor de aquisição, a menos que o contribuinte prove que o preço de terreno, acrescido dos custos de construção, foi de valor superior (art.° 46.°, n.° 3, do CIRS);
- Como prova do custo, o reclamante indica um empreiteiro («CC»), que terá recebido dois cheques, no valor de € 99.759,97. No entanto, para além de que o cheque não é meio de prova concludente, uma vez que poderá respeitar a gastos que nada têm a ver com a obra (deviam ser acompanhados das respectivas facturas ou recibos), ou que, mesmo que tenham, podem não ser aceites (é o caso de artigos de decoração, por exemplo), verificou-se que o empreiteiro em causa apenas declarou início de actividade de construção civil em 1999 ou seja, depois de concluída a obra. Assim, tais documentos não podem ser aceites, não existindo, portanto, prova do facto constitutivo do direito (art. 74.° n.° 1, da LGT). -Por conseguinte, está correcto o valor de aquisição declarado
Assim, projectou-se o indeferimento do pedido.
Em cumprimento do disposto no art.° 60° n.° 1 alinea b) da Lei Geral Tributária - exercício do direito de participação (audição) do contribuinte no procedimento tributário - foi o reclamante notificado, através do oficio n.° ...15, de 2010.06.11 (fls. 113), para se pronunciar sobre o teor do projecto de decisão da reclamação.
O reclamante não se pronunciou.
Pelo acima exposto, indefiro o pedido”.
21. Em 31.08.2010, os Impugnantes interpuseram recurso hierárquico – cfr. fls. 2 e ss. do processo de recurso hierárquico apenso aos autos.
22. Por despacho de 25.11.2010 da Directora de Serviços de IRS, por subdelegação, foi negado provimento ao recurso hierárquico com base nos fundamentos expressos na informação nº ...10, cujo teor se transcreve:
“[…] DOS FACTOS:
1. Em 28 04.2006 o recorrente entregou a declaração Mod 3 de IRS n° ...45/04 referente ao ano de 2005 com os anexos F e G, tendo indicado neste os valores inerentes à transmissão do imóvel U-..21 da freguesia ...12: valor de aquisição €18674,99 em 1994.12, valor de realização €120700,00 em 2005.08 e despesas no montante de €109735,54;
2. Notificado pela DTC da DF de ... para apresentar os documentos comprovativos dos valores indicados no anexo G, o oficio veio devolvido pelos CTT pelo que foi elaborado projecto de decisão alterando os valores declarados, expurgando o valor correspondente às despesas e encargos. Não tendo exercido o direito de audição pelo mesmo motivo, o referido projecto foi convertido em definitivo e preenchido o documento de correcção D...7/69 que deu origem à nota de cobrança nº ...98 (compensação) com RS a pagar no montante de € 27 131,89, neste momento em execução fiscal (proc nº ...95);
3. Foi deduzida reclamação graciosa invocando excesso de quantificação da matéria colectável porquanto o imóvel for alienado por € 100 000,00, havia sido construído sobre um lote de terreno adquirido por € 8479.56 e as despesas de construção tinham ascendido a € 109 735,54. Por lapso os reclamantes consideraram como rendimentos da categoria G a diferença entre o valor de realização (€ 120 700,00) e o valor de aquisição (€ 186 74,99), quando de facto deveriam ter considerado a diferença entre o valor de venda e o valor do terreno acrescido dos custos de construção (n° 3 do art" 46" do CIRS).
4. Junta fotocópias das escrituras de compra e de venda mas não exibe os documentos comprovativos das despesas por já não estarem disponíveis dado já ter passado o prazo legal de conservação dos documentos contabilísticos. Faculta apenas fotocopias de 3 cheques totalizando € 99 759,97, emitidos à ordem de «CC» que alegadamente serviram para pagamento de parte dessas despesas, e protesta juntar documentos adicionais que provam ter sido eles a construir o imóvel, requerendo ainda a notificação da sociedade construtora e a inquirição de testemunhas,
5. Sem prescindir e caso não seja aceite a argumentação supra referida, solicita que seja considerado como base para o cálculo das mais valias a diferença entre o valor de realização e o valor patrimonial tributário inscrito na matriz que, de acordo com a avaliação, será €102 700,00;
6. A reclamação foi apreciada pelo SF de ... e pela DJT da DF de ..., tendo-se concluído que os valores de aquisição e de realização declarados estão correctos e que os cheques exibidos não podem ser aceites como prova da realização das despesas pelo que foi indeferido o pedido:
7. Não se conformando com a decisão, vem dela interpor recurso hierárquico, basicamente reiterando os argumentos já invocados em sede de reclamação graciosa. Apenas adianta que a decisão enferma dos vícios de violação de formalidades essenciais e do principio do inquisitório, porque não foi ouvida atestemunha cuja audição foi requerida e volta a requerer à luz do art 72° da LGT, por entender ser essencial para a descoberta da verdade;
APRECIAÇÃO:
8. O presente recurso hierárquico foi interposto para o órgão competente (art° 80° da LGT), o acto é susceptível de recurso, é tempestivo (n° 2 do art. 66° do CPPT) e o recorrente tem legitimidade para o efeito (art. 65° da LGT e art. 9° do CPPT):
9. A questão a dirimir nos presentes autos e para apuramento das mais-valias a tributar passa por definir os valores de aquisição, realização e das despesas de construção do imóvel alienado:
10. O valor de realização é definido pela al f) do n° 1 do art° 44° do CIRS o valor da respectiva contraprestação conjugado com o n° 2 do mesmo artigo prevalecerão quando superiores, os valores porque os bens houverem sido considerados para efeitos de liquidação de sisa... (leia-se IMT. No caso em apreço verifica-se a condição do nº 2 do CIRS pelo que o valor de realização a considerar deve ser € 120 700.00 (valor patrimonial atribuído em resultado da primeira transmissão na vigência do CIMI) e não o valor da respectiva contraprestação:
11. O valor de aquisição é definido pelo nº 3 do art° 46° do CIRS o valor de aquisição de imóveis construídos pelos próprios sujeitos passivos, corresponde ao valor patrimonial inscrito na matriz ou ao valor do terreno, acrescido dos custos de construção devidamente comprovados, se superior aquele":
12. O imóvel em causa foi concluído em 1992 e foi inscrito na matriz com o valor patrimonial de € 18 674,99 (valor superior ao valor de aquisição do terreno).
13. Do citado preceito legal sublinha-se que os custos de construção devem ser devidamente comprovados O sujeito passivo não veio trazer ao processo, alegadamente por já não os ter, qualquer documento de prova desses custos de construção, nomeadamente facturas ou vendas a dinheiro. Apenas forneceufotocópias de três cheques alegadamente utilizados para pagamento de parte desses custos. Ora o cheque, enquanto meio de pagamento que é, apenas comprova o pagamento mas nada permite concluir acerca da origem da divida que pode ou não referir-se ao imóvel. Assim, as ditas facturas ou vendas a dinheiro haveriam de revestir capital importância para efeitos de prova dos custos de construção acompanhadas dos respectivos cheques, que só por si não podem ser aceites como de meio de prova;
14. Assim, para apurar a mais-valia a tributar em sede de IRS deve ser considerado como valor de realização o montante de € 120 700,00, como valor de aquisição o montante de 18 674 99, e não considerar qualquer montante de construção por não estarem comprovados;
15. O recorrente requer a audição de testemunhas à luz do art 72° da LGT, sendo que este é um meio de prova que o instrutor poderá utilizar para o conhecimento da verdade. Contudo, uma das regras fundamentais do procedimento de reclamação graciosa, conforme determina a al. e) do art 69° do CPPT, é a "limitação dos meios probatórios à forma documental. Ora, tendo o sujeito passivo informado que não dispunha de qualquer documento de prova, a audição de testemunhas não poderia trazer ao processo qualquer elemento relevante para a decisão, pelo que, e nada o obrigando, esteve bem o instrutor ao não ouvir as testemunhas roladas e consequentemente não violou o do princípio do inquisitório ou qualquer formalidade essencial;
Face ao exposto, verifica-se que os valores constantes do documento de correcção D...7/69 estão correctos e a liquidação não enferma de qualquer ilegalidade. Assim, porque o recorrente não veio acrescentar qualquer facto novo aos já avançados em sede de reclamação graciosa, os quais carecem de fundamento, sou de parecer que deverá ser negado provimento ao recurso, e manter-se a decisão recorrida.
Os factos analisados no âmbito do presente recurso já foram submetidos a audiência de contribuinte em sede de reclamação graciosa, pelo que de acordo as instruções divulgadas na al. c) nº 3 da Circular n° 13 de 08.07.1999 da DJT é dispensado novo direito de audição prévia.”
– Cfr. fls. 24 a 28 do processo de recurso hierárquico apenso aos autos.
23. O despacho referido no ponto anterior foi notificado à mandatária do Impugnante marido através do ofício nº ...02, remetido via postal registada com aviso de recepção, assinado em 21.12.2010 – cfr. fls. 29 e ss. do processo de recurso hierárquico apenso aos autos.
24. Em 21.03.2011, foi apresentada a petição inicial da presente impugnação judicial – cfr. fls. 1 do processo eletrónico. Mais se provou o seguinte:
25. Os Impugnantes despenderam a quantia de €99.759,97 na construção do edifício referido no ponto 2 – cfr. docs. de fls. 16 e 17 do processo de reclamação graciosa apensa aos autos.
*
II - B) FACTOS NÃO PROVADOS:
Não há factos relevantes para a decisão da causa que não se tenham provado
*
II - C) MOTIVAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO PROVADA:
A convicção do Tribunal relativamente aos factos dados como provados nos pontos 1. a 24. fundou-se na prova documental junta aos autos e no processo administrativo.
A factualidade descrita no ponto 25. foi considerada provada em resultado da conjugação dos documentos ali referidos com os depoimentos das testemunhas inquiridas nos autos.
Concretizando.
«DD», irmã da Impugnante mulher, referiu que esta levou a cabo a construção de uma moradia no terreno que adquiriu em 1992 e como se encontrava a viver na Alemanha encarregou o Sr. «CC» “para tratar de tudo”. Confrontada com os documentos de fls. 16 e 17 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos apenso confirmou que tais cheques foram emitidos pela irmã para “pagar a casa”, mais referindo que foi ela própria que entregou os cheques ao referido Sr. «CC».
«EE», cunhado da Impugnante mulher, disse ao Tribunal que os Impugnantes encarregaram o Sr. «CC» da construção da casa, o qual também foi “contratado” pela testemunha para construir uma casa num lote vizinho da mesma urbanização por ser técnico de desenho e ligado à área. Sabe que a cunhada suportou os custos de construção e que os mesmos terão rondado os 20.000 contos.
Pese embora a relação familiar entre as testemunhas e os Impugnantes, o Tribunal considerou que os depoimentos prestados merecem inteira credibilidade, atenta a espontaneidade e segurança com que relataram os factos em causa, demonstrando conhecimento directo dos mesmos e por se mostrarem coerentes entre si, bem como com a prova documental produzida nos autos (os referidos cheques), não sendo, a nosso ver relevante para afastar a credibilidade de tais testemunhos o facto de o referido Sr. «CC» apenas se ter colectado como “Desenhador” em 26.04.1993 (e pela actividade de “Construção Civil e Engenharia Civil” em 15.03.1999), uma vez que aquele podia ter prestado os serviços em causa mesmo sem estar colectado, nem, por outro lado, o facto de as datas de emissão dos referidos cheques (27.01.1992, 02.03.1992 e 03.08.1992) serem anteriores à data indicada pelos Impugnantes como sendo a da conclusão das obras (30.09.1992), pois é do conhecimento geral ser frequente a realização de pagamentos parcelares à medida que a obra vai avançando.”
***
2.2 – O direito
Constitui objecto do presente recurso a sentença proferida pela Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial intentada «AA», contribuinte n.º ...67 e «BB» contribuinte n.º ...65 contra a liquidação de IRS do ano de 2005, no valor de €27.131,89.
O Tribunal a quo decidiu julgar parcialmente procedente a impugnação judicial, anulando a liquidação impugnada, na parte em que resultou da desconsideração dos custos de construção na determinação do valor de aquisição.
A Recorrente, discordando do assim decidido, sustenta, no essencial, que a sentença padece de erro de facto e de direito, por insuficiente matéria de facto assente e errada subsunção dos factos ao direito, nomeadamente por errada interpretação e aplicação do artigo 46.º n.º 3 do CIRS.

2.2.1. Do erro de julgamento de facto

Invoca a Fazenda Pública que a sentença sob recurso fez um lacunar julgamento da prova apresentada, ao não dar como provados que «CC», iniciou a atividade de “Desenhador” em 26.04.1993, e ainda que em 12.03.1999, «CC» apresentou uma declaração de alterações no Serviço de Finanças ..., passando a estar coletado pela atividade principal de “Construção Civil e Engenharia Civil” desde 15.03.1999, e pela actividade secundária de “Desenhador”, que vinha exercendo desde 26.04.1993.
Os Recorridos, vêm, no entanto, defender que tais factos não são relevantes para a boa decisão da causa.
Vejamos.
Como decorre do disposto no artigo 607.º n.º 4 do Código de Processo Civil “Na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência”
Nesta senda, “na decisão de facto, o tribunal declara quais os factos, dos alegados pelas partes e dos instrumentais que considere relevantes, que julga provados (total ou parcialmente) e quais os que julga não provados, de acordo com a sua convicção, formada no confronto dos meios de prova sujeitos à livre apreciação do julgador; esta conviçção tem de ser fundamentada, procedendo o tribunal à análise crítica das provas e à especificação das razões que o levaram à decisão tomada sobre a verificação de cada facto (art. 607, nºs 4, 1ª parte, e 5)” – cfr. José lebre de Freitas (in “A Acção Declarativa Comum à luz do Código de Processo Civil de 2013”, 4ª edição, Gestlegal, pag. 361).
Relativamente à insuficiência de factos e como já supra referenciado, a insuficiência afecta o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso.
Retornando ao caso dos autos, a Recorrente vem defender a relevância dos factos que constam de fls. 91 a 101 da Reclamação Graciosa, apensa aos autos, pretendendo que conste da matéria de facto assente que “«CC», iniciou a atividade de “Desenhador” em 26.04.1993”, assim como que “em 12.03.1999, «CC» apresentou uma declaração de alterações no Serviço de Finanças ..., passando a estar coletado pela atividade principal de “Construção Civil e Engenharia Civil” desde 15.03.1999, e pela atividade secundária de “Desenhador”, que vinha exercendo desde 26.04.1993.
Ora, considerando que foi alegado em sede da petição inicial que os serviços de construção do imóvel em questão nos presentes autos foram prestados por «CC», consideramos serem pertinentes tais factos para a boa decisão da causa,.
Assim, ao abrigo do disposto no artigo 662.º n.º 1 do CPC, afigura-se-nos ser de alterar a decisão sobre a matéria de facto assente, proferida em 1ª instância, considerando-se relevante fazer constar da mesma os seguintes factos:

3.1 - «CC» entregou em 26.04.1993 declaração de inscrição no registo/início de actividade junto do Serviço de Finanças ..., indicando como actividade principal “desenhador” – cfr. fls. 96 a 98 do processo administrativo junto aos autos.
3.2. «CC», entregou em 15.03.1999 declaração de alterações junto do Serviço de Finanças ..., indicando como actividade principal “construção civil e engenharia civil” e em outras actividades “desenhador” – cfr. fls. 99 a 101 do processo administrativo junto aos autos.
Vem também a Fazenda Pública sustentar que o Tribunal a quo errou ao dar como provado o facto que consta do ponto 25. da matéria de facto assente, nomeadamente que “Os Impugnantes despenderam a quantia de €99.759,97 na construção do edifício referido no ponto 2 – cfr. docs. de fls. 16 e 17 do processo de reclamação graciosa apensa aos autos”, passando em vez a constar dos factos não provados que: “Os Impugnantes despenderam a quantia de € 99.759,97 na construção do edifício referido no ponto 2 – cfr. doc. de fls. 16 e 17 do processo de reclamação graciosa apensa aos autos.”
Nessa medida, sustenta que os Recorridos não lograram comprovar tal facto, pois a prova documental e testemunhal foi manifestamente insuficiente.
Os Recorridos, por sua vez, vêm defender que produziram prova bastante, nomeadamente, prova testemunhal, que conjugada com a prova documental junta aos autos permitiu ao Tribunal a quo julgar comprovado tal facto,
Vejamos.
No dizer de Anselmo de Castro (in Direito Processual Civil Declaratório, Almedina, Coimbra, vol. III, 1982, p. 268/269), “são factos não só os acontecimentos externos, como os internos ou psíquicos, e tanto os factos reais, como os simplesmente hipotéticos”, (…), acontecimentos ou factos concretos no sentido indicado podem constituir objecto da especificação e questionário (isto é, matéria de facto assente e factos controvertidos), o que importa não poderem aí figurar nos termos gerais e abstractos com que os descreve a norma legal, porque tanto envolveria já conterem a valoração jurídica própria do juízo de direito ou da aplicação deste” (in Direito Processual Civil Declaratório, Almedina, Coimbra, vol. III, 1982, p. 268/269).
Ora, parafraseando Helena Cabrita, (in “A fundamentação de facto e de direito da decisão cível”, págs. 106, 110 e 111), “Os factos conclusivos são aqueles que encerram um juízo ou conclusão, contendo, desde logo em si mesmos a decisão da própria causa ou, visto de outro modo, se tais factos forem considerados provados ou não provados, toda a acção seria resolvida (em termos de procedência ou improcedência), com base nessa única resposta”.
“Assim, em linha com esse entendimento, as afirmações de natureza conclusiva devem ser excluídas do elenco factual a considerar, se integrarem o thema decidendum, entendendo-se como tal o conjunto de questões de natureza jurídica que integram o objeto do processo a decidir, no fundo, a componente jurídica que suporta a decisão. Daí que, sempre que um ponto da matéria de facto integre uma afirmação ou valoração de factos que se insira na análise das questões jurídicas a decidir, comportando uma resposta, ou componente de resposta àquelas questões, tal ponto da matéria de facto deve ser eliminado [Ac. STJ de 28-01-2016, Proc. nº 1715/12.6TTPRT.P1.S1, António Leones Dantas, www.dgsi.pt.]. Significando isto, que quando tal não tenha sido observado pelo tribunal a quo e este se tenha pronunciado sobre afirmações conclusivas, deve tal pronúncia ter-se por não escrita. E, pela mesma ordem de razões, que deve ser desconsiderado um facto controvertido cuja enunciação se revele conclusiva, desde que o mesmo se reconduza ao thema decidendum, não podendo esquecer-se que o juiz só pode servir-se dos factos alegados pelas partes e que “Às partes cabe alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir (..)” [art.º 5.º 1 do CPC].” – cfr. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 27.09.2023, proc. 9028/21.6T8VNG.P1.
No caso presente, a referência no ponto 25. da factualidade assente pelo Tribunal a quo, de que “Os Impugnantes despenderam a quantia de €99.759,97 na construção do edifício referido no ponto 2”, resolve só por si a questão a decidir, na medida em que a questão a decidir é saber qual o montante despendido pelos Recorridos na construção de imóvel no lote de terreno destinado a construção (lote nº 2) situado no lugar do ... ou ..., freguesia ..., concelho ..., inscrito na matriz urbana sob o artigo ...72, decorrendo assim de tal facto assente a decisão da causa.
Nesta senda, tratando-se de matéria conclusiva, nunca a mesma deveria ter sido reconduzida ao probatório, determinando-se a sua expurgação da matéria de facto.
Nesta medida, procede a pretensão da Recorrente quanto à eliminação do acervo probatório do ponto 25), apesar da fundamentação para tal se mostrar distinta da invocada.
Acresce que, impõe-se fazer constar da factualidade assente os documentos que serviram de fundamento para o ponto 25. (aqui retirado) da matéria de facto assente, assim como os factos alegados, decorrentes dos depoimentos prestados, de forma a que, conjuntamente, possam ser valorados na decisão da causa.
Nestes termos, por se afigurarem ser relevantes, passam a constar da matéria de facto assente os seguintes pontos:

25. «BB» emitiu em 27.01.1992, em nome de «CC» o cheque n.º ...80 do Banco 2..., no montante de Esc.10.000.000,00 – cfr. fls. 16 do processo administrativo junto aos autos.
26. «DD» emitiu em 2.03.1992, em nome de «CC» o cheque n.º ...53 do Banco 2..., no montante de Esc.8.000.000,00 – cfr. fls. 16 do processo administrativo junto aos autos.
27. «AA» e «BB» emitiram em 3.08.1992, em nome de «CC» o cheque n.º ...89 do Banco 2..., no montante de Esc.2.000.000,00 – cfr. fls. 17 do processo administrativo junto aos autos.
28. «AA» e «BB» encarregaram «CC» da construção do imóvel – cfr. testemunho de «DD» e «EE».
Com efeito, e revisitada a prova testemunhal produzida, constata-se que tais testemunhas asseveraram que os Recorridos entregaram a construção do imóvel a «CC».
***

2.2.2.Do erro de julgamento

A Fazenda Pública vem invocar que, não obstante, recair sobre os Recorridos a prova dos custos de construção efetivamente por si suportados na construção do imóvel alienado, estes não logram comprovar tal, na medida em que considera que “não é suficiente em termos da necessária prova, a junção dos cheques em causa e a prova testemunhal produzida, porquanto são insuscetíveis, por si só, de estabelecer qualquer nexo de causalidade entre os montantes titulados nos cheques e montante dos custos de construção efetivamente suportado pelos recorridos com a construção do imóvel”.
Os Recorridos, no entanto, sustentam que através dos depoimentos das testemunhas e dos cheques juntos aos autos, lograram comprar que suportaram custos com a construção do imóvel no montante de 20.000,00 contos.
Assim, e no presente caso cabe decidir se o Tribunal a quo errou ao ter considerado suficiente a prova apresentada relativamente aos valores gastos na construção do bem alienado, que possam integrar o conceito de “valor de aquisição” do imóvel alienado.
Vejamos.
Nos termos do que dispunha à data dos factos a alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares “Constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de: a) Alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis (…)”
A par, a alínea a) do n.º 4 do mesmo preceito legal dispunha que “O ganho sujeito a IRS é constituído: a) Pela diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição, líquidos da parte qualificada como rendimento de capitais, sendo caso disso, nos casos previstos nas alíneas a), b) e c) do nº 1”
O n.º 3 do artigo 46.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares estatuía ainda que “O valor de aquisição de imóveis construídos pelos próprios sujeitos passivos corresponde ao valor patrimonial inscrito na matriz ou ao valor do terreno, acrescido dos custos de construção devidamente comprovados, se superior àquele” – negrito nosso.
Ora, não decorrendo da norma quais os documentos que servem o propósito de comprovar os custos de construção, impõe-se considerar toda a prova apresentada por forma a considerar, ou não, se o custo alegado foi devidamente comprovado.
Isto porque, quanto à prova a apresentar, é consabido que por forma a demonstrar a realidade que alega em juízo, a parte deve produzir prova, podendo fazê-lo através de prova documental, testemunhal, pericial, por inspecção ou por confissão por declaração de partes nos termos do disposto no artigo 341.º do Código Civil e artigos 410.º a 526.º, todos do Código de Processo Civil.
Isto porque, ao abrigo do disposto no artigo 115.º n.º 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário, não há limitações quanto à admissibilidade de qualquer meio de prova, prevalecendo a livre apreciação da prova, enquanto princípio orientador de valoração da mesma, com os limites inerentes àqueles factos para cuja prova a lei exige especial formalidade, só podendo ser provados por documentos ou estejam plenamente provados, de que são exemplo as situações previstas nos artigos 364.º n.º 1, 393.º e 394.º n.º 1, todos do Código Civil.
Ademais, o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos recai sobre quem os invoca à luz do disposto no artigo 342.º n.º1. do Código Civil e artigo 74.º n.º1 da Lei Geral Tributária.
Por outro lado, e como decorria à data dos factos do n.º 1 do artigo 128.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares “As pessoas sujeitas a IRS devem apresentar, no prazo que lhes for fixado, os documentos comprovativos dos rendimentos auferidos, das deduções e abatimentos e de outros factos ou situações mencionadas na respectiva declaração, quando a Direcção-Geral dos Impostos os exija.”
Assim, no caso sob apreciação recai sobre os Recorridos a comprovação dos custos de construção do imóvel em questão nos presentes autos.
No entanto, e atendendo aos preceitos legais que aqui demos conta, para além das normas não especificarem a forma como os Recorridos deveriam comprovar os custos incorridos com a construção de imóvel, também não estamos perante qualquer uma das situações previstas nos artigos 364.º n.º 1, 393.º e 394.º n.º 1, todos do Código Civil.
Como considerado por este Tribunal no Acórdão de 7.03.2024, proc. n.º 00605/09.4BEBRG “Efetivamente, em condições normais das práticas comerciais, o custo com qualquer obra será evidenciado mediante faturas, recibos ou, na falta destes, demonstrando o pagamento por meio de cheque. Todavia, se tal não for possível não se pode liminarmente rejeitar que a prova seja feita por outros meios que possam indicar com segurança que os custos foram suportados pelos sujeitos passivos.”, atendendo à possibilidade de apresentação de todos os meios de prova que aqui já demos conta com a enunciação do disposto no artigo 115.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Nesta medida, os Recorridos podiam recorrer a qualquer meio de prova.
No entanto, a Recorrente defende que deveriam os Recorridos ter apresentado para prova do alegado o contrato de empreitada, as faturas dos serviços eventualmente prestados ou dos materiais de construção adquiridos, recibos ou, segundas vias dos mesmo.
Contra-alegam os Recorridos invocando que seria desproporcional exigir a exibição dos recibos de pagamentos, ocorridos há mais de 10 anos, para prova do montante pago pela construção do imóvel, sobretudo quando o prazo para a conservação dos documentos fiscalmente relevantes já há muito que se encontrava ultrapassado.
Ora, não nos podemos esquecer que, no caso em concreto, desde a construção do imóvel (no decurso do ano de 1992) até ao momento em que se leva a efeito o juízo de valoração das provas disponíveis (2002) decorreram mais de 10 anos, não sendo expectável, nem exigível que os documentos como facturas e recibos ainda estivessem na posse dos Recorridos, isto porque, a obrigatoriedade de conservar os documentos era, à data, limitado ao prazo de 5 anos.
Com efeito, como decorria à data do artigo 128.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, sob a epígrafe “Obrigação de comprovar os elementos das declarações”, “2 - A obrigação estabelecida no número anterior mantém-se durante os cinco anos seguintes àquele a que respeitem os documentos”.
Assim, não se encontrando os Recorridos obrigados a apresentar à Autoridade Tributária e Aduaneira os documentos que directamente comprovariam o montante gasto na construção do imóvel (contrato de empreitada, faturas dos serviços prestados ou dos materiais de construção adquiridos, recibos), estes não podem ser penalizados por tal.
Acresce que, face à prova documental e testemunhal apresentada resultou comprovado, pontos 25. a 27. da matéria de facto aditada por este Tribunal, que foram emitidos 3 cheques pelos Recorridos em nome de «CC», perfazendo o total de Esc. 20.000.000,00 (€99.759,57).
Ora, a Recorrente vem invocar que à data da emissão dos cheques «CC» ainda não tinha iniciado a sua actividade, não se podendo relacionar os cheques e os custos com a construção do imóvel.
Com efeito, e como resulta da matéria de facto assente, pontos 3.1. e 3.2, «CC» iniciou a sua actividade de desenhador em 1993 e iniciou a actividade de construção civil e engenharia civil em 1999, sendo que, o imóvel em questão foi construído no ano de 1992, cfr. pontos 2. e 3., 3.1 e 3.2 da matéria de facto assente.
No entanto, consideramos que a data de inscrição de actividade de quem construiu o imóvel não pode ser factor determinante na comprovação do montante despendido na construção do imóvel.
Isto porque, se por um lado, é consabido, que existem muitos profissionais que exercem actividade sem que para isso se encontrem registados para efeitos fiscais na Autoridade Tributária e Aduaneira, por outro lado, tal, só poderia influenciar uma eventual tributação em sede do profissional em questão.
Isto porque, a Recorrente não questiona a construção do imóvel, resultando inclusivamente dos factos comprovados, pontos 2. e 3., que foi erigido pelos Recorridos um edifício composto por cave e dois pavimentos para habitação com logradouro, inscrito na matriz predial urbana da freguesia ... sob o artigo ...21, vindo questionando tão só o valor da sua construção.
Acresce que, como decorre da matéria de facto assente, ponto 28, os Recorridos encarregaram «CC» da construção do imóvel.
Neste medida, consideramos estabelecido o nexo causal entre os montantes pagos a «CC» e a construção do sobredito imóvel.
Como tal, atendendo ao conjunto dos factos comprovados, impõe-se concluir que estes são suficientes no sentido de comprovar de forma plausível, para além de qualquer dúvida razoável, face às circunstâncias do caso concreto, que o montante gasto pelos Recorridos na construção do imóvel, foi de, Esc.20.000.000,00 (€99.759,97).
Nestes termos, concluímos pela improcedência do recurso, mantendo-se a decisão recorrida.
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Nos termos do disposto no artigo 663.º nº 7 do Código de Processo Civil, elabora-se o seguinte SUMÁRIO:

I. Em condições normais, face às regulares práticas comerciais, o custo com a construção de imóvel deverá ser demonstrado por meio de faturas e ou recibos.
II. No entanto, tendo decorrido o período no qual estão obrigados, à luz do estatuído à data artigo 128.º n.º 2 do CIRS, a apresentar tais documentos (5 anos), não pode a AT exigir a apresentação desses documentos.
III. Não se verificando estarmos perante uma qualquer das situações elencadas nos artigos 364.º n.º 1, 393.º e 394.º n.º 1, todos do Código Civil, quem tem o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos que invoca pode recorrer a todos os meios de prova disponíveis ao abrigo do disposto no artigo 115.º do CPPT.

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3 – Decisão

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal em negar provimento ao recurso, e, em consequência, manter a sentença recorrida.


Custas pela Recorrente.
Porto, 28 de Novembro de 2024



Virgínia Andrade
José Coelho
Isabel Ramalho