Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01448/18.0BEAVR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:01/30/2025
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:VIRGÍNIA ANDRADE
Descritores:FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO SUBSTANCIAL;
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO FORMAL;
INDÍCIOS APLICAÇÃO MÉTODOS INDIRECTOS;
Sumário:
I. Saber se a AT deu a conhecer os motivos que a motivaram a actuar como actuou, as razões em que fundou a sua actuação, questão que se situa no âmbito da validade formal do acto, respeita à fundamentação formal,

II. Situação distinta e situada já no âmbito da validade substancial do acto, é saber se esses motivos correspondem à realidade e se, correspondendo, são suficientes para legitimar a concreta actuação administrativa, atinente à fundamentação substancial, vulgarmente designado por vicio de violação por erro nos pressupostos.

III. Para desconsideração dos elementos declarados, impõe-se à Autoridade Tributária e Aduaneira carrear elementos objetivos e seguros que demonstrem com um elevado grau de certeza a existência e quantificação dos factos tributários não declarados na medida em que contrariam a presunção de verdade e boa-fé da declaração do contribuinte.

IV. Questionado o erro de julgamento quanto ao excesso da matéria colectável, por via da aplicação a métodos indirectos, a Recorrente teria de, mediante a apresentação de provas adequadas e fortemente convincentes, conseguir demonstrar que o funcionamento do poder discricionário da AT conduziu e traduziu-se na fixação de resultados, no apuramento de valores, objectiva e inquestionavelmente fora dos limites da razoabilidade.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1 – RELATÓRIO
[SCom01...] LDA, contribuinte n.º ...72, vem interpor recurso jurisdicional da sentença proferida em 4.09.2024 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida na sequência do indeferimento do recurso hierárquico apresentado, contra as liquidações de IRC respeitantes aos exercícios de 2013 e 2014, no valor total de €65.409,98.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:
“1. Deve alterar-se dos factos não provados em V. “O número de funcionários que a impugnante tinha ao seu serviço em 2013 e 2014”, para facto provado com a seguinte redação: “No ano de 2013, em média, houve 4 pessoas a auferir rendimentos pagos pelo SP e no ano de 2014, em média 11 pessoas”, conforme Art.º 115.º, n.º 1.º, do CPPT.
2. Não está fundamentada a aplicação dos métodos indiretos, nem a respetiva nova quantificação, Art.º 77.º, da LGT.
3. Quanto à nova quantificação, nomeadamente o estimador, assente na mediana, não cumpre as regras para ser um bom estimador, conforme ensinam nas universidades e todo o conhecimento científico, nem a aplicação do rácio de 2013, pode ser aplicado em 2014, nem pode ser igual a uma exploração seguida, como foi a de 2013 e interpolada em 2014, nem a aplicação do rácio foi ponderada expressamente entre a similitude ou não das características do único restaurante que se encontra na mediana e as características da recorrente, nomeadamente nas sobras (desperdícios), aparecendo por artes mágicas, um indicador no RIT, para 2013 e seguido de outros dois diferentes, um para 2013 e 2014, pela PAT, no debate contraditório do Art.º 92.º, da LGT, o CAE do indicador não é específico da recorrente, mas um adaptado e sem ponderação sobre a adaptação, pelo que não está fundamentada a estimativa assente na mediana, Art.º 77.º, da LGT.
4. O RIT não demonstra a impossibilidade de a quantificação seguir o método direto e por montante exato, Art.º 87.º e 89.º, da Lei Geral Tributária.
5. A recorrente tem um modelo de negócio que assenta em ter de “recuperar” os restaurantes com compras de matérias de primas e depois cede a sua exploração.
6. A aplicação da margem bruta das vendas, com base na mediana distrital dos restaurantes com CAE 56103 é errada ou viciada.
7. A recorrente não tem culpas do CAE não ser específico.
8. A adaptação do estimador tinha de ser ponderada às diferenças entre o CAE genérico e a situação específica.
9. Tal adaptação não ocorreu.
10. Na população do estimador estão os sujeitos passivos, em velocidade cruzeiro e com desperdícios normais.
11. A impugnante não estava em velocidade cruzeiro, nos dois restaurantes com compras, o Restaurante 1 ... e o Restaurante 2 ... e tinha mais sobras que os normais.
12. Pelo que tais factos conduzem à solução de que a aplicação do estimador obtido com menos sobras, ao contrário do decidido prejudica a recorrente e existindo manifesto excesso de capacidade contributiva na liquidação recorrida, conduz à sua anulação, Art.º 90.º e 100.º, n.º 3, da LGT.
13. Pelo que em consequência a sentença tem de ser alterada.
Nestes termos;
Deve a douta decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que aprecie os vícios e erros alegados, com efeitos na anulação da liquidação recorrida e com todas as consequências legais, para que assim se faça JUSTIÇA.”

Não foram proferidas contra-alegações.
O Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal proferiu parecer, sustentando que o recurso deve ser considerado totalmente improcedente, por não provado, pelo que deve a sentença recorrida ser corroborada e consequentemente mantida na Ordem Jurídica.
Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos (cfr. artigo 657.º n.º 4 do Código de Processo Civil, submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso.
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Objecto do recurso

O objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, como resulta do artigo 608.º n.º 2, artigo 635.º, n.º 4 e 639.º n.º 1, todos do Código de Processo Civil.
Assim, considerando o teor das conclusões apresentadas, importa apreciar e decidir i) do erro de julgamento de facto ii) do erro de julgamento de direito assente na falta de fundamentação dos métodos indirectos e da sua quantificação iii) do erro de julgamento na quantificação da matéria colectável.
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2 - Fundamentação
2.1. Matéria de Facto
O Tribunal a quo decidiu a matéria de facto da seguinte forma, que aqui se reproduz:
“A matéria de facto adiante fixada foi selecionada em função dos factos considerados como efetivamente pertinentes para o julgamento da causa que irá ser efetuado, nomeadamente, em função dos contornos que as partes conferiram ao litígio e de harmonia com o princípio do dispositivo. Destarte, com relevância para a decisão a proferir consideram-se provados os seguintes factos:
A. A Impugnante dedica-se à atividade de restauração. [facto incontrovertido].
B. A Impugnante é um sujeito passivo de IRC e IVA no regime normal. [facto incontrovertido].
C. Entre setembro de 2012 e março de 2014 a Impugnante explorou o restaurante “Restaurante 1 ...” localizado na Rua ..., em .... [facto incontrovertido e que resulta do teor do RIT a que adiante se fará referência (pág. 4)].
D. Entre setembro de 2014 e 14 de abril de 2015 a Impugnante explorou o restaurante “Restaurante 2 ...” localizado na Makro de .... [facto incontrovertido e que resulta do teor do RIT a que adiante se fará referência (pág. 5)].
E. A Impugnante foi alvo de ação inspetiva externa efetuada a coberto das ordens de serviço OI20.....11 e OI20.....12, de âmbito geral e com referência aos exercícios de 2013 e 2014 [cfr. relatório inspetivo constante da peça do SITAF n.º 0004714687]. F. Na ação inspetiva anteriormente referida foram propostas correções e com a seguinte motivação:
“(…)
II.3.5. Caracterização da atividade exercida
O SP dedica-se à exploração de restaurantes, tendo até agora tido como prática a abertura de espaços, dinamização dos mesmos e posterior cessão de exploração a título oneroso a entidades terceiras (cessionários).
• No ano de 2011 a janeiro de 2012, o SP explorou o restaurante Restaurante 3 ... localizado em Rua ... — ..., ..., tendo firmado contrato de cessão de exploração do mesmo em 2012-01-25, para início em 2012-02-01, com o cessionário [SCom02...], Lda, NIF .... Neste contrato foi acordado o pagamento de €210.000,00 em 60 prestações mensais de €3.500,00 e cumulativamente o pagamento da renda mensal de €2.500,00 (na altura, agora €2.400,00), que o SP paga a [SCom03...], S.A., NIF ...47 (senhorio). Este contrato inicial foi já objeto de 3 alterações, nas quais o valor da cessão de exploração foi sendo reduzido e as prestações em falta "perdoadas". O cessionário durante este período apenas efetuou o pagamento do valor correspondente à renda que o SP paga ao senhorio. Na última alteração, de 2015-03-09, a cessão de exploração passou a ser no valor de €160.000,00 pagável no final do contrato e com cedência definitiva à cessionária, continuando esta, até àquele momento, a pagar o valor respeitante à renda;
• De setembro de 2012 a março de 2014, o SP explorou o restaurante Restaurante 1 ... localizado em Rua ... — ..., tendo firmado contrato de cessão de exploração do mesmo em 2014-03-20, para início em 2014-04-01, com o cessionário [SCom04...] Lda, NIF .... Neste contrato foi acordado o pagamento de 6288.000,00 em 72 prestações mensais de €4.000,00 com opção de compra (trespasse) no final do contrato por mais €22.000,00. Em 2014-04-09 foi feita uma alteração ao contrato, passando o valor da cessão de exploração para €264.000,00 pagos em 66 prestações mensais de €4.000,00, vencendo-se a 1a apenas em 2014-10-01. Desta forma os pagamentos que deveriam ter ocorrido entre 2014-04-01 e 2014-10-01 foram "perdoados". O SP pagaria renda no valor de €1.000,00 mensais a «AA», NIF ...51 (senhorio), contudo, em 2013, não existe qualquer registo contabilístico de pagamentos a este senhorio e em 2014 existe apenas um movimento em janeiro, de €1.200,00, a creditar a conta 278803. Consultando a base de dados da AT, nomeadamente as modelos 10, podemos verificar que em 2015 também não foram pagas quaisquer quantias referentes a este contrato de arrendamento ao senhorio já identificado;
• De setembro de 2014 a 14 de abril de 2015, o SP explorou o restaurante Restaurante 2 ... localizado na loja Makro de ... em Rua ... — [SCom05...], ..., tendo firmado contrato de cessão de exploração em 2015-04-13, para início em 2015-04-15, com o cessionário [SCom01...] Lda, NIF .... Neste contrato foi acordado o pagamento de €318.500,00 em 49 prestações mensais de €6.500,00, tendo as últimas 12 prestações, no valor de €71.500,00 sido pagas antecipadamente com a assinatura do contrato. O SP paga renda a [SCom06...], SA, NIF ...12 (senhorio), mas obteve desta um grande período de carência. As despesas de água e luz são debitadas ao SP e por este debitadas ao cessionário.
Já no ano de 2015, o SP explorou o restaurante Restaurante 4 ... em Rua ... — ..., tendo em 2015-11-12 feito cessão a terceiros. Desde 2016-02-03 e até à presente data, explora o restaurante Restaurante 5 ... em Rua ... — ....
Segundo o gerente do SP o modelo de negócio é sempre o mesmo em todos os restaurantes que explorou. Os restaurantes servem essencialmente em duas modalidades, comida ao peso e buffet. A maioria do volume de negócios é realizado com comida ao peso, em que o cliente se serve em regime "self service" e o prato é pesado no final aplicando-se um valor por Kg, sendo aplicável ao prato principal, entradas e sobremesas, a que soma o valor das bebidas. O regime de Buffet consiste no pagamento de um valor fixo por contrapartida do consumo "à descrição" de comida e bebidas.
(…)
II.3.8. Outros factos a destacar
• A empresa paga uma avença mensal por serviços de contabilidade a [SCom07...] Lda, NIF ...60 no valor de €225,00;
• Em termo de declarações, anexo 1, o gerente disse ter tido, em média, no restaurante Restaurante 1 ..., 10 pessoas a trabalhar, ele incluído, e no restaurante Restaurante 2 ..., 12 pessoas e aos fins de semana 15. Todavia, consultando as Declarações Mensais de Remunerações (DMR) declaradas pelo SP, no ano de 2013, em média, houve apenas 4 pessoas a auferir rendimentos pagos pelo SP e no ano de 2014, em média, 11 pessoas;
• Os equipamentos de faturação utilizados pelo SP são deixados nos estabelecimentos para uso dos cessionários, sendo efetuado backup dos dados em suporte "pen" e apagados das máquinas. O técnico de informática do SP disse ter sempre fornecido ao gerente esses backups. Após solicitação dos ficheiros SAFT da faturação, o gerente assumiu não os conseguir obter nem quaisquer tas vias das faturas emitidas nos anos de 2013 e 2014, uma vez que não saberia da importância das "pens" entregues pelo técnico de informática e as apagou, reescrevendo outros dados por cima;
• Os ficheiros SAFT de faturação que se obtiveram foram fornecidos pelo Contabilista Certificado do SP, que guardou alguns após submissão dos mesmos para o Efatura. Assim obtiveram-se os ficheiros de 2013 (exceto abril e maio) e de 2014 (exceto janeiro, novembro e dezembro);
• Os documentos bancários que constam da contabilidade são relativos às contas com o IBAN ...53 da Banco 1... que corresponde à que está devidamente declarada para efeitos de reembolso de IVA e a conta com o IBAN ...23 do Banco 2.... Também estão na contabilidade documentos bancários relativos à conta com o IBAN ...23 do Banco 3... em nome de «BB», mulher do sócio-gerente, NIF ...96..., mas cujos extratos refletem muitas operações claramente associadas à atividade do SP; (…) Os rendimentos declarados nas modelos 3 de IRS em nome do gerente e sua esposa foram desde 2005 os seguintes:
(…)
Os rendimentos declarados nas modelos 3 de IRS em nome do gerente e sua esposa foram desde 2005 os seguintes:

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

• O património imobiliário do sócio-gerente do SP e sua esposa é constituído por 2 artigos urbanos de valor patrimonial tributário de €66.555,63 e €53.140,58. Em nome dos dois existem igualmente os bens móveis sujeitos a registo que a seguir se enumeram:

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

(…)
IV. MOTIVOS E EXPOSIÇÃO DOS FACTOS QUE IMPLICAM O RECURSO A MÉTODOS INDIRETOS IV.1. ABORDAGEM DETALHADA AOS MOTIVOS E PRESSUPOSTOS
IV.1.1. Ficheiros SAFT - Faturação
Como já foi referido no ponto 11.3.8. o SP não dispõe de cópias das bases de dados dos programas de faturação dos anos de 2013 e 2014, não existindo por isso qualquer possibilidade de reconstituir a faturação emitida nesses anos. Através do Contabilista Certificado foi apenas possível obter os ficheiros SAFT da faturação dos anos de 2013 e 2014, excluindo os meses de abril e maio de 2013 e janeiro, novembro e dezembro de 2014.
IV.1.2 Inventários
Ao analisarmos os inventários finais dos exercícios de 2012, 2013 e 2014, constantes do quadro 3 do ponto II.3.6., verificamos que as existências finais declaradas ascenderam aos seguintes montantes:
• Ano de 2012 — €25.250,00
• Ano de 2013 — €26.520,00
• Ano de 2014 — €28.666,97
Nos inventários dos anos de 2012, 2013 e 2014 (anexos 4, 5, 6) fornecidos pelo SP foram detetadas várias incoerências, tendo sido feita uma pequena amostra no sentido de testar as quantidades e preços de custo de alguns produtos, em cada um dos anos, comparando com os dados obtidos com a circularização de fornecedores, com a qual se construiu uma base de dados das compras, constando no anexo 7 extrato dessa base de dados relativo aos produtos Água (todas), Cerveja, Sumos e refrigerantes, Sangria, Vinhos, Vinhos do Porto e Café (incluindo descafeinado), verificando-se o seguinte:

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

1. BARRIS SUPER BOCK: em 2012-12-31, conforme anexo 4, existiam em stock 10 Barris Super Bock, e durante o ano de 2013 foram comprados 45 a três fornecedores, [SCom08...] LDA, NIF ...38..., [SCom09...] SA, NIF ...02 e [SCom10...] LDA, NIF .... A primeira compra foi logo em 2013-01-04, logo não parece crível que em 2012 existissem em inventário final 10 barris (teriam sido consumidos em 4 dias?). A última compra em 2013 foi em 2013-09-04 de 1 barril apenas, não sendo crível igualmente que o SP o tenha feito para avolumar stock, não sendo também admissível que em 2013-12-31 ainda houvessem 25 barris de Cerveja Super Rock, sem compras nos últimos 3 meses desse ano.
2. BORGES GATÃO BRANCO: em 2012-12-31, conforme anexo 4, existiam em stock 120 garrafas, mas em 2013 não foram detetadas quaisquer compras deste produto. As compras de vinho de marca "Borges" foram todas feitas ao fornecedor [SCom11...] SA, NIF ...71, quer em 2013, quer em 2014, não existindo compras com esta referência. Assim afigura-se impossível que em 2013-12-31 houvessem 200 garrafas em stock, valor superior ao inicial e sem compras.
3. CAFE: em 2012-12-31, conforme anexo 4, existiam em stock 60 Kg de café, tendo logo em 2013-01-23 sido adquiridos 36 Kg de café à única fornecedora do produto, [SCom12...] SA, NIF .... Durante o ano de 2013 foram adquiridos 594 Kg de café, tendo a última compra ocorrido em 2013-11-28 de 162 Kg. Ora o preço unitário do café na última aquisição em 2013 à fornecedora identificada foi de €12,23/Kg, muito afastado dos €23,80 que foram inventariados. Aliás a média de preço de compra quer em 2012 quer em 2013 foi de €12,94/Kg.
4. HERDADE DO POMBAL BRANCO: em 2012-12-31, conforme anexo 4, existiam em stock 80 garrafas, sendo que em 2013-03-28 foram adquiridas 39 ao fornecedor [SCom11...] SA, NIF ...71. Apesar das quantidades em inventário final de 2013 não parecerem ajustadas à realidade, o seu valor é que está totalmente desfasado. O preço unitário de €9,00 não corresponde à realidade, porquanto o custo pago pelo SP à fornecedora identificada foi de €4,15 por garrafa.
5. HERDADE DO POMBAL TINTO: em 2012-12-31, conforme anexo 4, existiam em stock 60 garrafas, sendo que em 2013-03-28 foram adquiridas 156 ao fornecedor [SCom11...] SA, NIF ...71. Ora esta aquisição teve um custo unitário de €4,15 por garrafa e não os €9,00 inventariados.
6. SANGRIA BARRIL: em 2012-12-31, conforme anexo 4, existiam em stock 25 barris, sendo que durante o ano de 2013 apenas foram adquiridos 4 em abril ao fornecedor [SCom10...] LDA, NIF .... Todavia, no inventário de 2013-12-31 "aparecem" novamente 25. Obviamente que havendo 25 barris no início do ano, não se vão comprar mais 4 se não tiver havida consumo dos que já estavam em stock, não sendo igualmente crível que o consumo de abril a dezembro tenha sido tão reduzido, tanto mais que logo em 2014- 02-07 houve aquisição de mais 5 barris e em março de mais 10.
7. VINHO DO PORTO RP LBV 2009: em 2012-12-31, conforme anexo 4, existiam em stock 20 garrafas, não tendo sido detetada qualquer compra deste vinho do porto em 2013, pelo que o inventário em 2013-12-31 de 25 garrafas só pode estar incorreto. Acresce que em 2014 foram adquiridas 6 garrafas em 2014-09-04 ao fornecedor [SCom11...] SA, NIF ...71, por um custo unitário de €3,28, muito longe dos €18,47 inventariados.
8. ERMELINDA FREITAS T SYRAH: em 2012-12-31, conforme anexo 4, existiam em stock 150 garrafas, sendo que durante o ano de 2013 foram adquiridas 66 garrafas em 2013-11-22 ao fornecedor [SCom13...] LDA, NIF ...58 a um custo unitário de €6,10. Não se compreende porque razão o SP fez uma aquisição em novembro de 66 garrafas para ter em inventário final 200, o que revelaria um consumo em 2013 de apenas 16 garrafas. Com tão baixo consumo, porquê comprar 66 garrafas em novembro?

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

Em relação ao ano de 2014, há que fazer uma consideração prévia antes da análise do quadro 12. Em 2014- 03-31 o SP deixou de explorar o restaurante Restaurante 1 ..., tendo sido transmitido para o cessionário todos os inventários no restaurante, conforme fatura/recibo 52 de 2014-09-30 (anexo 8) e lista anexa a esta. Assim, as existências finais de inventários de 2014 correspondem apenas às compras efetuadas desde o início da exploração do restaurante Restaurante 2 ..., em setembro, até ao final do ano, diminuídas do consumo.
1. BONS ARES BRANCO: desde o início da exploração do restaurante Restaurante 2 ... foram adquiridas 78 garrafas ao fornecedor [SCom11...] SA, NIF ...71, por um custo unitário de €4,35 em 2014-09-04, pelo que o preço unitário de €6,00 encontra-se afastado da realidade
2. BORGES GATÃO BRANCO: desde o início da exploração do restaurante Restaurante 2 ... foram adquiridas 1590 garrafas ao fornecedor [SCom11...] SA, NIF ...71, por um custo unitário médio de €1,68 por garrafa. Desta forma é impossível que os inventários finais (1800) sejam superiores às compras, estando o preço unitário igualmente inflacionado.
3. CAFÉ: desde o início da exploração do restaurante Restaurante 2 ... foram adquiridos 259 Kg de café à única fornecedora do produto, [SCom12...] SA, NIF .... Em 2014-12-31 foram inventariados 60 Kgs, todavia logo em 2015-01-15 foram comprados 30 kgs. O custo unitário do último café adquirido em 2014 foi de €22,80, o que mais uma vez se afasta do valor inventariado.
4. HERDADE DO POMBAL BRANCO: desde o início da exploração do restaurante Restaurante 2 ... foram adquiridas 42 garrafas ao fornecedor [SCom11...] SA, NIF ...71, sendo que em 2014-12-31 existiam em stock 60. O preço unitário de €9,00 não corresponde à realidade, porquanto o custo pago pelo SP à fornecedora identificada foi de €3,15 por garrafa. Neste caso específico a sobrevalorização é tão mais flagrante que aquando da transmissão dos inventários para a cessionária do restaurante Restaurante 1 ..., foram faturadas garrafas deste vinho ao preço de €4,50, conforme se verifica no anexo 8.
5. HERDADE DO POMBAL TINTO: com semelhança ao ponto anterior, foram adquiridas 120 garrafas deste vinho com um custo unitário médio de €3,75 ao fornecedor [SCom11...] SA, NIF ...71. Em 2014-09-04 foram adquiridas 42 e em 2014-11-28 mais 78. É estranho, no mínimo, que em 2014-12-31 ainda houvessem 80, mais do que as adquiridas em novembro. Também aqui, a sobrevalorização é tão mais flagrante que aquando da transmissão dos inventários para a cessionária do restaurante Restaurante 1 ..., foram faturadas garrafas deste vinho ao preço de €4,50, conforme se verifica no anexo 8.
6. MEIA ENCOSTA BRANCO, MEIA ENCOSTA BRANCO 0.37, MEIA ENCOSTA TINTO e MEIA ENCOSTA TINTO 0.37: todos estes vinhos têm uma sobrevalorização de preço unitário. Na realidade, como se pode observar no quadro 12, as garrafas de 0,751 têm exatamente o mesmo preço unitário das de 0,371, o que não deixa de ser caricato. Além disso as compras deste vinho ao fornecedor [SCom11...] SA, NIF ...71 entre setembro e dezembro de 2014 foram aos seguintes custos unitários, €1,04 para MEIA ENCOSTA BRANCO 0.37, €1,63 para MEIA ENCOSTA BRANCO, €1,10 para MEIA ENCOSTA TINTO 0.37 e €1,73 para MEIA ENCOSTA TINTO. São valores radicalmente diferentes dos inventariados.,
7. VINHOS DO PORTO (todos): em relação aos vinhos do porto existe uma sobrevalorização dos preços unitários que em alguns casos ultrapassa o imaginável. Os vinhos do porto constantes do quadro 12 foram adquiridos ao fornecedor [SCom11...] SA, NIF ...71, com exceção do VINHO DO PORTO RP ADRIANO RESERVA, que foram adquiridas 3 garrafas ao fornecedor [SCom06...] 5 A, NIF ...12. Os custos unitários destes vinhos foram os seguintes:

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

É curioso constatar que o VINHO DO PORTO RP VINTAGE 2011 foi em 2014 valorizado ao preço unitário de €1.291,00, que origina um valor total de €7.746,00, enquanto em 2013 tinha sido valorizado ao preço unitário de €12,91.
Resta constatar que analisando os inventários verifica-se que muitos produtos têm exatamente as mesmas quantidades dos anos anteriores, apesar de terem tido consumos elevados nesse ano, parecendo serem simples cópias
De todos estes dados se conclui que os inventários declarados não oferecem a menor credibilidade.
IV.1.3. Consumos Vs Faturação
Apesar da dificuldade intrínseca de analisar os consumos quando o modelo de negócio inclui o regime buffet, vamos fazer uma análise de consumos e faturação, partindo da base de dados das compras, da qual se junta o anexo 7 correspondente a extrato com os produtos em análise incluídos, e nos ficheiros SAFT da faturação que foram recuperados. Os inventários dos anos de 2012, 2013 e 2014 foram propositadamente excluídos desta análise, porque, como vimos no ponto anterior, foram desacreditados. Para além desse facto, o valor global inventariado no final desses anos foi sempre muito similar, Assim presumem-se como consumidos os produtos adquiridos em cada ano.
➢ Consumo de café e descafeinado.
Ano de 2013
Foram adquiridos 594 Kg de café em grão e 2250 doses de descafeinado. De acordo com as instruções da generalidade das marcas de café, cada café expresso consome, conforme o café, entre as 6 e 7 gramas de café em grão, permitindo a elaboração de no mínimo 140 doses. No entanto, considerar-se-á 120 doses por Kg

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

1) N.° de cafés e descafeinados que constam faturados nos ficheiros SAFT de faturação que foram entregues pelo SP;
(2) N.° de cafés e descafeinados que se presume terem sido consumidos nos meses de abril e maio de 2013, para os quais não foi entregue SAFT. Conhecendo a faturação dos 239 dias em que o estabelecimento esteve aberto, aplicou-se a média diária aos 52 dias omissos nos ficheiros SAFT;
(3) N.° de cafés que se presume terem sido consumidos nos buffets faturados conhecidos, nos 239 dias em que existem dados de SAFT. Considerou-se por excesso um café por cliente, o que não deverá corresponder à realidade porquanto existem clientes que não bebem café. Excluem-se os buffets de criança, em que certamente não houve consumo de café;
(4) N.° de cafés que se presume terem sido consumidos nos buffets dos 52 dias em que não há ficheiros SAFT de faturação. Conhecendo a faturação dos 239 dias em que o estabelecimento esteve aberto, aplicou-se a média diária aos 52 dias omissos nos ficheiros SAFT por forma a obter o n.° de buffets desses dias. Da mesma forma que no ponto anterior presume-se um café por cliente;
(5) Considerado o autoconsumo de 3 cafés diários a multiplicar pelo n.° de funcionários médio do ano de 2013 (4), a que se aludiu no ponto 11.3.8.;
(6) Considerou-se 10% de quebras;
(7) Total não faturado resultante do consumo subtraído do (1), (2), (3), (4), (5) e
Ano de 2014
Foram adquiridos 289 Kg de café em grão e 1534 doses de descafeinado. De acordo com as instruções da generalidade das marcas de café, cada café expresso consome, conforme o café, entre as 6 e 7 gramas de café em grão, permitindo a elaboração de no mínimo 140 doses. No entanto considerar-se-á 120 doses por Kg.

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

(1) N.° de cafés e descafeinados que constam faturados nos ficheiros SAFT de faturação que foram entregues pelo SP;
(2) N.° de cafés e descafeinados que se presume terem sido consumidos nos meses de janeiro, novembro e dezembro de 2014, para os quais não foi entregue SAFT. Conhecendo a faturação dos 98 dias em que o estabelecimento esteve aberto, aplicou-se a média diária aos 88 dias omissos nos ficheiros SAFT;
(3) N.° de cafés que se presume terem sido consumidos nos buffets faturados conhecidos, nos 98 dias em que existem dados de SAFT. Considerou-se por excesso um café por cliente, o que não deverá corresponder à realidade porquanto existem clientes que não bebem café. Excluem-se os buffets de criança, em que certamente não houve consumo de café;
(4) N.° de cafés que se presume terem sido consumidos nos buffets dos 88 dias em que não há ficheiros SAFT de faturação. Conhecendo a faturação dos 98 dias em que o estabelecimento esteve aberto, aplicou-se a média diária aos 88 dias omissos nos ficheiros SAFT por forma a obter o n.° de buffets desses dias. Da mesma forma que no ponto anterior presume-se um café por cliente;
(5) Considerado o autoconsumo de 3 cafés diários a multiplicar pelo n.° de funcionários médio do ano de 2014 (11), a que se aludiu no ponto II.3.8.;
(6) Considerou-se 10% de quebras;
(7) Total não faturado resultante do consumo subtraído do (1), (2), (3), (4), (5) e (6).
Assim se chega à conclusão que a omissão de faturação no caso do café é muito grande, sendo que os valores obtidos nos quadros 14 e 15 foram calculados com algumas presunções claramente em beneficio do SP, nomeadamente a presunção de consumo de café em todos os buffets, o n.° claramente exagerado de autoconsumo e a percentagem de quebras, considerando que o n.° de cafés por KG de café em grão foi claramente definido por defeito.
De referir que os estabelecimentos explorados pelo SP são restaurantes e que o consumo de café está intrinsecamente associado ao consumo de refeição, pelo que daqui se presume igualmente a omissão de faturação de refeições, agravada com o facto de nem todos os clientes dos restaurantes consumirem café.
➢ Consumo de Águas, sumos e refrigerantes e cerveja.
Ano de 2013
Os ficheiros SAFT da faturação para além de não conterem todos os meses dos anos de 2013 e 2014 também não são claros quanto a alguns produtos vendidos, existindo linhas de produtos com descrições genéricas e outras com descrições específicas para algumas marcas. Porque em alguns casos não se conhece a linha de produto que alguns podem integrar, optou-se por converter todas as unidades de bebidas em litros, quer relativamente às compras quer às vendas (SAFT). Constam do anexo 7 todas as compras das bebidas em análise integradas nas subfamílias de Água, Água gás/sabores, Cerveja e Sumos e Ref., e do quadro 16 todos as descrições de produto constantes do SAFT relativas aos tipos de bebida em análise, sua faturação em unidades e conversão em litros, com comparação com o total de litros adquiridos:

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

Da mesma forma como no café, também aqui se tem que presumir o consumo nos meses de abril e maio, desta forma conhecendo a faturação dos 239 dias com informação disponível, aplicou-se a média diária de consumo aos 52 dias omissos nos ficheiros SAFT. O consumo presumido faturado de bebidas foi de 1739,50 litros (7995,02/239X52).
Ainda assim existe consumo destas bebidas nos buffets e que é integrado no preço do mesmo, pelo que não pode surgir em separado no SAFT. O n.° de buffets faturados, e o presumido nos meses sem SAFT, constam do quadro 14 no estudo do café, aos quais se juntam os buffets de criança faturados e presumidos que ali tinham sido excluídos, ou seja, 2996 buffets (2461+535) + 79 buffets criança faturados + 17 buffets de criança presumidos, no total de 3092 buffets no ano de 2013. Presume-se igualmente, como no caso do café, 10% de quebras. Considera-se que em cada buffet se consumiu 1 litro destas bebidas, obtendo assim um consumo total de 15257,52 litros, resultante da adição de 7995,02+1739,50+3092+2431.
O valor de consumo em buffets é claramente calculado por excesso, uma vez que nos buffets se consome muito vinho, sangria, espumantes e não exclusivamente águas, sumos, refrigerantes e cerveja. Atento também ao consumo considerado por pessoa, 1 litro de bebida, que é obviamente um valor excessivo para a média de consumo de homens, mulheres e crianças.
Ano de 2014
Como já foi exposto para o ano de 2013, e pelos mesmos motivos, optou-se por converter todas as unidades de bebidas em litros, quer relativamente às compras quer às vendas (SAFT), Constam do anexo 7 todas as compras das bebidas em análise integradas nas subfamílias de Água, Água gás/sabores, Cerveja e Sumos e Ref., e do quadro 17 todos as descrições de produto constantes do SAFT relativas aos tipos de bebida em análise, sua faturação em unidades e conversão em litros, com comparação com o total de litros adquiridos:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

Como para 2013, também aqui se tem que presumir o consumo nos meses omissos de SAFT (janeiro, novembro e dezembro), desta forma conhecendo a faturação dos 98 dias com informação disponível, aplicou-se a média diária de consuma aos 88 dias omissos nos ficheiros SAFT. O consumo presumido faturado de bebidas foi de 2175,23 litros (2422,41/98X88).
O consumo destas bebidas nos buffets é integrado no preço do mesmo. O n.° de buffets faturados, e o presumido nos meses sem SAFT, constam do quadro 15 no estudo do café, aos quais se juntam os buffets de criança faturados e presumidas que ali tinham sido excluídos, ou seja, 3927 buffets (2069+1858) + 42 buffets criança faturados + 38 buffets de criança presumidos, no total de 4007 buffets no ano de 2014.
Presume-se igualmente, como no caso do café, 10% de quebras. Considera-se que em cada buffet se consumiu 1 litro destas bebidas, obtendo assim um consumo total de 11015,64 litros, resultante da adição de 2422,41+2175,23+4007+2411.
Mais uma vez o valor de consumo em buffets é claramente calculado por excesso, porque a juntar aos argumentos já apresentados para o ano de 2013, foi referido pelo gerente em termo de declarações (anexo 1) que no restaurante Restaurante 2 ..., explorado desde setembro de 2014, a cerveja não era incluída no preço do buffet.
Em ambos os anos não foram considerados autoconsumos uma vez que não foram contempladas todas as bebidas e foram automaticamente excluídas as compras de água em garrafões, que se presumem para consumo interno.
Dos dados acima apresentados pode-se concluir que, quer em relação ao café quer às bebidas analisadas, existe uma grande discrepância entre o faturado e o que foi adquirido/consumido.
IV.1.4. Caixa, depósitos bancários e suprimentos
• Caixa e depósitos bancários
Ano 2013 Feita a análise na contabilidade às contas 111-Caixa, 1211-Banco 1... e 1213 - Banco 2..., através do ficheiro SAFT - Contabilidade do ano de 2013 e aos extratos bancários, verificou-se que os saldos reais das contas de depósitos bancários não coincidem com os que são relevados na contabilidade, porquanto não foi efetuada verdadeira reconciliação bancária, como se verifica em pequena amostragem no quadro seguinte.

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

O saldo de caixa apresenta resultado negativo no mês de abril, o que evidentemente não pode acontecer.
A conta do Banco 2... é subdividida em diversos tipos de aplicações, sendo que o saldo total da posição integrada perante este banco é influenciado por -€15.000,00 da componente "Tesouraria Express Bill" cujo saldo negativo transitou do ano anterior. Sem este valor o saldo a 2013-12-31 seria de €896,37, justificando dessa forma os esforços da contabilidade nessa data para colocar o saldo contabilístico nesse valor, uma vez que nesse dia foi feito movimento contabilístico com documento de suporte interno n.° 651, que se junta em anexo 9, apenas com a finalidade de regularizar saldos das contas relativas a depósitos bancários e da conta caixa, sendo utilizado para saldar contas de depósitos 1214 - Banco 4... e 1215 - Banco 5... que aparentemente não seriam utilizadas.
Para além dos saldos, existem movimentos nas contas identificadas que não foram refletidos na contabilidade. Verifica-se no quadro seguinte a comparação entre todos os aumentos de saldo das contas bancárias, retirados dos extratos bancários das contas da Banco 1... e do Banco 2... do ano de 2013, e o total de movimentos a débito das contas 1211-Banco 1... e 1213 - Banco 2... retirados do SAFT da contabilidade.

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

De salientar que os valores dos pagamentos efetuados pelos clientes do SP com cartões bancários (POS/TPA) não coincidem com os valores declarados através da mod. 40 das entidades bancárias, uma vez que em 2013 a Banco 1... declarou terem sido efetuados movimentos no valor de €166.842,95 e o Banco 2... de €69.641,92, podendo, no entanto, tais diferenças serem respeitantes a comissões.
O total de movimentos bancários a acrescer são diferentes do total de movimentos a débito das contas 1211 e 1213.
Mais alguns exemplos de incoerências entre as contas bancárias e a contabilidade:
Conta Banco 1... com IBAN ...53
1. Os débitos de cheques em 2013-04-02 por €541,00, em 2013-04-04 por 6755,00 e €990,66 não foram contabilizados;
2. O depósito em 2013-07-29 por 617.472,75 não foi contabilizado;
3. Os débitos de cheques de £300,00, €250,00, €2.400,00 e €1.192,60 em 2013-10-11 e de 62.205,39 em 2013-10-31 e o depósito de €1.570,00 em 2013-10-22, não foram contabilizados;
4. O depósito de €5.000,00 em 2013-11-19 não foi contabilizado;
5. O depósito de €10.000,00 em 2013-12-12 não foi contabilizado.
Conta Banco 2... com IBAN ...23
1. O levantamento de €10.000,00 em 2013-06-25 e o depósito de 610.000,00 em 2013-06-27 não foram refletidos na contabilidade;
2. O levantamento de €5.100,00 em 2013-07-01 não foi contabilizado;
3. O levantamento de €4.900,00 em 2013-07-08 foi indevidamente contabilizado como depósito na conta 1213 por contrapartida de caixa.
Ano 2014
O saldo de caixa durante o ano de 2014 apresentava os seguintes valores:

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

Como se facilmente se verifica, os saldos mensais desde abril são negativos, o que evidentemente não pode ocorrer. Em 2014-12-31, para regularização dos saldos, foi feito lançamento contabilístico tendo como documento de suporte interno n.° 566, (anexo 10), onde por contrapartida das contas 1213 e 278801 se regulariza o saldo de caixa e as contas 2311 e 2312. Obviamente que a conta de depósito já identificada do Banco 2..., em dezembro de 2014, não teve qualquer movimento de €15 000,00.
Alguns exemplos de incoerências entre as contas bancárias e a contabilidade:
Conta Banco 1... com IBAN ...53
1. Os débitos de cheques em 2014-01-29 por €2.180,50, e o depósito de €10.000,00 em 2014-01-27 não foram contabilizados;
2. Os débitos de cheques em 2014-02-10 de €901,37, em 2014-02-19 de €1.644,85 e de €1.112,89 e €1.369,18 em 2014-02-28, não foram contabilizados;
3. Os débitos de cheques em 2014-03-03 de €2.608,45 e €2.781,62, não foram contabilizados;
4. O débito de cheque em 2014-06-19 de €4.800,00, bem como os depósitos de €400,00 em 2014-06-26, €274,44 em 2014-06-27 e €2.000,00 em 2014-06-30, não foram contabilizados;
5. Os depósitos de €3.000,00 em 2014-07-07, €2.000,00 em 2014-07-30 e o débito de cheque de €3.010,61 em 2014-07-22, não foram contabilizados;
6. Os depósitos de €15.000,00 em 2014-08-07, €2.000,00 em 2014-08-15 e €2.000,00 em 2014-08-30, não foram contabilizados;
7. Os débitos de cheques de €4.000,00 em 2014-10-02 e €4.085,70 em 2014-10-14 e os depósitos de €5.000,00 em 2014-10-15 e €1.800,00 em 2014-10-31, não foram contabilizados;
8. Os depósitos de €5.000,00 em 2014-11-06 não foram contabilizados;
9. O depósito de €3.612,00 em 2014-12-25 não foi contabilizado.
Conta Banco 2... com IBAN ...23
1. Os débitos de cheques de €1.850,42 em 2014-01-07, €2.147,27 em 2014-01-08 e €1.914,23 em 2014- 01-10 não foram contabilizados;
2. A transferência de €12.000,00 em 2014-07-17, não foi contabilizada;
3. Os débitos de cheques de €15.000,00 em 2014-08-11, €6.580,50 em 2014-08-12, €1.513,64 em 2014- 08-20 bem como os depósitos de €3.000,00 em 2014-08-15, não foram contabilizados;
4. O débito de cheque de €2.400,00 em 2014-09-17 não foi contabilizado;
5. O débito de cheque de €6.514,13 em 2014-10-01 não foi contabilizado.
De todos os dados acima descritos, quer em relação ao ano de 2013 quer de 2014, ressalta a enorme diferença entre a realidade financeira (caixa e depósitos á ordem) com a percecionada pela contabilidade.
• Suprimentos
Em relação ao ano de 2013 o extrato da conta 278801 - «CC», apresentava os movimentos que figuram no quadro seguinte, que corresponde à conta de suprimentos do sócio-gerente.
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
O total de movimentos a crédito no ano de 2013 foi de €100.615,22. Consultados os documentos de suporte contabilístico, verificou-se que os maiores movimentos foram feitos com recurso a notas de lançamento internas sem qualquer outra documentação anexa. Analisemos assim alguns desses movimentos, identificados no quadro 21 através do n.° Doc.:
• Doc. 12 - Depósito bancário em numerário sem referência de proveniência, anexo 11; • Doc. 277 - Depósito bancário em numerário sem referência de proveniência, anexo 12
• Doc. 379 - Depósito bancário em numerário sem referência de proveniência, anexo 13
• Doc. 380 - Depósito bancário em numerário sem referência de proveniência, anexo 14
• Doc. 434 - Nota de lançamento de 2013-08-31 debitando-se a conta 278801 pelo valor de €17 472,75 por contrapartida da 1211, anexo 15. Consultando os extratos bancários verifica-se que em 2013-07-29 foi efetuado um depósito desta mesma quantia, que não foi contabilizado. Portanto não existe registo contabilístico da entrada deste montante apesar da sua saída ter sido relevada na conta 278801;
• Doc. 652 - Nota de lançamento de 2013-12-31, conforme anexo 16, que, segundo o contabilista certificado, serviu para regularizar saldos de contas de fornecedores que o gerente do SP disse estarem regularizados. Como o saldo de caixa não permitia fazer tais regularizações, a contrapartida foi a conta 278801;
• Doc. 653 - Nota de lançamento de 2013-12-31, conforme anexo 17, debitando-se a conta 278801 e creditando-se a 531 - Entregas suplementares.
Em relação ao ano de 2014, o extrato da conta 278801 - «CC», apresentava os movimentos que figuram no quadro seguinte, que corresponde à conta de suprimentos do sócio-gerente

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

O total de movimentos a crédito no ano de 2014 foi de €124.545,38. Consultados os documentos de suporte contabilístico, verificou-se que os maiores movimentos foram feitos com recurso a notas de lançamento internas sem qualquer outra documentação anexa. Analisemos assim alguns desses movimentos, identificados no quadro 22 através do n.° Doc.:
• Doc. 9 — Depósito bancário em numerário sem referência de proveniência, anexo 18;
• Doc. 152 — Depósitos bancários, só existindo o extrato bancário como doc. de suporte, anexo 19
• Doc. 175 — Depósitos bancários, só existindo o extrato bancário como doc. de suporte, anexo 20
• Doc. 244 — Depósito bancário em numerário sem referência de proveniência, anexo 21
• Doc. 293 — Depósito bancário em numerário sem referência de proveniência, anexo 22
• Doc. 565 — Nota de lançamento de 2014-12-31, conforme anexo 23, que, segundo o contabilista certificado, serviu para regularizar saldos de contas de fornecedores que o gerente do SP disse estarem regularizados. Como o saldo de caixa não permitia fazer tais regularizações, a contrapartida foi a conta 278801;
• Doc. 566 -Nota de lançamento de 2014-12-31, conforme anexo 10, que como já foi abordado na análise aos saldos de caixa de 2014, serviu para regularização destes;
• Doc. 567 — Nota de lançamento de 2014-12-31, debitando-se a conta 278801 e creditando-se a 531 — Entregas suplementares, anexo 24.
Daqui resulta que na generalidade os movimentos contabilísticos da conta 278801 foram feitos sem grande base documental, sem justificação plausível, tendo os movimentos de maior valor sido feitos para regularizar saldos de fornecedores e outros, quando não havia nenhuma outra conta para creditar. A maioria dos documentos acima referidos suscitam dúvidas, no mínimo, sobre a real constituição de tais suprimentos. A não justificação dos valores com os quais foram saldadas as contas de fornecedores e outros, não pode automaticamente conduzir à conclusão que foi o sócio gerente que as saldou, mas sim que esses pagamentos derivam da omissão de faturação do SP.
IV.1.5. TPA Terminais Pagamento Automático
Os valores declarados pelas instituições bancárias na mod. 40, referentes aos pagamentos feitos pelos clientes ao SP através de TPA foram:
Ano 2013
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Como adiante no ponto IV.1.6. se verá, o volume de negócios do SP em 2013, relativamente a prestação de serviços de restauração, foi de €275.496,59, pelo que se conclui que 69,7% (192264,12/236484,87X100) dos pagamentos de clientes terão sido através de TPA.
Ano de 2014
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Corno adiante no ponto IV.1.6. se verá, o volume de negócios do SP em 2014, relativamente a prestação de serviços de restauração, foi de €180.841,20, pelo que se conclui que 75,2% (136000,59/167280,73X100) dos pagamentos de clientes terão sido através de TPA.
Segundo os dados que os Serviços de Inspeção ... dispõem, no universo de SP do distrito com o CAE 56107, que é o do SP, as percentagens de pagamentos com TPA, em relação ao volume de negócios total, foram em 2013 e 2014 as que constam da coluna "Relação média" do quadro 25 que se segue:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Para que não restassem dúvidas foi acrescido no quadro os SP com CAE 56101, uma vez que são em muito maior quantidade, dando força à estatística. Em qualquer dos casos a percentagem de pagamentos com TPA é substancialmente inferior à que o SP declarou. Caso o SP tivesse uma percentagem de pagamentos com TPA idêntica à média distrital do CAE 56101 (mais favorável ao SP), o seu volume de negócios, em serviços de restauração, em 2013 seria de €400.550,25 (192264,12/0,48) e 2014 seria de €266.667,82 (136000,59/0,51).
Por si só estes dados não são totalmente reveladores da real omissão de faturação, mas em conjunto com os demais já abordados e o que falta abordar, constituem mais um forte indício.
IV.1.6. Margens vs Atividade
Nos anos de 2013 e 2014 as vendas e serviços prestados constantes do quadro 1, incluem €28.800,00 e €40.832,37, respetivamente, relativos a rendimentos decorrentes de valores pagos pelos cessionários. Assim os rendimentos exclusivamente da atividade de restauração foram de €275.049,59 em 2013 e de €180.841,20 em 2014. Apesar de não se conhecer o valor dos rendimentos pagos por cessionários em 2012, por não ser ano contemplado na presente ação, pelo menos €26.400,00 terão sido recebidos do cessionário [SCom02...], Ida, NIF ..., pelo período de fevereiro a dezembro de 2012, pelo que se considera que os rendimentos decorrentes da atividade de restauração foram de 6114.577,70 (€140.977,70-€26.400,00).
Em 2011 não terão havido rendimentos pagos por cessionários, porque ainda nenhum contrato de cessão tinha sido firmado.
Com estes valores e dos que se extraem das demonstrações de resultados podemos obter as margens brutas do SP, dadas pela relação entre o Custo mercadorias vendidas e matérias consumidas (CMV) e as Vendas (V) através da fórmula: ((V-CMV) / V) X100, assim temos, para o SP:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
É importante referir que estas margens São objetivamente não praticáveis neste setor de atividade e estão muito afastadas da média, quer distrital quer nacional. Os últimos valores disponíveis na base de dados da AT para SP enquadrados no CAE 56107 são referentes ao ano de 2013, sendo os seguintes:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Verifica-se assim uma enormíssima disparidade entre o que o SP declara e o que é declarado pelos SP com o mesmo CAE. Acresce que pela experiência dos Serviços de Inspeção Tributária, os valores reais das margens no setor são substancialmente superiores ao que é declarado e, ao refletido no quadro 27, todavia nem a estes, o SP se consegue aproximar.
Acresce aos factos apresentados que, tal corno descrito no ponto II.3.5., o SP dedica-se à exploração de restaurantes com o objetivo de posterior cessão de exploração a título oneroso a entidades terceiras (cessionários). Segundo palavras, reiteradas por diversas vezes pelo gerente do SP, tem conseguido dinamizar os espaços que explora e quando os transmite por cessão eles estão em plena atividade e com resultados positivos. Não será certamente com os dados contabilísticos que o SP consegue "convencer" os cessionários a tomarem a exploração dos estabelecimentos, porque com as margens declaradas e os resultados líquidos negativos, caso fossem reais, não haveria quem aceitasse e pagasse essa cedência de exploração.
Importa salientar que no ano de 2013 e 1° trimestre de 2014, o SP explorou o mesmo restaurante e que por isso não terá tido quaisquer eventuais efeitos negativos do arranque de uma exploração, pelo que menos se compreende a margem apresentada. Ainda assim, com base nos ficheiros SAFT da faturação e nos dados obtidos pela circularização de fornecedores, fizemos um pequeno estudo partindo dos produtos mais adquiridos respeitantes a carne de vaca, carne de porco, carne de aves, peixe, águas, cerveja, sumos e refrigerantes, batatas, arroz e café.
Segue quadro com as compras nos anos de 2013 e 2014:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Conhecendo os produtos mais comprados em cada ano, com base nas informações dos fornecedores, foi apurado o preço de compra de cada um, correspondente ao preço na maior (em quantidade) compra em cada ano, de cada produto:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Com as informações constantes dos quadros 28 e 29, simulámos a preparação de 4 pratos (a peso), com estes produtos, com as seguintes premissas:
• O peso líquido corresponde à média de peso do prato "PRATO COM GUARNIÇÃO", que é o mais representativo nos SAFT da faturação dos anos de 2013 e 2014; Face à dificuldade de se apurar os preços de venda e quantidades dos vinhos e sangria, por falta de informação do SAFT, foram analisadas apenas as bebidas correspondentes a água, sumos e r efrigerantes e cerveja;
• Os preços de venda foram retirados do SAFT da faturação e correspondem ao preço médio de venda dos produtos em cada um dos anos analisados;
• Para se calcular o peso bruto de cada alimento, partindo do peso líquido que pretendíamos obter, utilizámos os índices de cocção (IC) de cada alimento. Este índice expressa a perda de água ou retração das fibras de um produto, ou a absorção de água (como no caso do arroz). Os índices foram extraídos de "Bernardas SM. Laboratório Técnica Dietética — Centro Universitário São Camilo — 1999" e "Orneilas,
L.H. Técnica dietética -- seleção e preparo de alimentos, 5 ed. São Paulo: Atheneu, 1988", e são os seguintes:
Dianteiro — 0,65
2013 — 285g/0,65=44g
2014 — 291g/0,65=448g
Pá York — 0,45 2013 — 285g/0,45=633g
2014 — 291g/0,45=647g
Frango Campo — 0,61 2013 — 285g/0,61=467g
2014 — 291g/0,61=477g
Bacalhau — 0,60 2013 — 285g/0,60=475g
2014 — 291g/0,60=485g
• Considerou-se que em cada prato 1/3 do peso seria de guarnição (batata e arroz, ou no caso do prato 4 só batata) e os restantes 2/3 com proteína;
• A Margem bruta das vendas (MB) foi apurada com ((Preço de Venda-Custo) / Preço de Venda) X 100
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Dos quadros 30 a 37 se conclui que a margem bruta das vendas em qualquer dos cenários apresentados é substancialmente superior à que é declarada pelo SP. À exceção do prato 4 essas margens são sempre superiores a 55,90. Em relação ao prato 4, deve-se ter em consideração que o bacalhau é essencialmente servido ao fim de semana, segundo informação cio gerente do SP, sendo o preço de venda superior e por isso a margem também o será. O bacalhau apresenta a margem mais baixa, mas representa cerca de 14,35% do conjunto das compras de carne de vaca, porco, aves e peixe em 2013 e 8,32% das compras dos mesmos produtos em 2014.
Muito importante igualmente de referir que os índices de cocção indicados são muito conservadores, tendo sido sempre determinados por defeito em relação aos intervalos que existem para cada produto.
Nos restaurantes de comida ao peso existe um grande número de técnicas para potenciar o peso dos alimentos, nomeadamente na cozedura/confeção dos mesmos. Na comida ao peso há que considerar igualmente que apesar dos produtos sofrerem perda de peso com a cozedura, essa perda é compensada pelos molhos e por outros produtos que são adicionados a estes, tais como cebola, alhos, cogumelos, milho, pimento, tomate, etc. Nada disso foi aqui considerado, nem foram consideradas as sobremesas que, diz a experiência, têm normalmente margens muito maiores, pelo que as margens agora apuradas são inferiores às reais. Também a distribuição de guarnição e proteína (1/3 vs. 2/3) foi determinada em benefício do SP, uma vez que não será essa a verdadeira relação entre os dois, que deverá estar mais perto da divisão a metade para cada um dos componentes dos pratos
IV.2. CONCLUSÃO E FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO E DE DIREITO
Atendendo ao supra exposto, importa sintetizar os factos que fundamentam a aplicação de métodos indiretos, designadamente,
1. Inexistência de originais ou cópias dos documentos que titularam transmissões de bens e prestações de serviços e cópias dos ficheiros SAFT da faturação
2. Inventários sobrevalorizados;
3. Omissão de faturação em produtos não transformáveis;
4. Desconformidades na contabilização das contas de depósitos e caixa;
5. Suprimentos sem suporte documentai ou inadequado;
6. Margens brutas muito reduzidas, sendo mesmo negativas em 2014;
7. Prejuízos fiscais durante três anos consecutivos.
Conclui-se assim que, no seguimento dos procedimentos de inspeção verificaram-se irregularidades na organização da contabilidade, infrações, erros e-ou inexatidões no registo das operações e indícios claros e fundados de que a escrituração não reflete a exata situação patrimonial e o resultado efetivamente obtido. Com efeito, a aplicação dos métodos de avaliação direta não conduz à matéria tributável real do sujeito passivo em análise (n.° 1, do artigo 81.°, artigo 82.° e 87.°, todos da LGT).
Simultaneamente, fica demonstrado que para efeitos de IRC não houve um cumprimento integral do disposto no artigo 123.° do Código do IRC. Também para efeitos de IVA a insuficiência de elementos compromete o apuramento claro e inequívoco do imposto previsto no artigo 44.° do Código do IVA.
Neste sentido, em face do anteriormente descrito neste relatório, e em especial, no relevado neste capítulo, apuram-se factos que elidem a presunção de verdade dos valores declarados constante do número 1, do artigo 75.° da Lei Geral Tributária (LGT), por se verificar o indicado nas alíneas a) e b), do número 2, da mesma norma.
Conclui-se assim que a escrituração do sujeito passivo, não reflete a exata situação patrimonial e o resultado efetivamente obtido, pelo que, face à impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata dos elementos indispensáveis à correta determinação da matéria tributável, e ao facto de as irregularidades e os fundamentos referidos no presente relatório serem insupríveis, se recorre, nos termos da alínea b), do número 1, do artigo 87.° e da alínea a), do artigo 88.°, da LGT, para os efeitos previstos nos artigos 87.° a 89:°, do citado diploma legal, por remissão do artigo 57.° do Código do IRC, do artigo 39.° do Código do IRS e do artigo 90.° do Código do IVA, à sua determinação por aplicação de métodos indiretos, nos anos de 2013 e 2014.
V. CRITÉRIOS DE CÁLCULO DOS VALORES CORRIGIDOS COM RECURSO A MÉTODOS INDIRETOS
V.1. CORREÇÕES TÉCNICAS AOS VALORES DECLARADOS
Não aplicável
V.2. DETERMINAÇÃO DA MATÉRIA TRIBUTÁVEL POR MÉTODOS INDIRETOS V.2.1. Apresentação do critério
V.2.1.1. Ano 2013
V.2.1.1.1. Em sede de IRC
Por forma a determinar o volume de negócios presumido, optou-se por utilizar a margem bruta das vendas (rácio utilizado pela AT) através da fórmula (VN-CMV) / VN X 100, em que VN é Volume de negócios (Vendas + Prestações de Serviços) e CMV é Custo das Mercadorias Vendidas.
Pelos motivos expostos no ponto IV.1.2. não serão considerados os inventários iniciais e finais do ano de 2013, pelo que o CMV presumido será igual às compras desse ano, ou seja €261.158,57.
Optou-se por aplicar o rácio da mediana para o setor de atividade no distrito de Aveiro do ano de 2013 (último valor disponível) de 46,04, conseguindo-se dessa forma determinar o Volume de Negócios presumida:
VN = CMV / (1-rácio/100)
Ao volume de negócios apurado desta forma, há que somar o valor que o SP recebeu dos cessionários que não respeita a prestações de serviços de restauração, então no ano de 2013 o volume de negócios será €512.785,49, resultante de 261.158,57(a)/(1-46,04(b)/100) + 28.800,00 (c).
(a) Valor das compras declaradas constante do quadro 3 no ponto 11.3.6. no ano de 2013.
(b) Rácio MBI correspondente à mediana (medida estatística de tendência central) do distrito de Aveiro para o setor de atividade do sujeito passivo, para o ano de 2013 (último ano disponível).
(c) Rendimentos pagos pelos cessionários em 2013.
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
O valor a acrescer de rendimento é de €208.935,90
V.2.1.1.2. Em sede de IVA
O IVA referente ao ano de 2013 foi apurado tendo por base o volume de negócios apurado no ponto anterior, distribuindo essa base tributável, deduzida da que foi declarada pelo sujeito passivo, uniformemente nos vários períodos de tributação pela taxa normal. Ou seja:
1-Volume de negócios total: €512.785,49 (ponto V.2.1.1.1.)
2-Base tributável declarada: €303.849,59 (ponto II.3.6.)
3-Volume de negócios a acrescer: €208.935,90 (1-2)
V.2.1.2. Ano 2014
V.2.1.2.1. Em sede de IRC
Utilizando exatamente o mesmo critério do ponto V.2.1.1.1. para o ano de 2013, de forma a determinar o volume de negócios presumido, optou-se por utilizar a margem bruta das vendas (rácio utilizado pela AT) através da fórmula (VN-CMV) 1 VN X 100, em que VN é Volume de negócios (Vendas + Prestações de Serviços) e CMV é Custo das Mercadorias Vendidas.
Pelos motivos expostos no ponto 1V.1.2. não serão considerados os inventários iniciais e finais do ano de 2014, pelo que o CMV presumido será igual às compras desse ano, ou seja 6184.403,82.
Optou-se por aplicar o rácio da mediana para o setor de atividade no distrito de Aveiro do ano de 2013 (último valor disponível) de 46,04, conseguindo-se dessa forma determinar o Volume de Negócios presumido:
VN = CMV/ (1-rácio/100)
Ao volume de negócios apurado desta forma, há que somar o valor que o SP recebeu dos cessionários que não respeita a prestações de serviços de restauração, então no ano de 2014 o volume de negócios será €382.574,07, resultante de 184.403,82(a)/(1-46,04(b)/100) + 40.832,37 (c).
(a) Valor das compras declaradas constante do quadro 3 no ponto II.3.6. no ano de 2014.
(b) Rácio MBl correspondente à mediana (medida estatística de tendência central) do distrito de Aveiro para o setor de atividade do sujeito passivo, para o ano de 2013 (último ano disponível).
(c) Rendimentos pagos pelos cessionários em 2014.
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
O valor a acrescer de rendimento é de €160.900,50
(…)
V.2.2. Fundamentação da adequação do critério
Dado o modelo de negócio do SP, que mistura comida ao peso com o regime de buffet, torna-se extremamente difícil fazer a quantificação da matéria tributável por conversão direta das compras em prestações de serviços. Assim esta solução revela-se como mais apropriada, atendendo que não foram detetados factos que façam diferenciar este SP de outros com a mesma atividade.
O uso da mediana é justificado por ser a estatística mais resistente, que expurga os valores mais altos e baixos da amostra de dados, sendo menos afetada pelas situações excecionais.
V.2.3. Quantificação da matéria tributável
(…)
V.2.3.2. Em sede de IR Os rendimentos de IRC determinados com recurso a métodos indiretos são tributáveis nos termos da alínea a) do n.° 1 e n.° 3 do artigo 52.° e artigo 54.° do CIRC e pressupõem uma infração aos artigos 17.°, 20.° e 23.° do CIRC, que está prevista e é punível nos termos do artigo 119.° do Regime Geral das Infrações Tributárias.
V.2.3.2.1. Ano 2013
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
O lucro tributável do ano de 2013 é fixado em €161.599,21.
V.2.3.2.2. Ano 2014
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
O lucro tributável do ano de 2014 é fixado em €73.991,48.
(…)
IX.2. ABORDAGEM À RESPOSTA DO SUJEITO PASSIVO
No dia 2016-07-13, veio o sócio-gerente «CC», NIF ...55..., exercer o direito de audição, que se reduziu a escrito, anexo 25.
Analisando as declarações proferidas, verifica-se que assentaram predominantemente nas questões abordadas no ponto IV., sendo que em todos os pontos visados (n.° de funcionários, inexistência de backups do programa de faturação, valorização dos inventários, movimentos bancários e suprimentos) apenas confirma o que havia sido relatado e ainda assume erros e omissões.
Em relação aos suprimentos alega que alguns pagamentos a fornecedores registados contabilisticamente por contrapartida de suprimentos, não estariam na realidade regularizados, sendo todavia de salientar que indica apenas um desses fornecedores, não tendo dado explicação para os suprimentos no valor total de €100.615,22 em 2013 e €124.545,38 em 2014.
Diz ainda "Acha que a margem aplicada nos métodos indiretos é muito superior à real em relação ao seu modelo de negócio, porque existem muitos desperdícios e as casas que explora têm sempre muito pouco tempo de atividade", sem no entanto fornecer qualquer facto concreto que aponte para outra margem. Em relação a este ponto e reforçando o que foi já explanado no ponto IV.1.6., a margem utilizada no ponto V.2., é inferior à esmagadora maioria das margens encontradas para as simulações de refeições exemplificadas nos quadros 30 a 37.
Em relação ao argumento da exploração de novas casas e consequentes margens mais baixas, é de referir que em relação a todo o ano de 2013 o SP explorou o mesmo estabelecimento e nem por isso a margem declarada foi mais alta que nos outros anos, pelo contrário foi mais baixa do que no ano de 2012. Mesmo admitindo-se que o efeito da abertura de um espaço do género implique uma margem bruta de vendas inferior, esse efeito não é duradouro porque a gestão continuada vai sempre reduzindo os desperdícios.
A título de exemplo, admitindo que os suprimentos acima indicados são na realidade vendas/prestações de serviços não declaradas, o efeito que esse acréscimo teria nas margens brutas das vendas dos anos de 2013 e 2014 seria:
MB 2013: 30,87
MB 2014: 40,31
Só esta alteração das vendas/prestações de serviços, já originaria margens muito mais aproximadas com a utilizada no ponto V.2., substancialmente diferentes das declaradas.
Assim, não tendo havido argumentos que contrariem o método de cálculo do apuro da matéria coletável por métodos indiretos, será de manter as conclusões do relatório de inspeção
(…)”
[cfr. relatório de inspeção tributária constante do procedimento administrativo inserido no SITAF e constante da peça n.º004714687].
G. A Impugnante apresentou a seguinte pronúncia em sede de audição prévia do relatório final:
“(…)
Reforça o que foi dito em auto de declarações sobre o número de funcionários no restaurante Restaurante 1 ... e no Restaurante 2 ..., indicando que no primeiro tinha 10 pessoas e no segundo 11, e o filho e a namorada.
Relativamente à inexistência de faturas emitidas e cópias do SAFT e backup do programa de faturação, sempre pensou que após extração do SAFT e entrega para efeitos do Efatura, estaria a informação toda prestada. Em relação à valorização dos inventários assume que os valores de muitas rúbricas, nomeadamente bebidas, foram mal valorizados porque não tiveram em conta os descontos comerciais.
Assume que em relação aos movimentos bancários refere que existem uma série de movimentos indevidamente justificados referentes a utilização pessoal e utilização de contas pessoais para pagamentos relativos à empresa.
Em relação aos suprimentos, apesar de na contabilidade terem sido efetuados movimentos contabilísticos de regularização de saldos de fornecedores por contrapartida de suprimentos do sócio, a alguns desses fornecedores os pagamentos ainda não tinham ocorrido, nomeadamente os equipamentos hoteleiros, ....
Acha que a margem aplicada nos métodos indiretos é muito superior à real em relação ao seu modelo de negócio, porque existem muitos desperdícios e as casas que explora têm sempre muito pouco tempo de atividade.
E mais não disse.
(…)”
[cfr. resulta do anexo 25 ao RIT da peça do SITAF n.º 004714691].
H. A Impugnante apresentou pedido de revisão da matéria coletável
[cfr. resulta da decisão constante da peça do SITAF n.º 004714704].
I. Em 31 de março de 2017 foi proferido despacho com o seguinte teor:
“Em concordância com o teor do parecer que antecede, nos termos do n.° 6 do art.° 92.° da Lei Geral Tributária (LGT), resolvo manter os valores inicialmente fixados , a saber:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[cfr. despacho constante da peça do SITAF n.º 004714704].
J. O parecer referido no despacho constante do facto precedente tinha o seguinte teor: “(…)
B - ANÁLISE DOS FACTOS
B.1 — Caracterização da atividade exercida
O contribuinte tem como prática empresarial a abertura de restaurantes e a dinamização dos mesmos para posterior cessão de exploração a título oneroso a terceiras entidades (cessionários).
Breve resenha das cedências de exploração realizadas no período de 2011 a 2015:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Desde 3 de fevereiro de 2016 o sujeito passivo explora o restaurante Restaurante 5 ..., sito na Rua ..., em ....
Em todos os restaurantes explorados pelo sujeito passivo, o modelo de negócio é o mesmo: venda de comida ao peso em regime de "self service", sendo este o mais representativo em termos de volume de negócios, e serviço de buffet.
B.2 — Pedido de revisão e Posição do perito do contribuinte (PC)
O sujeito passivo apresentou pedido de revisão da matéria tributável fixada por métodos indiretos solicitando a sua revisão, o que o faz nos termos seguintes:
B.2.1 — O facto do sujeito passivo não dispor de cópias dos ficheiros SAFT de faturação de 2013 e 2014 não significa que não se possa reconstituir a faturação destes anos.
Após a extração do ficheiro mensal SAFT de faturação, o sujeito passivo procede ao seu envio através do site E-fatura, no Portal das Finanças, previamente expurgado dos dados que excedam os elementos referidos no n.° 4 do art.° 3.° do DL n.° 198/2012, de 24 de agosto*.
*Estabelece medidas de controlo da emissão de faturas e outros documentos com relevância fiscal e define a forma da sua comunicação à Autoridade Tributária e Aduaneira. O N.° 4 do art.° 3.° do DL 198/2012, de 24/08 dispõe: A AT disponibiliza no Portal das Finanças o modelo de dados para os eleitos previstos nos n's 1 e 2, devendo dele constar os seguintes elementos relativamente a cada fatura ou documento de conferência de entrega de mercadorias ou da prestação de serviços:
a) Número de identificação fiscal do emitente;
b) Número da fatura ou do documento:
c) Data de emissão;
d) Tipo de documento, nos termos referidos na Portaria n.° 321-A12007, de 26 de março, alterada pela Portaria n.° 1192/2005, de 8 de outubro, que regula o ficheiro normalizado, designado SAF-T (PT);
e) Número de identificação fiscal do adquirente que seja sujeito passivo de IVA, quando tenha sido inserido no ato de emissão;
O Número de identificação fiscal do adquirente que não seja sujeito passivo de IVA, quando este solicite a sua inserção no ato de emissão;
g) Valor tributável da prestação de serviços ou da transmissão de bens;
h) Taxas aplicáveis;
O O motivo justificativo da não aplicação do imposto, se aplicável;
j) Montante de IVA liquidado; k) A menção "IVA— regime de caixa", se aplicável;
l) O número do certificado do programa que os emitiu;
m) identificação do documento de origem,
No entanto, o contribuinte não impediu que a IT tivesse acesso aos elementos existentes antes da criação do ficheiro autónomo, sendo este o ficheiro posterior ao expurgo de determinados dados, para efetuar os testes que entendesse necessário;
B.2.2 — As considerações da IT acerca dos inventários não constituem pressuposto para a aplicação de métodos indiretos de avaliação da matéria tributável;
B.2.3 — O estudo efetuado aos consumos versus faturação parte de premissas erradas, nomeadamente quando é referido que 1 quilo de café dá para 120 chávenas de café; consumos de 3 cafés diários; quebra de 10%; etc.
B.2.4 — Em relação aos TPA (Terminais de Pagamento Automático), a IT limita-se a fazer comparações e a concluir que o sujeito passivo recebeu mais "a dinheiro" do que o registado;
B.2.5 — Inicialmente, a IT apenas refere que as margens declaradas se afastam significativamente da média, quer distrital, quer nacional. Depois refere que as margens calculadas por defeito são superiores às declaradas contabilisticamente. Porém, as conclusões retiradas não constituem pressuposto para o recurso à avaliação indireta;
B.2.6 — Quanto aos critérios de cálculo dos valores corrigidos com recurso a métodos indiretos, a peticionária acrescenta que não pode ser penalizada pelo facto de não estar disponível o rácio referente ao ano de 2014. Igualmente não reconhece a grandeza do rácio disponível para 2013, pelo que não o considera verdadeiro.
Por outro lado, a atividade da requerente é muito diferente das restantes com CAE similar. Não é um restaurante de tipo tradicional, nem um restaurante "não especificado".
Os desperdícios são muito mais significativos, pois tem de ter a comida pronta a servir no buffet, o que não acontece com os outros estabelecimentos.
A aplicação do rácio não tem em conta que os estabelecimentos estão nos primeiros anos de lançamento e de fidelização de clientela, que demora o seu tempo.
Por último, a IT parte da mediana, "que segundo quem sabe mais, não tem as qualidades adequadas, para o efeito."
A posição defendida pelo PC constitui o anexo n.° 2 à ata n.° 67/2017. Da leitura do parecer conclui-se que aquele reitera os fundamentos da petição do pedido de revisão, nada mais acrescentando.
B.3 - Posição da perita da administração tributária (PAT) O laudo do PAT constitui o anexo n.° 1 à ata n.° 67/2017, sugerindo-se a sua integral leitura. No entanto, destacamos o que consideramos essencial da sua análise:
B.3.1 - Quanto aos fundamentos do recurso aos métodos indiretos: Da leitura da ata e do laudo da PAT conclui-se que esta contra argumentou a totalidade dos fundamentos alegados na petição e os surgidos durante o debate contraditório, referindo que:
1 - Não é comunicada à AT a discriminação dos bens transmitidos elou dos serviços prestados. Em devido tempo, a Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD) esclareceu que a informação transmitida à AT apenas deve conter os "dados relevantes para efeitos fiscais", o que não inclui "em caso algum a discriminação dos produtos adquiridos nem deve incluir o NIF do consumidor, se tal não for expressamente solicitado por este".
Portanto, não tem acolhimento o argumento de que a AT podia aceder ao ficheiro previamente comunicado pelo sujeito passivo para fazer os testes que entendesse necessário.
2 - Fruto da circularização dos fornecedores do sujeito passivo, a IT concluiu que os preços unitários que serviram de valorização dos bens inventariados não tiveram em conta os descontos comerciais obtidos. A sobrevalorização dos mesmos foi reconhecida pelo gerente da sociedade no exercício do direito de audição ao projeto do RIT.
3 - Ao longo de 11 páginas do RIT são analisados os consumos de café, descafeinado, águas, sumos, refrigerantes e cerveja. Deste estudo, a IT concluiu pela existência de fortes indícios que demonstram a falta de credibilidade da contabilidade.
4 - A análise conjugada das contas 11- Caixa, 12- Depósitos Bancários e dos extratos bancários permite confirmar a prática de depósitos nas contas bancárias sem o corresponde reflexo na contabilidade. São muitos os exemplos indicados no RIT.
5 - É notório o distanciamento entre as margens brutas declaradas [16,52%, 8,85%, 5,51%, -0,78%3 e 27,75%, respetivamente nos anos de 2011, 2012, 2013, 2014 e 2015) e os rácios disponíveis na base de dados da Autoridade Tributária resultantes dos elementos declarados pelos contribuintes inseridos no mesmo CAE (56107 - restaurantes n.e.) onde se insere a sociedade [SCom01...]. Estes rácios para o ano de 2013 são os que a seguir se indicam:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Por outro lado, as margens brutas apuradas pela IT relativamente a quatro pratos, conforme quadro infra, permitiram comprovar que a margem declarada pelo contribuinte - significativamente mais baixa - não tem qualquer aderência com a realidade:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Em suma, a PAT considera que os fundamentos apresentados no RIT, que serviram de base à aplicação de métodos indiretos, são irrefutáveis e provam a impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata da matéria tributável do contribuinte dos anos em apreço.
B.3.2 - Quanto aos critérios e cálculos usados para a determinação da matéria tributável estimada:
O facto de ter sido aplicado o rácio disponível na base de dados da AT para o ano de 2013 ao valor das compras Compras = Consumos (custo das existências vendidas e das matérias consumidas), atendendo á desconsideração dos inventários por irregularidades na sua valorização e quantificação declaradas de 2014 para a presunção das vendas omitidas neste ano, não prejudicou o sujeito passivo porquanto o valor do rácio (entretanto disponível) do ano de 2014 (47,42%) é superior ao utilizado (46,04%).
Por outro lado, compete ao contribuinte a entrega de uma «declaração de alterações» com vista a um mais correto enquadramento da natureza da atividade desenvolvida nos códigos CAE's existentes.
Consultados os CAE's - Rev.3, a perita entende que o CAE 56103 - restaurantes sem serviço de mesa, poderia traduzir melhor a realidade do contribuinte. No entanto, mesmo que assim seja, consultados os rácios respetivos da base de dados da AT, confirma-se que o indicador que respeita à mediana distrital é superior, nos dois anos, ao rácio utilizado pela IT
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Tendo em conta que a atividade foi desenvolvida em moldes semelhantes, a PAT entende justificada a aplicação da margem bruta sobre as vendas de 46,04%, (mediana distrital de 2013 decorrente dos elementos declarados pelo conjunto de contribuintes enquadrados no mesmo CAE do sujeito passivo), às compras registadas nos anos de 2013 e 2014, para a quantificação do volume de vendas e prestação de serviços destes dois períodos de tributação.
Em conclusão, a PAT entende que a IT recorreu ao critério que considerou o mais adequado à obtenção da matéria tributável em falta, atuando com o propósito de repor a verdade tributária e a capacidade contributiva do contribuinte.
Nem o sujeito passivo, nem o perito por si designado, em momento algum alegam factos concretos e/ou cálculos distintos que permitam apurar resultados diferentes dos apresentados no RIT, limitando-se o PC a afirmar que estava mandatado para aceitar o pagamento total de € 50.000,00 (imposto de IVA e IRC, juros e custas). Por não ter apresentado cálculos ou factos que sustentassem o valor da proposta, contrariamente ao que preconiza o n.° 3 do art.° 74.° da LGT, a PAT entendeu — e bem, na nossa opinião - não estarem reunidas as condições necessárias para o estabelecimento de um Acordo.
C — APRECIAÇÃO DA MATÉRIA TRIBUTÁVEL
C.1 — Pressupostos para aplicação de métodos indiretos
O n.° 1 do art.° 75.° da LGT dispõe que 'Presumem-se verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal".
O relatório da inspeção tributária fundamenta-se em vários argumentos que implicam o recurso à avaliação indireta, sendo de considerar, no essencial:
1 — Inexistência de originais ou cópias dos documentos que titularam as transmissões de bens e prestações de serviços e inexistência dos ficheiros SAFT de faturação:
Os equipamentos de faturação utilizados pelo sujeito passivo são deixados nos estabelecimentos para uso dos cessionários, após a realização de cópias dos dados em suporte "pen". Dados, estes, que são posteriormente apagados das máquinas. O técnico de informática do sujeito passivo afirmou ter sempre fornecido ao gerente da sociedade todas as cópias efetuadas.
Após solicitação dos ficheiros SAFT da faturação, o gerente assumiu não os conseguir obter, nem quaisquer 2's vias das faturas emitidas nos anos de 2013 e 2014, uma vez que não sabendo da importância do conteúdo das "pens", apagou-os, reescrevendo outros dados por cima.
O Contabilista Certificado do contribuinte forneceu os ficheiros SAFT de faturação que guardou após a submissão dos mesmos para o E-fatura. Por esta via, a IT obteve os ficheiros do ano de 2013, excetuando os dos meses de abril e maio, e os do ano de 2014, com exceção dos respeitantes aos meses de janeiro, novembro e dezembro;
2 - Inventários sobrevalorizados:
Analisados os inventários finais de 2012 (inicial de 2013), de 2013 e de 2014, a IT aponta várias incoerências, quer a nível das quantidades inventariadas, quer ao nível dos preços unitários utilizados na sua valorização. Umas e outras inconsistências apontam para a sobrevalorização das existências finais inventariadas.
Em termos quantitativos, são descritos nas páginas 13 à 16 do RIT vários factos indiciadores da falta de credibilidade dos inventários, dos quais apenas referimos dois exemplos:
Cerveja Super Bock: em 31 de dezembro de 2012, foram relacionados 10 barris de cerveja Super Bock, tendo sido adquiridos durante o ano de 2013, 45 barris, a 3 fornecedores. Tendo em conta que a primeira compra foi logo em 4 de janeiro de 2013, não é credível que em 2012 existissem em inventário final 10 barris (teriam sido consumidos em 4 dias?). Por outro lado, a última compra foi realizada a 4 de setembro de 2013 de apenas 1 barril, não sendo plausível que o sujeito passivo o tenha feito para avolumar stock, nem que em 2013-12-31 ainda houvesse 25 barris de cerveja Super Bock, sem compras nos últimos 3 meses.
Vinho Borges Branco: no inventário de 31 de dezembro de 2012, estão relacionadas 120 garrafas, sendo inexistentes as compras deste artigo nos anos de 2013 e 2014. Tendo em conta estas realidades, é impossível a existência de 200 garrafas desta referência no inventário final de 2013 (quantidades superiores à existência inicial).
Em termos valorativos, foram detetados vários artigos avaliados a preços unitários superiores aos reais, referindo-se, a título de exemplo, o caso do vinho do Porto (cf. Pág. 16 do RIT)
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Note-se que no inventário de 2013, o vinho do Porto Vintage 2011 tinha sido valorado a € 12,91
Pelo referido, fica demonstrada a falta de credibilidade dos inventários;
3 - Omissão de faturação em produtos não transformáveis:
A IT procedeu à análise dos consumos versus faturação relativamente ao café, descafeinado, águas, sumos, refrigerantes e cerveja, tendo havido a necessidade de se presumir um consumo médio dos vários produtos nos meses em que não foram entregues ficheiros SAFT de faturação (2 meses do ano de 2013 e 3 meses do ano de 2014). Este consumo médio foi efetuado com base nos consumos diários dos meses em que existe informação disponível.
A desconsideração dos inventários foi imperativa, na medida em que os mesmos foram descredibilizados pela IT, conforme item anterior.
Por outro lado, é de referir que as premissas utilizadas neste estudo foram definidas com margem favorável ao sujeito passivo, conforme se descreve:
De acordo com a generalidade dos fornecedores das várias marcas de café, um café expresso consome 6 a 7 gramas de café em grão, permitindo a elaboração de 140 doses por quilo de café. A IT utilizou um consumo de 120 doses, por quilo. Do resultado ainda se previu um autoconsumo de 3 cafés diários por cada funcionário e uma quebra a título de desperdícios de 10% (acrescente-se que esta percentagem é considerada adequada e aceite pela generalidade dos contribuintes fiscalizados);
Tendo em conta que os ficheiros SAFT de faturação não são claros quanto à descrição de alguns produtos vendidos, a IT optou por converter todas as bebidas em litros (quer as compras, quer as vendas).
A quantidade de bebida considerada consumida nos buffets é de 1 litro por pessoa, claramente calculada por excesso, até porque nos buffets consome-se muitas outras bebidas, designadamente vinho, sangria e espumantes. Também foi assumido uma quebra de 10%, para possíveis desperdícios.
Relativamente a estas bebidas não foram calculadas autoconsumos, na medida em que foram excluídos os garrafões de água comprados, presumindo-se a sua existência para consumo interno.
Do resultado deste estudo, a IT chegou a percentagens de omissão de faturação na ordem dos 54% (2013) e 31% (2014) para o café/descafeinado e 37% (2013) e 54% (2014) no caso das bebidas,
4 - Irregularidades em movimentos nas contas de depósitos à ordem, caixa e suprimentos:
Os saldos dos extratos bancários (Banco 1... e Banco 2...) não coincidem com os relevados na contabilidade (contas 1211 -Banco 1... e 1213 - Banco 2...). Primeiro, há que referir que não são efetuadas reconciliações bancárias. Mas, mais importante é referir que existem movimentos nas contas bancárias que não estão refletidas na contabilidade, conforme exemplos descritos nas páginas 23 e 24 do RIT. Muitos destes exemplos referem-se a depósitos nas contas bancárias (entradas de meios financeiros que muito provavelmente se referem a recebimentos de clientes) que não foram reconhecidos contabilisticamente.
Por outro lado, em determinadas datas, o saldo da conta caixa apresenta-se negativo, o que fisicamente é uma impossibilidade e indicia a prática de omissão de registos de ganhos, nomeadamente de prestação de serviços de restauração.
Os movimentos mais significativos registados nas contas de suprimentos são efetuados exclusivamente através de documentos internos, conforme exemplos relacionados nas páginas 25 á 27 do RIT.
5 - Margens brutas muito reduzidas, até mesmo negativas versus margens praticadas: As margens brutas declaradas pelo sujeito passivo são as que a seguir se indicam, concluindo-se que, para além de muito reduzidas, se afastam substancialmente das declaradas pelos outros contribuintes inseridos no mesmo CAE de atividade, devendo ter-se em conta que estas se encontram influenciadas pelo nível de evasão fiscal que é transversal a todos os setores da economia
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Note-se que não foi apresentada nenhuma razão plausível para a variação das margens declaradas ao longo dos anos.
Foram retirados os seguintes indicadores do sistema informático da Autoridade Tributária:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Ao já referido, é de acrescer o afirmado, por diversas vezes, pelo gerente relativamente ao ter conseguido dinamizar os espaços que explora e quando são transmitidos por cessão de exploração, eles encontram-se em plena atividade e com resultados positivos. Se assim não fosse, ou melhor dizendo, se os resultados contabilísticos negativos e as margens declaradas fossem reais, não conseguiria interessados em adquirir a cedência dos estabelecimentos.
Ainda assim, a IT promoveu outra análise; com base nos ficheiros SAFT de faturação e nos elementos obtidos com base na circularização de fornecedores, tendo em conta os produtos mais comprados (de carne de vaca, carne de porco, aves, peixe, água, cerveja, sumos e refrigerantes, batatas, arroz e café), foi feito o cálculo da margem presumivelmente praticada em 4 pratos: de vaca (dianteiro), de porco (pá York), frango do campo e bacalhau.
Deste exame, a IT obteve margens entre 55,90% e 62,22%, nos 3 primeiros pratos e para o biénio em apreço. Apesar do prato de bacalhau O bacalhau representa cerca de 14,35% (2013) e 8,32% (2014) do total das compras de carne (vaca, porco e aves) e peixe apontar uma margem de 26,15% em 2013 e 32,16% em 2014, deve concluir-se, sem qualquer margem de dúvida, que foram praticadas margens visivelmente superiores às declaradas.
A complementar as apreciações feitas pela PAT, e com as quais afirmamos concordar, desde já diremos que a utilização da margem retirada da base de dados da Autoridade Tributária relativa ao ano de 2013, no cálculo do volume de negócios de 2013 e 2014, se justifica, pois, não sendo possível apurar, diretamente, através da contabilidade do sujeito passivo, a matéria tributável de determinado(s) ano(s), a Autoridade Tributária fica legitimada ao recurso dos métodos indiretos, podendo basear-se em todos os elementos de que disponha quer relativos a esse ano, quer relativos a qualquer outro, para os extrapolar e valorar para o(s) ano(s) em causa, quando nenhuma prova se fez que entre os anos em causa tenham ocorrido circunstâncias que tornassem desadequada essa extrapolação. É de relembrar que o modelo de negócio é sempre o mesmo em todos os restaurantes que o sujeito passivo explorou, segundo informações prestadas pelo gerente.
6 — Prejuízos fiscais declarados durante 3 anos consecutivos:
Conforme leitura do quadro seguinte, os resultados fiscais têm diminuído drasticamente, sendo mesmo negativos no triénio de 2012 a 2014
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Refere a al. a), do n.° 2, do art. 75.° da Lei Geral Tributária, que não se presumem verdadeiros e de boa fé os dados e apuramentos inscritos na contabilidade ou escrita e as declarações apresentadas nos termos previstos na lei quando revelem omissões, erros, inexatidões ou indícios fundados de que não refletem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo.
Pelo anteriormente exposto, concluímos que a contabilidade do sujeito passivo apresenta deficiências importantes que impedem o apuramento da matéria tributável por métodos diretos, desde logo pela comprovada omissão de vendas/serviços prestados, concluindo-se pela impossibilidade de controlar clara e inequivocamente o lucro tributável e o apuramento do IVA em falta, desde logo pelo desconhecimento da real amplitude das omissões, relativamente aos períodos de tributação de 2013 e 2014.
Encontram-se assim reunidos os pressupostos enunciados na ai, b) do n.° 1 do art.° 87.° e na al, a) do art.° 88.°, ambos da Lei Geral Tributária, no art.° 59.° do Código do lRC e no art.° 90.° do Código do IVA que prevêem em caso de impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata dos elementos indispensáveis à correta determinação da matéria tributável o recurso à avaliação indireta.
Pelo exposto, afigura-se-nos que os fundamentos que sustentam a aplicação de métodos indiretos se encontram devidamente comprovados justificando-se assim o recurso aos mesmos, no sentido de se obter a quantificação da matéria tributável em cédula de IRC e IVA.
C.3 - Quantificação da matéria tributável
No cálculo do lucro tributável presumido a IT adotou os critérios referidos no ponto V (pág. 35 à 39) do RIT.
O montante anual dos serviços prestados de restauração presumivelmente realizados foi obtido pelo recurso ao rácio da mediana distrital da margem bruta sobre as vendas disponível para o ano de 2013.
Tal como já foi referido, foi utilizada a margem disponível da base de dados da AT relativa a 2013 no cálculo do volume de negócios de 2013 e 2014, tendo em conta que entre os anos em causa não ocorreram circunstâncias que levassem a decidir de forma diferente.
Dado que foram descredibilizados os inventários, o CMVMC foi considerado igual ao valor das Compras declarado, em cada um dos anos analisados.
Atendendo às premissas anteriores, o volume de negócios em falta totalizou os montantes de € 483.985,49 e € 341.741,70, respetivamente nos anos de 2013 e 2014. Ao volume de negócios apurado referente à área da restauração, foi adicionado o montante recebido pelos cessionários.
Seguidamente apresentam-se os cálculos efetuados:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(…)
Encontrando-se reunidos os pressupostos para aplicação de métodos indiretos cabe ao contribuinte, ao não concordar com os critérios e cálculos efetuados, o ónus de provar o excesso na quantificação da matéria tributável, conforme dispõe o n.° 3 do art.° 74.° da Lei Geral Tributária.
No apuramento da matéria tributável por métodos indiretos procura-se atingir uma aproximação da realidade tributária, pelo que existirá sempre alguma margem de erro.
No entanto, para que possa relevar o erro na quantificação (excesso) é necessário que fique provado que o critério de que a administração tributária se socorreu se afaste significativamente dessa realidade, conduzindo a resultados injustos.
Sobre esta matéria - a quantificação - será de referir que o relatório indica os critérios, os quais consideramos adequados á obtenção da quantificação apurada, quer em sede de IRC, quer em sede de IVA, tendo em conta que o valor omitido dos serviços prestados foi obtido a partir de elementos objetivos e racionais.
Acresce que estes elementos, quanto muito, são obtidos por defeito, na medida em que são calculados com base nos resultados declarados pelo conjunto de contribuintes inseridos no mesmo CAE em que se insere o contribuinte, sabendo-se que estão influenciados pelos níveis de evasão fiscal comummente praticados.
A vantagem da mediana em relação à média é que a mediana pode dar uma ideia melhor de um valor típico porque não é tão distorcida por valores extremamente altos ou baixos. A média pode ser distorcida por um pequeno número de valores extremamente altos ou baixos.
Por outro lado, o mesmo indicador (margem bruta sobre as vendas) entretanto calculado e disponível para o ano de 2014, revela-se mais elevado do que o existente para 2013.
Tendo a Administração Tributária demonstrado, como lhe competia, a verificação dos pressupostos legais que permitem a tributação por métodos indiretos atuando com um critério quantificador dos possíveis, competia ao contribuinte o ónus de demonstrar que houve excesso na quantificação.
Não basta pôr em dúvida a existência e quantificação do facto tributário, antes ser necessário, à reclamante, trazer novos elementos (credíveis), que pudessem alterar a quantificação alcançada pela IT.
A "proposta de quantificação" apresentada pelo PC (pagar o montante total de € 50.000,00, incluindo juros e coimas, para além do próprio imposto) é sintomática do reconhecimento, por parte do sujeito passivo, de que os resultados declarados não correspondem aos efetivamente obtidos. Em conclusão, é nossa convicção que a Inspeção conseguiu, através da metodologia adotada, obter o resultado mais próximo possível daquele que seguramente seria obtido, diretamente, através da sua escrita, se esta não apresentasse omissões, garantindo uma menor margem de erro.
Pelo anteriormente exposto, concorda-se com a posição do perito da administração tributária, que aqui se dá por integralmente reproduzida.
D — APURAMENTO DA MATÉRIA TRIBUTÁVEL (n.° 6, do art.° 92.°, da Lei Geral Tributária)
Face a tudo antes descrito, propomos que a RESOLUÇÃO que venha a ser assumida tenha em linha de conta as correções inicialmente propostas pelo serviço de inspeção tributária, conforme mapas que a seguir se apresentam:
(…)
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(…)”
[cfr. parecer constante da peça do SITAF n.º 004714704.].
K. Em cumprimento do despacho anteriormente mencionado foi emitida liquidação de IRC relativa a 2013 com o seguinte teor:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[cfr. liquidação constante da peça do SITAF n.º 004714704].
L. Em cumprimento do despacho anteriormente mencionado foi emitida liquidação de IRC relativa a 2014 com o seguinte teor:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[cfr. liquidação constante da peça do SITAF n.º 004714704].
M. Na sequência das liquidações anteriormente referidas foram emitidas as seguintes notas de cobrança:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[cfr. notas de cobrança constantes da peça do SITAF n.º 004714704].
N. Previamente à notificação do projeto de relatório inspetivo final a Impugnante não foi notificada da intenção de aplicação de métodos indiretos de quantificação da obrigação tributária [facto incontrovertido].
O. A Impugnante procedeu à submissão dos ficheiros SAFT no portal das finanças [facto incontrovertido].
P. A Impugnante não apresentou os ficheiros SAFT de faturação para a totalidade dos meses objeto de inspeção. [facto incontrovertido].
Q. O sistema e-fatura não contém os dados necessários à reconstituição dos ficheiros SAFT de faturação. [cfr. prova testemunhal].
R. A Impugnante servia refeições em regime de buffet e comida vendida ao peso [facto incontrovertido]. S. As sobras nos restaurantes que servem em regime de buffet são superiores às que se verificam nos restaurantes do “tipo tradicional”. [cfr. prova testemunhal].
T. Os funcionários da Impugnante almoçavam e jantavam nos restaurantes.
[facto incontrovertido].
U. A Impugnante não procedia ao registo dos autoconsumos referidos no facto precedente. [facto incontrovertido].
Atenta a conformação da instância efetuada pelas partes, nomeadamente em função dos pedidos formulados e respetivas causas de pedir, não se provaram quaisquer outros factos com pertinência para a decisão a proferir.
Nomeadamente não se provou:
V. O número de funcionários que a Impugnante tinha ao serviço em 2013 e 2014.

Motivação da matéria de facto:
No que respeita à seleção da matéria de facto, importa referir que apenas foi levada ao probatório a matéria de facto estritamente necessária à prolação da decisão.
No que respeita à fundamentação, a convicção do Tribunal baseou-se essencialmente numa apreciação crítica [artigos 396.° do Código Civil e 607.°, n.º 5 do CPC, ex vi do art.º 2.° do CPPT], e à luz das regras da experiência comum, do exame da globalidade dos documentos (juntos aos autos e constantes do procedimento administrativo), não impugnados, bem como da inquirição das testemunhas arroladas.
Nesse domínio importa referir que o Tribunal ouviu na qualidade de testemunhas (i) «DD» (contabilista certificado), (ii) «BB» (antiga funcionária da Impugnante e divorciada de sócio da Impugnante), (iii) «EE» (cozinheiro da Impugnante em 2013 e 2014), arroladas pela Impugnante e (iv) «FF» (inspetor tributário).
No que tange ao teor das suas declarações, sobressaiu o seguinte:
• «DD»:
o A IT pediu os ficheiros de faturação e foram entregues os que tinha, não se recordando de eventuais faltas. O sistema avisava se estivesse algum em falta aquando da submissão da modelo 22.
o A AT “devolvia” um resumo da submissão do SAFT e que foi facultado ao inspetor. Não se recordar se “as linhas” eram comunicadas. Os ficheiros tinham o mesmo teor dos que eram carregados no portal;
o Recordar-se de “problemas” com alguns dos SAFTs;
o A Impugnante tinha por atividade a abertura de restaurantes e depois de estes estarem a funcionar, ceder a sua exploração;
o Conhecia os restaurantes como cliente, tinham serviço de self service e comida a peso. Não havia serviço à lista;
o Era utilizado um cartão onde era registado o consumo que depois servia de base à fatura que era paga em dinheiro ou cartão;
o “Imagina” que se estragasse muita comida (sobras) porque a comida já estava pronta. Os desperdícios são superiores que nos restaurantes tradicionais. A “ilha” tem de estar abastecida desde que haja clientes (muitos ou poucos);
o “Presume” que os funcionários fizessem as refeições no restaurante, não se recordando do seu número;
o Os restaurantes nunca dão o movimento esperado nos primeiros dois anos de atividade. Por vezes era retomada a “casa” porque os que “subalugavam” (cessionários da exploração) não conseguiam suportar os encargos;
o Com o fecho das contas eram confirmado o saldo dos fornecedores e perante a resposta da gerência da inexistência de dívidas saldava as contas por contrapartida da conta do sócio. Admite a existência de recibos dos fornecedores e a possibilidade de pagamentos serem contabilizados por contrapartida da conta caixa quando devessem ser na conta do sócio.
• «BB»:
o Fazia um pouco de tudo. Na hora de almoço trabalhava na caixa / balança.
o Os restaurantes trabalhavam com buffet e comida a peso, ao fim de semana com buffet livre (comida e bebida à discrição) e música.
o O peso da comida apenas era registado nos cartões individuais, no buffet livre era usada uma pulseirinha (não havia pesagem, mas também havia cartão). Os dois sistemas eram usados em simultâneo. No buffet apenas era registado no cartão as bebidas não incluídas como whisky.
o O cartão era apresentado no caixa para pagamento e o programa de faturação utiliza os respetivos dados para a fatura. Não é possível faturar sem cartão; o Apostam na comida tradicional e se o tabuleiro ficar a 1/3 é substituído. Disponibilizavam 12 tabuleiros de comida diferentes;
o Nem todas as comidas podem ser reaproveitadas depois de 3,5 horas em “banho-maria”. O desperdício é grande e ofereciam as sobras;
o O início da abertura é complicado, especialmente porque as pessoas não estavam habituadas a este tipo de restaurantes;
o Tiveram 8 restaurantes. Arranjavam um espaço “maltratado”, arranjavam-no, punham o restaurante a funcionar, formavam a equipa e quando começava a “trabalhar bem” cediam a exploração. Nunca ficavam muito tempo;
o “Ninguém pega em restaurante fechado porque sabe que o início vai ser complicado. Nós fazíamos porque sabemos da atividade” o Funcionários almoçavam e jantavam. Tomavam também pequeno-almoço porque só iam almoçar pelas três e meia da tarde. “No final toda a gente comia o que houvesse”;
o Podia haver mais dinheiro em caixa que faturação. Tiravam faturas todos os dias, mas por vezes havia pagamentos mais tarde de firmas e clientes regulares;
o Desconhecer as contas que eram domínio do ex-marido, mas saber que dava prejuízo.
• «EE»:
o A comida era vendida durante a semana ao peso e em buffet livre, à noite e ao fim-de-semana em buffet livre; o Serviam 7 tabuleiros de comida tradicional e outros com acompanhamentos. Quando estes ficavam “descompostos” eram substituídos;
o Os restaurantes tradicionais têm 2 ou 3 pratos já feitos sendo os restantes confecionados na hora. O desperdício é menor.;
o No restaurante “Restaurante 2 ...” eram 7 funcionários. No restaurante “Restaurante 1 ...” 5 ou 6. Os funcionários almoçavam e jantavam no restaurante. Desde que entravam até que saiam comiam e bebiam sem pagar.
o O objetivo era o “trespasse”.
o Os preços eram reduzidos para “fazer a casa”.
• «FF»:
o Não foram exibidas as faturas emitidas pela empresa. Foi-lhe transmitido que não existiam cópias destas. Pediu os SAFT, mas não foram todos entregues, tendo-lhe sido dito que teriam sido eliminados. Os ficheiros que lhe foram apresentados estavam completos;
o A comunicação para o “e-fatura” inicialmente suportava-se nos SAFT, mas o teor não é comunicado, apenas os elementos essenciais. O sistema apenas mantém os elementos que pode guardar, pelo que não é possível a reconstituição do SAFT com as declarações submetidas pela Impugnante;
o Nos meses em que não dispunha do SAFT apenas conhecia o valor mensal da faturação;
o Os inventários tinham vários erros descritos no relatório. Os controlos quantitativos revelaram disparidades;
o Partiu do pressuposto que nos meses omissos o teor das faturas era idêntico à média do pretérito. A comida a peso era a mais representativa. Até as bebidas eram discriminadas. No buffet estava tudo integrado;
o As bebidas faturadas eram muito inferiores às compras, mesmo considerando um consumo de um litro de bebida por pessoa no buffet;
o Não era feita a conciliação bancária, a conta caixa assumiu saldos negativos ao longo do ano, o que era demonstrativo que a contabilidade não refletia a realidade;
o Os suprimentos não estavam suportados em documentos e eram registados por contrapartida de regularização de saldos de outras contas como fornecedores;
o Os rendimentos dos gerentes eram incompatíveis com o valor dos suprimentos;
o O teste dos consumos apontou para margens muito superiores às declaradas. O restaurante não estava em funcionamento por isso não puderam fazer o controlo, mas a pesagem era prejudicial à Impugnante porque só consideraram a proteína e acompanhamento. Nas bebidas e café consideraram quebras de 10%; o Utilizaram como critério a mediada da margem no setor no distrito e que era menor que as margens apuradas;
o Não consideraram autoconsumos de bebidas porque não foram contabilizadas as compras de água que se presumiu terem esse destino. A percentagem não reflete o consumo real porque não levou em conta os vinhos e a sangria, apenas a cerveja e mesmo assim os valores eram díspares.;
o Não considerou o autoconsumo de comida porque não fez análise quantitativa da comida;
o Este tipo de restaurantes não tem CAE específico. Os restaurantes tradicionais são muito mais representativos;
o Nos depósitos em numerário pode identificar-se o depositante, mas não a proveniência do dinheiro;
o Desconsiderou inventários porque o seu valor era relativamente constante.
No geral as testemunhas prestaram declarações de forma razoavelmente espontânea, sem contradições de monta, demonstrando a origem do seu conhecimento pelo que se reputa as mesmas de credíveis e, como tal, em abstrato, passíveis de sustentar a convicção do Tribunal.
Resultou claro que o modelo de negócio da Impugnante assentava em pegar em restaurantes fechados e após estes estarem a operar em “velocidade de cruzeiro”, ceder a sua explorar e iniciar idêntico procedimento noutro estabelecimento e com as mesmas características.
Importa salientar que o essencial das declarações é compaginável com o teor dos documentos constantes dos autos, pelo que se considerou que estas podiam, genericamente, sustentar a formação da convicção do Tribunal.
Assim, contribuíram para a fixação dos factos as seguintes testemunhas:
• Facto «Q» a testemunha (iv);
• Factos «S» e «T» as testemunhas (i), (ii) e (iii);
No que respeita à matéria de facto levada ao probatório pela negativa, importa referir que a instrução dos autos não permitiu formar qualquer convicção quanto ao efetivo número de funcionários, seja pela indeterminação dos depoimentos, seja pela sua divergência quanto aos números referidos pela IT como constantes das folhas de remuneração ou das declarações a esse respeito pelo gerente da Impugnante em sede do procedimento inspetivo.
Consequentemente, na dúvida considerou-se o número como não assente, nos termos do art.º 74.º da LGT.”
***
2.2 – O direito

Constitui objecto do presente recurso a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, proferida em 4.09.2024 que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida contra as liquidações de IRC respeitantes aos exercícios de 2013 e 2014.
A Recorrente vem invocar o erro de julgamento de facto, o erro de julgamento de direito assente na falta de fundamentação dos métodos indirectos e da sua quantificação e o erro de julgamento na quantificação da matéria colectável.

2.2.3. Do erro de julgamento de facto

A Recorrente vem invocar o erro de julgamento de facto, defendendo que deve alterar-se dos factos não provados o ponto V. de onde decorre que “O número de funcionários que a impugnante tinha ao seu serviço em 2013 e 2014”, para facto provado com a seguinte redação: “No ano de 2013, em média, houve 4 pessoas a auferir rendimentos pagos pelo SP e no ano de 2014, em média 11 pessoas”, na medida em que do relatório do procedimento inspectivo, II.3.8, decorre que “Todavia, consultando as declarações Mensais de Remunerações declaradas pelo SP, no ano de 2013, em média, houve 4 pessoas a auferir rendimentos pagos pelo SP e no ano de 2014, em média 11 pessoas”
Vejamos.
Como dispõe o n.º 1 do artigo 662.º do CPC, subsidiariamente aplicável ao contencioso tributário, os Tribunais Centrais, enquanto tribunais de recurso, devem “(…) alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”
Com efeito, parafraseando António Abrantes Geraldes (in Recursos em processo civil, 7ª Edição actualizada, Almedina, pag. 333) “quando esteja em causa a impugnação de determinados factos cuja prova tenha sido sustentada em meios de prova submetidos a livre apreciação, a Relação deve alterar a decisão da matéria de facto sempre que, no seu juízo autónomo, os elementos de prova que se mostrem acessíveis determinem uma solução diversa, designadamente em resultado da reponderação dos documentos, depoimentos e relatórios periciais, complementados ou não pelas regras de experiência”
Nesta medida, verificados os pressupostos que decorrem do disposto no artigo 662.º do Código do Processo Civil, assiste a este Tribunal o poder de alterar a decisão de facto fixada pelo Tribunal a quo, competindo-lhe reapreciar as provas em que assentou a decisão impugnada objecto de recurso, bem como apreciar oficiosamente outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre as questões controvertidas.
Acresce que, como decorre do n.º 4 do artigo 607.º do Código de processo Civil “Na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência.”
Ora, “para demonstrar a realidade que alega em juízo a parte deve produzir prova, podendo fazê-lo através de prova documental, testemunhal, pericial, por inspecção ou por confissão por declaração de partes – cf. art.ºs. 341.º do CC e 410.º a 526.º do CPC
Depois, o tribunal forma a sua convicção sobre a prova atendendo a todos os meios de prova produzidos. Nesta análise, o tribunal goza de uma ampla margem de discricionariedade de apreciação, controlável apenas através de fundamentação da sentença, pela motivação ai indicada, que deve ter-se por acertada quando seja alicerçada em argumentos coerentes, razoáveis e plausíveis, que se coadunem com as regras da racionalidade, da lógica, da ciência e da experiência comum. Ou seja, em matéria de prova vigora o princípio da livre apreciação. O tribunal examina e avalia livremente a prova produzida, segundo a sua prudente convicção, valendo o referido princípio, de forma plena, frente à prova testemunhal, pericial, por inspecção, ou por declaração de partes. Quanto às principais ressalvas ao princípio, reconduzem-se aos factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, àqueles que só possam ser provados por documentos, aos factos que estejam plenamente provados, por documento, por acordo ou confissão das partes - cf. art.ºs 413.º, 466.º, n.º 3 e 607.º, n.º 5, do CPC.” – cfr. Acórdão do TCA Sul de 19.10.2017, proc. n.º 985/16.5BEALM
Com efeito, à luz do princípio da livre apreciação da prova, “um facto resultará provado (ou não) consoante o juiz, perante a prova produzida, se tenha convencido de que o mesmo incorreu efectivamente ou não (…)” – cfr. Helena Cabrita, in “A sentença cível, fundamentação de facto e de direito, 2ª edição Revista e Actualizada, Almedina, pag. 185.
No entanto, a livre apreciação da prova, enquanto princípio orientador de valoração da mesma, tem limites relativamente àqueles factos para cuja prova a lei exige especial formalidade, só podendo ser provados por documentos ou estejam plenamente provados, de que são exemplo as situações previstas nos artigos 364.º n.º 1, 393.º e 394.º n.º 1, todos do Código Civil.
Face a tais princípios, cumpre agora aferir se assiste razão à Recorrente, quanto à impugnação da matéria de facto, nos termos por ela propostos.
Retornando ao caso presente, sustenta a Recorrente que em vez do facto não provado V deve ser considerado provado que “No ano de 2013, em média, houve 4 pessoas a auferir rendimentos pagos pelo SP e no ano de 2014, em média 11 pessoas”
Ora, consta da motivação da decisão recorrida que “No que respeita à matéria de facto levada ao probatório pela negativa, importa referir que a instrução dos autos não permitiu formar qualquer convicção quanto ao efetivo número de funcionários, seja pela indeterminação dos depoimentos, seja pela sua divergência quanto aos números referidos pela IT como constantes das folhas de remuneração ou das declarações a esse respeito pelo gerente da Impugnante em sede do procedimento inspetivo. Consequentemente, na dúvida considerou-se o número como não assente, nos termos do art.º 74.º da LGT” – fim de citação.
Perscrutado o relatório do procedimento inspectivo, coligido no ponto F. da matéria de facto assente, no ponto III.3.8 do mesmo decorre que “Em termo de declarações, anexo 1, o gerente disse ter tido, em média, no restaurante Restaurante 1 ..., 10 pessoas a trabalhar, ele incluído, e no restaurante Restaurante 2 ..., 12 pessoas e aos fins de semana 15. Todavia, consultando as Declarações Mensais de Remunerações (DMR) declaradas pelo SP, no ano de 2013, em média, houve apenas 4 pessoas a auferir rendimentos pagos pelo SP e no ano de 2014, em média, 11 pessoas;”
Ora, a Recorrente, para além de somente sustentar a sua posição no relato do relatório do procedimento inspectivo relativamente ao termo de declarações proferido pelo seu gerente em sede inspectiva, não logrou apresentar qualquer outro meio de prova por forma a validar as declarações prestadas.
Acresce que, revisitada a prova testemunhal produzida e como decorre da motivação da matéria de facto assente, dos depoimentos prestados não se consegue retirar tal facto.
A única testemunha que fez referência ao n.º de funcionários, a testemunha «EE», apenas afirmou que no restaurante “Restaurante 2 ...” eram 7 funcionários e no restaurante “Restaurante 1 ...” 5 ou 6.
Assim, tal como decidido em sede da decisão recorrida, não é possível com os elementos que constam dos autos concluir pela média do n.º de funcionários no ano de 2013 e de 2014, nem sequer que “houve 4 pessoas a auferir rendimentos pagos pelo SP e no ano de 2014, em média 11 pessoas”, pois as declarações prestadas pelo gerente da Recorrente em sede do procedimento inspectivo não foram confirmadas por nenhum dos meios de prova apresentados nos autos.
Acresce que, a Recorrente também não logrou justificar/contrariar a divergência quanto aos números referidos pelo inspector tributário como constantes das folhas de remuneração e as declarações a esse respeito pelo gerente da Recorrente em sede do procedimento inspetivo, a que se faz referência na motivação da matéria de facto assente.
Ora, considerando que ao abrigo do disposto no artigo 413.º do Código do Processo Civil “o tribunal deve tomar em consideração todas as provas produzidas, tenham ou não emanado da parte que devia produzi-las (…)”, o Tribunal a quo encontrava-se obrigado a considerar todas as provas que decorrem dos autos por forma a formar a sua convicção, o que efectivamente se verifica.
Assim, não tendo a Recorrente sido capaz de comprovar os factos que pretendia que fossem considerados comprovados, não se vislumbra razão para divergir do sentido decisório do Tribunal a quo relativamente à materialidade por aquele fixado.
Nesta senda, impõe-se negar provimento ao erro da matéria de facto alegado pela Recorrente.

2.2.3. Do erro de julgamento de direito

Estabilizada a matéria de facto, cumpre apreciar e decidir do erro de julgamento de direito sustentado pela Recorrente quanto à falta de fundamentação do relatório do procedimento inspectivo, ao vício de violação de lei e à errónea quantificação e manifesto excesso de capacidade contributiva.

2.2.4. Da falta de fundamentação do relatório do procedimento inspectivo

A Recorrente vem alegar que o relatório não se encontra fundamentado, quer quanto à determinação da matéria colectável, por via dos métodos indirectos, quer quanto à quantificação da mesma.
Vejamos.
A fundamentação dos actos administrativos em geral constitui um imperativo constitucional, expressamente vertido no artigo 268° n.º 3 da Constituição da Republica Portuguesa.
Em obediência ao dever geral de fundamentação dos actos administrativos previsto na Constituição da Republica Portuguesa, assim como nos artigos 152.º e 153.º do Código do Procedimento Administrativo, conjugados com o que dispõe o artigo 77.º da Lei Geral Tributária, os actos têm de se encontrar fundamentados de forma expressa, clara, congruente e suficiente.
A fundamentação tem de ser suficiente e congruente, na medida em que o conteúdo do acto tem de ter uma relação lógica com os fundamentos invocados e tornar claro os pressupostos tidos em conta pelo autor do acto.
Os actos administrativos devem apresentar-se, formalmente, como disposições conclusivas lógicas de premissas correctamente desenvolvidas, e, permitir, através da exposição sucinta dos factos e das regras jurídicas em que se fundam, que os seus destinatários concretos, pressupostos cidadãos diligentes e cumpridores da lei, façam a reconstituição do itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido pela entidade dissidente.
Acresce que, se impõe a distinção entre fundamentação formal e fundamentação material, isto porque, uma coisa é saber se a Autoridade Tributária e Aduaneira deu a conhecer os motivos que a motivaram a actuar como actuou, as razões em que fundou a sua actuação, questão que se situa no âmbito da validade formal do acto, situação distinta e situada já no âmbito da validade substancial do acto, é saber se esses motivos correspondem à realidade e se, correspondendo, são suficientes para legitimar a concreta actuação administrativa.
Distinguindo a dimensão formal e a dimensão substancial do dever de fundamentação, e parafraseando Vieira de Andrade, (in “O dever de fundamentação expressa de actos administrativos”, Almedina, 2003, pág. 231), a diferença está “em que o dever formal se cumpre pela apresentação de pressupostos possíveis ou de motivos coerentes e credíveis; enquanto a fundamentação material exige a existência de pressupostos reais e de motivos correctos susceptíveis de suportarem uma decisão legítima quanto ao fundo”.
No caso presente o Tribunal a quo considerou que “Decorre do teor da fundamentação anteriormente transcrita que a Administração Fiscal explicou com cristalina clareza os motivos pelos quais entendia que a contabilidade da Impugnante não merecia credibilidade e pela necessidade de utilização de métodos indiretos. Também resulta claro o entendimento de que por o modelo de negócio da Impugnante incluir a venda de comida a peso e o regime de buffet que não era possível converter a aquisição das compras em vendas de refeições, tendo entendido que deveria usar a mediana do rácio setorial daquele CAE no distrito A utilização de fórmulas matemáticas, embora possa não ser acessível a todos, é uma necessidade resultante da utilização daqueles métodos, estas não têm uma especial complexidade na medida em que consistem em operações aritméticas elementares e, caso a Impugnante porventura não fosse capaz de apreender tal conteúdo, bastaria socorrer-se do auxílio do seu contabilista certificado ou do seu perito no procedimento de revisão. Está em causa uma sociedade comercial que realiza uma atividade comercial de elevado valor pelo que tem a obrigação de dispor dos meios técnicos necessários à sua atividade e relação com as autoridades. Independentemente da bondade dos resultados da utilização de tal modelo (que serão apreciados a final) e da sua efetiva compreensão por um leigo, o certo é que a sua utilização se encontra adequadamente fundamentada e não é desproporcionadamente complexa.” – fim de citação
Ora, como resulta do relatório do procedimento inspectivo, vertido no ponto F. da factualidade assente, a actuação da Autoridade Tributária e Aduaneira, decorreu das várias irregularidades detectadas, como seja i) a inexistência de originais ou cópias dos documentos que titularam transmissões de bens e prestações de serviços e cópias dos ficheiros SAFT da faturação ii) inventários sobrevalorizados iii) a omissão de facturação em produtos não transformáveis, iii) irregularidades em movimentos nas contas bancárias que não estão refletidas na contabilidade, iv) suprimentos sem suporte documentai ou inadequado v) margens brutas muito reduzidas, sendo mesmo negativas em 2014 vi) prejuízos fiscais declarados durante 3 anos consecutivos.
Nesta medida, tal como considerou o Tribunal a quo, é perceptivel, por decorrer da fundamentação apresentada no relatório do procedimento inspectivo, as razões que nortearam a actuação da Autoridade Tributária e Aduaneira.
Acresce que, a Recorrente vem tentar contrariar os vários factos plasmados no relatório do procedimento inspectivo.
Ora, saber se colhem ou não as razões invocadas é matéria que vai para além da formalidade da fundamentação, entrando já no domínio da substância da decisão, do vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto e/ou de direito, que já não no da validade formal do acto.
Quanto à quantificação da matéria tributável e como foi dado conta na sentença recorrida, decorre do relatório do procedimento inspectivo, coligido no ponto F da matéria de facto assente o seguinte:
“V.2.2. Fundamentação da adequação do critério
Dado o modelo de negócio do SP, que mistura comida ao peso com o regime de buffet, torna-se extremamente difícil fazer a quantificação da matéria tributável por conversão direta das compras em prestações de serviços. Assim esta solução revela-se como mais apropriada, atendendo que não foram detetados factos que façam diferenciar este SP de outros com a mesma atividade. O uso da mediana é justificado por ser a estatística mais resistente, que expurga os valores mais altos e baixos da amostra de dados, sendo menos afetada pelas situações excecionais.”
Como tal, é perfeitamente perceptivel qual o critério utilizado para determinar a matéria colectável, assim como as razões de tal escolha.
Entendido o dever de fundamentação expressa na sua dimensão formal, impõe-se concluir que, no caso concreto, a Autoridade Tributária e Aduaneira externou as razões de facto e de direito que estão na base da decisão em termos que as tornam apreensíveis para o seu destinatário e, dessa forma, cumpriu aquele dever.
Nesta conformidade, a fundamentação que foi levada ao conhecimento da Recorrente contem os elementos suficientes para a tornar ciente dos motivos da impossibilidade da comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável, negando-se provimento no que a este vício formal contende.

2.2.3.2 Do erro de julgamento quanto à falta de pressupostos para a aplicação de métodos indirectos

A Recorrente vem também alegar que a Autoridade Tributária e Aduaneira não demonstrou a impossibilidade de determinação exacta da matéria colectável pelo método directo.
Vejamos.
Quanto à determinação da matéria colectável por via da avaliação indirecta, o nosso ordenamento jurídico tributário consagra o princípio do sistema declarativo, como meio de apuramento do valor tributável, surgindo as outras vias pela iniciativa da Autoridade Tributária e Aduaneira, como meios subsidiários ou residuais, o que significa que vigora a declaração do contribuinte, nos termos do que dispunha à data o artigo 16.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, presumindo-se a veracidade do declarado, como decorre do artigo 75.º n.º 1 da Lei Geral Tributária.
No entanto, nos termos do disposto nos artigos 58.º e 63.º da Lei Geral Tributária e artigo 133.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, são conferidos à Autoridade Tributária e Aduaneira poderes de descoberta da verdade material da situação tributária dos contribuintes, podendo esta proceder à correção das declarações apresentadas sempre que resultem de outros elementos ao seu dispor omissões nelas praticadas, cessando como tal a presunção de veracidade dos rendimentos declarados, tal como dispõe a alínea a) do n.º 2 do artigo 75.º da Lei Geral Tributária.
Isto é, a Autoridade Tributária e Aduaneira poderá emitir liquidação quando os elementos apurados permitam formar a séria convicção sobre a existência do facto tributário não declarado (total ou parcialmente) pelo sujeito passivo de imposto, no cumprimento do princípio da verdade material, conforme estatui o artigo 58.º nº 1 da Lei Geral Tributária.
Acresce que, como decorria à data do disposto no n.º 1 do artigo 99.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas “A Direcção -Geral dos Impostos procede à liquidação adicional quando, depois de liquidado o imposto, seja de exigir, em virtude de correcção efectuada nos termos do nº 10 do artigo 90º ou de fixação do lucro tributável por métodos indirectos, imposto superior ao liquidado”
Acresce que, o artigo 87.º da Lei Geral Tributária, enunciando os pressupostos da realização da avaliação indirecta estatui que “1 - A avaliação indirecta só pode efectuar-se em caso de:
a) Regime simplificado de tributação, nos casos e condições previstos na lei;
b) Impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável de qualquer imposto;
c) A matéria tributável do sujeito passivo se afastar, sem razão justificada, mais de 30% para menos ou, durante três anos seguidos, mais de 15% para menos, da que resultaria da aplicação dos indicadores objectivos da actividade de base técnico-científica referidos na presente lei.
d) Os rendimentos declarados em sede de IRS se afastarem significativamente para menos, sem razão justificada, dos padrões de rendimento que razoavelmente possam permitir as manifestações de fortuna evidenciadas pelo sujeito passivo nos termos do artigo 89.º-A;
e) Os sujeitos passivos apresentarem, sem razão justificada, resultados tributáveis nulos ou prejuízos fiscais durante três anos consecutivos, salvo nos casos de início de actividade, em que a contagem deste prazo se faz do termo do terceiro ano, ou em três anos durante um período de cinco.
f) Acréscimo de património ou despesa efectuada, incluindo liberalidades, de valor superior a (euro) 100 000, verificados simultaneamente com a falta de declaração de rendimentos ou com a existência, no mesmo período de tributação, de uma divergência não justificada com os rendimentos declarados.
2 - No caso de verificação simultânea dos pressupostos de aplicação da alínea d) e da alínea f) do número anterior, a avaliação indirecta deve ser efectuada nos termos dos n.os 3 e 5 do artigo 89.º-A.“
Nesta senda, “há-de caber, em princípio, à Administração o ónus de prova da verificação dos pressupostos legais (vinculativos) da sua actuação, designadamente se agressiva (positiva e desfavorável); em contrapartida, caberá ao administrado apresentar prova bastante da ilegitimidade do acto, quando se mostrem verificados estes pressupostos” (cfr. Vieira de Andrade, in "A Justiça Administrativa" (Lições), 2° edição, p. 569).
Com efeito, é consabido que àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado, competindo àquele contra quem a invocação é feita a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado - cfr. artigo 342.º n.ºs 1 e 2 do Código Civil e artigo 74.º n.º 1 da Lei Geral Tributária.
Ou seja, para desconsideração dos elementos declarados, impõe-se à Autoridade Tributária e Aduaneira carrear elementos objetivos e seguros que demonstrem com um elevado grau de certeza a existência e quantificação dos factos tributários não declarados na medida em que contrariam a presunção de verdade e boa-fé da declaração do contribuinte, facto que é constitutivo do direito à liquidação adicional, cujo ónus da prova não pode deixar de recair sobre a mesma, nos termos do n.º 1 do artigo 74.º da LGT, demonstrando então a existência e o conteúdo do facto tributário que afirma ocorrer.
Apesar de entender-se que tal prova, a mais das vezes, não pode ser feita de uma forma directa ou patente, na medida da sua impossibilidade, pode, no entanto, resultar de circunstâncias colaterais e indiretas que, indiciem fundadamente, pelas regras da experiência comum, um determinado resultado que não o declarado, devendo, então, assentar em pressupostos objetivos e não em meras suposições ou juízos de natureza puramente subjetiva.
Nesta senda, cabe pois à Autoridade Tributária e Aduaneira abalar a presunção da veracidade da declaração do imposto pelo contribuinte, atento o sobredito princípio da declaração vigente, pois, com efeito, quem tem a seu favor uma presunção legal está dispensado da prova do facto presumido, conforme prescrevem os artigos 349.º e 350.º nº 1 do Código Civil, o que significa que se a Autoridade Tributária e Aduaneira não fizer prova da formação do seu juízo, a questão relativa à legalidade do seu agir terá de ser resolvida contra ela, sem necessidade de se analisar se o contribuinte logrou ou não provar, em sede inspectiva ou em Tribunal, a veracidade da declaração e a inexistência do facto tributário que a Autoridade Tributária e Aduaneira considerou verificado para proceder à liquidação adicional.
Enunciado o quadro legal aplicável ao caso, cumpre aferir se a Autoridade Tributária e Aduaneira cumpriu o ónus que sobre ela recaía aferindo-se do alegado pela aqui Recorrente.
Ora, como foi enunciado na decisão recorrida: “(…) foram os seguintes os fundamentos da utilização de métodos indiretos: 1. Inexistência de originais ou cópias dos documentos que titularam transmissões de bens e prestações de serviços e cópias dos ficheiros SAFT da faturação; 2. Inventários sobrevalorizados; 3. Omissão de faturação em produtos não transformáveis; 4. Desconformidades na contabilização das contas de depósitos e caixa; 5. Suprimentos sem suporte documental ou inadequado; 6. Margens brutas muito reduzidas, sendo mesmo negativas em 2014; 7. Prejuízos fiscais durante três anos consecutivos.”
Assim, face aos elementos recolhidos, conclui-se que a Autoridade Tributária e Aduaneira logrou reunir um conjunto de elementos capazes de aventar que a contabilidade da Recorrente padece de erros e de omissões impeditivos de determinar a matéria tributável por via directa, e, nem se diga que somente no seu conjunto eles traduzem essa impossibilidade, na medida em que, alguns dos indícios, só por si, justificariam a aplicação de métodos indirectos, tais como i) a inexistência de facturas das vendas e prestação de serviços ii) inventários sobrevalorizados, iii) omissão de faturação em produtos não transformáveis e iv) desconformidades na contabilização das contas de depósitos e caixa.
Com efeito, consideramos que qualquer um destes indícios, atenta a sua gravidade e o que eles traduzem justificaria por si só a determinação da matéria colectável por via da aplicação de métodos indirectos.
A Recorrente, vem, no entanto, tentar contrariar e desconsiderar a importância dos indícios recolhidos pela Autoridade Tributária e Aduaneira, vejamos então cada um dos fundamentos apresentados.
Considerou o Tribunal a quo que “Do mesmo modo, a falta de aderência à realidade dos inventários, reconhecida pela Impugnante, pelo reflexo que tem em sede do apuramento do custo das existências vendidas e matérias-primas consumidas, retira idoneidade ao apuramento dos resultados operacionais constante da contabilidade e, consequentemente, da matéria tributável declarada na modelo 22 de IRC.”
Invoca a Recorrente que “se os inventários não refletem o real valor das mesmas e a AT verificou o erro, devia-o ter corrigido pelo método direto e por montante exato, pois se as bebidas estavam mal valorizadas, esse erro foi detetado no confronto com o documento de aquisição e o valor constante no inventário”
Assim, a Recorrente, em vez de justificar as irregularidades detectadas nos inventários, defende que a Autoridade Tributária e Aduaneira deveria ter procedido à correcção dos inventários por via directa.
Ademais, a Recorrente apesar de confessar que existem valores de rubricas que foram mal valorizadas (cfr. artigo 91. do corpo das alegações do recurso), defende que os supostos erros não têm a gravidade que inquinem a aplicação do método indirecto
Ora, para além de recair sobre a Recorrente o ónus da regularização da sua contabilidade, como decorria à data do disposto nas alíneas a) e b) do n.º 3 do artigo 17.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, este não foi o único indício recolhido, por forma a que a sua correcção permitisse a determinação da matéria colectável por via directa.
Com efeito, não obstante, se poder aventar da possibilidade deste indício puder ser corrigido individualmente por via directa, há que atender aos demais elementos que compõe o apuramento da matéria colectável, como seja a margem bruta sobre a venda das mercadorias, a omissão da facturação, etc…
Invoca também a Recorrente que “se existem entradas de suprimentos na contabilidade a antecederem os pagamentos a fornecedores, isto é, antes dos pagamentos a fornecedores de investimento ocorrerem, tal facto não inquina a determinação dos rendimentos tributáveis”.
Ora, como decorre do relatório do procedimento inspectivo, coligido no ponto F. da matéria de facto assente, a existência de suprimentos não fundamentou, por si só, a actuação da Autoridade Tributária e Aduaneira, na medida em que, a irregularidade detectada decorre da falta ou inadequação de suporte documental dos suprimentos efectuados, não tendo a Recorrente logrado apresentar qualquer justificação para tal.
Invoca ainda a Recorrente que “Segundo o facto provado em O. “A impugnante procedeu à submissão dos ficheiros SAFT no portal das finanças”, mostrando-se assim contrário ao facto dado como provado em F. na parte em que se refere “inexistência dos ficheiros de faturação”.
Ora, para além da Recorrente não ter impugnado nessa parte a matéria de facto assente, como se impunha, é perceptivel do relatório do procedimento inspectivo que efectivamente a Recorrente não detinha todos os ficheiros de faturação, tendo sido possível “obter os ficheiros SAFT da faturação dos anos de 2013 e 2014, excluindo os meses de abril e maio de 2013 e janeiro, novembro e dezembro de 2014” – cfr. decorre de “IV. MOTIVOS E EXPOSIÇÃO DOS FACTOS QUE IMPLICAM O RECURSO A MÉTODOS INDIRETOS IV.1. ABORDAGEM DETALHADA AOS MOTIVOS E PRESSUPOSTOS IV.1.1. Ficheiros SAFT – Faturação”
Ademais, ao longo do relatório é dado conta, por diversas vezes, que os ficheiros SAFT da faturação foram recuperados, não tendo, no entanto, sido recuperados na sua totalidade.
Invoca também a Recorrente que desconhece “onde é que, de direito, se tem por pacífico que a falta de apresentação dos ditos ficheiros impede a comprovação do declarado”, não compreendendo a apreciação critica do Tribunal a quo quando considerou que “Tem-se por pacífico que a falta de apresentação de cópia das faturas emitidas e dos ficheiros SAFT onde o seu teor é referido impede a comprovação do declarado, constituindo fundamento da aplicação dos métodos indiretos”, não compreendendo também porque os ficheiros eram relevantes para o apuramento e controlo pelo método directo.
Ora, mais uma vez a Recorrente usa uma técnica de defesa inacabada, na medida em que, não apresenta qualquer justificação para a falta de apresentação de cópia das faturas emitidas, limitando-se a tecer argumentos sobre os ficheiros SAFT.
Com efeito, é perceptivel que o Tribunal a quo relevou a falta dos ficheiros SAFT, uma vez que, não constavam da contabilidade da Recorrente as cópias das facturas emitidas, não tendo sido percecptivel aferir das mesmas por inexistência de todos os ficheiros SAFT.
Quanto aos funcionários, e uma vez estabilizada a matéria de facto, a Recorrente não logrou comprovar o n.º de funcionários a trabalhar no ano de 2003 e 2004, não colhendo assim tal fundamento.
Invoca também a Recorrente que “não está demonstrada a existência de correlação entre os saldos credores no caixa, com por exemplo os serviços prestados não faturados”
Quanto aos saldos de caixa, percepcionaram os Serviços da Inspecção Tributária que “os saldos reais das contas de depósitos bancários não coincidem com os que são relevados na contabilidade, porquanto não foi efetuada verdadeira reconciliação bancária” e que o saldo de caixa apresenta saldo negativo, verificando-se assim enorme diferença entre a realidade financeira (caixa e depósitos à ordem) com a percepcionada pela contabilidade – cfr. relatório do procedimento inspectivo coligido no ponto F. da factualidade assente.
Ademais, como decorre da decisão recorrida “na conta caixa são relevados os fluxos das “disponibilidades”, ou seja, do “dinheiro” que “entra” e “sai” e que não se encontra relevado noutras contas (como de depósitos em instituições financeiras). A existência de saldos credores significa que saiu do “caixa” um montante superior àquele que lá deu entrada, o que é equivalente a dizer que se retirou da “caixa registadora” um valor superior ao que lá se tinha posto. Ora, tendo-se por incontroverso que o dinheiro não se reproduziu naquele local e não se podendo retirar o que lá não se colocou previamente, a conclusão óbvia é que ou há erro ou a diferença tinha de ter dado entrada preteritamente sem qualquer registo (por exemplo o recebimento de serviços prestados não faturados).
Se aliarmos tal circunstância com (i) a existência de suprimentos suportados em documentos internos e relativos “pagamentos” que não têm uma origem comprovável (como cheques ou comprovativos de transferências bancárias dos sócios) ou sequer que ocorreram efetivamente, (ii) rendimentos aparentemente incompatíveis com aqueles empréstimos (atente-se o valor dos suprimentos e do rendimento declarado do agregado familiar), não sendo sequer esboçada qualquer explicação convincente para a origem daqueles montantes, as regras de experiência militam no sentido de que há uma probabilidade séria de tais montantes resultarem de operações efetuadas à margem da fiscalidade.” – fim de citação.
Assim, os saldos credores no caixa traduzem irregularidades ao nível dos registos contabilísticos, consubstanciando operações não declarados fiscalmente, pois é certo que as saídas de valores têm de corresponder a entradas da mesma ordem e verificando-se que o montante que sai é superior ao que entrou, então não há dúvidas que entrou dinheiro que não foi registado contabilisticamente.
Invoca outrossim a Recorrente que “apesar de referidos na página 34, em IV.2. Conclusão e fundamentação de facto e de direito -“Prejuízos fiscais durante três anos consecutivos” não encontra no RIT a que três anos se referem os “prejuízos consecutivos, para os explicarmos”.
Ora, perscrutado o relatório do procedimento inspectivo constata-se que decorre do ponto C.1 — Pressupostos para aplicação de métodos indiretos, item 6, a enunciação a prejuízos fiscais declarados durante 3 anos consecutivos – constatando-se que nos exercícios de 2012, 2013 e 2014 a Recorrente apresentou prejuízos fiscais na ordem dos €42.631,99, €47.336,69 e €86.909,02 respectivamente, e, tal como enunciado na decisão recorrida “Os prejuízos fiscais em três anos consecutivos são fundamento de aplicação de métodos indiretos nos termos da alínea e) do n.º 1 do art.º 87.º da LGT”
Quanto à explicação para ocorrer prejuízo em 3 exercícios, não obstante, não decorrer do relatório do procedimento inspectivo que a Autoridade Tributária e Aduaneira tenha questionado a Recorrente por forma a esta justificar tal, a verdade é que também nesta sede a Recorrente não logrou apresentar qualquer justificação para o sucedido, limitando-se mais uma vez a atacar o que decorre do sobredito relatório sem que apresente fundamentos aceitáveis.
Pelo exposto, impõe-se negar provimento ao recurso no que respeita à verificação dos pressupostos para aplicação de métodos indirectos, pois, como decorre da decisão recorrida encontram-se “reunidos os requisitos legalmente previstos para a utilização de métodos indiretos de tributação porquanto, desconhecendo-se o valor das operações omitidas, não era possível proceder à respetiva sanação por meras correções técnicas”.

2.2.3.3 Do erro de julgamento quanto à quantificação da matéria colectável

A Recorrente vem invocar o erro de julgamento quanto à quantificação e manifesto excesso de capacidade contributiva.
Vejamos.
Como decorre do disposto no artigo 83.º n.º 2 da Lei Geral Tributária, a avaliação indirecta visa a determinação do valor dos rendimentos a partir de indícios, presunções ou outros elementos de que a Autoridade Tributária e Aduaneira disponha.
Assim, a quantificação dos rendimentos deve obedecer a critérios tidos como referência, permitindo desta forma a avaliação do rendimento real da forma mais próxima da realidade existente.
Nesta senda, estatui o artigo 90.º da Lei Geral Tributária que perante a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria colectável, a Autoridade Tributária e Aduaneira poderá atender aos vários critérios de avaliação aí espelhados.
Com efeito, decorria, à data dos factos, do artigo 90.º da Lei Geral Tributária que
“1 - Em caso de impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável, a determinação da matéria tributável por métodos indirectos poderá ter em conta os seguintes elementos:
a) As margens médias do lucro líquido sobre as vendas e prestações de serviços ou compras e fornecimentos de serviços de terceiros;
b) As taxas médias de rentabilidade de capital investido;
c) O coeficiente técnico de consumos ou utilização de matérias-primas e outros custos directos;
d) Os elementos e informações declaradas à administração tributária, incluindo os relativos a outros impostos e, bem assim, os relativos a empresas ou entidades que tenham relações económicas com o contribuinte;
e) A localização e dimensão da actividade exercida;
f) Os custos presumidos em função das condições concretas do exercício da actividade;
g) A matéria tributável do ano ou anos mais próximos que se encontre determinada pela administração tributária.
h) O valor de mercado dos bens ou serviços tributados;
i) Uma relação congruente e justificada entre os factos apurados e a situação concreta do contribuinte.
2 - No caso de a matéria tributável se afastar significativamente para menos, sem razão justificada, dos indicadores.”
Assim, este método presumido parte dos factos apurados em sede inspectiva, para inferir o facto desconhecido – rendimento presumivelmente obtido pelo sujeito passivo de imposto – e para, a partir daí determinar a matéria colectável obtida.
Com efeito, embora na aplicação de métodos indirectos não seja possível determinar o rendimento real, deve, todavia, ser aplicado um critério que permita a aproximação à realidade conhecida, usando qualquer dos índices estabelecidos no citado artigo 90.º da Lei Geral Tributária.
Assim, e, não obstante, se ter concluído que à Autoridade Tributária e Aduaneira assistia legitimidade para recorrer à avaliação indirecta, poderá constatar-se, contudo, ter havido excesso na quantificação da matéria colectável apurada nesses termos.
No que respeita ao ónus da prova, e, como decorre do disposto no artigo 74.° n.º 3 da Lei Geral Tributária, uma vez demonstrado pela Autoridade Tributária e Aduaneira o preenchimento dos pressupostos da verificação dos pressupostos da sua aplicação, recai sobre o sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação
Assim, tal como decorre do preceito legal enunciado e como resulta da Jurisprudência reiterada e uniforme, incumbe assim à aqui Recorrente o ónus probandi de que a realidade é completamente distinta do resultado a que conduziu a utilização do critério utilizado, e/ou que houve erro ou manifesto excesso na matéria tributável quantificada.
No entanto, não basta “suscitar dúvidas quanto ao resultado obtido, antes impondo-se que demonstre a inadequação ou errada aplicação dos critérios de quantificação utilizados”, pois “se se apurar que o critério é suscetível de surtir algumas divergências de quantificação, tal, não é suficiente porque o que releva não é uma qualquer divergência ou dissonância, ela terá de ser uma divergência intolerável” – cfr. Acórdão deste Tribunal de 3.02.2022, proc. n.º 01520/07.1BEVIS.
Sustenta a Recorrente que o critério aplicável é errado “porquanto escolhe um restaurante que é o da mediana e aplica-o cegamente, sem explicação das suas características à recorrente, o que conduziu a resultados excessivos”
O Tribunal a quo, embora por remissão para a apreciação que fez da falta de fundamentação do relatório do procedimento inspectivo, decidiu que “Ainda importa referir que não se comunga da apontada inidoneidade da utilização da mediana do rácio, enquanto medida estatística, porquanto o respetivo valor mais não significa que metade dos sujeitos passivos apresentam um rácio de valor superior a esta e a outra metade um rácio inferior. Ao contrário da média que é suscetível a valores extremados que lhe enviesam o respetivo valor (basta que um sujeito passivo apresente um valor anormalmente baixo ou anormalmente alto para distorcer o respetivo resultado, enviesando-o no respetivo sentido), a mediana não é afetada por tais circunstâncias. Daí que em abstrato constitua uma unidade de medida estatística idónea para ser utilizada em modelos de quantificação por estimação, sem prejuízo de a bondade da sua utilização dever ser ponderada em função das características do “universo” em causa (dimensão, valores observados, etc.).” – fim de citação.
Ora, concordamos com o assim decidido, isto porque, estando a Autoridade Tributária e Aduaneira obrigada a quantificar a matéria colectável por via de um dos critérios que tem ao seu dispor, optou pela mediana do rácio, que, como explicitado pelo Tribunal a quo em nada penalizou a Recorrente por se situar a meio dos valores respeitantes à actividade exercida pela Recorrente.
Invoca a Recorrente que o normal é que os restaurantes na fase inicial, como a maioria dos negócios não tenham lucro.
Ora, no caso da Recorrente, o modelo de negócio é precisamente o arranque da actividade e, se assim fosse, considerando que o escopo das sociedades é a obtenção do lucro, não se vislumbraria o móbil da actividade exercida, pois nunca obteria lucro na decorrência do início da actividade dos restaurantes.
Ademais, não se vislumbra que tenha resultado comprovado qual o tempo de arranque de um restaurante e a partir de que momento é que se consegue obter lucro, por forma a justificar a relevância do que vem alegado pela Recorrente, no sentido de que o restaurante Restaurante 1 ... estava no segundo ano em 2013 e no Restaurante 2 ... estava no primeiro ano de atividade, a fazer clientela e, portanto, ainda não tinham entrado em velocidade cruzeiro.
Ora, poderiam os restaurantes não ter entrado ainda em velocidade cruzeiro e, não obstante, darem lucro.
Invoca também a Recorrente que as sobras são superiores às que resultam dos restaurantes do “tipo tradicional”.
Tal facto encontra-se comprovado no ponto S. da matéria de facto assente, no entanto, para além do Tribunal a quo ter tido tal em consideração, tal como o mesmo referencia “tal circunstância não é determinante para a demonstração do excesso de presunção na medida em que, mesmo assim, metade dos restaurantes do distrito de Aveiro apresentam rácios superiores. Consequentemente, embora tal circunstância aponte no sentido de um potencial excesso, não é, contudo, suficiente para lograr a sua demonstração”
Ainda quanto às sobras, consideramos que as mesmas têm de entrar em linha de conta com os autoconsumos, pois os funcionários da Recorrente consumiam as suas refeições no restaurante, nomeadamente consumindo as sobras, e tal como evidenciado pelo Tribunal a quo, “o que conduz à conclusão de que aqueles autoconsumos se devem considerar como fator de mitigação das sobras e sem autonomia para efeitos da demonstração de excesso de quantificação”.
Ora, colocado em causa o erro de julgamento quanto à quantificação da matéria colectável, a Recorrente teria, mediante a apresentação de provas adequadas e fortemente convincentes, conseguir demonstrar que o funcionamento do poder discricionário da Autoridade Tributária e Aduaneira conduziu e traduziu-se na fixação de resultados, no apuramento de valores, objectiva e inquestionavelmente fora dos limites da razoabilidade, da mais ampla e impressiva aceitabilidade, o que no caso presente não sucedeu.
Isto porque, não foi apresentada qualquer prova capaz de contrariar as conclusões da Autoridade Tributária e Aduaneira, restringindo a sua defesa no que considerou ser necessário aferir por forma a apurar a matéria colectável, numa análise casuística insuficientemente concretizada.
Acresce que, a Recorrente não logrou materializar em que medida é que a quantificação era excessiva, o que se impunha.
A par do exposto, e tal como é sobejamente considerado pela nossa Jurisprudência, a avaliação indirecta da matéria colectável mais não é do que uma mera presunção dos rendimentos auferidos pelos sujeitos passivos de imposto, não traduzindo como tal os rendimentos reais, na medida em que tal resultaria da aplicação da avaliação directa que, in casu, não foi possível aplicar.
Pelo exposto, não logrando a Recorrente demonstrar, através de prova concludente, factos que permitissem apontar o excesso da quantificação verificada, inflectindo os pressupostos em que assentou o juízo de probabilidade feito pela Autoridade Tributária e Aduaneira, e consequente erro de julgamento, impõe-se negar provimento ao alegado.

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Nos termos do disposto no artigo 663.º nº 7 do Código de Processo Civil, elabora-se o seguinte sumário:

I. Saber se a AT deu a conhecer os motivos que a motivaram a actuar como actuou, as razões em que fundou a sua actuação, questão que se situa no âmbito da validade formal do acto, respeita à fundamentação formal,
II. Situação distinta e situada já no âmbito da validade substancial do acto, é saber se esses motivos correspondem à realidade e se, correspondendo, são suficientes para legitimar a concreta actuação administrativa, atinente à fundamentação substancial, vulgarmente designado por vicio de violação por erro nos pressupostos.
III. Para desconsideração dos elementos declarados, impõe-se à Autoridade Tributária e Aduaneira carrear elementos objetivos e seguros que demonstrem com um elevado grau de certeza a existência e quantificação dos factos tributários não declarados na medida em que contrariam a presunção de verdade e boa-fé da declaração do contribuinte.
IV. Questionado o erro de julgamento quanto ao excesso da matéria colectável, por via da aplicação a métodos indirectos, a Recorrente teria de, mediante a apresentação de provas adequadas e fortemente convincentes, conseguir demonstrar que o funcionamento do poder discricionário da AT conduziu e traduziu-se na fixação de resultados, no apuramento de valores, objectiva e inquestionavelmente fora dos limites da razoabilidade.


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3 – Decisão

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal em negar provimento ao recurso interposto pela Recorrente e, em consequência, manter a sentença recorrida.


Custas pela Recorrente, nos termos do disposto no artigo 7.º n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais.

Porto, 30 de Janeiro de 2025


Virgínia Andrade
Graça Martins
Irene Isabel das Neves